terça-feira, 21 de fevereiro de 2023

Bolsonaro será mesmo preso?

Por Fernando Castilho




Ministros do STF, não identificados, já estariam conformados e trabalhando com a hipótese de que Jair Bolsonaro nunca será preso?


Na semana passada o portal Uol publicou uma matéria em que a articulista dizia, genericamente, que “ministros do STF consideram difícil a prisão de Bolsonaro, mas têm como quase certa sua inelegibilidade”.

Sempre que surge uma matéria como essa, a pergunta a se fazer é: quais foram os ministros que se posicionaram dessa forma e como essa informação foi obtida?

Se foram Nunes Marques e André Mendonça, não há nenhuma novidade, já que eles sempre votam a favor do ex-presidente. Mas, confesso que é inevitável desconfiar da veracidade da informação que, se verdadeira, transfere a Alexandre de Moraes a árdua tarefa de se ver isolado na defesa da democracia e do estado de direito.

Segundo a colunista, Bolsonaro, agora entregue à justiça comum, poderá ter seus vários processos se arrastando por muitos anos até o trânsito em julgado de uma possível sentença condenatória devido à falta de materialidade, de provas e aos recursos que impetrará. O capitão, de 67 anos, estaria muito idoso quando, enfim suas sentenças definitivas de seus 28 processos forem confirmadas.

Sobre isso, o jurista Walter Maierovitch afirmou que, se procedente a afirmação dos ministros, seria a falência da justiça. E seria mesmo.

Caso os ministros tenham se esquecido, Bolsonaro foi, durante 4 anos, mestre em produzir provas contra si próprio.

Só no caso da pandemia da Covid-19 foram várias, ou alguém não se lembra de quando o ex-ministro da saúde, general Pazuello, anunciou a compra da vacina Coronavac? No dia seguinte, ao ser indagado por repórteres sobre a compra, Bolsonaro reagiu rispidamente dizendo que quem mandava era ele e que a vacina só seria comprada se passassem por cima de seu cadáver. Em seguida, apareceu ao lado do sorridente general que disse que um manda e o outro obedece, confirmando que, a mando do presidente, acabava de cancelar a aquisição. Quantas mortes aqueles sorrisos maldosos causaram devido ao atraso na compra de imunizantes que só acabou ocorrendo depois de muita pressão popular, da mídia e de parlamentares?

Existe um sem-número de provas de crimes, mas, se apenas esse único episódio não servir como prova de que deliberadamente o capitão boicotou a vacina, não sei o que mais serviria. Aliás, a CPI da Covid-19 encontrou vários indícios de crimes que acabaram nas mãos do PGR, Augusto Aras que os ignorou e varreu para baixo de seu tapete.

Neste país das contradições, é particularmente notável que o senador eleito, Sergio Moro, esteja justamente neste momento, buscando aprovar seu projeto de trânsito em julgado de sentenças condenatórias após a segunda instância, o que poderia fazer, caso não fosse inconstitucional, com que seu ex-inimigo, agora reconciliado, Jair Bolsonaro, fosse enviado ao xilindró mais rapidamente.

Mas, além das contradições, este é um país em que se procura o tempo todo perdoar a quem nos tem ofendido. Antigamente se chamava de “jeitinho brasileiro”.

Sérgio Buarque de Hollanda, em Raízes do Brasil, afirmou que o brasileiro é um homem cordial, ou seja, pensa mais com o coração (“cordial” vem de “coração”) do que com a razão. No passado já distante, a atriz comediante norte-americana, radicada no Brasil, Kate Lyra tinha um famoso bordão na TV: “brasileiro muito bonzinho”.

A justiça frequentemente esquece a gravidade de crimes cometidos e dá uma segunda chance ao meliante, mas só se este for poderoso, caso da recente liberação de Sérgio Cabral que, acumulando 436 anos de pena, cumpriu 6 e voltou para casa com uma tornozeleira.

Caso diferente, mas com a semelhança da impunidade, foi o de Paulo Maluf. O ex-prefeito de São Paulo, ao longo de décadas foi conseguindo protelar o trânsito em julgado de sua sentença, usando e abusando de recursos. Quando, enfim, esgotaram-se todos, foi enviado para casa com tornozeleira devido à idade avançada e à saúde fraca.

Portanto, caso os processos contra Bolsonaro se arrastem por muitos anos, como sugerem os ministros, teremos mais um caso em que o crime terá compensado.

E o pior de tudo é que Bolsonaro, mesmo inelegível, ao final, rirá da cara de Alexandre de Moraes e de todos nós. Com a certeza da impunidade, continuará a atuar politicamente para causar ainda mais males ao povo brasileiro.


quinta-feira, 9 de fevereiro de 2023

O editorial de O Globo e seus indisfarçáveis objetivos

Por Fernando Castilho





O contrato do Válter chegara ao fim e Seu Durval foi convidado a voltar para salvar a empresa, enquanto o larápio fugia para não ser preso pelas falcatruas que cometeu. O chefe, Irineu, pôs toda a culpa no Válter e recebeu cinicamente Seu Durval com um grande abraço.

Seu Durval ficou assustado com o que encontrou. As finanças todas fora de ordem, planilhas inconsistentes ou faltando, documentos extraviados, fluxo de caixa zerado, enfim, um caos.

 

Seu Durval, um autodidata e gênio da contabilidade, trabalhou por anos numa grande empresa onde teve a oportunidade de levantar suas finanças e fazê-la crescer e prosperar. Era um homem que se fez por seu próprio esforço.

Um dia, sentindo que já tinha cumprido sua missão, decidiu que era hora de se retirar.

Sua sucessora, Matilde, alguns anos depois, acabou sendo demitida devido a uma trama de seu subordinado puxa-saco, que assumiu seu lugar. Ele não ficou muito tempo no cargo e acabou sendo substituído pelo Válter, numa trama urdida por Irineu, o chefe.

Seu Durval ainda tentara voltar, pois sabia que a empresa ia mal das pernas, mas o Irineu, que nunca gostara dele, empenhou-se pelo Válter. Na verdade, ele sempre desejou que um amigo próximo, totalmente sem experiência, assumisse o cargo, porque assim, ele poderia comandá-lo como a um fantoche e mandar no caixa da empresa. Poderiam juntos combinar certos esquemas que não seriam possíveis com Seu Durval.

Sem Seu Durval na parada, chegara a hora do Válter ser admitido no cargo.

Como era inexperiente, incompetente e totalmente inepto, o chefe passou a disfarçar os balanços escondendo os prejuízos, mas sempre levando algum por fora.

