quinta-feira, 11 de fevereiro de 2016

Dilma, Lula, o republicanismo e a ética

Por Fernando Castilho



Uma reflexão sobre se Dilma, Cardozo e até mesmo Lula estariam sendo alvos daqueles que se aproveitam, de maneira aética (com licença do trocadilho) de seu discurso republicano.


Durante debates na campanha eleitoral de 2014, Dilma Rousseff usou mais de uma vez as frases ''não restará pedra sobre pedra'' e ''as investigações ocorrerão, doa a quem doer''.

Dilma é o que se pode chamar de republicana. Ela gosta disso.

Ao que consta até agora, desde sua vida ameaçada pelas torturas da ditadura, pode se dizer que ela é também muito ética, convenhamos.

Por tudo isso, Dilma vem mantendo José Eduardo Cardozo à frente do Ministério da Justiça.

Cardozo é o responsável pela coordenação da Polícia Federal.

Em seu republicanismo, Cardozo defende que a Operação Lava Jato esteja sendo bem conduzida pelo juiz Moro. Embora não esteja.

Nos tempos de FHC a Procuradoria Geral da União era comandada por Geral Brindeiro.
Brindeiro ficou conhecido pela alcunha de engavetador geral da União. Todas as denúncias comprovadas, suspeitas de ilícitos ou ilações eram solenemente arquivadas por ele sem que fosse cobrado de explicações.

Naquela época a Polícia Federal vivia um período difícil em faltavam equipamentos, veículos e respaldo às suas ações. Hoje ocorre o contrário.

Não se pode dizer então que FHC fosse republicano. Nem ao menos ético, vamos aceitar.

Neste momento, em que as investigações da Lava Jato são direcionadas apenas a empreiteiras (com o fim específico de extorquir à força delações premiadas) e a políticos do PT ou de partidos aliados do governo, Cardozo e Dilma se mantém republicanos.

Neste momento, em que um despreparado juiz Moro interroga Zé Dirceu sem que, pelo que se depreende do depoimento de mais de duas horas, haja qualquer suporte à intenção de mantê-lo preso, Cardozo e Dilma se mantém republicanos.

Neste momento, em que a mídia e o juiz Moro lançam suas garras sobre Lula, o ministro e a presidenta se mantém calados.

Ora, há então que se fazer uma leitura sobre o que significa ser republicano e ético.

Admitiria a postura elevada de Cardozo e Dilma se a Lava Jato estivesse sendo guiada pelas normas puristas da isenção política. Fosse assim, após 3 delações sobre as propinas entregues a Aécio Neves, este já teria sido denunciado pelo Procurador Geral da República, Rodrigo Janot.

Lula está sendo massacrado diariamente pela mídia por comparecer de vez em quando, após ter deixado a presidência em 2010, a um sítio de propriedade de dois amigos.

A ex-primeira dama, Marisa Letícia, comprou um barco de pesca para Lula no valor de 4 mil reais, com nota fiscal em seu nome.

Não se sabe bem se foi a construtora OAS ou a Odebrecht que executou reformas no sítio.

Sobre este fato, há indagações a serem feitas.

1) O custo das reformas constitui uma retribuição ao ex-presidente pela ''força'' que ele deu às empreiteiras durante sua gestão?

Alguém poderia responder: claro que sim, afinal o que elas ganharam nas falcatruas da Petrobras justificam a retribuição!

Não, sinto muito, mas o valor gasto é muito baixo pra ser isso...

2) O empenho das empreiteiras em reformar o sítio que não é de Lula se constitui num toma lá dá cá como o que acontecia com as contribuições às campanhas eleitorais?

Não, novamente sinto muito, mas Lula não estava em campanha e ainda nada sinalizava que ele voltaria a ser candidato em 2018.

Alguém, talvez o mesmo alguém, poderia argumentar: ah, mas a reforma aconteceu para que Lula influenciasse Dilma em contratos com as empreiteiras.

Não, isso nunca aconteceu. Lula sempre se manteve distante do governo Dilma.

3) Lula foi ético ao aceitar de presente as reformas?

Primeiramente, não vamos ser ingênuos ao crer que as reformas no sítio, embora não pertencente à Lula, não fossem de seu conhecimento. Foram sim.

Lula então foi antirrepublicano? Anti-ético?

Antirrepublicano, claro que não, uma vez que não era mais presidente.

E anti-ético?

Aí a questão é mais complexa.

Este blogueiro, que já ocupou cargo público executivo no passado, já passou por situação de certa forma semelhante.

Havia um contrato, executado dentro das normas legais, com medição já concluída, portanto, o executante nada mais teria a receber, certo?

Mesmo assim, ele ofereceu ao blogueiro uma reforma em seu apartamento, pintura, ou que precisasse.

Sua intenção seria então que eu o favorecesse num futuro contrato? Como, se ele teria de participar de uma licitação conduzida de forma absolutamente lícita?

Um presente apenas. Que não aceitei. Não precisava. Então nem considerei. E vale lembrar que eu ainda estava no cargo.

Mas, e Lula?

Cada cabeça, uma sentença, dizem.

Mas acho que a partir de 2010 sua cabeça já era outra.

Decidiu montar seu instituto. Decidiu dar palestras munido de seu alto capital adquirido em 8 anos de gestão exitosa.

Decidiu abrir mercados para o Brasil no exterior para que nossas empresas pudessem competir com as empreiteiras americanas que papavam toda e qualquer concorrência a preços elevados.

Decidiu exportar nossa tecnologia adquirida durante décadas de execução de obras monumentais.

