Charge: Aroeira |
A
ideia deste texto não é absolutamente sugerir uma forma de resposta
por parte da presidente. É apenas uma carta.
Caro
vice- presidente, Michel Temer,
O
senhor reclamou em sua carta endereçada à presidente Dilma, de sua
perda de protagonismo.
Sr.
Michel, primeiramente, o senhor não é protagonista no governo, o
senhor é vice, vamos lembrar.
Vossa
Excelência se disse indignada por sua missiva, de teor pessoal ter
sido vazada para a mídia.
Ora,
está na cara, percebe-se, está nas entrelinhas, na composição do
texto, na forma de linguagem, que ela foi dirigida à imprensa. Se
não o fosse, a Globonews teria revelado que a obteve de uma fonte do
Planalto, já que o interesse da emissora é grande em jogar mais
gasolina nessa fogueira, estejamos certos.
Portanto,
foi o senhor que divulgou a carta à imprensa, certo?
E
mais, ela se destina também ao PMDB e à oposição como quem grita
num megafone: ''ei, estou aqui e quero ser o presidente! Vamos com
tudo ao golpe, que eu assumo e faço o jogo que todos nós
queremos!''
Desde
que teve início o ''apoio'' do PMDB ao governo, o senhor não fez
outra coisa senão atuar com dubiedade, trocando esse apoio por
cargos e mais cargos, não é?
Nunca
poderia passar pela cabeça de quem raciocina um pouco e acompanha
política, que o PMDB participaria de um governo preocupado com
causas sociais. Nunca.
O
senhor agora sai usando como pretexto um difuso desdém com que Dilma
teria lhe tratado ao logo destes anos. Quer sair fazendo-se de
vítima: ''olha aí, minha gente, o que tenho sofrido nas mãos dessa
mulher diabólica que todos querem ver pelas costas!'', é como
traduzo o sentido da missiva.
Poderia
ter saído com discrição e talvez com certa honradez, mas preferiu
outro caminho.
Sei
que o senhor e outros precisam que Dilma seja impedida de governar.
Dizem que seu nome e os de outros podem ser citados a qualquer
momento em delação premiada.
Delcído
poderá falar. E Delcídio vem de governo anterior ao de Lula, certo?
Leia também este outro artigo sobre Temer
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O
senhor se lembra de quando, em 1998, como Presidente da Câmara,
conseguia junto à Fernando Henrique Cardoso, verbas para prefeituras
do PSDB?
O
senhor visitava prefeitos, era recebido com pompa e depois enviava o
chefão de empreiteira envolvida na Lava Jato para oferecer projetos
habitacionais, de urbanização de favelas e de modificações no
sistema viário a prefeituras tucanas. O homem afirmava que o senhor
já havia garantido recursos enormes para os municípios. E que isso
iria ser bom para todos.
FHC-Michel-empreiteira-tucanos-lava
jato. Olha a conexão.
O
juiz Moro até deu uma sumida nos últimos tempos, talvez aguardando
o impeachment que teria o poder de fazer todo o restante da operação
Lava Jato cair no esquecimento, uma vez que os petistas que poderiam
ser presos já foram.
Convenhamos,
Dilma não foi citada nem será, não é? Agora só sobram os outros
e queremos saber quem são.
O senhor reclamou que Dilma se aproximou do deputado Picciani. O tom é de ciúmes, mas sabemos que não foi por isso, não é? Reclamou, na verdade, porque Picciani é contra o impeachment e está propondo para a Comissão que estudará o processo, nomes favoráveis à presidente. Isso destrói seus planos futuros imediatos, não?
Qual são eles?
Já
sem Dilma, defenestrada por um julgamento espúrio e ilegítimo,
porque as pedaladas fiscais não configuram crime de
responsabilidade, como o senhor que é advogado bem sabe, o caminho
estaria aberto para que o vice (e nessas horas é que os vices tem
valor), assumisse a tão sonhada e até então longínqua presidência
da República. Sim, longínqua porque Dilma nunca o faria seu
sucessor, não é?