A diretoria, aos poucos, começou a perceber o mal que o Válter causava à empresa, mas ele era autoritário e ligado a elementos perigosos e isso intimidava a todos.

Mas o contrato do Válter chegara ao fim e Seu Durval foi convidado a voltar para salvar a empresa, enquanto o larápio fugia para não ser preso pelas falcatruas que cometeu. O chefe, Irineu, pôs toda a culpa no Válter e recebeu cinicamente Seu Durval com um grande abraço.

Seu Durval ficou assustado com o que encontrou. As finanças todas fora de ordem, planilhas inconsistentes ou faltando, documentos extraviados, fluxo de caixa zerado, enfim, um caos.

O trabalho de reparação dos males causados pelo Válter demoraria vários meses e a diretoria foi informada disso.

Porém, Irineu, ainda sonhando com a volta do Válter para retomarem os esquemas de falcatruas, começou a atacar Seu Durval cobrando-lhe resultados.

“Onde estão os lucros? Não era para levantar a empresa que você voltou?”

Seu Válter tentou explicar que o caos que encontrara era maior do que pensara e que mudanças profundas teriam que ser feitas. Além disso, havia um amigo do Válter, o Campos, no departamento financeiro, que sabotava as medidas que precisava tomar.

Irineu, então, bradou: “Em vez de ficar reclamando, você deveria apresentar resultados! Saiba que o cara de quem você reclama atua de maneira independente dentro da empresa!

“Você deveria fazer avançar a agenda de crescimento pro[1]metida quando assinou contrato!”

Seu Válter estava há apenas 40 dias no cargo e sabemos que é concedido aos novos funcionários um prazo de 3 meses para experiência, mas o chefe não quis nem saber disso. Queria seu protegido de volta ao cargo porque assim manteria seus lucros.

A última frase entre aspas proferida por Irineu está no editorial de hoje, 08/02, de O Globo.

 


sexta-feira, 3 de fevereiro de 2023

Falhou mais um plano infalível do Cebolinha

Por Fernando Castilho




O plano de Bolsonaro, Daniel Silveira, Braga Netto e Augusto Heleno para dar um golpe mais se assemelha a um dos inúmeros planos infalíveis do Cebolinha.


Todo mundo sabe que a Mônica é a dona da rua e que o Cebolinha está sempre engendrando um golpe para conquistar esse poder.

Como não consegue fazer isso sozinho, sempre busca a ajuda do amigo, Cascão.

Para este último plano, Cascão achou melhor procurar o apoio logístico do Louco. Como todos sabem, o Louco é um personagem com personalidade conturbada e cheio de maluquices. O ideal para a missão.

Como era de se esperar, mais um plano que não deu certo. O Louco acabou revelando-o à Mônica e os três acabaram sendo surrados por ela, que continua a ser a dona da rua.

Fim da história infantil. Vamos para o assunto que é muito sério. Ou infantil, como veremos mais adiante.

Dois outros planos infalíveis cujos mentores provavelmente foram Jair Bolsonaro, Augusto Heleno e Braga Netto, também não deram certo: os atentados à bomba antes da diplomação de Lula e a depredação dos edifícios dos três poderes em 08/01.

Não vou gastar linhas aqui contando toda a história na cronologia apresentada pelo senador Marcos Do Val, por demais já conhecida de todos, mas comentarei algumas possíveis incongruências e esquisitices.

A história contada pelo senador à Veja colocava o ex-presidente Jair Bolsonaro na chefia direta do golpe, como o autor da coação que teria sofrido para participar da “missão”, como Do Val chama a incumbência que lhe foi dada.

Após ter sido pressionado pelo senador Flávio Bolsonaro, Do Val mudou a versão. O capitão não o teria coagido, limitando-se a ficar calado durante a reunião de planejamento do plano que o recolocaria no poder. Só no final teria dito que aguardaria sua decisão em ser o protagonista principal da “missão”.

Foi essa a versão apresentada à coletiva de imprensa e ao depoimento à Polícia Federal.

O ministro do STF, Alexandre de Moraes, confirmou a veracidade do que Do Val apresentou à PF na conversa que tiveram.

O senador, ao ser procurado pelo então deputado Daniel Silveira para participar de uma reunião com ele e o presidente, segundo suas palavras, optou por primeiro consultar Alexandre de Moraes se deveria ou não comparecer ao encontro. Moraes teria dito que sim.

Ora, o senador ainda não tinha conhecimento da proposta que lhe fariam. Poderiam conversar sobre qualquer assunto. Então, por que consultar o ministro?

Do Val se diz especialista em inteligência e repetiu isso várias vezes durante sua coletiva. Mas, nessa condição, não seria ele uma pessoa mais apropriada que Silveira a propor um método para tentar captar alguma fala que pudesse ser usada contra Moraes?

Por que, passados quase dois meses, só agora decidiu levar o caso a público?

Não resta dúvida de que a reunião golpista existiu. Se foi Bolsonaro que a convocou e a conduziu, como foi afirmado à Veja, já há motivos claros para sua prisão.

Na nova versão, o capitão teria deixado Silveira conduzir a reunião e propor a “missão”, mas é óbvio que isso não o isenta de responsabilidade, uma vez que, pelo seu cargo, deveria ter encerrado a conversa logo no início e ter dado voz de prisão ao então deputado.

Não há como Bolsonaro se safar desse planejamento golpista. Ele não pode dizer que foi chamado ao encontro sem saber do que se tratava. Seria uma reunião secreta para conversar sobre futebol?

Felizmente, Do Val, em depoimento à PF, não negou a presença do capitão na reunião. Se o fizesse, uma simples convocação do motorista do carro presidencial e dos funcionários presentes no palácio (estranhamente o senador disse que não sabe se o evento ocorreu na Granja do Torto ou no Alvorada) bastariam para confirmar sua presença.

A partir da revelação de Marcos Do Val, fica mais fácil ligar essa reunião à minuta de golpe descoberta na casa do ex-ministro da Segurança, Anderson Torres. Uma pisada na bola de Moraes, segundo o raciocínio de Bolsonaro e Silveira, serviria para tornar a minuta, oficial e dar o golpe.

Só que as coisas não funcionam assim. E, por isso, o plano é infantil.

Mesmo que Moraes confidenciasse alguma impropriedade, não seria suficiente para um golpe. E sabemos muito bem como o ministro é cuidadoso. Ele não cairia numa armadilha ridícula, como ele mesmo se referiu à tentativa de golpe.

Resta considerar a participação de Augusto Heleno e Braga Netto, já que Silveira, em mensagem, citou 5 partícipes. E ainda soltou uma frase enigmática: “cinco estrelas”. Provavelmente em alusão aos 2 generais da reserva.