Decidiu, enfim, criar empregos para os brasileiros que se dispusessem a trabalhar por essas empresas no exterior.

Confesso que tentei, tentei, e depois de muito tentar, tentei novamente enxergar na atitude de Lula o mais leve sinal de falta de ética, mas fracassei.

Quiçá de desonestidade.

Desonestidade seria Lula ter utilizado recursos do governo na construção de um aeroporto particular em terras de seu tio-avô.

Isso sim, seria muito condenável.

Mas como a presidenta e seu ministro são republicanos, o Procurador Janot e a Polícia Federal continuarão a alimentar o ego do juiz Moro.

E concluo que Dilma, Cardozo e até mesmo Lula são alvos daqueles que se aproveitam, de maneira aética (com licença do trocadilho) do discurso republicano.

Em tempo, há um boato sobre a saída de Cardozo.

Espero sinceramente que um próximo nome seja capaz de contrariar Dilma.

E que Dilma continue a ser ética.

Mas, se ética é a inteligência sendo colocada a serviço da melhor convivência dentro de um determinado grupo, Dilma tem a obrigação de ser ética neste momento determinando que a PGR e PF atuem de maneira isenta na Lava Jato.

Isto é o que todo o povo brasileiro espera dela.





terça-feira, 9 de fevereiro de 2016

Dois anos de Lava Jato e a ascensão de uma celebridade nacional

Por Fernando Castilho





Como o número de irregularidades e até mesmo ilegalidades cometidas pelo juiz Moro é grande, segundo se deduz da matéria da Folha, caso haja condenações, é preciso esclarecer que elas se darão em primeira instância.

Quando os réus recorrerem, a situação poderá mudar.

A Operação Lava Jato acaba de completar dois anos.

Embora tenha um balanço favorável para aqueles que como nós, sempre desejaram que os crimes de colarinho branco fossem punidos com o rigor da Lei, há que se analisar à que preço isso vem acontecendo.

Marcelo Odebrecht e outros presidentes e diretores das mais importantes empreiteiras do país que mantém relações promíscuas com governos desde a ditadura militar, quando de fato começaram a enriquecer, estão presos.

Motivos para comemorar?

Fossem suas prisões incontestavelmente legais, sim.

Folha de São Paulo publicou uma matéria sobre o assunto que flerta com Deus e o Diabo.

Primeiro lista uma série de irregularidades aplicadas pelo juiz Moro, ratificadas por juristas como Pedro Estevam Serrano, Professor de Direito Constitucional da PUC-SP e Lenio Streck, advogado e membro da Academia Brasileira de Direito Constitucional. Ou seja, gente que conhece a fundo a Constituição brasileira.

O ''outro lado'' para mostrar que a Folha é plural, está representado pelo Procurador da República Roberson Henrique Pozzobon.

Um dos questionamentos diz respeito à escolha de Curitiba como Fórum dos julgamentos dos envolvidos na operação, uma vez que a sede da Petrobras fica no Rio de Janeiro.

Pozzobon responde que o delator Alberto Yousseff atuava em Curitiba. Fraco motivo, convenhamos. Mas isso nem é tão importante assim.

A crítica mais grave é sobre o fato de que Odebrecht e outros estão presos preventivamente há vários meses e isso poderia configurar uma tentativa de coação para que os réus se transformem em delatores e façam confissões que possam agradar ao juiz.

Pozzobon responde que ''as prisões são necessárias para evitar interferências nas investigações e se justificam pela solidez nos indícios e provas encontradas''.

E aí está o X da questão.

Eu imaginava que prisões preventivas seriam necessárias para se evitar a fuga dos réus para outros países, mas não é esse o motivo. A justificativa mais uma vez é fraca.

Tudo indica que Moro quer mesmo extorquir uma delação, mesmo que não possa ser comprovada, de certos nomes-alvo que ele e todo o consórcio de que ele participa, desejam.

Se não fosse isso, nomes da oposição que também já foram citados em delações, além da esposa e filha de Eduardo Cunha, que não têm foro privilegiado, já estariam presos.

Como o número de irregularidades e até mesmo ilegalidades cometidas pelo juiz Moro é grande, segundo se deduz da matéria da Folha, caso haja condenações, é preciso esclarecer que elas se darão em primeira instância.

Quando os réus recorrerem, a situação poderá mudar.

Enquanto Moro serve aos interesses da oposição e da grande mídia, escolhendo políticos petistas como alvo final, ele será o grande paladino da Justiça admirado por todos.

Mas caso ele não consiga seu intento e os presos resumam-se somente aos grandes empresários, numa segunda instância a própria mídia se encarregaria de limpar a barra de Odebrecht e colegas. Eles teriam então seus processos considerados nulos devido às irregularidades cometidas por Moro.

A Folha sinaliza isso.

Ou seja, estamos assistindo a um espetáculo midiático montado apenas para um fim específico, a um custo financeiro que atinge toda a Nação e que no final poderá não dar em muita coisa, além de uma vitória de Pirro.

Menos para o juiz Moro, elevado ao posto de celebridade nacional máxima da Justiça do Brasil, ofuscando até Joaquim Barbosa.

Quem será o próximo? 

Gilmar Mendes continua tentando.

Infográfico: Folha



quinta-feira, 4 de fevereiro de 2016

O dia em que o juiz Moro prestou depoimento a Zé Dirceu

Por Fernando Castilho





Muitos já escreveram sobre o depoimento de Dirceu a Moro. Vai aqui outra leitura que demonstra que os papeis parecem ter se invertido naquela ocasião.


Zé Dirceu deu um depoimento de mais de 2 horas ao juiz Moro.

