quarta-feira, 9 de fevereiro de 2022

Vem renúncia por aí?

Por Fernando Castilho



Já cogitei neste blog a possibilidade de Bolsonaro optar por uma candidatura ao Senado, mas na época era pura especulação.

Curiosamente, agora, meses depois, essa hipótese volta a circular como um rumor que vaza de dentro do Palácio do Planalto.

Ciro Nogueira, o ministro-chefe da Casa Civil da Presidência, e outras vozes fortes do Centrão, parece que têm tentado aconselhar o Capitão Morte sobre essa saída para que não seja preso pouco tempo depois do final de seu mandato.

À vista das últimas pesquisas de opinião e de uma em particular, encomendada pelo PL, o partido do presidente, a distância de Lula para Bolsonaro é muito grande e muito difícil de ser reduzida. Ainda por cima, o capitão não ajuda, fazendo motociatas pequenas pelo país, falando para poucas dezenas de pessoas que o bajulam no cercadinho e, no mais, contrariando o senso comum das pessoas que querem se vacinar e aos seus filhos, o mais rápido possível.

A verdade é que o capitão fala só para o seu curral de cerca de 20 a 25% de seguidores, enquanto Lula se dirige a cerca de 45% da população.

Parte das raposas do Centrão e também de outros partidos de direita é candidata à reeleição ou disputará o governo de seu estado.

Quando se tem dois planetas com massas muito diferentes, o maior, por ter mais atração gravitacional, puxa para si todos os corpos menores que passam perto dos dois.

Assim é Lula.

O PSD de Kassab já se dispõe a apoiar o ex-presidente no primeiro turno para liquidar logo a fatura. E assim vai acontecer com outros partidos também.

Nenhum parlamentar do Centrão, vai querer, principalmente no Nordeste, ter sua imagem associada a Bolsonaro, aquele que negou a pandemia e depois a vacina, contribuindo para a morte de centenas de milhares de entes queridos, Brasil afora. Eles vão desembarcar da canoa furada do capitão muito em breve.

Outro fator que contribui para que isso aconteça são as verbas advindas do orçamento secreto e das emendas que já foram entregues aos deputados. Centrão, sabe como é, recebeu a grana, tchau.

O Auxílio Brasil, o vale-gás e o reajuste de professores não bastarão para alavancar a popularidade de Bolsonaro.

Sendo assim, assistiremos logo mais o esvaziamento de sua candidatura.

A estratégia para salvar o capitão já está delineada por Ciro Nogueira e seus próximos: o presidente aguardaria até 2 de abril, quando se esgota o prazo para sua desincompatibilização do cargo, renunciaria ao mandato e, numa operação casada, o novo presidente, Hamilton Mourão o nomearia embaixador em algum país, mantendo seu foro privilegiado. Tem que ser embaixador e não ministro.

Dessa forma, Bolsonaro disputaria o Senado por algum estado (dizem que seria por Santa Catarina onde possui muitos eleitores), venceria e ficaria oito anos no cargo com direito à reeleição por mais oito anos. No total, 16 anos para exercer seu esporte predileto que praticou durante 28 anos na Câmara dos Deputados, vagabundear e xingar mulheres, gays e esquerdistas, além de homenagear torturadores e milicianos.

Quer mamata maior que essa?

Mas o ex-milico possui aquele perfil autoritário que não lhe permite seguir conselhos que não sejam de seus filhos. Bolsonaro resiste, talvez por medo de desagradar o cercadinho.

Claro que não estou aqui tentando achar uma saída para o Capitão Morte.

O que mais espero é que num futuro próximo ele pague por seus crimes contra o povo brasileiro e pelas centenas de mortes pelas quais é responsável direto.

Até as proximidades de abril veremos se os rumores se confirmarão.

 


terça-feira, 8 de fevereiro de 2022

Get Back - The Rooftop Concert

Por Fernando Castilho



Eles tocam Get Back, Don’t Let Me Down e daí começa um jogo de imagens para dividir a tela e mostrar simultaneamente o show e o que acontece na rua


Há 10 câmeras espalhadas por toda parte! Todas analógicas! Cinco no telhado, uma na cobertura de um prédio em frente, três na rua (uma delas nas mãos de um repórter que entrevista as pessoas) e uma última escondida na recepção do prédio da Apple. Michael Lindsay-Hogg parece que desconfiou que policiais poderiam tentar entrar no edifício e quis filmá-los.

Ringo usa uma capa de chuva vermelha, George um casaco preto grosso sobre uma calça verde, Paul vai de blazer preto e um par de old brown shoes. John veste um casaco de pele emprestado de Yoko que lhe fica curto nos braços.

O show enfim começa e mostra os Beatles com uma desenvoltura surpreendente para um grupo que se mostrava inseguro apenas alguns dias atrás. Mas é revelado que até a hora de subir, eles resistiam a ideia.

Eles tocam Get Back, Don’t Let Me Down e daí começa um jogo de imagens para dividir a tela e mostrar simultaneamente o show e o que acontece na rua.

À certa altura John reclama que seus dedos estão doendo por causa do frio.

As pessoas começam a chegar na hora do almoço. Há muitos funcionários de escritório, mas também senhoras aposentadas.

O repórter pergunta se sabem quem está tocando. Claro que todos sabem.

O que estão achando? A grande maioria está gostando muito, mas um homem, possivelmente um empresário ou chefe de departamento diz que naquele horário o show atrapalha os negócios.

