sexta-feira, 26 de junho de 2015

Os ungidos e a pregação do mal

Por Fernando Castilho


Latuff


Assistimos nos dias de hoje ao crescimento do ódio, da intolerância e do preconceito, fomentados justamente por aqueles que deveriam pregar o amor ensinado pelo Senhor que eles dizem representar aqui na Terra, Jesus Cristo.

Sem generalizar, uma vez que devem existir pastores que realmente praticam o bem, os ''ungidos'', como eles se intitulam, não mais se detém diante de questões em que Cristo sem pensar muito, certamente iria para o lado do mais fraco. Extorquem dinheiro dos mais pobres, aterrorizam com ameaças de inferno após a morte, defendem que bandido bom é bandido morto, apedrejam quem pratica outros credos, influenciam o assassinato de gays e por aí vai. Para quem acredita, é coisa do diabo, ou não é?

O Congresso Nacional está infestado dessas pessoas que não se poupam em se aliar à bancada da bala, aquela que defende o armamento das pessoas, a pena de morte, a redução da maioridade penal, ou mesmo a volta da ditadura.

Não se limitam a isso. São homofóbicos, racistas e violentos em seus discursos nas Câmaras e nas Assembleias.

Se depender desses indivíduos, retrocederemos à Idade Média, anteriormente a Martinho Lutero, aquele que justamente fundou o protestantismo que é o norte das religiões evangélicas.

O catolicismo já teve historicamente suas máculas. Matou milhares nas Cruzadas e mais milhares na Inquisição, entre eles Joana D'Arc e Giordano Bruno. Ninguém é santo, vamos combinar.

O último Papa considerado no mundo todo um homem justo, após a triste experiência do nazista Pio XII, foi João XXIII que faleceu em 1963. Mas, mesmo assim, vários grupos tradicionalistas acusavam-no de ser radical de esquerda e herege por ter convocado o Concílio Vaticano II e promovido a liberdade religiosa e o ecumenismo (lembra alguém?)

Após João XXIII veio João Paulo I que pontificou somente durante um mês e que pode ter sido envenenado, segundo dizem, uma vez que logo no início quebrou vários protocolos ao recusar o luxo e a ostentação, desagradando aos tradicionalistas. João Paulo I poderia, já em 1978, ter iniciado o trabalho de Francisco, mas talvez não tenham deixado.

Depois vieram João Paulo II e Bento XVI, dois papas tradicionalistas que nada fizeram pela modernização da Igreja e nem pelo seu enquadramento na filosofia de Cristo, muito pelo contrário, alimentaram a intolerância. Mas foram papas pop.

Francisco vem enfim reposicionar o catolicismo dentro dos ensinamentos de Cristo, pela igualdade, tolerância, justiça social, voto pela simplicidade, etc.. Já recebeu transexuais e homossexuais, já abrigou mendigos, intermediou a reaproximação entre Estados Unidos e Cuba e acaba de publicar a Encíclica Laudato Sí sobre o meio ambiente, em que critica o capitalismo como modelo de destruição da natureza. Almoça no bandejão pois assim é mais difícil que o envenenem. o Papa é alinhado com aqueles que sempre, durante sua vida toda, defenderam os injustiçados e os menos favorecidos, como Dom Pedro Casaldáliga e outros. Francisco faz justamente o contrário do que os pastores pop fazem.

Enquanto a Igreja Católica está estruturada mundialmente pela figura papal, os neopentecostais estão pulverizados em várias pequenas estruturas chefiadas por bispos.
É assim que os pop Edir Macedo, Silas Malafaia, Valdemiro, Marco Feliciano e outros comandam seus rebanhos. E competem entre si. O uso da mídia televisiva e da internet é abundante para eles.

Seu crescimento quase que exponencial ocorre justamente neste período que vivemos de renascimento do fascismo já demonstrado em vários episódios recentes. Torna-se necessário um estudo mais detalhado desse fenômeno sociológico.

À custa daqueles que passam por dramas em suas vidas, metidos em drogas, sem perspectiva de futuro, esses pastores conseguiram enriquecer com o dízimo e já aparecem na lista da Forbes. Segundo a teologia da prosperidade, quanto mais você oferta, mais retorna a você. Retornou para eles, cujo símbolo máximo de Deus não é a cruz, mas sim o cifrão.

O dízimo é despudoradamente pedido como oferta na casa do Senhor. A ameaça vem logo em seguida: ''se você não ofertar, meu irmão (alguns já falam mermão), como você espera que Deus vá lhe ajudar? Cadê a senha do cartão? Não dá a senha e quer que Deus ajude? Assim não dá!''

A origem do dízimo está em Israel, anterior a Cristo, quando este agrupamento de aldeias era governado por um sistema teocrático. Quem mandava era o Sinédrio, a Igreja da época, que entregou Cristo a Pôncio Pilatos. Os sacerdotes tinham poderes de prefeitos, de polícia, de coletores de impostos e de rabinos. Pagava-se o dízimo para que se mantivessem as vielas em estado razoável, uma vez que sempre chovia muito na região, se fizessem obras de contenção, construção de templos, cisternas, funerais, etc.. Enfim, serviços do Estado.

Hoje em dia esses serviços nos países não teocráticos são executados pelas prefeituras, o que desmoraliza a cobrança por parte dos pastores.

Não que a Igreja Católica não se utilize de contribuições, mas estas são voluntárias. O padre não ameaça ninguém. É riquíssima porque se apropriou de terras no passado.

Segundo o que se depreende do Novo Testamento, Cristo nunca cobrou nada de ninguém para fazer milagres e pregar com seus apóstolos. Vivia entre gente humilde, inclusive zelotes (aqueles que praticavam atos classificados como terroristas visando a libertação de Israel do jugo romano) e do que lhe era dado, tão somente.

Os pastores, não contentes em já estarem milionários, ainda querem mais. Querem que a religião evangélica seja ensinada nas escolas. Se conseguirem, o rebanho aumentará e consequentemente, os lucros. Não há limites pra esse pessoal.

A Educação é laica e o Estado também.

Se Bento XVI ainda fosse o Papa não haveria nenhum tipo de contraponto.

Felizmente, Francisco é uma brisa de esperança dando diariamente lições que podem servir de marco divisório entre o que é decente, fraterno e justo e o que é puro estelionato e retrocesso civilizatório.






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