segunda-feira, 31 de janeiro de 2022

Militares baterão continência a Lula?

Por Fernando Castilho


A Folha noticiou hoje que o comandante da Força Aérea Brasileira, Carlos de Almeida Baptista Junior, em entrevista afirmou que os militares baterão continência caso Lula ou qualquer outro candidato assuma o lugar de Bolsonaro no ano que vem. Observem que ele fala em nome de todos os demais.

O colunista Josias de Souza apressou-se em dizer que a afirmação seria pleonástica e que por isso mesmo deve ser ouvida com cuidado.

Carlos de Almeida é tido como um dos militares mais bolsonaristas da Aeronáutica. Suas redes sociais estão repletas de postagens de Eduardo Bolsonaro, Carla Zambelli e tantos outros.

Para Josias, a afirmação, antes de nos assossegar, provoca desassossego pela obviedade.

O que o colunista teme?

Será que era de se esperar uma revolta nos quartéis e um golpe para evitar que qualquer outro que não Bolsonaro tome posse em janeiro de 2023?

Será que os militares embarcariam numa aventura golpista?

O Capitão Morte bem que tentou um golpe em 7 de setembro último, mas não obteve o apoio imaginado das Forças Armadas e recuou.

Hoje se sabe que, além de divididas, boa parte dos militares já acenam para Lula porque já têm indícios suficientes de que ele tem reais possibilidades de vender a disputa.

Não há dúvida de que foi durante os dois governos do ex-presidente que as Forças Armadas receberam maior volume de recursos e se reequiparam.

Carlos de Almeira poderia ter desconversado e deixado de responder à pergunta da Folha, mas preferiu dizer o que acha sobre o papel dos militares quanto ao resultado das eleições porque essa deve ser a atual postura dos generais, exceto os que estão mamando nas tetas do governo, recebendo altos salários acumulados com seus soldos da caserna.

De qualquer forma, seria interessante que Lula intensificasse a interlocução com os mais importantes representantes das Forças Armadas para tentar pulverizar o ranço que alguns sentem por ele.

Partindo de um militar bolsonarista, a entrevista, antes de desassossegar, nos assossega. E desassossega o presidente

Será que essa entrevista ocorreu antes ou depois do episódio do frango com farofa?




Ao encenar, Bolsonaro revela suas verdades

Por Carlos Fernandes


O mico da vez retrata o comandante-chefe da República sentado como um jeca numa birosca de meio de estrada se lambuzando com um espetinho de frango e coberto dos pés à cabeça de farinha de qualidade muito duvidosa.


O presidente Jair Bolsonaro está em franca campanha presidencial.

Peças de puro marketing eleitoral, ainda que não oficiais, estão sendo montadas e veiculadas nas redes com o intuito de sempre: criar a aparência de um homem do povo, gente como a gente.

Em absolutamente nada se diferencia dos medalhões da direita liberal e "sudestina" a cada vez que esses vão ao nordeste brasileiro andar de jumento e usar chapéu de couro ainda que isso, hoje em dia, seja apenas uma caricatura mal acabada e um tanto quanto preconceituosa dos nordestinos.

Neste final de semana não foi diferente. Numa direção digna de Carlos Bolsonaro, um sujeito que no meio político ganhou o apelido de Tonho da Lua, o atual presidente aparece naquilo que deverá entrar para os anais da política brasileira como uma das coisas mais patéticas e inapropriadas de sua história.

E olha que estamos falando do homem que já chegou a questionar em suas redes oficiais o que viria a ser Golden Shower veiculando, inclusive, um vídeo bastante autoexplicativo.

O mico da vez retrata o comandante-chefe da República sentado como um jeca numa birosca de meio de estrada se lambuzando com um espetinho de frango e coberto dos pés à cabeça de farinha de qualidade muito duvidosa.

Cena, vale dizer, que contrasta muito com o presidente que já torrou cerca de R$ 30 milhões só em despesas com cartões corporativos cuidadosamente submetidos a um sigilo secular.

Mas o fato é que não há aqui nenhuma novidade. Definitivamente não é a primeira vez (e certamente não será a última) que Bolsonaro e seu staff mais próximo buscam construir cenários que retratam um presidente "que não liga para o luxo". Como não lembrar do sujeito, junto com uma plêiade ministerial, comendo pizza numa esquina de Nova York às vésperas da abertura da Conferência Anual da ONU?

Esse de tipo de estratagema é tão usual ainda hoje, apesar de tão manjado, porque traz resultados práticos. O povo gosta de empatia, de ser representado de alguma forma, de saber que não está sozinho no seu sofrimento e que o presidente da República, apesar de todas as benesses que o cercam, não esquece as suas origens e participa de forma real do seu cotidiano.

Ainda que no fundo saiba que tudo, ao fim e ao cabo, não passa de representação, há um efeito psicológico que remete a um certo acolhimento.

Mas é exatamente aí que Bolsonaro erra a mão e acaba revelando justamente aquilo que mais quer esconder.

Se a vida imita a arte, é a arte, por conseguinte, quem com mais perfeição representa a vida. Ao querer imitar os pobres, Bolsonaro revela e materializa a imagem que este possui daqueles. E o resultado é o que temos.

Para Jair Bolsonaro o pobre é tão somente isso: um sub-humano miserável, iletrado e mal-educado incapaz de utilizar garfo e faca e que uma vez colocado à frente de um mísero prato de comida que seja, se atira sobre ele como se não houvesse amanhã ao ponto de criar sujeira num raio de 5 metros de diâmetro.