Outro senhor mais idoso diz que gostaria que sua filha namorasse com um dos Beatles porque eles eram ricos.

Dois policiais chegam ao prédio da Apple e dizem na recepção que o barulho está incomodando e que era preciso parar sob pena de começarem a fazer prisões. Não sabem que estão sendo filmados. A recepcionista diz que os Beatles estão gravando um filme. Um funcionário aparece para dizer que vai ver como resolver o caso.

John reclama que seus dedos doem por causa do frio.

Passa-se algum tempo e aparece na recepção Mal Evans, o faz-tudo do grupo. Conversa com os policiais para enrolá-los ao máximo. Sai para ver como pode resolver a situação enquanto os policiais aguardam na recepção. Mais tarde, já com o show no fim, os leva para o telhado.

Um sargento. muito educadamente, pede para entrar.

Com os policiais já no telhado, Mal desliga os amplificadores, mas George os religa.

O show, enfim, termina.

Uma coisa que não sabia é que algumas músicas foram repetidas algumas vezes, como Get Back (3 vezes) e Don’t Let Me Down (2 vezes), o que acaba sendo um tanto cansativo para quem vê o documentário, mas já para quem está na rua, as músicas são novidade. Em Don't Let Me Down, John errou a letra e todos riram, menos Paul. Dali em diante um dos auxiliares se ajoelha segurando as letras das músicas.

Algumas delas receberam também a legenda “esta é a versão que aparece no  álbum Let it Be”, cumprindo assim o propósito de um álbum gravado ao vivo, ou quase. É por isso que as músicas eram repetidas. Precisavam encontrar a melhor performance.

Terminado o concerto, restava ainda gravar no estúdio as faixas que não foram tocadas no telhado. George perguntou se havia uma lei que proibisse shows como aquele e profetizou que dali pra frente todos os grupos de rock de Londres iriam fazer shows em telhados. Certo, U2?

Por fim, depois que Glyn falou que ficou tudo muito bom, Paul convoca todos a tentar mais uma gravação.

Só o Paul mesmo.

A ideia do concerto foi genial e agitou a sisuda e cinzenta Londres na hora do almoço.

O intuito de promover o novo álbum funcionou, mas o projeto de gravá-lo integralmente no terraço foi frustrada, pois os Beatles precisavam de mais tempo para tocar, impedidos que foram pelos policiais.

A imagem em 4K permite uma definição muito boa não parecendo que o show foi gravado há 53 anos!

É preciso falar também do som, excelente, mesmo se tratando sda tecnologia analógica de apenas oito canais da época. Logicamente Peter Jackson trabalhou também para digitalizar as músicas.

Não sei se Michael Lindsay-Hogg teve a intenção ou não de “esconder” Billy Preston durante o concerto, mas o fato é que o espectador desavisado dificilmente o notará. Billy deveria naquele momento aparecer como um quinto beatle pois foi ele quem motivou o grupo a continuar e emprestou seu talento para que as músicas ficassem realmente boas.

Enfim, para encerrar, fica um documento com sabor de quero mais. Surpreende quem é fã desde aquela época e pode empolgar novas gerações que não conheceram os Beatles e sua obra fantástica.

Não há como, para alguém como eu, que vivenciou o auge e o fim do quarteto de Liverpool e que tinha assistido ao filme Let It Be algumas vezes, tentando decifrar como se dava a criação de suas músicas, não se emocionar com os detalhes que Michael Lindsay-Hogg captou tão bem e que Peter Jackson condensou nassas quase oito horas de documentário.

Que venha mais!

Agradeço a todos por acompanhar esta série de análises e comentários. É graças a isso que me sinto motivado a escrever cada vez mais.



           

 

 

 


segunda-feira, 7 de fevereiro de 2022

20 aforismos contemporâneos de equivalência, redução ou circunstância

Por Walter Falceta 


1) Nem todo idiota é bolsonarista, mas todo bolsonarista pratica a idiotia.

2) A maioria dos esportes competitivos é um tipo de arte; mas o inverso nunca é uma verdade.

3) A vacina tem muitos inimigos; ela, no entanto, é sempre generosa, mesmo com eles.

4) Se a magnânima Amazônia trocasse de lugar com o presidente, ela certamente não o escalpelaria.

5) Sem educação, o sonho do oprimido é se tornar um opressor; enquanto o inverso, obviamente, nunca é uma verdade.

6) A argumentação clara, precisa e fundamentada é bem necessária, ainda que seja o pé de cabra que abre a caixa de pandora da inveja.

7) Tornar-se vítima do maldizer popular pode, em última instância, representar o elogio do bom senso.

8 ) Todo moralista, em última análise, quer proibir os outros de fazerem o que ele deseja, mas não pode ou não consegue.

9) O que mais enfurece o conservador não é a demanda do trabalhador, mas o sucesso do filho deste.

10) Preste atenção: os impacientes que te apressam são, em geral, lentos e preguiçosos no momento de retribuir teu zelo.

11) Os maiores imbecis do mundo têm grandes chances de arrebanhar multidões de seguidores; os grandes sábios, na mesma proporção, de receber um tiro, um laço no pescoço ou uma cruz.

12) Todo racista berra que a bronca do oprimido seja mimimi; enquanto, na verdade, o verdadeiro mimimi é o berro.

13) Alguns amigos somente existem para que você se lembre da falta que faz a verdadeira amizade.

14) Um copo meio cheio ou meio vazio? Sofisma. Do lado de fora, é sempre vazio.

15) Se toda nudez será castigada, por que não desnudar todas as formas de castigo?