Moraes precisa pedir que a PF convoque Silveira e Bolsonaro para depor, mesmo que a fala do capitão seja tomada por vídeo conferência.

O ministro chamou o plano de golpe Tabajara e Gilmar Mendes afirmou que “estávamos sendo governados por gente do porão”.

Nada mais apropriado para descrever mais um plano infalível frustrado do Cebolinha.

Cebolinha não pode ser preso, mas Bolsonaro, sim.

 

  


terça-feira, 31 de janeiro de 2023

Se for preciso, que se intervenha no estado de Roraima

Por Fernando Castilho


Foto: Ricardo Stuckert


O que transparece, pela fala do governador de Roraima, é que, por ele, o solo da Amazônia pode ser revirado totalmente do avesso, desde que se extraia dele o máximo de riqueza possível. E claro, não sem contrapartida.


Todo presidente tem o poder de mudar a situação do povo que governa, para o bem ou para o mal.

Jair Bolsonaro debochou o tempo todo da pandemia que matou 700 mil pessoas, chegando a sabotar as medidas sanitárias e até a receitar remédios de ineficácia comprovada.

Sua agenda presidencial revelava que trabalhava muito pouco nos dias de semana e saía de “férias” de maneira irregular, enquanto as chuvas tratavam de matar e desabrigar milhares de pessoas pobres.

Reunia-se com garimpeiros, na verdade, donos de mineradoras, aliando-se a eles para pôr em prática seu antigo projeto de extinção dos povos indígenas.

Jair se empenhou em mudar a situação do brasileiro para pior. E conseguiu.

Lula, apenas 20 dias após a posse, arregaçou as mangas e foi conhecer de perto, in loco, a situação dos indígenas Yanomamis, acompanhado de 3 ministros.

"Se alguém me contasse que, aqui em Roraima, tinham pessoas sendo tratadas da forma desumana que eu vi o povo Yanomami sendo tratado, eu não acreditaria. Não podemos entender um país que tem as condições que têm o Brasil deixar os nossos indígenas abandonados como eles estão aqui", afirmou o presidente.

A visita causou um alvoroço nas redes sociais e repercutiu significativamente na imprensa internacional. A nacional não deu muita bola no início, talvez preocupada em não dar pontos para Lula, mas, devido ao volume na Internet, teve que se render e fazer reportagens.

O presidente, nem bem começa a governar e já muda a situação de todo um povo para melhor.

Hoje, em reunião com ministros, Lula exigiu que os tráfegos aéreo e pluvial dos garimpeiros em Roraima sejam cortados o mais rápido possível.

Se a nova administração federal já consegue reverter em parte um dos maiores crimes do capitão, classificado como genocídio, é preciso também que se olhe com atenção para o estado de Roraima.

O governador, Antônio Denarium, manifestou-se sobre os Yanomamis, não deixando dúvidas de que ele e grande número de prefeitos da região, não só são a favor do garimpo ilegal em terras da federação cedidas aos indígenas, como também incentivam e apoiam.

Enquanto o capitão nega seus crimes, Denarium, bolsonarista convicto, prefere seguir o caminho da hipocrisia ao dizer que não é novidade os Yanomamis passarem fome e que deveriam eles próprios explorar suas terras.

O que transparece, pela fala do governador, é que, por ele, o solo da Amazônia pode ser revirado totalmente do avesso, desde que se extraia dele o máximo de riqueza possível. E claro, não sem contrapartida.

As matérias sobre as terras Yanomamis e o garimpo ilegal não deixam dúvidas de que há um plano de enriquecimento de grupos compostos de mineradoras, militares e políticos em execução, cujo obstáculo são alguns milhares de indígenas. Se, principalmente as crianças forem envenenadas pelo mercúrio ou mortas por doenças e fome, a população originária será reduzida a ponto de se tornar inviável sua multiplicação, o que, na prática, significa sua extinção.

O governo Lula tem que fincar pé na região, implementar ações de salvamento dos indígenas e de corte do tráfego das mineradoras, como foi decidido na reunião ministerial, mas também aumentar e concentrar na região contingentes de fiscalização e segurança para, não só prender, mas também confiscar aviões e helicópteros e destruir barcaças e outros equipamentos, afetando assim significativamente o poder econômico desses grupos. Não será uma tarefa fácil e, muito menos, rápida, mas é preciso que se comece a sufocar os donos dessas atividades mineradoras, aumentando-lhes os prejuízos.

Além disso, é preciso que a tragédia Yanomami não saia tão cedo dos noticiários, já que vem sensibilizando a opinião pública, a ponto de criar uma massa crítica contrária ao bolsonarismo, ao governador e aos prefeitos da região.

O governador, metido até o pescoço com a extração ilegal de ouro, verá aumentada a pressão das mineradoras contra ele e poderá reagir às medidas adotadas por Lula e seus ministros.

Antecipando-se a isso, é bom que o governo federal já tenha um plano elaborado para pôr em prática uma intervenção no estado, caso seja necessário.

Lula termina seu primeiro mês de governo já cumprindo com êxito uma amostra-grátis do que prometeu em campanha: acabar com a fome do povo.

Neste caso, a fome do povo Yanomami.

 

 


sexta-feira, 27 de janeiro de 2023

A banalidade do mal em Damares Alves e nos terroristas de Bolsonaro

Por Fernando Castilho




Se Eichmann não sentia o mínimo remorso por seus atos, o que dizer da ex-ministra incumbida de preservar as terras Yanomamis, Damares Alves?


Quando Adolf Eichmann, oficial nazista responsável pelo envio de cerca de 6 milhões de judeus para o extermínio em campos de concentração no que se chamou de “solução final”, foi julgado em Jerusalém em 1961, o mundo se surpreendeu com sua frieza ao afirmar que não sentia que tivesse feito algo errado porque era apenas um soldado burocrata encarregado de cumprir ordens.

A filósofa alemã e judia, Hanna Arendt, chegou a entrevistar Eichmann na prisão e dessa entrevista extraiu elementos para seu livro, Eichmann em Jerusalém – Um Relato sobre a Banalidade do Mal.

Na obra, Arendt defende que Eichmann se tornara um homem desprovido da moral, da ética e do senso crítico, cuja objetivo de vida era tão somente executar as ordens de Hitler sem refletir sobre elas ou fazer qualquer julgamento.

