Mauro Santayana é um dos jornalistas mais experientes e sagazes que o Brasil já teve.
Vai aqui sua análise comparativa entre dois mundos: o que se pretende e o que na prática está prevalecendo hoje em dia no Brasil.
É
curiosa a situação que vive hoje o Brasil.
Estamos
em plena vigência de um Estado de Direito?
Ou
de um “estado” de direita, que está nos levando, na prática, a
um estado de exceção?
Afinal,
no Estado de Direito, você tem o direito de ir e vir, de freqüentar
um bar ou um restaurante, ou desembarcar sem ser incomodado em um
aeroporto, independente de sua opinião.
No
estado de direita, você pode ser reconhecido, insultado e
eventualmente agredido, por um bando de imbecis, na saída do
estabelecimento ou do avião.
No
Estado de Direito, você pode cumprimentar com educação o seu
vizinho no elevador, desejando-lhe um Feliz Ano Novo.
No
estado de direita, você tem grande chance de ouvir como resposta:
“tomara que em 2016 essa vaca saia da Presidência da República,
ou alguma coisa aconteça com essa cadela, em nome do Senhor.”
No
Estado de Direito, você pode mandar “limpar” o seu computador
com antivírus quando quiser.
No
estado de direita, você pode ficar preso indefinidamente por isso,
até que eventualmente confesse ou invente alguma coisa que atraía o
interesse do inquisidor.
No
Estado de Direito, você tem direito a ampla defesa, e o trabalho dos
advogados não é cerceado.
No
estado de direita, quebra-se o sigilo de advogados na relação com
seus clientes.
No
Estado de Direito, a Lei é feita e alterada por quem foi votado para
fazer isto pela população.
No
“estado” de direita, instituições do setor público se lançam
a promover uma campanha claramente política – já imaginaram a
Presidência da República colhendo assinaturas na rua para aumentar
os seus próprios poderes? – voltada para a aprovação de um
conjunto de leis que diminui – em um país em que 40% dos presos
está encarcerado sem julgamento – ainda mais as prerrogativas de
defesa dos cidadãos.
No
Estado de Direito, você é protegido da prisão pela presunção de
inocência.
No
estado de direita, inexistem, na prática, os pressupostos da prisão
legal e você pode ser detido com base no “disse me disse” de
terceiros; em frágeis ilações; do que “poderá” ou “poderia”,
teoricamente, fazer, caso continuasse em liberdade; ou subjetivas
interpretações de qualquer coisa que diga ao telefone ou escreva em
um pedaço de papel – tendo tudo isso amplamente vazado, sem
restrição para a “imprensa”, como forma de manipulação da
opinião pública e de chantagem e de pressão.
No
Estado de Direito, você pode expressar, em público, sua opinião.
No
estado de direita, você tem que se preocupar se alguém está
ouvindo, para não ter que matar um energúmeno em legítima defesa,
ou “sair na mão”.
No
Estado de Direito, os advogados se organizam, e são a vanguarda da
defesa da Lei e da Constituição.
No
estado de direita, eles deixam agir livremente – sem sequer
interpelar judicialmente – aqueles que ameaçam a Liberdade, a
República e os cidadãos.
No
Estado de Direito, membros do Ministério Público e da Magistratura
investigam e julgam com recato, equilíbrio, isenção e discrição.
No
estado de direita, eles buscam a luz dos holofotes, aceitam prêmios
e homenagens de países estrangeiros ou de empresas particulares, e
recebem salários que extrapolam o limite legal permitido, percebendo
quase cem vezes o que ganha um cidadão comum.
No
Estado de Direito, punem-se os corruptos, não empresas que geram
riquezas, tecnologia, conhecimento e postos de trabalho para a Nação.
No
estado de direita, “matam-se” as empresas, paralisam-se suas
obras e projetos, estrangula-se indiretamente seu crédito, se corrói
até o limite o seu valor, e milhares de trabalhadores vão para o
olho da rua, porque a intenção não parece ser punir o crime, mas
sabotar o governo e destruir a Nação.
No
Estado de Direito, é possível fazer acordos de leniência, para que
companhias possam continuar trabalhando, enquanto se encontram sob
investigação.