16) Todo fariseu tem por perto outro fariseu, que o aplaude. O farisaísmo é um vício de grupo.

19) É preciso separar a obra de seu artista; tá ok; quem vai levar a 6a. Série B para a exposição com as pinturas de Hitler?

20) Se a morte de Teori foi acidente, quem tramou para acidentá-lo?


Imagem: "Filósofo em Meditação", 1632, Museu do Louvre,
Rembrandt Harmenszoon van Rijn (Leida, 15 de julho de 1606
Amsterdam, 4 de outubro de 1669)



Adeus, Rayan

Por Fernando Castilho



Rayan tinha apenas cinco anos e, por isso, eu gostaria que o leitor fizesse um esforço de empatia para tentar sentir o que o menino sentia ali, num lugar escuro, apertado, a 32 metros da superfície, longe dos pais e com muito frio


O acidente sofrido por Rayan Awran gerou comoção e solidariedade nas redes sociais em todo o mundo. "Resista pequeno Rayan, por favor, resista", implorou um internauta no Twitter.

"Nossos corações estão com a família e oramos a Deus para que ele se reúna com seus parentes o mais rápido possível", disse o porta-voz do governo Mustapha Baitas.

Rayan caiu num poço de 32 metros de profundidade na terça-feira passada. A família custou um pouco a encontrar o local, mas logo em seguida as tentativas de resgatá-lo começaram.

Por mais que água e alimento tenham sido baixados para o fundo do poço, não se sabe se a criança chegou a usufruir disso.

Rayan tinha apenas cinco anos e, por isso, eu gostaria que o leitor fizesse um esforço de empatia para tentar sentir o que o menino sentia ali, muito machucado pela queda, no escuro da noite, num lugar apertado, a 32 metros da superfície, longe dos pais e com muito frio.

Se você conseguiu sentir a dor e o desespero, parabéns. Eu não consegui. Porque devem ter sido indescritíveis.

Ontem fiquei prostrado após saber da notícia. O choro foi inevitável.

Comparo Rayan com minha netinha quando tinha essa idade. Tão frágil, tão dependente dos pais, tão cheia de vida.

Mas ela leva uma vida boa, tendo acesso a comida boa e farta, brinquedos e celular, além de escola.

Mas, e Rayan? O pequeno Rayan nascido em uma família muito pobre. Rayan, o menino cujo brinquedo era o quintal de sua casa, que se alegrava com o pouco que tinha para brincar e que não teria na vida as mesmas oportunidades de quem nasceu em berços mais privilegiados.

Rayan sofreu uma das piores torturas que uma criança já pode ter sofrido.

Mustapha Baitas orou a Deus, mas não foi atendido. O mesmo a família deve ter feito, mas também não foi atendida.

Sofrerei críticas por minha indignação, é certo, mas não há como aceitar que um Criador, também chamado de Pai, que tudo pode e tudo vê, não tenha tido a sensibilidade de salvar esse menino. Seria um milagre? Ora, não dizem que milagres em condições menos desfavoráveis e até menos importantes, acontecem todos os dias?

Que mal fez essa criança de apenas cinco anos para não ser salvo?

A mãe disse que essa foi a vontade de Deus.


domingo, 6 de fevereiro de 2022

Get Back, o filme - episódio 3

Por Fernando Castilho



Billy continua a fazer a diferença nos teclados. Inova em Let it Be e Paul lhe faz uma revelação em tom de elogio: “vir do norte da Inglaterra não facilita nada essa pegada mais soul”


Após ter analisado e comentado os episódios 1 e 2 de Get Back, decidi separar a análise e os comentários do episódio 3 em duas partes para que o texto não ficasse longo demais.

Desta forma, vai aqui o episódio 3 sem o concerto no rooftop, pois este será tratado à parte, pois demandará mais descrições de como ele se deu.

No fim do episódio 2 a câmera capta o exato momento e não deixa dúvidas. A ideia de fazer o show no telhado da Apple foi apresentada a Paul por Michael Lindsay-Hogg e Glyn Johns. A expressão de Paul mostra o quanto ele se surpreendeu e gostou logo de cara.

Michael Lindsay-Hogg

O terceiro episódio começa com Ringo tocando uma parte de Octopus’s Garden ao piano. O pessoal gosta e John vai à bateria para marcar o ritmo. Ringo revela que só tem a primeira parte. A música não fará parte de Let It Be, mas será incluída em Abbey Road.

George agora parece bem à vontade no grupo. Apresenta ao grupo Old Brown Shoe bem mais elaborada e Paul se empolga com a música. Parece que George percebeu que precisava trazer músicas em estágio um pouco mais avançado para mostrar aos companheiros. Agora temos um grupo coeso novamente.

Billy continua a fazer a diferença nos teclados. Inova em Let it Be e Paul lhe faz uma revelação em tom de elogio: “vir do norte da Inglaterra não facilita nada essa pegada mais soul”. Realmente essa pegada de Billy dá um tempero bem melhor às músicas.

Os Beatles trabalham como nunca. Get Back fica praticamente pronta e Don’t Let me Down ainda é um problema para John, principalmente na letra.

I’ve Got a Feeling fica pronta.

George insiste em Something e revela que não sai do lugar há seis meses. Apesar de John voltar ao “me atrai como uma couve-flor”, agora eles gostam da música. Ela também fará parte de Abbey Road.

Interessante ver nesse episódio o grande consumo de champanhe, sei lá por quê. George também aparece tomando uísque enquanto compõe.