Confesso que havia de minha parte uma grande expectativa, uma vez que estavam enfim frente a frente o inimigo público número um da Nação e o justiceiro eleito pela grande mídia e pela classe média brasileira.

Logo no começo foi possível ver um Dirceu magro, envelhecido e com certa aparência de cansaço. Seria logo engolido por Moro.

Mas para minha surpresa, Dirceu foi respondendo pausadamente e com muito preparo a todas as questões que lhe eram formuladas.

Aos poucos fui percebendo que as perguntas a ele dirigidas eram frágeis, quase simplórias.

Já tinha lido alguns despachos de Sérgio Moro que me chamaram a atenção por uma certa dificuldade em escrever em bom Português.

Alguém poderá alegar preconceito meu, uma vez que nosso idioma passa constantemente por transformações. Porém, ao contrário do comum dos brasileiros, um juiz não pode escrever mal, sob pena de ser mal interpretado em seus despachos.

Mas voltando às perguntas.

Moro à certa altura pergunta a Dirceu se ele tinha alguma divergência com relação à delação premiada de Fernando Moura que o isentou do esquema da Lava Jato ao que Dirceu responde de imediato que não. Mas é claro que não. Se ele foi isentado, como iria invalidar a delação?

Moro faz até 5 vezes as mesmas perguntas, demonstrando que, ou não se preparou direito para o embate ou realmente não tinha o que perguntar a alguém que ele certamente já sabe que não está envolvido na Lava Jato. É que a vaidade o impede de simplesmente soltar o preso o que seria ruim para sua imagem.

Ele e o promotor do Ministério Público, de voz adolescente trêmula demonstraram não conhecer o Zé Dirceu de antes de 2005, ano que estourou o Mensalão. Não conhecem sua história.

Por não conhecer sua história não conseguem compreender que alguém dê consultorias à empresas sem que elabore planilhas, tabelas, gráficos e relatórios como faria qualquer técnico médio.

Não sabiam que o trabalho de Dirceu era, aproveitando-se de seu relacionamento com políticos importantes e governos de esquerda da América Latina e Cuba, abrir oportunidades para que empresas brasileiras pudessem disputar concorrências lá fora, com consequente entrada de divisas para o país e contratação de mão de obra brasileira.

À certa altura Moro lhe pergunta se não enriqueceu com isso, ao que Zé lhe responde que seu objetivo de vida nunca foi enriquecer. Incompreensível para lacaios do capital.

O promotor foi ainda mais primário. Indagou o por quê de Dirceu ter parado de dar consultorias. Ele responde: ora, porque eu estava preso! O promotor não sabia disso?

Além disso, ao final, indagou sobre a pensão às filhas de Dirceu, coisa totalmente alheia à Lava Jato.

Moro revelou também desconhecer que Dirceu não é ministro nem deputado desde 2005.

À certa altura um dos inquiridores o chama por excelência, ao que Dirceu responde que dispensa o termo uma vez que não é mais deputado.

Dirceu foi humilde do começo ao fim. Nem ao perceber a fragilidade dos que o ouviam, mudou de comportamento.

Mas Moro sentiu que lhe escapava a capacidade de desestabilizar o homem e induzi-lo ao erro. Por isso, fez questão de demonstrar sua autoridade quando Zé Dirceu ao responder a alguém, virou-se de costas. Lembrou então ao depoente que não se vira as costas para um juiz, ao que Zé reagiu com um pedido de desculpas.

Outra pergunta que demonstra cabalmente o despreparo de Moro foi quando ele indagou a Dirceu sobre seu patrimônio em dinheiro. Este lembrou-lhe que seu sigilo bancário havia sido quebrado, o que só demonstrou o volume de dívidas que vem se acumulando mês a mês.

Ao final, quando Moro deu a palavra a Dirceu para as últimas considerações, la crème de la crème: a mídia sempre martelou que as relações entre ele e Lula estavam muito abaladas pelo fato de o ex-presidente nunca tê-lo defendido, certo? Pois Dirceu afirmou a Moro que Lula não tem qualquer envolvimento em esquemas de propinas da Petrobrás.

Quando digo que desconfio que Moro e o promotor desconhecem a história de Dirceu é porque foram surpreendidos. Esperavam entrevistar um homem destruído psicologicamente mas não esperavam que ele tivesse aquela fibra moldada em anos de treinamento de guerrilha, vida clandestina, privações de toda ordem. 

E Dirceu não se utilizou disso para crescer frente a eles. Eles é que se assustaram e se apequenaram diante do mito.

Por tudo isso, a impressão que se tem foi de que Moro prestou um depoimento a Zé Dirceu.

Nesse depoimento, Moro revelou que é um juiz despreparado, não conhece História, não se aprofundou em saber qual trabalho Dirceu desempenhou em suas consultorias e nem tinha perguntas objetivas que o pudessem incriminar.

A impressão que fica é que, devido à juventude e imaturidade, Moro e o promotor do MP estiveram juntos jogando games na véspera do depoimento.

E após o depoimento, Moro deve ser condenado a libertar Zé Dirceu.

Se continuar preso será a prevalência da vaidade de Moro sobre a Justiça.







segunda-feira, 1 de fevereiro de 2016

O barco e a farofa de Lula

Por Fernando Castilho


Foto: Lúcio Távora, O Globo


Esperava-se que Lula tivesse se tornado um homem refinado, que tivesse trocado a cachacinha por uísque 21 anos e sua esposa, Marisa Letícia, a sacola da 25 de março por uma bolsa Prada.