Gostaria, a partir daqui, de tentar traçar um paralelo, que pode parecer a alguns um tanto forçado entre Eichmann e Damares Alves, já que a comparação entre Adolph Hitler e Jair Bolsonaro salta aos olhos, nestes últimos tempos em que foi revelado, como um verdadeiro plano de extermínio da etnia yanomami.

Assim como Hitler, como já escrevi anteriormente em Hitler, o Führer e Bolsonaro, o mito. Semelhanças, Bolsonaro defendia, desde os tempos de deputado, que o Brasil deveria fazer com nossos indígenas aquilo que a cavalaria norte-americana fez com sucesso, ou seja, exterminá-los. Portanto, o plano não se restringia somente aos yanomamis, mas a todas as outras etnias e só não obteve sucesso pleno porque ele não se reelegeu e porque Lula chegou a tempo a Roraima para impedir a continuidade do genocídio.

Mas se Eichmann não sentia o mínimo remorso por seus atos, o que dizer da ex-ministra incumbida de preservar as terras Yanomamis, Damares Alves?

Damares é o que se pode chamar de evangélica fundamentalista. Acredita piamente que os indígenas vivem em pecado por não reconhecerem Cristo e por viverem nus, o que é, na sua visão, uma agressão à moral e aos bons costumes. É preciso lembrar que essa visão da ex-ministra, constantemente exposta à opinião pública, tem revelado uma obsessão com relação ao sexo, frequentemente encarado como algo extremo, por exemplo, quando afirmou que crianças teriam seus dentes arrancados para facilitar o sexo oral na Ilha de Marajó, algo jamais confirmado.

Além disso, acredita que as crianças indígenas, por viverem na floresta, isolados, dormindo em redes, caçando e pescando e expostos a doenças e perigos, deveriam ser transferidas para as cidades e adotadas preferencialmente por casais evangélicos que as salvariam. Ela própria, segundo noticiários, sequestrou no passado uma criança indígena e a levou para viver com ela na paz de Cristo. A menina, hoje uma moça, foi doutrinada e nega qualquer maldade cometida com ela.

Damares Alves se empenhou, durante sua estada no governo, em facilitar a entrada de pastores evangélicos nas aldeias indígenas para catequização. A ONG Missão Caiuá, entidade missionária evangelizadora pertencente à Igreja Presbiteriana, que recebeu pelo menos R$ 2,98 bilhões em pagamentos e R$ 3,05 bilhões em contratos celebrados com o poder público desde o ano de 2014, é uma dessas entidades que utilizava até aviões do garimpo para se deslocar às aldeias. O que esperar de uma entidade como essa?

Quando era ministra dos Direitos Humanos, para tornar a permanência das crianças indígenas cada vez mais insuportável, forçando-as a deixar suas terras em direção à civilização, a atual senadora pediu a Jair Bolsonaro que vetasse a entrega de leitos de UTI e de água potável a indígenas em plena pandemia. Era aceitar Jesus ou morrer. Em ambas a opções, sem crianças, os Yanomamis teriam sua sentença de morte assinada por não mais ser possível a continuidade da etnia.

Nesse sentido, é possível um paralelo entre Damares e Eichmann?

Enquanto Eichmann parecia um robô nas mãos de Hitler, Damares agia movida por seu fundamentalismo religioso, acreditando insanamente que estaria fazendo o bem. Indiretamente cumpria os planos de Bolsonaro que queria, sem meias palavras, pura e simplesmente a extinção do povo Yanomami e de todos os demais indígenas, facilitando a ocupação de suas terras pelas empresas mineradoras.

A banalidade do mal está presente em ambos os casos e isso não significa que a punição deva ser branda. No caso de Eichmann, seus crimes foram punidos com a forca. No caso de Damares, esperamos investigação, julgamento e condenação à altura, de acordo com o Estado de Direito, embora talvez nunca vejamos, como em Eichmann, a admissibilidade dos males que cometeu.

Ainda há que se considerar o que Hanna Arendt escreveu em sua obra:

“a execução de ordens é a mera obediência cega, independentemente se o partido pede para organizar distribuição de alimentos ou o extermínio de um grupo étnico”.

Fica claro, por essas palavras, que muitos dos que contribuíram para a tragédia dos Yanomami tornaram o mal apenas uma banalidade. E vejam que bolsonaristas se manifestaram nas redes sociais ridicularizando a FAB por ter enviado alimentos para os indígenas ou afirmando que são venezuelanos fugindo da ditadura de maduro.

“o cidadão massificado executa as ordens, não por ódio, por haver um mal em seu coração ou por premeditar atrocidades, mas o mal que faz é fruto da não consciência de seus atos”.

Essa frase remete imediatamente aos atentados terroristas de 8 de janeiro. Observem que logo após serem presos, os terroristas reclamaram da falta de wi-fi, ar-condicionado e comida de qualidade, como que alheios à sua nova condição de criminosos detidos. Executaram ordens subliminares de seu capitão sem a correspondente noção do crime que cometeram. É por isso que muitos não esconderam o rosto e ainda gravaram selfies, como se não esperassem responsabilização.

Para esses indivíduos, o mal foi banalizado a ponto de se confundir com o bem. Eles acreditavam realmente que estavam libertando o Brasil de uma ameaça comunista que não existe.

Será preciso um esforço dos ministérios da comunicação e da educação rumo a uma desbolsonarização do país para que a noção de bem ou mal seja novamente aferida com precisão na balança de nossos atos éticos e morais.

Enquanto isso não acontece, Lula segue apagando os focos de incêndio que Bolsonaro deixou, este sim, o mal sem nenhuma banalidade.


quarta-feira, 25 de janeiro de 2023

Hitler, o Führer e Bolsonaro, o mito. Semelhanças

Por Fernando Castilho




"A cavalaria brasileira foi muito incompetente. Competente, sim, foi a cavalaria norte-americana, que dizimou seus índios no passado e hoje em dia não tem esse problema em seu país"

Deputado Federal Jair Bolsonaro em discurso em 15 de abril de 1998


Nos anos que antecederam o início da Segunda Guerra Mundial, Adolph Hitler se empenhou em “mostrar” ao povo alemão sua superioridade em relação aos demais povos não arianos.

Mesmo sem redes sociais, o Führer instigou na população o ódio, não só aos judeus, mas também aos ciganos, comunistas, pessoas com deficiência física ou mental, pessoas de pele mais escura e todos aqueles que não reuniam fisicamente as características, na visão dele, de um povo superior.

No Brasil, muito antes das eleições de 2018, Jair Bolsonaro já demonstrava em discursos como deputado e, mesmo durante a campanha, seu enorme desprezo pelas minorias, que, conforme pregava, deveriam se curvar à maioria ou serem extintas.