Os Beatles sempre se ressentiram da morte de Brian Epstein, o paizão que mantinha o grupo coeso e, por isso buscam um novo empresário já que não admitem a liderança de Paul como foi demonstrado no episódio 1. John fala pela primeira vez de Allan Klein e elogia suas qualidades para se tornar o novo empresário do grupo. “Impressionante como conhece todos, sabe tudo de cada um”.

Paul vira a cara. Mais tarde saberemos que ele preferia que seu sogro empresariasse os Beatles.

George expõe a John seu projeto de um álbum solo. Este fica um pouco surpreso, mas o primeiro se justifica dizendo que todos poderiam enveredar por esse caminho para dar vazão aos seus projetos próprios. Sabemos que o resultado, Wonderwall Music não foi tão bom assim.

Uma das passagens mais engraçadas é quando Jonh e Paul cantam Two of Us entre os dentes, sem mover a boca. Hilário. Eles se divertem muito e, por incrível que pareça, conseguem, mesmo quando tem que cantar trechos como “Not arriving on our way back home” que tem a palavra “back” que começa com “B”, muito difícil de falar dessa forma. Nada indica que eles se desentenderão e se separarão.

Algo que chama a atenção é como John se desconcentra o tempo todo. Faz piadas sem muita graça, imita outras pessoas cantando (Well you can imitate ev'ryone you know) e faz caretas de todo tipo. O grupo precisava focar nas músicas devido ao prazo curtíssimo, mas John atrapalhava. Nem por isso os demais o repreenderam, muito menos Paul, que até parece que curtia. He just let it be.

Diz-se por aí que Yoko era a mala que John carregava (she’s so heavy), mas talvez fosse o contrário, pelo menos durante as filmagens. In that respect he let me down.

Sem querer defender que Paul era realmente o mais profícuo criador dos quatro, fica patente que John não está em seus melhores momentos criativos, apesar de Don’t Let Me Down ser realmente uma grande música, mas que não fará parte de Le It Be.

No documentário aparecem legendas do tipo “esta é a versão que aparece no álbum” quando algumas músicas já tiveram suas gravações concluídas por Glyn Johns.

Glyn Johns

Enfim chega a véspera do concerto no telhado da Apple e todos estão apreensivos. Fará frio, mas não choverá. De qualquer forma, Ringo vestirá uma capa vermelha impermeável. One of us will wear a raincoat.

Peter Jackson tem um valiosíssimo tesouro em mãos e só compartilhou conosco cerca de 15% dele.

Pode ser que a maior parte seja entediante e sem importância, mas ficou claro que houve um hiato no documentário, já que, de uma hora para outra, as músicas que ainda estavam muito embrionárias, aparecem já quase prontas no episódio 2, quando surge Billy Preston.

Além disso, há trechos que poderiam ser cortados, principalmente no episódio 2.

Portanto, não há como, sem ver o restante das quase 45 horas de gravação, avaliar se a edição feita por Jackson foi a melhor possível.

Podemos dizer que Michael Lindsay-Hogg, o diretor que gravou as 53 horas, foi visionário e que Glyn Johns fez um grande trabalho de mixagem e gravação numa mesa de oito canais, como George queria.

Bem, espero que todos tenham gostado.

Acompanhe a análise do concerto no telhado da Apple, The Rooftop Concert, o último dos Beatles.



sábado, 5 de fevereiro de 2022

O país dos elegantes

Por Flávio de Castro



Eu confesso que não sei a verdade: não sei se Lula é ou não dono de um triplex no Guarujá como não sei se FHC é ou não dono de um apartamento na Avenue Foch, em Paris.

Sei apenas que a presunção de ser dono de um tríplex no Guarujá é inequivocamente associada à corrupção e a presunção de ser dono de um apartamento em Paris não tem nada a ver, obviamente, com corrupção.

Especialmente se o apê do Guarujá for um tanto novo-rico e o apê de Paris, um tanto elegante.

A questão é estética.

Lula carregando uma caixa de isopor e sendo dono de um barco de lata é uma cômica farofa. Se FHC carregasse uma caixa de isopor e fosse dono de um barco de lata seria uma concessão à humildade.

A questão é classista.

Um Odebrecht sentado à mesa com FHC é um empresário rico. O mesmo Odebrecht sentado à mesa com Lula é um pagador de propina.

Nada disso tem a ver com corrupção. Nada disso revela qualquer preocupação com o país.

A cada dia que passa, é mais evidente que o que está em discussão é quem são os verdadeiros donos do poder.

E os donos legítimos do poder são os elegantes. Aqueles com relação aos quais não interessa saber como amealharam riqueza porque, simplesmente, a riqueza lhes cai bem.

A casa grande tem um perfume que inebria toda a lavoura arcaica e sensibiliza até a senzala. É o que estamos assistindo.

Tudo o mais, tudo o que não é casa grande é Lula e os amigos de Lula!

A questão é preconceito.

Vejam como um fraque cai naturalmente bem em FHC. Um fraque assim em Lula, certamente, deveria ter sido roubado.

O Brasil é o país dos elegantes. De uma elegância classista, racista e preconceituosa deitada eternamente no berço esplêndido do aristocrático século XIX.

[FHC, por favor, levante a gravata do seu lado direito, está um pouco torta, isso, perfeito!]


Bolsonaro, Moro e o pau de arara mais bem sucedido do Brasil

Por Fernando Castilho



Essa fala mostra mais uma vez o quanto o Capitão Morte carrega de preconceitos contra a gente nordestina, além das mulheres, gays e negros


Jair Bolsonaro falou outra besteira nesta quinta-feira, durante sua live.