E esse é um conceito tão enraizado na canalha que hoje ocupa os mais altos cargos da República que até agora ainda não entenderam o que de errado deu dessa vez.

De toda forma, vendo que a coisa deu ruim, os ministros que primeiro publicaram o vídeo, já o deletaram de suas redes fingindo que nada aconteceu.

O problema é que o estrago já foi feito. Ao querer se fantasiar de pobre, Bolsonaro deixou nu o asco que sente pelas classes mais necessitadas desse país e que, não por acaso, tem se empenhado com tanto afinco em simplesmente exterminá-la.

Que a imensa massa de pobres desse país lembre-se muito bem disso quando outubro chegar.




O paradoxo de Lula: um programa de esquerda na base de um amplo arco de alianças

Por Mauro Lopes


Lula surpreende e aponta para um programa à esquerda como base para uma política de alianças com o centro, a centro-direita e a direita, escreve Mauro Lopes


Nesta altura do campeonato, tudo caminha para uma chapa Lula-Alckmin. Apenas um evento inesperado de impacto poderá alterar o que, conforme Lula e a direção do PT têm sinalizado, está politicamente decidido, faltando apenas sacramentar e operacionalizar.

O ponto de indefinição é apenas qual será o partido ao qual Alckmin se filiará. O movimento em curso guarda semelhança com o realizado em 2002. Na época, José de Alencar era filiado ao PMDB e deixou o partido, que tinha aliança com o PSDB, para abrigar-se no PL. Agora, Alckmin deixou o PSDB e estão em andamento as conversas sobre qual será seu destino partidário.

Foto: Ricardo Stuckert

Da mesma forma que com José de Alencar, não se trata de uma aliança partidária nos moldes tradicionais, mas de um acordo político-social com capacidade de sinalizar ao país o espírito do governo que virá, se as urnas o confirmarem. 


No caso do PT, a presença de Alckmin terá a virtude extra de auxiliar na campanha para eleger Haddad em São Paulo. Para Lula, governar com um apoio do líder do estado-país que São Paulo representa, terá uma potência inédita. De quebra, começa-se a construir a “passagem do bastão” interna no partido. 

Um dos elementos mais relevantes -e até surpreendentes- da operação política em curso foi captado pelo cientista político Mathias Alencastro no programa Giro das 11 da TV 247 da última terça-feira (25): “ “Fiquei surpreso quando em plenas férias de janeiro, o PT colocou na mesa dois temas estruturantes e difíceis: o teto de gastos e a reforma trabalhista. Foi um movimento perfeito, porque o PT sinalizou para a esquerda que a política de alianças será feita com base num programa de esquerda para o governo.”

Isso é inovador e, de fato, surpreendente. Uma política de alianças ampla, com setores do centro, centro-direita e até direita tradicional que terá como pano de fundo um programa de governo que deve ser o mais à esquerda das quatro eleições que levaram Lula e Dilma ao Planalto. 

De fato, em suas entrevistas, Lula tem indicado que não fará concessões neoliberais no programa de governo para receber Alckmin na chapa ou articular mais amplamente as alianças eleitorais. A entrevista de Lula à CBN Vale do Paraíba nesta quarta (26), foi exemplar deste ponto de vista. Nela, Lula foi ainda mais explícito quanto a Alckmin: "“Eu tenho confiança no Alckmin. Fui presidente por oito anos, tive relações com Alckmin e sempre foram relações de respeito, institucionais. Se der certo da gente construir essa aliança, eu tenho certeza que vai ser bom para o Alckmin, vai ser bom para mim, vai ser bom para o Brasil e sobretudo deve ser bom para o povo brasileiro”.

Com sensibilidade, o professor Alencastro pontuou algo de aparência paradoxal: quanto mais for sendo construído e consolidado um programa de governo à esquerda, mais haverá espaço para ampliação da política de alianças, pois a bússola estará apontando para o norte, mesmo com uma tripulação de alta diversidade no navio eleitoral de Lula.

Estaremos ao mar, até as eleições. 


Mauro Lopes é jornalista e editor da TV 247


sábado, 29 de janeiro de 2022

A jogada ensaiada de Bolsonaro para provocar uma nova crise com o STF

Por Walter Maierovitch


Em futebol, os comentaristas diriam que foi jogada ensaiada, preparada nos treinamentos.

Sim, de caso pensado, Bolsonaro deixou, hoje, de comparecer à Polícia Federal.

Assim agiu para voltar à sua guerra antidemocrática e paranóica. Guerra que fora suspensa em 7 de setembro, quando tentou golpear o Estado de Direito.

Agora e desafiando ordem do Supremo Tribunal Federal (STF), Bolsonaro volta à carga e joga para desmoralizar a Corte excelsa.

Poucas semanas atrás, Bolsonaro retomou os ataques e voltou a ofender a honra dos ministros Alexandre de Moraes e Roberto Barroso.

Com essas provocações recentes, Bolsonaro busca, de imediato, uma crise institucional e cavar os impedimentos legais de Moraes e Barroso.

Sob o prisma legal e relativamente ao não comparecimento à Polícia Federal, o caso é de solução simples. Bolsonaro é investigado.