Sempre houve dúvidas com relação ao padrão de vida levado por Lula e sua esposa.

Afinal, o Lula metalúrgico todo mundo sabe que vivia de acordo com o que sua classe de proletário poderia lhe proporcionar.

A origem de retirante nordestino, de família numerosa, impôs-lhe o padrão típico dos que procuravam trabalhar em uma fábrica, usufruir de uma vida simples e lutar para melhorar.

A partir do momento em que Lula se elegeu deputado em 1986 com consequente aumento de renda, tornou-se difícil conhecer acerca da mudança de hábitos que o maior poder aquisitivo poderia proporcionar à sua família.

Sabe-se, porém que ele conseguiu comprar um apartamento de classe média em São Bernardo do Campo, seu reduto eleitoral, sendo muito criticado pela imprensa na época, como se vivêssemos num país como a Índia cuja sociedade, organizada por castas, impede a mobilidade social das pessoas. Lula, segundo a mídia preconceituosa, deveria continuar a viver humildemente.

Após dois anos na presidência da República, era de se esperar que com o soldo somado à sua aposentadoria pela Lei da Anistia, Lula passasse a construir um patrimônio como todo presidente faria.

Após sua saída, com a criação do Instituto Lula, o ex-presidente passou a dar palestras no Brasil e no mundo, sendo bem pago por isso.

Embora continue a ter trânsito entre os movimentos sociais e o povo mais pobre do país, agora Lula também se encontra com líderes mundiais, empresários milionários, reis e doutores. Torna-se por várias vezes ele próprio doutor honoris causa em várias universidades brasileiras e estrangeiras.

Ou seja, espera-se que Lula tenha se tornado agora um homem refinado que tenha trocado a cachacinha por uísque 21 anos e sua esposa, Marisa Letícia uma madame com bolsa Prada.

Mas a fofoca contada pela Folha de São Paulo acerca do barco comprado por Marisa para Lula pescar em fins de semana no sítio de amigos e de seu filho, sem querer revela algo muito interessante.

1) O barco de alumínio sem motor, ao preço de 4100 reais é dos mais modestos do mercado. Dona Marisa poderia ter comprado uma lancha ou algo mais luxuoso, talvez 10 vezes mais caro. Dinheiro há para isso.

2) Lula, como aquele nordestino de décadas atrás ainda prefere num final de semana pegar seu barquinho com a esposa, pescar uns lambaris, fazer um churrasquinho e tomar umas cervejas.  Fosse um FHC, ele estaria na Côte d'azur em um barco bem mais luxuoso, usufruindo de serviço de hotel com todas as mordomias e fotografado pela Caras. 

3) Além disso, a foto da capa de O Globo de janeiro de 2010, mostra Lula carregando uma caixa de isopor com dona Marisa a lhe seguir em sandálias havaianas. A manchete ainda meio que zomba um pouco dele ao chamá-lo de farofeiro, coisa de pobre, afinal. Essa capa, por si só é por demais reveladora da simplicidade do homem.

Agora a mídia fica num beco sem saída.

Se Lula fosse flagrado ostentando hábitos luxuosos e extravagantes, seria criticado por, sendo socialista, trair o povo que o elege. Colunistas iriam chamá-lo de socialista caviar.

Como Lula foi pego de surpresa mostrando de maneira sincera que continua a ser o mesmo homem com hábitos simples dos tempos em que era pobre, não é possível acusá-lo de populista ou hipócrita, mas sim de verdadeiro.

E isso não vão fazer.

Para mim fica a grata satisfação dessa revelação.

Lula não é um Pepe Mujica mas não esqueceu sua origem.


Por isso confio em Lula.

domingo, 31 de janeiro de 2016

Lula errou mesmo em ser conciliador?

Por Fernando Castilho
Charge por Pataxó http://pataxocartoons.blogspot.jp/





Imaginar um futuro alternativo àquele que já aconteceu é um exercício complexo e inútil, mas acho que dá para imaginar o que teriam sido os governos Lula sem a conciliação de classes proposta na Carta aos Brasileiros


O jornalista Luiz Carlos Azenha publicou artigo em seu site Viomundo onde afirma que o erro de Lula foi ter acreditado na conciliação de classes. Será?

A única forma de saber se a afirmação está correta é analisá-la do ponto de vista do materialismo histórico, ou seja, Marx.

Marx dizia que há duas classes, a saber, a burguesia e o proletariado.

A burguesia é a classe bem pouco numerosa que detém os meios de produção e o proletariado é a classe bem mais numerosa que detém a força de trabalho.

Enquanto a burguesia deseja o lucro e luta por ele, o proletariado deseja salário e também luta por ele. Daí a luta de classes, ok?

Mas Lula, ao publicar a famosa Carta aos Brasileiros no início de seu governo, celebrou um pacto com a burguesia, os grandes empresários do país que estavam com medo de sua eleição.

Com este pacto ficou claro que Lula evitaria a luta de classes e não permitiria a revolução prevista por Marx.

Ou seja, Lula passou a ser um amortecedor muito útil à burguesia. Neste sentido, os governos Lula e mesmo o de Dilma, apesar de muitos avanços sociais, foram burgueses.

É a chamada conciliação de classes que permitiu a Lula, além de melhorar muito a vida dos pobres, criar condições para que os detentores dos meios de produção enriquecessem ainda mais.

Perfeito, não? Todo mundo ganhou.

Se não houvesse essa conciliação, será que 30 milhões de pessoas teriam saído da linha pobreza?

Será que haveria, Minha Casa, Minha Vida, Mais Médicos e outros programas exitosos?