 Ao falar sobre a revogação de decretos de luto oficial, errou o local de nascimento de Padre Cícero e, ao comentar com assessores, os chamou de “pau de arara”.

Essa fala mostra mais uma vez o quanto o Capitão Morte carrega de preconceitos contra a gente nordestina, além das mulheres, gays e negros.

Não acredito que ele tenha pensado em Lula durante a live porque ele fala muita coisa sem pensar. Aliás, pensar e ler não são seu forte.

Lula, assim como inúmeros nordestinos que desceram para as grandes cidades do sudeste e do sul, fugiram da seca e suas consequências, como a fome, a sede e a falta de perspectivas para melhorar de vida.

Mas ele não veio por iniciativa própria porque ainda era criança. Foram seus pais que migraram com toda a família para São Paulo.

Embora haja um número enorme de gente que conseguiu refazer sua vida e seu futuro, Lula foi o retirante mais bem sucedido da história do Brasil por que não só conseguiu se eleger presidente por dois mandatos, mas ainda por cima encerrou seu último governo com 83% de aprovação, um recorde que lhe confere o título de melhor presidente da história do Brasil desde que as pesquisas começaram a ser feitas.

O preconceito de Bolsonaro é enraizado, mas é lógico que ganha cores mais fortes depois que foi revelado que o Nordeste não vota nele de jeito nenhum. Aliás, ele também se referiu às mulheres como esquerdistas, movido pelo resultado das pesquisas que mostram que ele não tem eleitorado feminino.

Mas, voltando a Lula, ele profetizou, ainda quando estava sendo interrogado, que naquele momento o ex-juiz, ex-ministro e ex-consultor, Sergio Moro, o estava massacrando, mas que no futuro seria ele o massacrado. Não foram exatamente essas palavras, mas ele quis dizer que toda aquela perseguição contra ele, que seu advogado Cristiano Zanin, chamou de lawfare, um dia ia se voltar contra ele.

O que está acontecendo hoje com Moro não é perseguição, mas sim, a conta que lhe chega por atos determinados de ilegalidades cometidas e com provas suficientes para incriminá-lo. Mas, embora não se trate de perseguição, Lula estava certo.

Um procurador do TCU, Tribunal de Contas da União, percebeu sonegação de impostos quando Moro atuou como consultor da Alvarez & Marsal e vai propor investigação disso.

Logicamente, Moro, apressou-se em dizer que se trata de perseguição e abuso de poder contra ele por ser candidato a presidência.

Ora, não foi ele quem mandou prender Lula quando este estava em primeiro lugar nas pesquisas, baseado em absoluta falta de provas, destacando na sentença que a condenação se dava por atos indeterminados? Não seria isso abuso de poder?

Vejam que o procurador não mandou prender Moro para que depois fosse investigado como o ex-juiz propõem em seu projeto de excludente de ilicitude que permite que policiais militares atirem primeiro antes de perguntar.

É preciso que se lembre que Moro mandou a Polícia Federal conduzir Lula coercitivamente para inquérito sem que este jamais tivesse se recusado a fazê-lo.

O procurador não mandou colocar grampo ilegal na casa de Moro, como ele mandou fazer com Lula.

Desta vez até a Rede Globo, que vinha tentando aumentar os índices do ex-juiz, noticiaram a ação do procurador contra ele, sinal de que já está desembarcando desse projeto mal-sucedido de terceira via.

Quanto a Bolsonaro, continua e continuará fazendo a anticampanha que lhe garante 25% de eleitorado.




Publicado também em Piauí Hoje
https://piauihoje.com/blogs/e-o-que-eu-acho/bolsonaro-moro-e-o-pau-de-arara-mais-bem-sucedido-do-brasil-390689.html

sexta-feira, 4 de fevereiro de 2022

Get Back, o filme (episódio 2) - The smiles returning to their faces

Por Fernando Castilho



As lágrimas vieram aos olhos de Paul. “Restaram só dois”


Bem amigos, continuando a análise de Get Back, vamos ao segundo episódio.

No episódio anterior George havia deixado o grupo na sexta-feira. Os três Beatles restantes demonstraram sua preocupação com o fato e, é claro, Paul havia sido o principal responsável por isso.

Houve uma reunião no domingo, mas nada ficou resolvido.

Na segunda-feira encontramos a equipe com Ringo, Paul e Linda. Todos cabisbaixos.

Ninguém conseguiu falar com John Lennon que estava o tempo todo com seu telefone ocupado.

Paul acha que John está curtindo mais Yoko do que os Beatles e ele não o censura por isso. “Vai ser divertido ver daqui a 50 anos disserem que Yoko sentava no amplificador”.

As lágrimas vieram aos olhos de Paul. “Restaram só dois”.

Interessante que após a morte de John e George, hoje só restaram dois.

Lá pela hora do almoço Lennon chega.

Não se sabe quem colocou um microfone num vaso de flores para gravar a conversa entre Paul e John, uma indiscrição.

John reclama do tratamento autoritário que Paul dispensa a George. Ele reconhece. Há acusações e muita roupa suja sendo lavada, mas no fim, eles se acertam, pois há muito amor envolvido. Decidem ir os três à casa de George.

Agora estão nos estúdios da Apple em Londres e isso faz toda a diferença. Lá é menos frio, o astral melhora e eles tocam músicas antigas suas e de seus ídolos, enquanto que o engenheiro de som, Glyn Johns acerta as mixagens.