Como todo mortal comum, o investigado tem de comparecer à delegacia para prestar depoimento. Se o cidadão comum não comparece, é conduzido coercitivamente e, à luz do Código Penal, comete crime de desobediência.

A Constituição faculta a todo suspeito ou acusado o direito de silenciar. Na velha forma romana do "meno tenetur se detegere": ninguém está obrigado a se auto a acusar. O ônus de comprovar é do acusador, em resumo.

Como explicou o então ministro decano do STF, Celso de Mello, o presidente, como testemunha, tem o direito de enviar o seu relato por escrito, ou seja, não precisa comparecer.

No caso, Bolsonaro não é testemunha, mas, sim, suspeito. É objeto de uma investigação. Tem de comparecer, como um brasileiro comum.

Além do foro especial, o presidente da República tem outra prerrogativa. A prerrogativa de marcar dia, local e hora para comparecer perante a autoridade de polícia judiciária.

Na verdade, a determinação de Moraes, - depois de anteriormente atender Bolsonaro e adiar a sua ouvida pela Polícia Federal -, veio de bandeja para um presidente que sente a derrota eleitoral se aproximar. pelas pesquisas mostradas no momento, Bolsonaro, não emplacará a sua reeleição à presidência do Brasil.

criar crise institucional, trombar com o STF e os seus ministros, é o caldo em preparação e, na visão de Bolsonaro, ideal para um golpe.

Moraes será, a partir de 17 de agosto, o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Por consequência, presidirá as eleições deste ano.

Tornando-se inimigo público e notório de Moraes, Bolsonaro tudo fará para afastá-lo dos julgamentos. a inimizade capital é causa legal de suspeição.

atenção: o vice presidente do TSE será o ministro Kássio Nunes Marques, observado o critério de rodízio costumeiro.

Kássio Nunes Marques, como se sabe e apontam as suas decisões, é, como se diz no popular, bolsonarista "desde menininho".

Por último. Bolsonaro sente, e por isso se anima para as suas ilegítimas e ilegais lutas, ter "costas quentes".

No caso, o crime de desobediência fica sujeito à avaliação de Augusto Aras, procurador-geral da República e filobolsonarista.

Crime de responsabilidade, a gerar impeachment, é sempre brecado pelo presidente da Câmara, o bolsonarista Arthur Lira.

Caso denunciado e em face de crime comum por Aras, existe a barreira dos 2/3 da Câmara. Ou seja, os deputados podem não autorizar o recebimento da denúncia.

 

Walter Maierovitch é professor, desembargador e jurista




Sergio Moro e o paradoxo de Kate Lyra

Por Sérgio Batalha Mendes



Kate Lyra é uma atriz norte-americana que fez sucesso em programas humorísticos no Brasil dos anos 70 com um bordão: “Brasileiro é tão bonzinho!”, pronunciado com forte sotaque americano.

O bordão era pronunciado como fecho do quadro no qual ela interpretava uma americana ingênua, que era atraída por cantadas de brasileiros, sempre com o pretexto de “ajudá-la” com algum problema.

Sérgio Moro protagonizou esta semana a personagem de Kate Lyra ao avesso, revelando que recebeu 3,5 milhões por cerca de um ano de trabalho na empresa de consultoria americana Alvarez & Marsal. Afirmou que não enriqueceu e que não fez nada de errado.

A empresa americana é conhecida por abrigar antigos membros da comunidade de informações nos EUA e recebeu neste período R$ 65 milhões das empresas investigadas na Lava-Jato, o que representou mais de 77% de seu faturamento no Brasil.

No entanto, Moro quer nos convencer de que foi contratado apenas pelo seu conhecimento jurídico e que a empresa pagou esta bolada para ele atuar em questões que não tinham relação com a Lava-Jato. Como diria nossa Kate Lyra revisitada: “Americano é tão bonzinho!”.

O conflito de interesses é gritante, com forte suspeitas de extorsão e também de remuneração por trabalhos anteriores, como juiz, para o governo americano.

Sim, hoje não é absurdo cogitar que Moro tenha atuado como juiz à serviço do governo dos EUA para desestabilizar o governo brasileiro e impedir seu crescente protagonismo na diplomacia e na política mundial, em uma linha que não atendia aos interesses americanos.

Registre-se que entre 2018 e 2021 a família de Sergio Moro viveu em uma casa em Maryland, EUA, cujo aluguel mensal custaria quase 50 mil reais por mês em valores de mercado. A pergunta seguinte é óbvia: Como Moro conseguia custear esta despesa e ainda se manter com um alto padrão de vida no Brasil? Aduza-se que, até atuar na Lava-Jato, Moro não tinha um patrimônio que destoasse do patamar remuneratório de um juiz federal.

Logo, é importante que a Justiça e o Congresso investiguem a origem nebulosa dos recursos de Moro, não apenas porque ele será candidato a presidente, como principalmente porque há fortes indícios de crimes de corrupção e até contra a soberania nacional.

Afinal, o americano não “é tão bonzinho” e nenhuma firma americana pagaria uma remuneração milionária para um ex-juiz brasileiro atuar em questões irrelevantes. A personagem da Kate Lyra perdeu sua graça nos anos 70 e Moro nada tem de ingênuo. É chegada a hora da verdade para o “juiz lava-jato”.


