Por Fernando Castilho
Bem, terminei de assistir a Get Back dos Beatles e resolvi escrever aqui o que achei do episódio 1. Mais tarde escreverei sobre os demais.
Alerto que é inevitável que haja spoilers, pois sem eles seria impossível escrever uma análise e opinião.
Não poderia ter sido escolhido título melhor. Voltar àquela época, uma viagem no tempo há 53 anos atrás é uma experiência única. Ainda mais com som perfeito e imagens que parece que foram gravadas agora (aliás, o concerto no rooftop foi convertido para 4K!). O resultado são 3 episódios que somam cerca de sete horas e meia de duração.
Ver os quatro de Liverpool no convívio do trabalho, da criação, da arte, é algo maravilhoso e serve muito para as gerações que não viveram a época, verem como as coisas aconteciam analogicamente, sem os requintes de uma tecnologia avançada como a de hoje.
Peter Jackson, o diretor do filme teve um trabalhão para escolher as cenas que mais representassem o ânimo do quarteto em 1969, entre 56 horas de imagens e 150 de áudios, mas o resultado foi excelente, embora haja trechos sem grande importância que poderiam ter sido excluídos.
No primeiro episódio fica bem claro que os Beatles não estavam a fim de produzirem nada naquele momento. Talvez a exceção fosse Paul McCartney que já demonstrava estar se tornando o workaholic que conhecemos hoje, mesmo aos 79 anos.
O diretor Michael Lindsay-Hogg, responsável pelo filme Let It Be (uma edição baixo astral que mostrava os Beatles se desentendendo o tempo todo) que aproveita cenas das muitas horas de fitas que resultaram em Get Back, tinha como meta original gravar um show ao vivo (hoje seria um DVD) em um local remoto no Saara para onde seriam levadas muitas pessoas em um navio e depois, sabe-se lá como) para servir de público. Uma loucura.
O fato é que o quarteto precisava compor e gravar músicas suficientes para um álbum em apenas três semanas. Ringo tinha compromisso para estrelar o filme The Magic Christian (que aqui se chamou Um Beatle no Paraíso), junto com Peter Sellers. George não estava a fim de se apresentar e John parecia absorto em outras coisas. Mas durante todo esse primeiro episódio Michael Lindsay-Hogg insiste num show distante da Inglaterra.
O estúdio para compor as músicas era o de Twickenham, um grande galpão sem nenhuma mobília localizado em uma área muito fria de Londres, o que influenciava o humor dos quatro.
Foi justamente em Twickenham que Paul teve uma discussão com George em que até a separação do grupo foi cogitada. Paul queria que George tocasse de uma certa forma e este parecia não estar conseguindo. John e Ringo permaneceram inertes só observando. Aliás, o tempo todo Ringo fica solitário em sua bateria só observando os movimento dos companheiros e tocando sua bateria.
Paul ficava irritado porque John sempre chegava muito atrasado, visivelmente anulado pela heroína da noite anterior, o que comprometia o prazo exíguo.
Não achei que a presença de Yoko, sempre junto a Lennon, fosse algo que atrapalhasse ou determinante para o mau humor ou constrangimento dos demais. Ela fica quieta e não dá palpite nenhum. Acho que houve muita injustiça com ela. Peter Jackson também acha.
Um belo dia acontece uma mágica. Paul chega antes dos outros e começa a tocar sua guitarra com um esboço muito cru de uma possível música. A ele se juntam um George bocejante e Ringo.
Aos poucos surge o embrião do que viria a ser Get Back. Note-se que George e Ringo percebem isso e se juntam a Paul nos instrumentos.
Reparei em algo que me chamou muito a atenção. John já tinha as linhas gerais de Gimme Some Truth que só seria lançada no álbum Imagine com crédito só para ele. Mas o que se vê é Paul ajudando John, inclusive na letra. Deveria ser Lennon/McCartney.
George estava sempre irritado. Talvez porque suas composições não emplacassem. Mas o que percebi é que, ao contrário de Lennon/McCartney, que traziam composições já mais ou menos delineadas, Harrison trazia suas músicas ainda cruas demais. É por isso que John brinca com ele sobre a letra de Something (atracts me like a cauliflower). All Things Must Pass não tinha nada a ver com o grande sucesso que integrou o álbum de mesmo nome.
Aliás, é meio estranho ver George tentando convencer os demais que ele já conseguia tocar tão bem quanto Eric Clapton. Este ainda seria melhor que ele pela sua capacidade de improvisação, mas mesmo isso seria fruto de padrões já desenvolvidos e estabelecidos. Os outros só olharam.
Os demais brincavam com George pelo fato de ter agredido um fotógrafo. Não esperava isso dele.
Também se nota que os Beatles gostavam muito de tocar composições de outros autores como Chuck Berry e Carl Perkins, além de músicas antigas de Lennon/McCartney que nunca foram aproveitadas.
O fato é que o estúdio de Twickenham quase foi responsável pelo fim mais precoce ainda da banda. Lá quase nada deu certo.
George sai do grupo, Ringo não se manifesta, John está anulado e Paul tenta puxar a banda para trabalhar.
Assim termina o episódio 1.
Aguardem a análise e a opinião sobre os demais episódios.
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