Mas então, se foi bom pra todo mundo, como explicar esta sanha em prender Lula usando para este fim até mesmo um ridículo barco de 4 mil reais adquirido com nota fiscal? Por que não o querem de volta, afinal?

Parece-me simples. Vou tentar explicar.

A oposição, que pela ótica de Marx não poderia ser chamada de burguesia pois não detém meios de produção, sendo entidade somente política, está toda na lista das operações Lava Jato, Zelotes e HSBC.

A mídia só noticia a Lava Jato pois lá estão alguns nomes do PT, além de empreiteiros, estes sim, burgueses.

Mas é na Zelotes e HSBC que estão os peixes grandes.

Dilma desde a campanha eleitoral avisava que não restaria pedra sobre pedra.

Esperava-se que ela interferisse na Polícia Federal e na Procuradoria Geral da República, mas, fiel às ideias que defende, manteve a autonomia dos órgãos.

Era urgente então derrubá-la, mas isto também se mostrou muito difícil pela sua imagem honesta reconhecida até por gente da oposição.

Lula então apareceu como possível candidato em 2018.

O PSDB, teoricamente o partido com mais chances de enfrentá-lo, olhou para seu próprio umbigo e não gostou do que viu: Aécio, que tem farto material contra si a ser utilizado durante a campanha; Serra, velho postulante a qualquer coisa e destacado representante dos interesses da Chevron americana com relação ao pré-sal; Alckmin que vem acumulando desastres em seu governo de São Paulo, como a gestão hídrica, a paralisação e os escândalos do Metrô, a matança de jovens da periferia e a truculência da PM contra simples estudantes que lutam contra o fechamento de suas escolas. Aparece agora também o crime hediondo, na minha opinião, de desvios de recursos das merendas escolares.

Ou seja, Lula nadaria de costas, venceria e seria sério candidato à reeleição em 2022. Brrrrrr!

Os tucanos querem voltar ao poder não só para jogar uma pá de cal sobre as operações da PF, mas também para revitalizar seus velhos esquemas que já sofrem jejum de 13 anos.

Mas então, por que a mídia está tão empenhada em prender Lula ou destruir sua reputação?

Ora, já expliquei antes neste blog.

A mídia, toda ela, está financeiramente acabada. Precisa de socorro.

Já há um acordão com o PSDB há muitos anos, desde o primeiro governo Lula, que prevê, em troca de içar a oposição de volta ao poder, receber generosa ajuda do BNDES.

Então, não considero erro de Lula acreditar numa conciliação de classes. Era o que tinha naquela época. Ou emergia como um ser da esquerda conciliador ou sua cabeça seria cortada rapidamente.

Agora, se a oposição e a mídia, para chegar ao poder apostam em seu projeto atual inconsequente de prender Lula sem que haja crime cometido por ele, esperando que todo mundo aceite sem problemas a injustiça, ignoram a possibilidade de convulsão social que pode levar o país a uma crise econômica, política e institucional profunda, terrivelmente ruim, não só para o povo, como também para eles.


sexta-feira, 29 de janeiro de 2016

Lula, da humilde casa de Roberto Teixeira ao triplo X

Por Fernando Castilho



Qualquer pessoa minimamente informada sabe que triplex TEM que ser grande e luxuoso. Quem compraria um triplex de 270 m² em cotas, tendo condição de pagar à vista, afinal? Tem que ser alguém que pense de forma modesta, vamos combinar.


Ok, antes de mais nada, se alguma falcatrua for provada contra Lula, eu disse PROVADA, tá, pego meu chapéu e saio de cena.

Na década de 80 Lula morava de favor numa casa simples em São Bernardo do Campo, cedida por seu amigo, o advogado Roberto Teixeira.

Virou um escândalo. As manchetes questionavam como poderia um advogado ceder uma casa a um metalúrgico?

Tentaram criminalizar o fato.

Lula poderia ter morado lá pelo tempo que quisesse, mas como não é populista nem hipócrita, assim que melhorou de vida ao se eleger deputado federal e receber aposentadoria pela Lei da Anistia, tratou de comprar um apartamento na mesma cidade.

Não é enorme nem luxuoso, mas é bom.

Como presidente, ao auferir salário de 39 mil reais em valores atuais, além de 5 mil da Anistia, Lula poderia comprar muitos imóveis e ficar rico com isso, se quisesse. Não quis. Preferiu sempre ajudar com dinheiro comunidades carentes, entidades sociais, etc..

Mas resolveu comprar cotas de um imóvel em construção no Guarujá.

Parece que as cotas seriam de dona Marisa, sua esposa, talvez preocupada em garantir algum tipo de patrimônio caso o marido viesse a falecer daquele câncer de alguns anos atrás. Qualquer um faria isso.

Como os apartamentos mediam apenas 90 m², o projeto incorporou outros dois, transformando-se num triplex de modestos 270 m².

Explico o porquê do termo ''modestos''.

Qualquer pessoa minimamente informada sabe que triplex TEM que ser grande e luxuoso. Quem compraria um triplex de 270 m² em cotas, tendo condição de pagar à vista, afinal? Tem que ser alguém que pense de forma modesta, vamos combinar.

Pois bem, então a Lava Jato desloca todo um efetivo, incluindo o japonês bonzinho, para investigar café pequeno. E que nem irregularidade tem, uma vez que Lula não consta como proprietário pois ainda nem há escritura!

Além disso, a participação já foi vendida.

Posto isto, o que pretende a Lava Jato?

A PF e o MPF não é composta de néscios, podemos crer.

Eles sabem que não há elementos para incriminar Lula.