Sérgio Batalha Mendes é advogado e sócio gerente na Batalha Advogados Associados

 


Capitão Morte X Xandão

Por Fernando Castilho


É certo, porém, que o capitão cometeu crime de responsabilidade de acordo com a Polícia Federal. O presidente da Câmara, Arthur Lira, se sentará sobre mais um pedido de impeachment e tudo ficará na mesma


Bom dia, amigos!

Em primeiro lugar, gostaria de agradecer a todos que têm visitado este blog que estava desativado e que volta agora com entusiasmo.

Bem, vamos lá!

28 de janeiro de 2022. Dia cheio, minha gente! Dia cheio.

O ministro do STF, Alexandre de Moraes, já de saco cheio com os adiamentos do depoimento do presidente Jair Bolsonaro, determinou que ele comparecesse hoje às 14:00  para esclarecer sobre a live em que vazou informação sigilosa sobre o ataque hacker que o TSE sofreu, mas que não afetou em nada os dados das eleições.

O Capitão Morte havia pedido adiamento e concordado em comparecer.

Logicamente, de acordo com a Constituição, poderia ficar calado diante das perguntas, mas optou pelo não comparecimento.

Com isso abre nova crise com o STF e se coloca nas mãos de Moraes. Não se sabe ainda qual será a resposta do ministro.

É certo, porém, que o capitão cometeu crime de responsabilidade de acordo com a Polícia Federal. O presidente da Câmara, Arthur Lira, se sentará sobre mais um pedido de impeachment e tudo ficará na mesma.

Na mesma? Pera lá! Tudo converge, se não houver algum acontecimento excêntrico, para a derrota de Bolsonaro nas eleições. Esse será mais um dos crimes pelos quais terá que responder se perder o mandato.

Ontem, ainda, o ex-juiz, ex-ministro e ex-consultor, Sergio Moro fez uma live junto ao deputado Kim Kataguiri, em que tentou se defender das desconfianças que pairam acerca de seu trabalho de consultor junto a empresa Alvarez&Marsal, responsável pela liquidação extrajudicial da Odebrecht, justamente uma das empreiteiras quebradas pela Operação Lava Jato.

Moro não quis dar uma entrevista coletiva para esclarecer o caso. Preferiu a live porque não precisaria responder às indagações de repórteres.

O ex-juiz recebeu, segundo ele, por um ano de trabalho, a quantia de 3,5 milhões de reais, montante que ele próprio considera de acordo com os padrões americanos.

Negou haver um conflito de interesses, mas esse é o assunto do qual o TCU está se encarregando em desvendar. No mínimo, trabalhar para a liquidadora da Odebrecht foi antiético e isso será utilizado contra ele durante os debates que virão antes das eleições.

Ainda, em 28 de janeiro, o ex-presidente Lula teve seu processo sobre o tríplex do Guarujá encerrado atendendo a pedido do próprio MPF que não vê prazo hábil para reiniciar as ações devido à idade avançada de Lula.

A Rede Globo noticiou o fato de maneira correta, mesmo com certa expressão irônica de William Bonner. Desta vez, reportou corretamente que os supostos crimes prescreveriam. De outra feita, suprimiu o termo “supostos”.

Ao verificar a agenda do presidente para o dia de ontem, este blogueiro verificou o todo mundo anda comentando, ou seja, que desde as “férias”, há mais de um mês, o capitão praticamente não trabalha. Ontem se limitou a falar pela manhã no cercadinho (isso não consta da agenda), das 9:30 às 10:30, participou do lançamento do Programa Nacional de Prestação de Serviço civil Voluntário e das 15:00 às 15:30, encontrou-se com Pedro Cesar Sousa, Subchefe para Assuntos Jurídicos da Secretaria-Geral da Presidência da República. Uma hora e meia de trabalho, mais nada.

Ontem também, (ufa!) a Folha de São Paulo teve acesso a uma nota técnica da ministra Damares Alves que diz que pessoas que se sentirem "discriminadas" por serem contrários à vacinação contra Covid-19 poderão denunciar os casos ao Disque 100.

Um absurdo! A corrida negacionista no governo continua a todo vapor e vai na contra-mão do desejo das pessoas em se vacinar.

Trata-se de mais crime contra a saúde pública e certamente será contestado pelo STF.

Como vemos, meus amigos, as campanhas eleitorais para 2022 já começaram e prometem muto.



 

 


quinta-feira, 27 de janeiro de 2022

Ao mestre Chico, com açúcar e com afeto

Por Fernando Castilho




Chico Buarque, um de nossos maiores compositores, uma das maiores instituições de nossa Música Popular Brasileira, acaba de ser cancelado por um movimento feminista que não sei se representa realmente o coletivo.

O fato é que Chico acusou o golpe e decidiu não mais cantar a música Com Açúcar, Com Afeto, composta para a interpretação de Nara Leão e tida como machista.

O compositor carioca é um dos maiores especialistas em interpretar a alma, as paixões e angústias das mulheres brasileiras, em sua maioria negras, diaristas e muitas vezes abandonadas pelos maridos, tendo que sustentar seus filhos sozinhas. Feministas da classe média das grandes cidades não as conhecem, mas Chico, sim.

Entre outras letras que tratam de temas semelhantes, lembro-me de Teresinha que ficou excelente na voz de Maria Bethânia:

“Se deitou na minha cama
E me chama de mulher
Foi chegando sorrateiro
E antes que eu dissesse não
Se instalou feito um posseiro
Dentro do meu coração”

Um homem rude, machista, que invade a vida de uma mulher e dela se apossa como se apossa de um objeto qualquer.