No episódio anterior George havia manifestado sua preocupação com o show ao vivo durante o qual os Beatles gravariam seu próximo álbum. Seria ao vivo, mas se Paul tocasse baixo, quem tocaria os teclados?

George relembrou ao grupo que eles conheceram um cara que tocava com Little Richard em Hamburgo e que integrava o grupo de Ray Charles, mas que ele considerava melhor que o mestre: Billy Preston.

Por incrível que pareça, Billy apareceu no estúdio alguns dias depois e foi recebido de maneira esfuziante. Os Beatles sempre demonstraram humildade diante de seus ídolos. Apesar de estarem no topo, não se colocavam acima de outros.

Billy, convidado por John, logo sentou-se ao teclado e sua maneira de tocar, sua facilidade em “pegar” as músicas deixou todos muito animados. Foi uma verdadeira injeção de alegria em todos. E ele estaria no álbum.

Os sorrisos voltaram às faces dos Beatles e agora estava tudo bem entre eles.

Aqueles esboços confusos de músicas e letras do primeiro episódio agora tomavam corpo e os Beatles começaram a sentir outras possibilidades com a presença de Billy Preston.

O diretor Michael Lindsay-Hogg ainda insistia quase todos os dias em fazer um show grandioso fora da Inglaterra, mas ninguém se empolgava com a ideia.

George, talvez estimulado pela sua sugestão que deu muito certo, começou a mostrar suas músicas agora mais elaboradas. John, como sempre, aproveitou para brincar com ele sobre I Me Mine, que seria uma valsa. Mas foi justamente George que havia dito que a inspiração fora de um filme que tinha visto na TV em que as pessoas dançavam nesse ritmo.

Os Beatles tinham muito disso. Viam notícias nos jornais, assistiam a filmes e já vinha a inspiração para as letras.

Se alguém ainda acha que Yoko atrapalhou as gravações, deveria ter visto Heather, a filha de Linda. Ela detonou o estúdio sem que qualquer um interferisse.

Foi nesse episódio que Paul demonstrou todo seu virtuosismo e sua fonte inesgotável de canções da mais alta qualidade, como Let it Be e The Long and Winding Road. Fica claro que ninguém mais conseguia acompanhá-lo.

John Lennon já não era a metade do homem que costumava ser. Isto é, de relapso e preguiçoso, se tornou um beatle de novo e um dos mais entusiasmados.

Glyn caprichava nas gravações piloto enquanto que George Martin se mantinha discreto, à distância. Certamente ele não foi aproveitado no álbum Let it Be.

É nesse clima de volta dos Beatles aos velhos tempos que termina o segundo episódio.

Aguardem a análise e opinião do terceiro e último.





quinta-feira, 3 de fevereiro de 2022

O golpe, com o Supremo, com Barroso, com tudo

Por Fernando Castilho



Passados quase seis anos daquele domingo, há a percepção geral de que Dilma jamais praticou corrupção, embora a mídia permanecesse muda por todo esse período

Domingo, 17 de abril de 2016, um dos dias mais vergonhosos da história do Brasil.

Foi nesse dia que a Câmara, abarrotada de deputados, votou o impeachment de Dilma Rousseff.

Vimos com indignação e horror, parlamentares citarem a família, a esposa, os filhos, o cachorro, o papagaio para darem seus votos a favor da derrubada da presidenta.

Não faltou, claro, o voto do então deputado Jair Bolsonaro que prestou homenagem ao maior torturador do país, aquele mesmo que torturou Dilma barbaramente, o coronel Brilhante Ustra.

Voltando mais ainda no passado, uma conversa telefônica gravada do então senador Romero Jucá com um empresário expunha como as coisas eram tramadas nas sombras. Jucá afirmava que era preciso tirar Dilma e por Temer. Que era preciso estancar a sangria. Que tinha que ser com o Supremo, com tudo, embora poupasse o então ministro Teori Zavascki que, segundo ele, não compactuaria do golpe.

Ou seja, o ministro Luís Roberto Barroso, indicado pela própria Dilma, estaria no bolso do colete de Jucá.

Quem acompanhou todo o processo que começou bem lá atrás em 2013 quando inicialmente pessoas ligadas ao Movimento Passe Livre saíram às ruas para protestar contra o aumento de 20 centavos nas passagens de ônibus e metrô em São Paulo. O movimento cresceu, impulsionado pela mídia e tomou as ruas de todo o Brasil. Agora não seria mais o preço das passagens, mas um descontentamento com a presidenta que viu sua aprovação cair de 60 para 30% em apenas um mês.

A partir daquele ano, os ataques contra Dilma começaram a aumentar e tornaram sua reeleição bem mais difícil do que se pensava.

Uma vez reeleita, Dilma viu não só aumentarem os ataques, mas também os boicotes a sua administração. O presidente da Câmara, Eduardo Cunha trabalho para que nenhum projeto fosse aprovado, amarrando as mãos do governo e criando o clima favorável para o impeachment.

Dilma seria defenestrada pelo poder devido a um crime de responsabilidade inventado de última hora, as tais pedaladas fiscais que não significaram apropriação indébita de recursos, ou seja, sem corrupção.

Mas o que deputados e senadores queriam de fato era espaço para corrupção, já que Dilma fechara as comportas do dinheiro ilegal.

Passados quase seis anos daquele domingo, há a percepção geral de que Dilma jamais praticou corrupção, embora a mídia permanecesse muda por todo esse período.