Além disso, o senhor sabe que a reportagem do Estadão publicou um artigo afirmando que Vossa Excelência assinou sete decretos de pedaladas fiscais, não sabe?
Além disso, o senhor sabe que a reportagem do Estadão publicou um artigo afirmando que Vossa Excelência assinou sete decretos de pedaladas fiscais, não sabe?
Acomodado
na cadeira presidencial, após o atentado à democracia ter sido
deflagrado, as primeiras medidas a serem tomadas seriam:
1)
Tranquilizar o povo, pois o mal foi afastado e agora o país entrará
no rumo certo.
Como
se o senhor nunca tivesse feito parte do governo. Neste item em
particular, a mídia teria um papel de destaque, mas isso o senhor já
deve ter negociado. Grana do BNDES para socorrer a velha imprensa é
muito bem-vinda. A crise econômica sairia do noticiário, as pessoas
ficariam felizes e confiantes e o país voltaria a crescer.
2)
Suprimir a independência de atuação da Procuradoria Geral da
República e da Polícia Federal e passar a controlar a Lava Jato até
que ela caia no esquecimento. Todos se livrariam, até seu amigo,
Eduardo Cunha.
3)
Colocar em ação o Plano Temer, elaborado por seu comparsa, Moreira
Franco, que acaba com os programas sociais, o reajuste automático do
salário mínimo, o sistema de partilha do pré-sal e inaugura um
novo período de privatizações. Ou seja, o senhor poria pra
funcionar o programa de governo do Aécio Neves. Mais sobre o Plano Temer, aqui
Possivelmente
ele próprio e José Serra, que já se ofereceu para ser seu
colaborador em eventual governo, seriam convocados para ser seus
ministros.
Mas
faltou combinar com os russos.
Não
pense que não haverá reação ao seu golpe.
A
consciência de 54,5 milhões de votos não se compra tão facilmente
com essa jogada.
Pode
ser que esta seja sua grande oportunidade na vida, mas não se iluda,
vai ser muito difícil governar em meio à convulsão social que se
seguiria logo após o golpe.
Em
tempo: o senhor não engana a ninguém com sua cartinha.
Leia
abaixo a íntegra da carta obtida pela GloboNews:
São
Paulo, 07 de Dezembro de 2.015.
Senhora
Presidente,
"Verba
volant, scripta manent" (As palavras voam, os escritos
permanecem)
Por
isso lhe escrevo. Muito a propósito do intenso noticiário destes
últimos dias e de tudo que me chega aos ouvidos das conversas no
Palácio.
Esta
é uma carta pessoal. É um desabafo que já deveria ter feito há
muito tempo.
Desde
logo lhe digo que não é preciso alardear publicamente a necessidade
da minha lealdade. Tenho-a revelado ao longo destes cinco anos.
Lealdade
institucional pautada pelo art. 79 da Constituição Federal. Sei
quais são as funções do Vice. À minha natural discrição
conectei aquela derivada daquele dispositivo constitucional.
Entretanto,
sempre tive ciência da absoluta desconfiança da senhora e do seu
entorno em relação a mim e ao PMDB. Desconfiança incompatível com
o que fizemos para manter o apoio pessoal e partidário ao seu
governo.
Basta
ressaltar que na última convenção apenas 59,9% votaram pela
aliança. E só o fizeram, ouso registrar, por que era eu o candidato
à reeleição à Vice.
Tenho
mantido a unidade do PMDB apoiando seu governo usando o prestígio
político que tenho advindo da credibilidade e do respeito que
granjeei no partido. Isso tudo não gerou confiança em mim, Gera
desconfiança e menosprezo do governo.
Vamos
aos fatos. Exemplifico alguns deles.
1.
Passei os quatro primeiros anos de governo como vice decorativo. A
Senhora sabe disso. Perdi todo protagonismo político que tivera no
passado e que poderia ter sido usado pelo governo. Só era chamado
para resolver as votações do PMDB e as crises políticas.
2.
Jamais eu ou o PMDB fomos chamados para discutir formulações
econômicas ou políticas do país; éramos meros acessórios,
secundários, subsidiários.
3.