Em Com Açúcar, Com Afeto, Chico mostra o homem que não compartilha, não soma, individualista ao extremo e que engambela sua mulher para manter seu estilo de vida.

“Você diz que é um operário
Sai em busca do salário
Pra poder me sustentar
Qual o quê
No caminho da oficina
Há um bar em cada esquina
Pra você comemorar
Sei lá o quê”

Daí perguntamos: o autor de A Banda está sendo machista ou está esfregando na cara dos homens tudo aquilo que eles são na verdade?

O que o movimento diz de um de nossos maiores clássicos, Se Acaso Você Chegasse, de Lupicínio Rodrigues e Felisberto Martins, interpretada por ninguém menos que Elza Soares?

“Eu falo porque essa dona já mora no meu barraco

À beira de um regato e de um bosque em flor

De dia, me lava a roupa

De noite, me beija a boca

E assim nós vamos vivendo de amor”

Os homens das periferias, das comunidades, muitas vezes camelôs, pedreiros, operários, entregadores de aplicativos, etc., e que à noite vão para os botecos encontrar com os amigos para beber uma cachaça barata, deixando suas mulheres sozinhas com as crianças e que muitas vezes voltam bêbados para casa, pedem perdão ou as espancam, são os homens retratados por Chico ou Lupicínio. Eles existem de fato e Chico, classe média, filho de um dos maiores intelectuais do país, os conhece e denuncia o machismo com que tratam suas mulheres.

Esse movimento feminista não interpretou corretamente as letras de Chico que aceitou a truculência com afeto, recusando-se a enfrentar a polêmica.

A que isso vai nos levar?

Será que veremos o revisionismo geral de todas as letras de nosso cancioneiro popular? De Cartola a Lupicínio e a Chico, passando até por Erasmo Carlos em Coqueiro Verde?

Em frente ao coqueiro verde
Esperei uma eternidade
Já fumei um cigarro e meio
E Narinha não veio

Como diz Leila Diniz
O homem tem que ser durão
Se ela não chegar agora
Não precisa chegar

Pois eu vou me embora
Vou ler o meu Pasquim
Se ela chega e não me vê
Sai correndo atrás de mim

Será que essas músicas não são nosso patrimônio cultural devendo ser preservadas como o retrato da realidade de uma época?

Será que estamos vendo o nascimento de uma expressão do fascismo disfarçada?

Tratem Chico com açúcar e com afeto porque ele merece.

 

 


quarta-feira, 26 de janeiro de 2022

O PT precisa ajudar Lula a vencer no primeiro turno

Por Fernando Castilho




Muita gente está questionando se o ex-presidente estará vivo após quatro anos de mandato. A dúvida tem sua razão, afinal, Lula completará 76 anos no mês do primeiro turno e estará com 80 ao final do mandato, se vencer.


Lula fechou questão sobre Geraldo Alckmin como seu vice na chapa à candidatura de presidente em 2022.

Imediatamente vieram as mais variadas críticas de várias vertentes do PT e da esquerda em geral.

Logicamente Alckmin não é o vice dos sonhos de ninguém que deseje que o país se recupere da destruição levada à cabo por Jair Bolsonaro e avance nos programas necessários a promover o cidadão brasileiro e reduzir as terríveis desigualdades entre as pessoas.

Mas será que Lula vê o ex-governador de São Paulo dessa forma também?

É preciso entender que há uma guerra a ser vencida. Precisamos enxotar os facínoras que se instalaram no Palácio do Planalto e na Esplanada dos Ministérios porque ninguém aguenta mais tantos desmandos e atitudes genocidas contra o povo brasileiro. E não podemos correr o risco de composições serem urdidas durante a campanha para o segundo turno.

O ex-presidente tem também o governo de São Paulo em mente. Se Alckmin, o favorito nas pesquisas para o Palácio dos Bandeirantes, desistir da disputa, o caminho estará aberto para que Fernando Haddad seja o primeiro petista a morar lá.

É por isso que Lula vem trabalhando arduamente na costura de alianças, tentando trazer figuras como o senador Randolfe Rodrigues, por exemplo e acenando com Alckmin para a elite financeira do país para mostrar que a terceira via está a vista de todos.

Lula tem pressa.

Muita gente está questionando se o ex-presidente estará vivo após quatro anos de mandato. A dúvida tem sua razão, afinal, Lula completará 76 anos no mês do primeiro turno e estará com 80 ao final do mandato, se vencer. 

Se Lula vier a falecer durante seu mandato, Geraldo Alckmin assumirá a presidência. Este deve estar pensando nisso.

Mas Lula, com certeza, já avaliou sua condição física. Não vai jogar o Brasil numa aventura que ninguém sabe no que vai dar e comprometer sua história. Ele deve confiar que termina o mandato.

E a reeleição?

Acho que isso já foi pensado também.

Por isso que Lula quer Haddad governador. São Paulo pesa muito numa disputa presidencial e se Haddad fizer um bom governo, se cacifa para a presidência em 2026. Lula não deve estar pensando em dois mandatos.

Como Lula vem trabalhando muito já há alguns meses nessas costuras, seria mais lógico e até humano que as arestas entre os petistas fossem aparadas.

É imprescindível que agora todos unam forças contra o mal maior e trabalhem de maneira positiva para a eleição de Lula/Alckmin.