Agora a Folha de São Paulo publicou um artigo que reaviva aqueles tempos.

O ministro Barroso resolveu escrever um artigo para a revista do Cebri (Centro Brasileiro de Relações Internacionais) em que defende que o motivo real para o impeachment não foram as pedaladas, mas sim, a falta de apoio político.

“Creio que não deve haver dúvida razoável de que ela não foi afastada por crimes de responsabilidade ou corrupção, mas, sim, foi afastada por falta de sustentação política. Até porque afastá-la por corrupção depois do que seguiu seria uma ironia da história”.

Em artigo publicado em 2019 no livro Estado, Democracia e Direito no Brasil, Barroso já tinha defendido essa mesma tese. 

Ora, se não houve crime de responsabilidade nem corrupção, houve motivo razoável para o impeachment? Por que essa gente insiste em não usar o termo “golpe”? Pior, ele sustenta que não houve golpe!

Essa reflexão de Barroso acontece somente agora porque só agora ele tem um termo de comparação com Jair Bolsonaro, perto de quem, Dilma é uma madre Tereza?

Ou Barroso já tinha essa opinião em 2016, mas guardou para si, mesmo tendo sido indicado por Dilma?

Ele não poderia pelo menos declarar que não havia crime de responsabilidade?

Realmente Romero Jucá tinha razão. O golpe seria com o Supremo, com tudo.

Com cinismo, com tudo.

 


quarta-feira, 2 de fevereiro de 2022

O horror, o horror, o horror!

Por Marcos Bagno



É no Congo que se desenvolve a trama do romance “The Heart of Darkness” ("O Coração das Trevas", 1899), de Joseph Conrad (1857-1924), no qual aparece a exclamação tantas vezes citada: “O horror, o horror, o horror!”. 

Entre 1885 e 1908, o que é hoje a República Democrática do Congo (RDC) foi propriedade pessoal do rei Leopoldo II da Bélgica (1835-1909). Durante esse período, e para explorar ao máximo as enormes riquezas do país, especialmente o marfim e a borracha, os belgas (e outros europeus) cometeram atrocidades que deixariam com inveja muitos carrascos nazistas: trabalhos forçados, tortura, amputação de membros de crianças, mulheres e homens que não alcançassem as impossíveis cotas estabelecidas pelos exploradores, envenenamento, assassinatos em massa. As cifras variam, mas os cálculos de historiadores atuais giram em torno dos 10.000.000 de pessoas mortas naquele período. O horror! O horror! O horror! 

Em 1960, a RDC se tornou independente, mas a manipulação da política local pelos belgas não se interrompeu: o primeiro chefe de governo do país, Patrice Lumumba (1925-1961), de ideias progressistas e nacionalistas, foi deposto e assassinado sob supervisão belga e com o patrocínio dos Estados Unidos. 

O controle do país foi parar nas mãos de Mobutu Sese Seko (1930-1997), que mudou o nome do país para Zaire e implantou uma ditadura que durou de 1965 a 1997, durante a qual acumulou uma fortuna de dezenas de bilhões de dólares (devidamente depositados na "neutra" Suíça). 

A RDC abriga imensas reservas minerais: tem a maior reserva mundial de cobalto, além de grandes jazidas de cobre e diamantes. A exploração dessas riquezas tem sido, desde sempre, a causa principal do horror, horror, horror de que a população congolesa é vítima há séculos (foi do Congo que vieram muitos milhares das pessoas escravizadas que os portugueses trouxeram para o Brasil). 

Um país riquíssimo, mas que ocupa a posição 175 de 189 no índice de desenvolvimento humano. Diversos conflitos ocorridos desde 1997 já provocaram a morte de mais de 5.000.000 de pessoas, numa guerra em que o estupro das mulheres tem sido uma das principais armas empregadas. 

Na RDC existe um exército de crianças-soldados, algo como 30.000. Nossos telefones celulares e outos aparelhos ultramodernos têm componentes que são frutos diretos dessa imensa tragédia humanitária, um holocausto ininterrupto, sobre o qual Hollywood até o momento não produziu nenhum filme, já que nenhum congolês é dono de estúdio e a exploração dos minerais é de primordial interesse das maiores empresas do mundo, que produzem alta tecnologia ao custo de vidas humanas. 

Se tem sido possível falar de “diamantes de sangue” quando as pedras preciosas são extraídas de países em guerra (Angola, Serra Leoa, Libéria etc.), também é possível falar dos “chips de sangue”, produzidos pela máquina de guerra congolesa, posta em marcha pelo capitalismo globalizado (50% das exportações de minério da RDC vão para a China). 

Leia-se o livro “Les minerais de sang: les esclaves du monde moderne” ("Os minerais de sangue: os escravos do mundo moderno, 2014) de Christopher Boltanski, um relato sobre a exploração da cassiterita, indispensável para a produção de telefones, rádios, televisores etc. É desse cenário de horror que centenas de milhares de pessoas como Moïse Mungenyi Kabamgabe e sua família têm fugido. 

Mas como encontrar abrigo num país igualmente trágico, marcado por séculos de atrocidades e genocídios, uma sociedade entranhadamente racista, em que 77% das pessoas assassinadas em 2021 são negras, assim como 67% das mulheres mortas também são negras? O quinto país em número de feminicídios, o primeiro em número de assassinatos de homossexuais e pessoas trans? 