Embora a população negra não seja exatamente minoria no país, esta também entrou na alça de mira do capitão quando ele, num discurso, disse que os quilombolas não serviam para nada, nem para procriar. Mesmo assim, não faltam bolsonaristas negros.

A população LGBT também sempre foi duramente atacada pelo ex-presidente, mas isso também não impediu que haja bolsonaristas gays.

Bolsonaro nunca se furtou a atacar a esquerda ao dizer numa entrevista que a ditadura deveria ter matado 50 mil pessoas, claro, de esquerda. Quanto ao PT, em comício no Acre, convocou seus apoiadores a metralhar os petralhas.

Mas agora, com a tragédia revelada do morticínio pela fome e por doenças do povo Yanomami, lembramos do que o capitão dizia também em comício: “NO MEU GOVERNO, NEM UM CENTÍMETRO DE TERRA SERÁ DEMARCADA PARA OS ÍNDIOS!”

Em 15 de abril de 1998, o então deputado Jair Bolsonaro, em discurso na Câmara Federal, disparou: ""A CAVALARIA BRASILEIRA FOI MUITO INCOMPETENTE. COMPETENTE, SIM, FOI A CAVALARIA NORTE-AMERICANA, QUE DIZIMOU SEUS ÍNDIOS NO PASSADO E HOJE EM DIA NÃO TEM ESSE PROBLEMA EM SEU PAÍS!"

Os primeiros contatos com os Yanomamis se deu entre 1910 e 1940, de forma ainda bastante rarefeita. Foi só a partir da década de 1970 que os contatos se tornaram mais intensos, o que contribuiu significativamente para que adquirissem as doenças que os homens brancos lhes levaram.

Nossa grande imprensa demorou dois dias para escrever sobre a tragédia dessa etnia indígena, após a corajosa visita do presidente Lula à principal aldeia ameaçada constantemente por ferozes garimpeiros instigados por Jair Bolsonaro a explorar aquela área.

A política do capitão com relação aos povos originários é a de genocídio por asfixia. Os garimpeiros vão aos poucos ampliando sua área de atuação, destruindo terras agricultáveis e impossibilitando as atividades de caça, pesca (devido ao mercúrio descartado principalmente no Rio Parima) e de coleta. As doenças, como pneumonia, Covid-19 e SRAG (Síndrome Respiratória Aguda Grave) são agravadas com a extrema desnutrição, causando enormes morticínios, principalmente de crianças e de idosos.

Não há como não fazer um paralelo com a política de extermínio de pessoas não arianas implementada por Hitler. A diferença é que os Yanomamis estão presos em um campo de concentração a céu aberto e dele não podem fugir.

Assim como grande parte do povo alemão acreditou em Hitler e suas mentiras, bolsonaristas-raiz divulgam em suas redes sociais que são contrários ao envio de alimentos e rempedios para os indígenas. As semelhanças são muitas.

Enquanto Hitler se acercou de asseclas que rapidamente encamparam seu discurso de ódio colocando em prática sua necropolítica, por aqui não é muito diferente, já que tivemos uma Damares Alves que brada contra o aborto de uma única criança, vítima de estupro, mas não se importa com a morte de centenas por doenças e desnutrição pelo simples fato de serem indígenas. Outro assecla do nosso Hitler tupiniquim é Ricardo Sales que incentivou o garimpo ilegal em áreas de reserva indígena e o desmatamento na Amazônia.

Esses dois foram eleitos parlamentares e, por isso, a justiça terá dificuldades em atingi-los, mas seu chefe, o “Fuhrer” brasileiro, chamado por aqui de mito, pagará por seus crimes.

O difícil será encontrar uma pena que possa fazer justiça a todo mal que ele cometeu.

 

 


sexta-feira, 20 de janeiro de 2023

Uma imagem vale por mil palavras

Por Fernando Castilho


Foto: Gabriela Biló


A fotógrafa, Gabriela Biló pode estar sugestionando subliminarmente para que um ato criminoso possa ser cometido, afinal, não faltam lobos solitários soltos por aí.


Do G1:

“Uma imagem em que a presidente Dilma Rousseff parece ser transpassada por uma espada de um militar em uma cerimônia oficial foi anunciada esta semana como a vencedora do Prêmio Internacional de Jornalismo Rei da Espanha na categoria Fotografia.

Feita pelo fotógrafo Wilton de Sousa Júnior, da Agência Estado, a foto foi publicada no jornal "O Estado de S.Paulo" em 21 de agosto de 2011 e no dia 31 do mesmo mês na revista "Veja", que a escolheu como "imagem da semana".”

Da Folha:

”Como a autora da foto [Gabriela Biló], aceito as críticas. Ninguém é obrigado a ver o mundo da mesma forma que eu. Respeito as diversas leituras e dores [que] causou. O debate sobre a dupla exposição no fotojornalismo é válido e rico. Não precisa ser fechado. E por hoje chega."

No primeiro caso, Dilma Rousseff ainda estava no início de seu primeiro mandato, quando ostentava altos índices de aprovação. A única justificativa para a publicação da foto seria uma certa animosidade das Forças Armadas para com a presidenta. Mas o fotógrafo, afoito em fazer uma foto muito criativa, uniu a oportunidade com a técnica e, de maneira, a meu ver, irresponsável, produziu uma ficção alimentada pelos demais órgãos de imprensa que muitas vezes procuram alimentar bactérias potencialmente perigosas que podem contaminar as relações institucionais, mas também, como vimos, lhe garantir prêmios e notoriedade.

No segundo caso, talvez não sejam necessárias grandes explicações, já que a fotógrafa parece que também não as tem. Ela jogou para a plateia. Interpretem como quiserem, diz ela. Mas não é tão simples assim.

A foto, ou a manipulação da foto, induz à maioria dos eleitores ou não de Lula, a sensação de que o presidente está frágil e que, a qualquer momento, poderá ser atingido por uma bala e encerrar sua carreira. Foi assim que também vi. Outros podem enxergar uma sugestão subliminar para que um ato criminoso possa ser cometido, afinal, não faltam lobos solitários soltos por aí. Nesse aspecto, a fotógrafa pode estar, sem querer, se confundindo com Jair.

Ela, simplesmente não enxergou nada disso e parece não ter enxergado nada. Mas também não está nem aí.

Jornalistas têm a função de informar e a informação não é ficcional. Fotojornalistas devem ilustrar matérias ou captar momentos das notícias, com toda liberdade criativa, mas não devem eles serem a notícia, como no caso de Gabriela.