O projeto de Lula é maior que o PT neste momento.

É o projeto de salvação do país e de nosso povo.

É só nisso que ele pensa.




 

 


O xadrez de Bolsonaro

Por Fernando Castilho


Quando Jair Bolsonaro montou seu governo no final de 2018, se apoiou em vários pilares:

1 – Eleitores. 55% dos eleitores votaram no capitão, o que teoricamente significaria que cerca de 117 milhões de pessoas o apoiariam em seu governo. Num tabuleiro de xadrez, eles seriam os peões;

2 – Militares. Bolsonaro nunca escondeu de ninguém seu apreço e saudosismo pela ditadura militar. Por várias vezes o vimos enaltecer torturadores. A ideia é ter uma retaguarda que amedronte pela força qualquer um que se opusesse a sua forma de governar. Seriam os cavalos no xadrez.

3 – Lideranças evangélicas. Os pastores que têm amplo espaço nas TVs e também no congresso tratariam de estabelecer entre os fiéis um link dele com o divino. No ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, o capitão colocou Damares Alves, evangélica fundamentalista. Seriam os bispos no xadrez;

4 – Mídia. Nas televisões a Rede Record do bispo Macedo da Universal e o SBT de Sílvio Santos se encarregariam entrevistá-lo sem questioná-lo sobre temas polêmicos sempre que ele quisesse e destacariam os feitos de seu governo. Alguns jornais menores e rádios populares Brasil afora também se prestariam ao mesmo serviço. Uma das torres;

5 – Olavo de Carvalho. A ala olavista do governo do Capitão Morte assumiria o papel de dar suporte teórico a sua ideologia. O chanceler Ernesto Araújo trataria de mostrar ao mundo a nova cara da diplomacia brasileira, isolacionista e antiglobalização, de acordo com Donald Trump. O ministro da Educação que sucedeu a Ricardo Veléz Rodriguez, Abraham Weintraub, se encarregaria de incutir na mente do brasileiro comum a mentira de que os estudantes brasileiros nada produzem e só consomem maconha plantada em suas faculdades. Trataria também de destruir o Enem e qualquer iniciativa que visasse a melhoria do ensino no país. Já o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, promoveria o desmonte da fiscalização do Ibama, incentivo ao desmatamento e ao garimpo na Amazônia legal e os incêndios criminosos Brasil afora. Descobriu-se depois que ele tentava vender madeira ilegal para os Estados Unidos. Outros menos importantes, mas nem por isso destruidores em suas ações como o secretário de cultura, Mário Frias, o quinto da pasta até agora. Mais uma torre;

6 – Elite financeira. O instrumento para ganhar a confiança dessa elite é o ministro da economia, Paulo Guedes. Este estaria encarregado de proceder às reformas que garantiriam o aumento dos lucros do mercado financeiro e dos donos do poder econômico do país. Essa era a rainha.

Pronto, estava montado o xadrez do governo.

Passados três anos, como está esse tabuleiro?

1 – Eleitores. Bolsonaro perdeu metade dos peões. Possui agora cerca de 25% a 30% do apoio popular que tinha antes. Agora tem 4 peões;

2 – Militares. Alguns saíram do governo, como o general Santos Cruz. Outros estão desembarcando agora e até flertando com Lula. Os que têm boquinha com altos salários, ainda se mantém fiéis. Agora o capitão tem apenas um cavalo;

3 – Lideranças evangélicas. Pesquisa recente mostrou que quase metade dos evangélicos já apoia Lula. Restam os Malafaias da vida. Um bispo agora, somente;

4 – Mídia. Os veículos que apoiavam o Capitão Morte há três anos atrás ainda o apoiam, porém outros maiores como a Globo e a Folha de São Paulo fazem oposição a ele, embora não contundente. Essa torre continua;

5 – Olavo de Carvalho morreu, mas antes disso declarou que não mais apoiava esse governo. Weintraub já concorre ao governo de São Paulo, rompido com o governo. Ernesto Araújo tem feito críticas fortes a Bolsonaro e seus filhos. Uma torre a menos;

6 – Elite financeira. A decepção com Paulo Guedes enfim chegou. O ministro não conseguiu fazer as reformas pretendidas e agora tem fama de falastrão e homem preocupado em enriquecer mais ainda. Essa elite começa a flertar com Lula e Alckmin, afinal, se lembra de que nos governos do ex-presidente, lucraram muito. Meio pilar agora. A rainha agora está debilitada;

Mas Bolsonaro substituiu a rainha por outra: o centrão liderado por Arthur Lira e Ciro Nogueira. Mas esta está começando a mudar de cor, passando pro outro lado. As campanhas dos deputados e senadores começam agora e estes vão continuar a levar a grana das emendas do orçamento, mas se desvincularão do capitão em seus redutos eleitorais. Muitos se ligarão a campanha de Lula.

Resumidamente, o capitão agora tem 4 peões, 1 bispo, 1 cavalo, 1 torre e 1 rainha.

Isso basta para se reeleger?



 

 

 

 


terça-feira, 25 de janeiro de 2022

Olavo, o astrólogo, não previu a ômicron

Por Fernando Castilho



Passou também a escrever livros e um deles, O Que Você Precisa Aprender Para Não Ser Um Idiota, foi best-seller. Muitos compraram, mas poucos leram, pois como ele mesmo afirmava, seus seguidores eram todos idiotas


O filósofo alemão, Friedrich Nietzsche se autointitulava um homem póstumo. Sabia que seus escritos só seriam valorizados após sua morte.