Num país desgovernado pelo que pode haver de mais abjeto, corrupto, desprezível, ignorante e brutal na espécie humana? Que tipo de refúgio pode oferecer o Brasil, especialmente a Barra da Tijuca, a pessoas negras que tentam escapar da guerra e da violência? O horror, o horror, o horror!

 

Marcos Bagno é escritor


Get Back, o filme (episódio 1)

Por Fernando Castilho



Bem, terminei de assistir a Get Back dos Beatles e resolvi escrever aqui o que achei do episódio 1. Mais tarde escreverei sobre os demais.

Alerto que é inevitável que haja spoilers, pois sem eles seria impossível escrever uma análise e opinião.

Não poderia ter sido escolhido título melhor. Voltar àquela época, uma viagem no tempo há 53 anos atrás é uma experiência única. Ainda mais com som perfeito e imagens que parece que foram gravadas agora (aliás, o concerto no rooftop foi convertido para 4K!). O resultado são 3 episódios que somam cerca de sete horas e meia de duração.

Ver os quatro de Liverpool no convívio do trabalho, da criação, da arte, é algo maravilhoso e serve muito para as gerações que não viveram a época, verem como as coisas aconteciam analogicamente, sem os requintes de uma tecnologia avançada como a de hoje.

Peter Jackson, o diretor do filme teve um trabalhão para escolher as cenas que mais representassem o ânimo do quarteto em 1969, entre 56 horas de imagens e 150 de áudios, mas o resultado foi excelente, embora haja trechos sem grande importância que poderiam ter sido excluídos.

No primeiro episódio fica bem claro que os Beatles não estavam a fim de produzirem nada naquele momento. Talvez a exceção fosse Paul McCartney que já demonstrava estar se tornando o workaholic que conhecemos hoje, mesmo aos 79 anos.

O diretor Michael Lindsay-Hogg, responsável pelo filme Let It Be (uma edição baixo astral que mostrava os Beatles se desentendendo o tempo todo) que aproveita cenas das muitas horas de fitas que resultaram em Get Back, tinha como meta original gravar um show ao vivo (hoje seria um DVD) em um local remoto no Saara para onde seriam levadas muitas pessoas em um navio e depois, sabe-se lá como) para servir de público. Uma loucura.

O fato é que o quarteto precisava compor e gravar músicas suficientes para um álbum em apenas três semanas. Ringo tinha compromisso para estrelar o filme The Magic Christian (que aqui se chamou Um Beatle no Paraíso), junto com Peter Sellers. George não estava a fim de se apresentar e John parecia absorto em outras coisas. Mas durante todo esse primeiro episódio Michael Lindsay-Hogg insiste num show distante da Inglaterra.

O estúdio para compor as músicas era o de Twickenham, um grande galpão sem nenhuma mobília localizado em uma área muito fria de Londres, o que influenciava o humor dos quatro.

Foi justamente em Twickenham que Paul teve uma discussão com George em que até a separação do grupo foi cogitada. Paul queria que George tocasse de uma certa forma e este parecia não estar conseguindo. John e Ringo permaneceram inertes só observando. Aliás, o tempo todo Ringo fica solitário em sua bateria só observando os movimento dos companheiros e tocando sua bateria.

Paul ficava irritado porque John sempre chegava muito atrasado, visivelmente anulado pela heroína da noite anterior, o que comprometia o prazo exíguo.

Não achei que a presença de Yoko, sempre junto a Lennon, fosse algo que atrapalhasse ou determinante para o mau humor ou constrangimento dos demais. Ela fica quieta e não dá palpite nenhum. Acho que houve muita injustiça com ela. Peter Jackson também acha.

Um belo dia acontece uma mágica. Paul chega antes dos outros e começa a tocar sua guitarra com um esboço muito cru de uma possível música. A ele se juntam um George bocejante e Ringo.

Aos poucos surge o embrião do que viria a ser Get Back. Note-se que George e Ringo percebem isso e se juntam a Paul nos instrumentos.

Reparei em algo que me chamou muito a atenção. John já tinha as linhas gerais de Gimme Some Truth que só seria lançada no álbum Imagine com crédito só para ele. Mas o que se vê é Paul ajudando John, inclusive na letra. Deveria ser Lennon/McCartney.

George estava sempre irritado. Talvez porque suas composições não emplacassem. Mas o que percebi é que, ao contrário de Lennon/McCartney, que traziam composições já mais ou menos delineadas, Harrison trazia suas músicas ainda cruas demais. É por isso que John brinca com ele sobre a letra de Something (atracts me like a cauliflower). All Things Must Pass não tinha nada a ver com o grande sucesso que integrou o álbum de mesmo nome.

Aliás, é meio estranho ver George tentando convencer os demais que ele já conseguia tocar tão bem quanto Eric Clapton. Este ainda seria melhor que ele pela sua capacidade de improvisação, mas mesmo isso seria fruto de padrões já desenvolvidos e estabelecidos. Os outros só olharam.

Os demais brincavam com George pelo fato de ter agredido um fotógrafo. Não esperava isso dele.

Também se nota que os Beatles gostavam muito de tocar composições de outros autores como Chuck Berry e Carl Perkins, além de músicas antigas de Lennon/McCartney que nunca foram aproveitadas.

O fato é que o estúdio de Twickenham quase foi responsável pelo fim mais precoce ainda da banda. Lá quase nada deu certo.

George sai do grupo, Ringo não se manifesta, John está anulado e Paul tenta puxar a banda para trabalhar.

Assim termina o episódio 1.

Aguardem a análise e a opinião sobre os demais episódios.