A Folha, mesmo com seu manual de reportagem que parece não admitir esse tipo de liberdade, parece que não percebeu o mal gosto da foto. Se percebeu, significa que a trégua dada a Lula acabou e daqui pra frente ele voltará a ser seu alvo preferido, afinal, contrariamente a Bolsonaro, o presidente é um democrata e jamais se oporá a que a imprensa emita opiniões a seu governo.

É da democracia de Lula que a Folha se aproveita.

 

 


Até quando teremos medo de Bolsonaro?

Por Fernando Castilho





Seria preciso que, caso fosse decretada prisão preventiva do capitão, houvesse uma ação conjunta dos governos brasileiro e americano para que sua condução ao Brasil fosse feita totalmente em sigilo.


A Folha publicou por esses dias que os ministros do STF estão divididos sobre a prisão de Jair Bolsonaro assim que desembarcar no país.

O ex-presidente já insinuou que pode permanecer por mais tempo nos Estados Unidos, mas sabemos que a pressão para que Biden não renove o visto que deve expirar nos próximos dias é muito grande.

O medo, não só de ministros, mas também de parte da imprensa, inclusive de blogues e sites progressistas é que a prisão do capitão faça com que novos atos terroristas pipoquem pelo país, não se descartando a possibilidade de um resgate cinematográfico.

Então, como ficamos? Bolsonaro vai ditar a pauta da Justiça? O medo impedirá que ele pague por seus crimes? É tão simples assim, ou a velha impunidade e o deixa disso continuam a existir no país? Será tão trabalhoso prender um bandido a ponto de ser melhor que lhe tirem os direitos políticos e o deixem solto? Ficaremos reféns desse crápula?

Se de fato a Justiça quer alcançar Bolsonaro, há meios para que isso seja feito sem cause atentados por todo o país. Afinal, temos ou não forças de segurança capazes de, com inteligência, se antecipar aos fatos? Será que não temos condições de posicionar efetivos em locais estratégicos, frustrando os terroristas?

Em primeiro lugar, seria preciso que, caso fosse decretada prisão preventiva do capitão, houvesse uma ação conjunta dos governos brasileiro e americano para que sua condução ao Brasil fosse feita totalmente em sigilo. É difícil, porém, não impossível.

Ao mesmo tempo, a inteligência da Polícia Federal deveria trabalhar fortemente para detectar possíveis focos de atentados. É preciso lembrar que a tarefa poderá ser facilitada, uma vez que uma parte dos empresários que financiaram a tentativa de golpe de 8 de janeiro já se encontra presa e o restante responderá por seus crimes nas próximas semanas.

Grande parte dos terroristas que ousaram depredar os prédios da Praça dos Três Poderes já está presa e os demais já se encontram amedrontados pela pronta ação da polícia.

Vale lembrar que, segundo o Datafolha, 93% da população condenou os atos terroristas. Além disso, não se vê mais quase ninguém vestindo camisa da seleção. O momento é propício à prisão. Se deixarmos o tempo passar, as coisas podem acabar se complicando devido à reaglutinação das forças golpistas que se esfacelaram.

De qualquer forma, o que não podemos admitir é que, por medo, Bolsonaro fique impune.

Somente com a responsabilização do capitão por seus crimes, é que o bolsonarismo refluirá.


quinta-feira, 19 de janeiro de 2023

FRAUDE!

Por Jarbas Capusso Filho




Vocês estão ouvindo? Não? Estranho. Eu também não.

Mas, vamos tentar de novo. Desliguem todos os aparelhos sonoros e os pensamentos (há pensamentos muito ruidosos).

Desligaram? Eu também. Agora conseguem ouvir? Não? Putz, nem eu.

Será que desta vez é aquele ruído, aquela frequência que só os animais ouvem? Gatos? Cães? Pode ser.

Por que não estamos ouvindo a grita do mercado, depois da quebradeira fraudulenta das Lojas Americanas? Poxa, afinal de contas, teve um errinho na planilha, um detalhe de 20 de bilhões. (Já falam em 40 bilhões), vejam bem.

As Americanas não faliu. Ela fraudou documentos e maquiou números. E cadê a indignação do nosso cândido mercado? Não teve, não tem e nem vai ter.

Sabem por que? Dissolução de grandes empresas, por essas bandas, sempre beneficia seus donos. Mappin? G Aronso? Brasilinvest? Vasp? Varig? Transbrasil? E nomes como Daniel Dantas? Ricardo Mansur? Mário Garnero? São prova viva (ainda atuam no mercado) de que a fraude compensa e o mercado aceita.

Quem adivinhar quem se dana todo com isso, de verdade, ao cabo e ao fundo, ganha um chicabon.

Os pequenos credores, funcionários e, no caso das Lojas Americanas, um milhão e trezentos mil correntistas do Nubank. Este banco investia dinheiro dos seus correntistas nas Americanas. São milhões de pequenos investidores que mantinham, no banco, suas pequenas economias e, agora, perderam tudo!

Quem vai pagar quem? Nin-guém! O mercado se autorregula, se blinda. Os proprietários já enviaram enormes remessas de dinheiro para fora e, talvez, o Banco Central dê até uma forcinha, em nome da estabilização do mercado.

Esse é o mesmo mercado que fica agitado toda vez que o presidente Lula fala em furar o teto de gastos para incluir os mais pobres no orçamento.

Milhões de famélicos e famílias em situação de rua. É o mesmo mercado que lucra horrores com o teto de gastos. O mesmo mercado que investe no sucateamento de serviços públicos para, depois, privatizá-los.

Agora está em silêncio. Diria, até, em sono profundo, sobre seus macios colchões forrados de dólares.

O pior cego é aquele que não quer ouvir.

 


Uma palavrinha sobre Greenwald, Moraes e esses tempos tão brutos

Por Milly Lacombe




A Lava Jato da qual Moro tanto se orgulha foi uma espécie de berçário do tsunami nazi-fascista que despontou no horizonte e que ainda faz tremer nossas estruturas.


Glenn Greenwald já tem seu nome marcado na luta democrática brasileira. Não apenas pelo trabalho feito na Vaza Jato - a série de reportagens que trouxe à luz muitas das ilegalidades e imoralidades cometidas por Sergio Moro, Deltan Dallagnol e um tanto de outras autoridades durante a Lava Jato -, mas também por ter se mantido atuante nos quase sete anos desde o golpe em Dilma Rousseff mostrando verdades através de entrevistas importantes e históricas.

Em escala mundial, Greenwald - vencedor de um Oscar em 2015 pelo documentário "Citizenfour" - também já tem seu nome devidamente catalogado ao lado dos maiores pelo trabalho desenvolvido com Edward Snowden e com a cineasta Laura Poitras.