Olavo de Carvalho se autointitulava filósofo. Mas em pouco tempo será esquecido não totalmente porque sempre haverá quem insista em continuar sendo enganado.

Há muito tempo atrás assisti a um debate entre ele e o filósofo Mário Sérgio Cortella. Lembro-me que foi um debate com bom nível, mas Cortella o dominou. O que, então, de lá pra cá?

Olavo percebeu que era perda de tempo continuar a tentar ser filósofo e não ganhar dinheiro. Era hora de mudar de vida e faturar.

Descobriu que há muita gente disposta a ouvir bobagens sem contestar. Então, criou um curso pela Internet e passou a angariar suas vítimas.

Quem são as pessoas que se inscrevem em seus cursos?

Há empresários endinheirados, gente estudada como o ex-chanceler, Ernesto Araújo e os irmãos, Weintraub e políticos como os filhos do presidente. Mas o grosso mesmo é de jovens que precisam de um rumo a seguir e coisas estranhas em que acreditar, como a terra plana, por exemplo.

O que há em comum a todos eles? Eles não vão ler Kant para conferir se o que Olavo falou é verdade. Desta forma, a grana vinha fácil.

Porém, uma vez um de seus alunos, um estudante de filosofia, percebeu que o que Olavo falava sobre Kant numa de suas aulas não batia com o que seu professor na USP ensinava. Procurou o professor, um especialista no filósofo alemão e lhe relatou sua inquietação. O professor, então, acessou a aula de Olavo e descobriu que o que ele falava era para enganar incautos.

Esse professor, cujo nome já não me lembro, entrou em contato com Olavo e o convidou para um debate sobre Kant.

Qual foi a resposta do “filósofo”?

Sim, mandou-o tomar naquele lugar.

Essa era invariavelmente a resposta dele a qualquer questionamento.

Passou também a escrever livros e um deles, O Que Você Precisa Aprender Para Não Ser Um Idiota, foi best-seller. Muitos compraram, mas poucos leram, pois como ele mesmo afirmava, seus seguidores eram todos idiotas.

Em 2013 um desses exemplares chegou às mãos de Carlos e Eduardo Bolsonaro que ficaram muito impressionados com o escritor.

Durante a campanha presidencial de 2018, os filhos de Bolsonaro tentaram demonstrar ao pai a importância de ter uma base teórica anticomunista e de extrema-direita. E ainda por cima, era Trumpista roxo! O Capitão Morte a princípio não gostou da ideia porque jamais lhe passaria pela cabeça ler um livro daquele tamanho, mas foi convencido por Carlos.

Ao montar sua equipe de governo, lógico, o filho 02 impôs ao pai a necessidade de escalar a elite dos seguidores de Olavo para alguns ministérios. Assim, o governo Bolsonaro teria um pilar olavista e outro militar. Um nortearia as ideias de extrema-direita em que se destacariam nomes como Ernesto Araújo e Abraham Weintraub e outro as ações autoritárias.

O fato é que o capitão acabou, pressionado pela necessidade de se reeleger, abandonando a ala ideológica de Olavo e mantendo os militares porque estes jamais largariam o osso de seus altos salários acumulados com os das Forças Armadas. Foi preciso dar um cavalo de pau e se juntar aos políticos do centrão que evitariam que processos de impeachment fosse levados a cabo.

Olavo acusou o golpe e, numa live em que participaram Ernesto, Weintraub e Ricardo Salles, desabafou dizendo que Bolsonaro nunca leu sequer um livro seu e que seu governo agora pertencia ao centrão.

Após essa live Weintraub, já de olho no governo de São Paulo, entrou em rota de colisão com os filhos do capitão.

As últimas teses de Olavo que Bolsonaro seguiu fielmente foram a de que a pandemia não existia e que as vacinas eram ineficazes contra a Covid-19.

Mas Olavo viu que o capitão, embora corroborasse ardentemente de suas teses, não conseguia impor seu pensamento ao governo e, mesmo com Marcelo Queiroga como ministro da Saúde, não pode impedir a compra de vacinas e a imunização de 70% dos brasileiros porque estes eram majoritariamente favoráveis aos imunizantes. Para Olavo, Bolsonaro era um fraco.

O que Olavo não conseguiu prever, mesmo sendo astrólogo, era que viria uma variante extremamente contagiante, a Ômicron que nem ele conseguiria vencer.

Como, ao contrário do fraco Bolsonaro (este afirma que não se vacinou, mas mantém sua caderneta de vacinação sob sigilo de estado por cem anos), Olavo se manteve fiel às suas teses, não se vacinando nem com uma primeira dose, contraiu o vírus com seus anticorpos totalmente despreparados para isso e faleceu.

Assim, a terra plana dá seu adeus a um enganador, negacionista, mentiroso, assassino de ursos, uma fraude e um dos responsáveis pelas mais de 400 mil mortes que poderiam ser evitadas se Bolsonaro abraçasse desde o início a política de vacinar rapidamente a população do país.