Pausa.

O que pretende a mídia ao divulgar de maneira histriônica a operação Triplo X?
Voltar atrás no tempo e reeditar a velha denúncia de que Lula morava de favor na casa de Roberto Teixeira e incriminá-lo onde não há crime.

Pausa.

E o que pretende a classe média, a classe alta e um bando de pobres analfabetos políticos que viram sua vida melhorar durante os governos Lula e que agora agem como cães raivosos à espera dos ossos que a PF, o MPF, o juiz Moro e a elite que mandou no país durante 500 anos lhes oferecem?

Querem a prisão de Lula.

Para essa gente, Lula não deveria ter sido eleito.

Se foi, não poderia conseguir governar.

Se governou, não poderia ter tido êxito.

Mas teve. Foi o melhor presidente de toda a História do Brasil! Maior que Getúlio e Juscelino!

Para eles, Lula tinha que morar numa casa muito humilde como seu quase ídolo, José Mujica faz.

Para eles, socialista tinha que morar na caverna, nordestino que é.

Lula, em oito anos de governo se precaveu. Não deixou linha com ponta.

Lula não podia errar. A responsabilidade em suas costas era muito grande.

Lula foi o primeiro operário a governar o Brasil, por si só, um fato histórico.

Lula quer deixar uma biografia irreparável.

Não tenho dúvidas. Já desistiram de procurar algo contra Dilma, portanto, ela vai até o fim.

Mas Dilma não pode ser reeleita. Então, pra que continuar dispendendo energia contra ela?

Lula, ao contrário, pode ser candidato em 2018. E pior, pode ser reeleito em 2022. E isso é inadmissível!

Não vão achar nada contra Lula, estou certo.

Porém, a Justiça não anda bem das pernas, como fica evidente no fato de Eduardo Cunha continuar solto e ganhando força dia a dia. O STF já declarou que não há elementos contra ele.

Então, não há como afirmar que Lula não seja preso por algum artifício.

E vimos artifícios serem usados no Mensalão.

Mas acredito que a verdadeira intenção ao veicular todos os dias alguma acusação contra Lula seja o de destruir sua credibilidade e reputação para deixá-lo enfraquecido durante a campanha e principalmente durante os debates onde todas essas ilações serão muito exploradas por seus adversários.

P. S. Enquanto escrevo este texto, mais uma denúncia contra Lula foi divulgada.



quinta-feira, 28 de janeiro de 2016

Moro, Dirceu e a extorsão do lobista

Por Fernando Castilho




Não se deram ao trabalho de ler em outras fontes, não se deram ao trabalho de questionar incongruências e contradições sérias, e pior, desconhecem o que diz nossa Constituição cidadã, carta magna do Estado de Direito, conquistado a duras penas.


Já escrevi algumas vezes sobre o saco de pancadas chamado Zé Dirceu.

Não, ele não é um santo como alguns pretendem. E sei do que estou falando.

E sei também que muitos dos que lerão este texto destilarão seu ódio porque não acompanharam com rigor os desdobramentos de tudo que envolveu o ex-ministro desde o Mensalão até agora. Por preguiça ou desinteresse.

Não se deram ao trabalho de ler em outras fontes, não se deram ao trabalho de questionar incongruências e contradições sérias, e pior, desconhecem o que diz nossa Constituição cidadã, carta magna do Estado de Direito, conquistado a duras penas.

Afinal, queriam um medalhão do governo preso, um ineditismo a lavar a alma de um povo habituado à impunidade desde sempre. Podia ser qualquer um, desde que fosse político.

O ex-ministro foi condenado com base na Teoria do Domínio do Fato, uma excrescência criada na Alemanha após a queda de Hitler para responsabilizar os criminosos de guerra e que não vinha mais sendo usada desde então.

Serviu, porém, como o artifício conveniente, um achado de Joaquim Barbosa, fora da Constituição e que pressupõe que se Dirceu era o chefe de gabinete, ele tinha por obrigação saber de toda e qualquer falcatrua que tenha acontecido em todo o governo federal.

É como se um diretor de uma empresa tivesse pleno domínio de tudo o que seus subalternos fazem ou conversam, mesmo fora do expediente. E uma empresa não tem nem de longe o mesmo número de funcionários de um governo federal.

Zé Dirceu, quer aceitem ou não aqueles que o odeiam, foi condenado sem provas. Isto é fato pois a ministra Rosa Weber admitiu que não havia provas contra ele mas que mesmo assim o condenaria porque a literatura jurídica assim lhe permitia.

Ponto.

Mas Dirceu foi preso novamente por ter sido citado em delação premiada pelo lobista Fernando Moura em agosto de 2015.

Enquanto vemos o presidente da Câmara, Eduardo Cunha escarnecendo devido à sua impunidade, apesar das inúmeras provas já colhidas contra ele, sem que a imprensa peça sua cabeça diariamente, Dirceu foi preso imediatamente à delação, de maneira irregular pois seria preciso que antes o delator apresentasse provas do que afirmou.

Mas para o juiz Sérgio Moro, que inclusive, desprezando a ética do Judiciário, já foi premiado pela Globo, Dirceu era um troféu a ser conquistado.

Os colunistas dos órgãos de imprensa comemoraram sua prisão, se não com fogos, com textos exaltando a coragem e determinação de Moro.

Aliás, sobre esses colunistas, cabe abrir um parênteses. Hoje eles se parecem mais com soldados num front de guerra contra a internet, na necessidade diária de combater não só o petismo, mas também toda a esquerda para agradar seus patrões e tentar evitar dessa forma uma possível demissão em virtude de cortes que estão ocorrendo amiúde devido a problemas financeiros de seus empregadores que só podem ser mitigados com a volta dos tucanos ao poder, via BNDES.