Acompanho com muito interesse Glenn Greenwald em suas colaborações para a imprensa estadunidense e, também, para a nossa.

Tenho profundo respeito pelo que ele fez até aqui e sempre me coloquei como admiradora de sua coragem e coerência.

É complexo o momento em que discordamos de alguém por quem nutrimos imenso afeto, mas é também necessário que sejamos honestos e honestas com um certo pensamento independente e por isso escrevo esse texto.

Greenwald tem se colocado abertamente contra o que considera um perigoso super-poder exercido pelo ministro Alexandre de Moraes, do STF e atualmente presidente do Tribunal Superior Eleitoral.

Para ele, Moraes está agindo com mãos fortes demais, movido por poderes excessivos, e em democracias modernas Greenwald não se lembra de outro juiz agindo assim.

Alvo de muitas críticas por parte da esquerda por sua posição sobre a atuação de Moraes, Greenwald escreveu no Twitter nesse 14 de Janeiro:

"Moro aqui há 17 anos, então sabia que minhas reportagens e críticas ao de Moraes enfureceria grande parte da esquerda. Como disse o NYT, a esquerda e a mídia corporativa se uniram para fazer dele seu novo Moro: o juiz-herói que salva a nação e, portanto, não pode ser criticado".

De relance, a declaração de Greenwald tem lógica.

Não é aceitável e nem desejável que um juiz esteja nutrido de supra-poderes para agir.

Todo regime autoritário e ditatorial teve os seus juízes, advogados e juristas amigos que legitimaram horrores, extermínios e genocídios com base em leis.

Mas é nesse ponto que precisamos parar e refletir.

Sergio Moro, como mostrou a Vaza Jato, agiu de modo parcial e, portanto, fora da lei.

Foi, por isso, declarado suspeito em mais de uma ocasião.

Não existe nada mais perverso do que um juiz suspeito porque ele, que deveria ser justo, atua de saída em benefício de uma das partes e, portanto, contra a outra.

A Lava Jato da qual Moro tanto se orgulha foi uma espécie de berçário do tsunami nazi-fascista que despontou no horizonte e que ainda faz tremer nossas estruturas. Exatamente como aquela operação que tanto inspirou Moro e sua turma: a Mãos Limpas italiana.

Não haveria Jair Bolsonaro sem o enviesamento de uma operação como a Lava Jato, que colocou na linha de frente dos problemas nacionais a corrupção e nada além dela.

Essa é, aliás, a base conceitual de todo projeto de nazismo e de fascismo bem sucedidos: vamos acabar com a corrupção. É o chão sobre o qual o fascismo se ergue: o da luta contra a corrupção.

Não quer dizer, obviamente, que a corrupção é uma coisa maravilhosa e que deve ser aceita e celebrada.

Quer apenas dizer que lutas higienistas de aspecto moral-religioso que visam destruir qualquer coisa que não seja espelho (racial ou ideológico) nascem com essa bandeira. Não sou eu quem digo; é a história.

Isso entendido, chegamos a Jair Bolsonaro e a esse Brasil dos últimos quatro anos.

Sob muitos aspectos, mergulhamos em um período de trevas que tem bastante paralelo com o nazismo e com o fascismo.

Aqui seria preciso recorrer ao pensamento do professor da UFRJ Michel Gherman, pesquisador do Centro de Estudos do Antissemitismo da Universidade Hebraica de Jerusalém - e lembrar que o Holocausto foi uma fase posterior do regime nazista, que começou anos antes pregando justamente a luta contra a corrupção.

O nazismo não nasce, portanto, com os campos de concentração.

Nasce com a promessa de uma Alemanha livre, centrada na família, baseada no trabalho honesto e sem corrupção.

Esse foi o contrato estabelecido com os apoiadores.

Não houve, de saída, o genocídio como promessa.

E quando as chaminés começaram a queimar já era tarde demais.

Michel Gherman pede que olhemos com essas lentes para Bolsonaro e sua administração.

Gherman tem produzido textos sobre o tema e sugiro que recorram a ele para entender as minúcias do horror nazi-fascista de Bolsonaro e sua turma.

Ele trabalha com evidências, fatos e dados traçando paralelos doloridos mas necessários.

Recentemente, lançou um livro que recomendo muito: "O Não Judeu Judeu".

Gherman diz categoricamente que sim, podemos usar a palavra nazismo para falar dessa fase de nossas vidas.

Isso estabelecido, volto a Greenwald e Alexandre de Moraes.

Muito da base de meu pensamento tem as digitais de Noam Chomsky, o linguista-ativista de 95 anos que é, além do mais importante intelectual vivo, amigo de Greenwald.

Aprendi com Chomsky que qualquer estrutura ou ação de dominação ou de autoridade, para existir, precisa se justificar. Se não for justificável, deve ser eliminada.

Aprendi com Chomsky que lutar pela livre expressão é lutar justamente para que aqueles com os quais não concordamos possam falar porque até Hitler era a favor do livre direito de se expressar daqueles que pensavam como ele.

Chomsky é tão apaixonado por essa ideia que ele advogou em nome de um negacionista do Holocausto - Chomsky é judeu - que usou um de seus textos como prefácio de um livro que relativizada os horrores do Holocausto.

Chomsky foi muito criticado por isso, mas não cedeu mesmo discordando do autor do livro e, mais do que isso, mesmo enojado com suas ideias.

Muito do que os estadunidenses entendem por liberdade de expressão vem desse lugar que, para eles, é constitucional: tudo pode ser dito. A tão evocada primeira emenda de uma carta constitucional escrita há mais de 200 anos garante o direito.

Não é assim na Alemanha nem em outras democracias como a nossa, regida por uma constituição bastante diferente e bem mais atual do que a estadunidense, diga-se. Aqui, como na terra em que Hitler executou seu plano perverso, nem tudo pode ser dito.

Na minha área, por exemplo, defendo fortemente a ideia de que o fascismo não tem "o outro lado", como reza a cartilha jornalística: você não precisaria publicar "o outro lado" quando um dos lados é o fascismo.

Tampouco acho tolerável que se escreva que a escravidão é um elemento do seu tempo, como disse recentemente um badalado intelectual relativizando, portanto, a escravidão.

Há correntes que consideram aceitável que, em nome da liberdade de expressão, esse tipo de horror seja dito, escrito, publicado mesmo concordando que se trata de uma declaração deplorável.

Vale para racismo, machismo e LGBTfobia: não considero aceitáveis declarações desse tipo e acho que deveríamos alargar o debate sobre fakenews para incluir no escopo manifestações que relativizam ou negam alguns horrores históricos.