A senhora, no segundo mandato, à última hora, não renovou o
Ministério da Aviação Civil onde o Moreira Franco fez belíssimo
trabalho elogiado durante a Copa do Mundo. Sabia que ele era uma
indicação minha. Quis, portanto, desvalorizar-me. Cheguei a
registrar este fato no dia seguinte, ao telefone.
4.
No episódio Eliseu Padilha, mais recente, ele deixou o Ministério
em razão de muitas "desfeitas", culminando com o que o
governo fez a ele, Ministro, retirando sem nenhum aviso prévio, nome
com perfil técnico que ele, Ministro da área, indicara para a ANAC.
Alardeou-se a) que fora retaliação a mim; b) que ele saiu porque
faz parte de uma suposta "conspiração".
5.
Quando a senhora fez um apelo para que eu assumisse a coordenação
política, no momento em que o governo estava muito desprestigiado,
atendi e fizemos, eu e o Padilha, aprovar o ajuste fiscal. Tema
difícil porque dizia respeito aos trabalhadores e aos empresários.
Não titubeamos. Estava em jogo o país. Quando se aprovou o ajuste,
nada mais do que fazíamos tinha sequência no governo. Os acordos
assumidos no Parlamento não foram cumpridos. Realizamos mais de 60
reuniões de lideres e bancadas ao longo do tempo solicitando apoio
com a nossa credibilidade. Fomos obrigados a deixar aquela
coordenação.
6.
De qualquer forma, sou Presidente do PMDB e a senhora resolveu
ignorar-me chamando o líder Picciani e seu pai para fazer um acordo
sem nenhuma comunicação ao seu Vice e Presidente do Partido. Os
dois ministros, sabe a senhora, foram nomeados por ele. E a senhora
não teve a menor preocupação em eliminar do governo o Deputado
Edinho Araújo, deputado de São Paulo e a mim ligado.
7.
Democrata que sou, converso, sim, senhora Presidente, com a oposição.
Sempre o fiz, pelos 24 anos que passei no Parlamento. Aliás, a
primeira medida provisória do ajuste foi aprovada graças aos 8
(oito) votos do DEM, 6 (seis) do PSB e 3 do PV, recordando que foi
aprovado por apenas 22 votos. Sou criticado por isso, numa visão
equivocada do nosso sistema. E não foi sem razão que em duas
oportunidades ressaltei que deveríamos reunificar o país. O Palácio
resolveu difundir e criticar.
8.
Recordo, ainda, que a senhora, na posse, manteve reunião de duas
horas com o Vice Presidente Joe Biden - com quem construí boa
amizade - sem convidar-me o que gerou em seus assessores a pergunta:
o que é que houve que numa reunião com o Vice Presidente dos
Estados Unidos, o do Brasil não se faz presente? Antes, no episódio
da "espionagem" americana, quando as conversar começaram a
ser retomadas, a senhora mandava o Ministro da Justiça, para
conversar com o Vice Presidente dos Estados Unidos. Tudo isso tem
significado absoluta falta de confiança;
9.
Mais recentemente, conversa nossa (das duas maiores autoridades do
país) foi divulgada e de maneira inverídica sem nenhuma conexão
com o teor da conversa.
10.
Até o programa "Uma Ponte para o Futuro", aplaudido pela
sociedade, cujas propostas poderiam ser utilizadas para recuperar a
economia e resgatar a confiança foi tido como manobra desleal.
11.
PMDB tem ciência de que o governo busca promover a sua divisão, o
que já tentou no passado, sem sucesso. A senhora sabe que, como
Presidente do PMDB, devo manter cauteloso silencio com o objetivo de
procurar o que sempre fiz: a unidade partidária.
Passados
estes momentos críticos, tenho certeza de que o País terá
tranquilidade para crescer e consolidar as conquistas sociais.
Finalmente,
sei que a senhora não tem confiança em mim e no PMDB, hoje, e não
terá amanhã. Lamento, mas esta é a minha convicção.
Respeitosamente,
\
L TEMER
A
Sua Excelência a Senhora
Doutora
DILMA ROUSSEFF
DO.
Presidente da República do Brasil
Palácio
do Planalto