No
estado de direita, isso é considerado “imoral”. Não se pode ser
leniente com empresas que pagam bilhões em impostos e empregam
milhares de pessoas, mas, sim, ser mais do que leniente com bandidos
contumazes e notórios, com os quais se fecha “acordos” de
“delação premiada”, mesmo que eles já tenham descumprido
descaradamente compromissos semelhantes feitos no passado com os
mesmos personagens que conduzem a atual investigação.
No
Estado de Direito, existe liberdade e diversidade de opinião e de
informação.
No
estado de direita, as manchetes e as capas de revista são sempre as
mesmas, os temas são sempre os mesmos, a abordagem é quase sempre a
mesma, o lado é sempre o mesmo, os donos são sempre os mesmos, as
informações e o discurso são sempre os mesmos, assim como é
sempre a mesma a parcialidade e a manipulação.
No
Estado de Direito você pode ensinar história na escola do jeito que
a história ocorreu.
No
estado de direita, você pode ser acusado de comunista e perder o seu
emprego pela terceira ou quarta vez.
No
Estado de Direito você pode comemorar o fato de seu país ter as
oitavas maiores reservas internacionais do planeta, e uma dívida
pública que é muito menor que a dos países mais desenvolvidos do
mundo.
No
estado de direita você tem que dizer que o seu país está quebrado
para não ser chamado de bandido ou de ladrão.
No
Estado de Direito, você pode se orgulhar de que empresas nacionais
conquistem obras em todos os continentes e em alguns dos maiores
países do mundo, graças ao seu know-how e capacidade de realização.
No
estado de direita, você deve acreditar que é preciso quebrar e
destruir todas as grandes empresas de engenharia nacionais, porque as
empresas estrangeiras – mesmo quando multadas e processadas por
tráfico de influência e pagamento de propinas em outros países –
“não praticam corrupção.”
No
Estado de Direito você pode defender que os recursos naturais de seu
país fiquem em mãos nacionais para financiar e promover o
desenvolvimento, a prosperidade e a dignidade da população.
No
estado de direita você tem que dizer que tudo tem que ser
privatizado e entregue aos gringos se não quiser arrumar confusão.
No
Estado de Direito, você pode defender abertamente o desenvolvimento
de novos armamentos e de tecnologia para a defesa da Nação.
No
estado de direita, você vai ouvir que isso é um desperdício, que o
país “não tem inimigos”, que as forças armadas são
“bolivarianas”, que o Brasil nunca vai ter condições de
enfrentar nenhum país poderoso, que os EUA, se quiserem, invadem e
ocupam isso aqui em 5 minutos, que o governo tem que investir é em
saúde e educação.
No
Estado de Direito, é crime insultar ou ameaçar, ou acusar, sem
provas, autoridades do Estado e o Presidente da República.
No
estado de direita, quem está no poder aceita, mansamente,
cotidianamente, os piores insultos, adjetivos, acusações,
insinuações e mentiras, esquecendo-se que tem o dever de defender a
Democracia, a liturgia do cargo, aqueles que o escolheram, a Nação
que representam e teoricamente, comandam, e a Lei e a Constituição.
No
Estado de Direito, você pode interpelar judicialmente quem te ameaça
pela internet de morte e de tortura ou faz apologia de massacre e
genocídio ou da quebra da ordem institucional e da hierarquia e da
desobediência à Constituição.
No
estado de direita, muita gente acha que “não vale a pena ficar
debatendo com fascistas” enquanto eles acreditam, fanaticamente,
que representam a maioria e continuam, dia a dia, disseminando
inverdades e hipocrisia e formando opinião.
No
Estado de Direito você poderia estar lendo este texto como um jogo
de palavras ou uma simples digressão.
No
estado de direita, no lugar de estar aqui você deveria estar
defendendo o futuro da Liberdade e dos seus filhos, enfrentando, com
coragem e informação, pelo menos um canalha por dia no espaço de
comentários – onde a Democracia está perdendo a batalha – do
IG, do Terra, do MSN, do G1 ou do UOL.
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