Entendo, entretanto, que existe aí um debate sobre os limites da liberdade de expressão. Meu argumento é o de que não é hora de chamarmos esse debate para o palco.

E por que não? Explico.

Esse mesmo Chomsky diz que existem épocas em que a perda temporária de liberdades podem se justificar: épocas de guerra, por exemplo; épocas em que uma nação está sendo atacada e se faz necessário protegê-la.

É precisamente o que estamos vivendo.

O que fez Sergio Moro como juiz não era justificável sob nenhum aspecto.

O que faz Alexandre de Moraes, na minha opinião, é.

Vejamos as diferenças.

A primeira é a de que Moraes age dentro da lei.

Ele não atua à revelia de suas capacidades como ministro, não rasga a constituição, não o faz sob críticas de seus pares no STF.

A segunda é a de que Moraes age na luta contra uma insurreição de inspirações nazi-fascitas - como já estabelecemos.

Que tipo de ações podem ser tomadas na luta contra o nazismo? Até onde podemos ir?

Vale silenciar aqueles que relativizam a insurreição de caráter nazista?

Eu diria que sim.

Vale mandar prender aqueles que apoiam abertamente a insurreição?

Eu diria que sim.

Somos uma nação que está sendo atacada por dentro. Por homens de farda. Por empresários. Por juristas. Por juízes.

É preciso que lutemos com as armas que temos - e as de Alexandre de Moraes são constitucionais ainda que bastante fortes.

Sob ameaça de uma insurreição de inspiração nazi-fascista vale suprimir temporariamente liberdades individuais em nome da liberdade coletiva?

Eu diria que sim.

Diante da tentativa de execução de um golpe de estado através do uso de atos terroristas podemos apoiar o juiz que, usando a lei, pune os envolvidos - intelectual ou fisicamente envolvidos - de forma dura, rápida e direta?

Eu diria que sim.

Por isso, a comparação entre Moraes e Moro me parece injusta.

Compactuo com o que diz Greenwald se estivermos em tempos de paz.

Mas não estamos; estamos em guerra.

E quanto antes entendermos isso mais rápido venceremos e mais prontamente poderemos voltar a deixar falar livremente os imbecis porque, nesse caso, já teremos nos livrado da ameaça nazi-fascista.


domingo, 15 de janeiro de 2023

O golpe deu chabu

Por Fernando Castilho




A manada, sem um bom cão pastor, se descontrolou e saiu em estouro, quebrando e depredando tudo, o que colocou a opinião pública, a imprensa nacional e internacional, além de chefes de estado de países importantes contra os terroristas.


Passados alguns dias da estupefação pela ousadia dos que queriam dar um golpe e implantar uma ditadura no país, podemos tirar algumas possíveis conclusões.

O plano era implementar uma ação a nível nacional após a tomada dos edifícios dos 3 poderes que sensibilizaria as Forças Armadas a se engajarem e darem o xeque-mate em nossa democracia.

O documento para tentar institucionalizar, isto é, dar uma aparência de legalidade – já que citava alguns artigos da Constituição e invocava o estado de defesa - estava pronto para consolidar a ruptura.

Imaginavam que o gado, a massa de manobra-bucha-de-canhão de Bolsonaro, fosse tomar na boa os edifícios dos 3 poderes instigando as Forças Armadas a decretarem a Garantia da Lei e da Ordem (GLO).

Porém, a manada, sem um bom cão pastor, se descontrolou e saiu em estouro, quebrando e depredando tudo, o que colocou a opinião pública, a imprensa nacional e internacional, além de chefes de estado de países importantes contra os terroristas. O Datafolha apurou que 93% da população brasileira condenou os atentados terroristas.

Se uma parte significativa dos militares estava envolvida na intentona, outra parte preferiu se incluir fora disso, pois daria muito trabalho consolidar o golpe, ter que lidar com os opositores que seriam a maioria, ter que voltar a prender, torturar, matar, etc.

O ministro da Justiça, Flávio Dino e o presidente Lula agiram muito rapidamente nomeando um interventor no DF, enquanto o ministro do STF, Alexandre de Moraes, afastava o governador Ibaneis Rocha por 90 dias.

O ex-ministro da segurança de Bolsonaro e então secretário de segurança de Ibaneis, Anderson Torres, havia demitido boa parte do pessoal incumbido de proteger a Praça dos Três Poderes de invasão e, numa atitude de moleque, se mandou para Orlando para acompanhar os desdobramentos junto ao seu capitão. Teve sua prisão decretada por Moraes com direito à busca e apreensão em sua casa. Voltou e já se encontra preso no Brasil.

Um dos resultados da busca foi uma minuta de decreto de estado de defesa, leia-se, golpe, encontrada na casa de Torres que não havia sido destruída porque deveria ser usada no momento oportuno, caso o plano tivesse dado certo. Não deu certo, mas Torres não teve como programar, como nos filmes da franquia Missão Impossível, sua autodestruição. Simplesmente a deixou num armário.

Há uma grande lista de crimes cometidos por Torres e Bolsonaro e, se as instituições não forem complacentes, como parece que alguns ministros do STF desejam, em tempo muito mais curto do que imaginávamos, Bolsonaro será preso.

O plano de golpe deu chabu. Mas foi por pouco.

A situação do capitão se agrava porque chega a hora da quadrilha tentar se livrar de prisões e, provavelmente, não faltarão delações premiadas.

Observem que todos seus asseclas, que vão desde ex-ministros que perderam foro privilegiado, como Fábio Faria, Marcelo Queiroga, Paulo Guedes e Oniz Lorenzoni, até outros que se elegeram a algum cargo político, como o astronauta Marcos Pontes e Damares Alves, estão se fingindo de mortos. A exceção é o general Mourão. Braga Netto e Augusto Heleno, artífices do golpe, antes eloquentes ao pedir a apoiadores que aguentassem mais um pouco porque algo estaria por acontecer, agora, apavorados, silenciam.

O fato é que agora Bolsonaro não é mais nada e está isolado. Até o PGR, Augusto Aras, começa a se colocar como independente ao pedir ao STF a inclusão de seu antigo chefe nas investigações sobre os atos terroristas.

Se esperávamos que o capitão começasse a sofrer os rigores da lei em médio prazo, começamos a nos surpreender com a agilidade das instituições.

Os ministros do STF, TSE e TCU, após quatro anos sofrendo todo tipo de ameaças e ofensas, estão com a faca nos dentes e devem pra cima do capitão.

Esperamos que seja pra valer.