Por Fernando Castilho
Estava numa fila para resolver problemas particulares quando um senhor de cabelos brancos, aparentando uns 70 anos puxou conversa comigo:
O que o senhor acha dessa guerra do Bolsonaro com o STF?
Observei o homem de cima a baixo e algo me disse que ele era adepto das teses do presidente. Decidi responder que o STF tem razão.
Pronto, bastou para o seguidor se revelar:
É a ditadura de toga, exclamou. Bolsonaro precisa fechar o STF e o Congresso para poder governar!
Embora não concorde com tamanha bobagem, sempre acho que é preciso ouvir a outra parte em sinal de respeito às diferentes opiniões. Por isso, adotei, como em outras vezes, o método socrático de fazer perguntas para que a outra parte, caso não tenha argumentos coerentes, caia em contradição.
Perguntei se, uma vez fechados o STF e o Congresso Nacional, Bolsonaro governaria sozinho.
Não, claro que não! Ele tem o partido dele que vai ajudá-lo!
Mas, se o Congresso foi fechado, como ainda haveria um partido?
Primeira contradição. Não soube responder, tentando mudar de assunto.
Mas veja, o ministro Marcos Pontes, o astronauta, já tem a vacina nacional para a Covid-19. O Bolsonaro não queria vacinas estrangeiras, por isso é que foi obrigado a ir adiando a compra de vacinas, disse ele num tom mais de dúvida que de afirmação.
Perguntei se Marcos Pontes ainda era ministro.
Não é mais, respondeu o homem.
E a vacina, em que pé está?
Bem, não sei. Mas agora não importa, já que está quase todo mundo vacinado, né?
Mais contradição.
Voltando às perguntas: o senhor acha que, Bolsonaro reeleito, vai ser bom para o país?
- Ele tem que terminar o que começou, né? Em 4 anos não dá pra fazer tudo, né?
- O que falta ele terminar?
- Ah, falta melhorar a economia, baixar os preços dos alimentos e da gasolina.
- Ele está trabalhando pra isso?
- Agora não dá porque ele está em campanha, viajando pelos estados.
O homem ficou vermelho.
Indaguei: mas por que Bolsonaro é tão bom para o país?
- Ora, porque ele é enviado por Deus, é a favor da família, contra os gays e a Anitta.
- O senhor acha que ele vai fazer alguma coisa contra os gays?
- Ah, aí não dá, né? Só matando. Mas ele vai falando contra, sabe como é, né?
- E a Anitta? Ele vai proibir ela de rebolar?
- Se ele tivesse esse poder, ia proibir sim.
- Mas se ele não pode fazer nada contra os gays nem proibir a Anitta de rebolar, o senhor acha que mesmo assim ele está fazendo um bom governo e merece continuar?
O velho mudou de assunto.
- Ele está combatendo o comunismo!
- É mesmo? Tem comunismo no Brasil?
- Tem, não, graças a Deus! Mas se tiver, ele combate.
Olhou para os lados, incomodado e disse: esta fila está muito demorada. Dá licença que vou embora.
Uma só pessoa não representa os 30% que Bolsonaro tem de eleitores, mas fica claro que há muitos que pensam de forma parecida. Gente que vê ameaça comunista em todos os lugares, que odeia a população LGBTQIA+, que acha que um presidente pode mais que a Constituição, que não se importa com as milhares de vidas ceifadas pela pandemia, que vê com naturalidade o armamento daqueles que podem adquirir armas, que não percebe que seu mito não trabalha e não se importa com a escalada do desemprego, a alta dos preços dos alimentos e combustíveis e a corrupção que grassa em seus ministérios. Parece até que têm cupons de desconto por serem bolsonaristas.
Não se trata aqui de fazer apologia a Lula, mas de repelir o autor desse quadro de destruição para que ele não consiga completar sua obra.
Antes de Bolsonaro se eleger, ele avisou a que viria e muita gente não acreditou.
Agora ele avisa que dará um golpe e muita gente ainda não acredita.
É preciso que o povo e a sociedade civil se mobilizem em defesa do STF, mesmo aqueles que criticam a instituição por seus atos e omissões no passado recente.
Se o capitão vencer essa queda de braço com o Supremo, cujo pivô é um deputado louco por ditadura, sairá fortalecido e confiante para um golpe que pode resultar em última instância, até numa guerra civil.
Fiquemos atentos.
De acordp.
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