É por isso que a Folha contrata um Kim Kataguiri da vida, certamente com salário bem inferior aos dos outros colunistas e muito provavelmente como pessoa jurídica para escapar de encargos.

A classe média e alta, além de muitos que expressam seu ódio nos comentários publicados nos jornais, também comemoraram a prisão de Dirceu. A eles, assim como aos colunistas, não interessa se a Constituição está sendo aviltada. Não vem ao caso, como diria Moro.

Mas o lobista em novo depoimento isentou Zé Dirceu de culpa.

E agora, o que fazer? Meu troféu escapa de minhas mãos, pensou o juiz Moro.

Quando perguntaram a Fernando Moura se ele estaria mudando sua versão dos fatos, ele disse estranhar que tenha afirmado o que lhe disseram que afirmou antes.

Zé Dirceu então pediu a gravação do primeiro depoimento. Estranhamente o MPF alegou que o depoimento não fora gravado.

Como assim, se todos os depoimentos são meticulosamente gravados pelo juiz Moro? Aliás, este é um estilo bastante pessoal dele.

Agora Moro ameaça Fernando Moura de anulação de sua delação premiada pelo motivo de que teria alterado seu depoimento.

Na realidade o que Moro pretende é extorquir a delação do lobista e manter seu troféu, Dirceu, preso, sob o risco de desmoralização de toda a operação.

Possivelmente teremos uma mentira valendo como prova contra Dirceu.

E mais uma vez ele será condenado injustamente.

E os mesmos de sempre novamente comemorarão.





sexta-feira, 22 de janeiro de 2016

O Waze, o mundo líquido e a paisagem urbana

Por Fernando Castilho





Waze é uma ferramenta muito útil para você se livrar de congestionamentos encontrando a rota mais favorável para atingir seu destino. Ele processa as informações dos celulares dos próprios motoristas. Ou seja, você vai direto ao ponto.

Mas o que isso tem a ver com a modernidade líquida de Zygmunt Bauman?


Um artigo da Folha de São Paulo me chamou a atenção por ser extremamente ilustrativo do que afirma Zygmunt Bauman sobre a tese da pós modernidade ou, como ele acha melhor chamá-la, a modernidade líquida que estamos vivendo.

Antes de tudo, um approach sobre o tema.

Bauman defende resumidamente, que vivíamos até cerca dos anos 50 num mundo sólido, onde as instituições eram duradouras, as coisas se resolviam em três dimensões e as relações eram pessoais.

Hoje vivemos num mundo líquido em que tudo escapa pelas nossas mãos. As relações são fugazes e virtuais, como amizades no Facebook com as quais não se pode contar. Se você precisar de um amigo do Facebook para alguma coisa importante como passar a noite no seu quarto de hospital, esqueça. Com exceções, claro. E você adiciona amigos com a mesma facilidade com que os bloqueia ou exclui.

Tudo gira numa velocidade frenética e cada vez mais acelerada.

Nosso dia de 24 horas já não consegue mais dar conta do número de atividades que temos que executar.

E no sistema capitalista, se você não dá conta, há quem o faça.

É por isso que, ao final do ano cansamo-nos de ouvir que o ano passou tão rápido...

Não há mais tempo para reflexões, para leitura ou para o simples lazer ou ócio.

Pois bem, segundo o artigo da Folha, o israelense Uri Levine criou o aplicativo Waze e o vendeu rapidamente ao Google por US$1,1 bilhão em 2013.

Ficou muito rico e se ocupa hoje em desenvolver outros aplicativos para facilitar a vida das pessoas.

Mas o que é o Waze?

Waze é uma ferramenta muito útil para você se livrar de congestionamentos encontrando a rota mais favorável para atingir seu destino. Ele processa as informações dos celulares dos próprios motoristas. Ou seja, você vai direto ao ponto.

O terrível efeito colateral, a meu ver, é que devido ao aplicativo, deixamos de fazer uma leitura da paisagem urbana que percorremos.

Afinal, o que mais importa a você é chegar o mais rápido possível ao seu local de trabalho e mais tarde à sua casa. E é claro que você vive para o trabalho e não trabalha mais para viver, como nos tempos do mundo sólido.

E é um olho no trânsito e outro no celular.

Este trecho da entrevista de Levine, caso não se interesse em ler toda a entrevista, é especialmente revelador.



Entendeu? As pessoas não pensam mais por onde estão indo. Nem sabem mais os nomes das ruas. O Waze te leva lá e pronto. Quase que um piloto automático.

Bingo! Bauman tem razão!

Antigamente (e isso não faz muito tempo) podíamos atravessar São Paulo admirando sua paisagem ou odiando-a. Mas de qualquer forma, fazíamos uma leitura dela, o que nos capacitava a tecer críticas e sugerir mudanças.

A gente se apropriava da cidade. Agora a força da grana ergue e destrói coisas belas virtualmente, já que você deixa de vê-las e senti-las.

O Waze, neste aspecto, tem semelhança com o metrô subterrâneo. Não vemos nada da paisagem, só queremos chegar à estação desejada e fim. Nosso dia é corrido e não temos tempo para essas coisas que pertencem ao mundo sólido.

Quando o teletransporte chegar, será muito pior que isso.

Meu texto não é uma ode ao passado, visto que sou progressista, mas uma perspectiva histórica pode nos indicar aonde poderemos chegar, se levados por pessoas que estão mais preocupadas em se tornar bilionárias, como Levine.