O imperativo categórico que se impõe agora é extirpar do poder essa gente que tanto mal fez ao povo brasileiro.

segunda-feira, 24 de janeiro de 2022

"Rumorese”: A estratégia de controle mental mais sutil que opera em toda a sociedade

De Rincón De La Psicologia 




Em “O Grande Ditador”, Hynkel, o personagem interpretado por Charles Chaplin, fala Grammelot, uma linguagem composta de sons, palavras e rumores que têm significado que, no entanto, outros parecem entender.

No romance “1984”, George Orwell se referiu a uma “linguagem neo” a serviço do sistema de controle, na qual todas as palavras consideradas “perigosas” para o regime foram eliminadas. O lema do partido é: “Guerra é paz, liberdade é escravidão, ignorância é força”.

Na verdade, essa linguagem sem sentido, que fala muito sem dizer nada, se espalhou entre nós a uma velocidade vertiginosa, como uma epidemia real. O filólogo Igor Sibaldi chamou de “rumorese”. E é importante ser capaz de detectá-lo, porque – sem perceber e de maneira sub-reptícia – pode acabar restringindo nosso pensamento e, portanto, limitando nossas decisões de vida.

O que é rumorese?

Rumorese é falar muito sem dizer nada, é a “capacidade” de colocar uma palavra após a outra, rapidamente, sem se preocupar que a mensagem seja consistente, tenha significado ou valor. Um discurso em rumorese é composto de palavras vazias ou termos excessivamente ambíguos que são frequentemente contraditórios entre si.

Rumorese é, portanto, a linguagem de todos aqueles que querem se destacar, mas não têm nada importante para contribuir com o mundo. É também a linguagem daqueles que querem exercer controle sem recorrer à razão ou ao entendimento. É uma linguagem em que os sons prevalecem e o significado é óbvio.

Vivendo na sociedade da loquacidade

Nos tempos em que conta mais quantidade do que qualidade, não deve nos surpreender que falar muito sem dizer nada tenha se tornado a norma. Como Thoreau disse, “parece que o importante é falar com rapidez e não com bom senso”.

Quem não aprende esse idioma, mas fala de maneira sensata, pode ser visto com desconfiança pelos outros. Seu discurso será classificado como muito complicado e raro, porque exige uma capacidade de atenção e reflexão perdida.

Assim, discursos razoáveis, lógicos e coerentes tornam-se incompreensíveis para a maioria, uma maioria que foi convenientemente lobotomizada graças a uma educação sistemática à loquacidade.

De fato, para funcionar em certos contextos sociais e ter “sucesso”, muitas pessoas são forçadas a aprender a falar mais e dizer menos. Quem não se sente perdido, como um peixe fora d’água, como se fosse o único são em um manicômio, testemunhando uma cena absurda que se desenrola com extraordinária normalidade. Quem não fala esse idioma acaba, portanto, se sentindo marginalizado, excluído e raro.

O “rumorese” cria o absurdo que nos lobotomiza

“Estamos prontos para fazer as modificações necessárias, de uma justiça por parte do cidadão, implementando reformas que não modificam o processo em andamento …”

Essas palavras, tiradas de um jornal, podem nos parecer familiares, uma vez que fazem parte dos rumores políticos, embora seja verdade que existem muitas outras variantes que falam muito sem dizer nada que se estenda a diferentes áreas de nossas vidas.

Nesse exemplo, embora o leitor possa se sentir feliz porque as “reformas necessárias” serão aplicadas, na realidade elas “não modificarão o processo em andamento”, o que significa que tudo mudará para que nada mude. A isto se acrescenta que o fato de a justiça ser da parte do cidadão é uma contradição, uma vez que a justiça não deve estar em lugar nenhum, mas ser imparcial.

O rumorese, portanto, serve apenas para gerar confusão e criar expectativas que nunca serão satisfeitas, por isso acaba gerando frustração. As contradições flagrantes e o absurdo que ele gera fazem com que uma parte do nosso cérebro se desligue, cansada de procurar uma lógica inexistente. E é precisamente esse tipo de lobotomização autoinfligida que se adapta a todos aqueles que aproveitam os rumores para alcançar seus objetivos.

A isto se acrescenta que, como os rumoreses não têm significado em si, geralmente é mais credível quem tem maior autoridade. Se não entendermos dois discursos antagônicos, teremos a tendência de fundamentar e acreditar no discurso institucionalizado e canonizado. O poder do referente trabalha sua mágica onde não há hábito do pensamento livre.

E isso significa que a razão e o diálogo não prevalecem, mas o poder. Como Thoreau advertiu, “o homem aceita não o que é verdadeiramente respeitável, mas o que é respeitado”.

A reflexão como arma contra palavras vazias

O rumorese é composto por uma série de ideias projetadas para serem acreditadas, independentemente de sua veracidade ou racionalidade. Geralmente, trata-se de especulações ou deturpações que se espalham porque causam impacto em nossas emoções mais atávicas.

De fato, o rumorese se espalha de maneira extremamente eficaz e é uma ferramenta de manipulação perfeita, porque geralmente ajustamos nossa visão de mundo à percepção que os outros têm. Pensamos que muitas mentes não podem estar erradas, portanto, quem eu estou errado sou eu.

O melhor antídoto para conter essa conversa vazia é a razão. Precisamos passar tudo pela peneira do nosso pensamento. Não importa de onde venham as palavras ou quem as disse, temos que questioná-las e, se necessário, refutá-las. É nesse ato de desconstrução do que foi dito que encontramos nossa verdade e nos tornamos livres.