A modernidade líquida está aí, não adianta reclamar nem lutar contra ela pois que é inexorável.

Mas ainda há iniciativas pertencentes ao mundo sólido que podem contrabalançar e reduzir um pouco a velocidade das coisas. E são muito legais.

Uma delas é a iniciativa da criação de ciclovias na cidade de São Paulo, de autoria do prefeito Fernando Haddad.

Sei que há muita gente revoltada com isso, mas isso acontece porque entraram inconscientemente de cabeça na modernidade líquida, preocupam-se somente em ganhar dinheiro o mais rápido possível e se esqueceram de tolerar aqueles que vivem mais distendidos.

Com as ciclovias é possível que se desloque de maneira menos tensa (desde que os motoristas respeitem as faixas e os ciclistas), que se interaja mais com a paisagem urbana e que se pratique mais exercícios reduzindo o sedentarismo. Além de contribuir para a redução de emissão de gases.

Outra iniciativa é a abertura da Av. Paulista aos domingos para o lazer.

As pessoas ainda gostam de dançar, cantar, fazer piquenique, papear, namorar, passear a pé ou de bicicleta com as crianças ou tomar sol.

Nessas horas esquece-se até os lap-tops e i-phones.

Afinal, temos um corpo físico e ainda não deixamos totalmente o mundo sólido.


quarta-feira, 20 de janeiro de 2016

O que 1% da população mundial tem a nos dizer?

Por Fernando Castilho



Grande parte da situação de intolerância de hoje em dia se deve a um sentimento de impotência diante de um sistema opressor que não permite ao pobre o consumo de bens que a própria mídia exige dele.

Esse sentimento vai se acumulando até que uma hora explode em violência urbana.


O jornal Valor Econômico noticiou esta semana que 1% da população mundial passa agora a deter mais riqueza que os restantes 99%.

Além disso, 62 pessoas tem tanto dinheiro quanto a metade mais pobre da população mundial.

Há apenas 5 anos atrás eram 388 pessoas que acumulavam esse capital.

Ou seja, esse gráfico cresce numa proporção assustadora e nos faz imaginar se pode piorar ainda mais.

Mas se esses números, mesmo que sem uma análise mais apurada, já revelam uma situação extremamente preocupante, compreender o que eles significam pode nos tirar noites de sono.

Antes de mais nada, embora o capitalismo afirme que é o único capaz de gerar riqueza, não nos iludamos pois nos encontramos num sistema isolado chamado Planeta Terra cujos recursos são limitados.

Para agravar o quadro, esses recursos naturais e energéticos vão se esgotando à medida em que a população cresce em ritmo exponencial.

Então, primeiramente, os pobres.

O fato de o Brasil ter retirado 30 milhões de pessoas da linha de miséria pode ter evitado que os números divulgados fossem ainda piores. Porém, como a maior parte da população mundial é de pobres, podemos esperar que o número de miseráveis em situação de fome tenha aumentado e ainda aumentará significativamente. E pensar que gente morrerá de fome e de doenças ligadas à falta de alimentação por essa espécie de genocídio econômico nos entristece e revolta.

Em seguida a classe média.

Certamente essa também vem perdendo seu poder de compra e consumo, já está engrossando as fileiras dos pobres e em alguns anos teremos uma massa sem poder aquisitivo.

Mas, e os ricos?

Os ricos teoricamente, como disse Marx, dependeriam dos pobres para gerar sua riqueza. Isso, se o acúmulo de capital fosse ainda hoje totalmente proporcionado pela exploração do trabalho. Nesse caso, os ricos também precisariam depender da classe média e de parcela dos pobres para consumir aquilo que é produzido, os bens de capital.

Porém, hoje em dia não é mais só a atividade produtiva que acumula riqueza, mas também a especulação financeira.

Muita gente se faz rica ao comprar ações na baixa e vender na alta sem que isso signifique produzir alguma coisa.

Além disso, o não pagamento de impostos, coisa de que os pobres não podem escapar por ter descontos efetuados já no pagamento de seus salários, e a remessa de grandes quantias para paraísos fiscais onde são criadas holdings especiais para esse fim, fazem a delícia dos ricos.

E acúmulo desmedido de capital faz bem?

Vejamos o caso do bilionário brasileiro, Paulo Lemann, dono e sócio de marcas com Imbev, Burguer's King, Heinz, etc..

Consta que sua fortuna é estimada em cerca de 84 bilhões de reais. Se parasse de trabalhar e investisse seu patrimônio em caderneta de poupança, teria garantidos só de juros e correção monetária a quantia mensal de cerca de 420 milhões de reais. Mesmo que mantivesse uma vida de luxo, não conseguiria gastar todo esse montante e reinvestiria a maior parte dele. Ou seja, ficaria ainda mais rico.

Bem, mas aonde essa situação de acúmulo de capitais nas mãos de poucos pode nos levar?

Já está nos levando a revoltas no mundo inteiro.

Grande parte da situação de intolerância de hoje em dia se deve a um sentimento de impotência diante de um sistema opressor que não permite ao pobre o consumo de bens que a própria mídia exige dele.

Esse sentimento vai se acumulando até que uma hora explode em violência urbana.

E quem mais paga o preço é a classe média que insiste em defender os do andar de cima, que são poucos, enquanto protesta contra políticas de distribuição de renda.

Como disse Marx, o capitalismo gera o seu próprio coveiro.

Como disse Étienne de La Boétie, acostumamo-nos a nos curvar a um único soberano sem que percebamos que somos muitos e ele um só.