segunda-feira, 10 de novembro de 2025

O intruso interestelar e a fragilidade das certezas

Por Fernando Castilho



Tenho uma convicção racionalista e cética sobre quase tudo, e, ao longo dos anos, venho comprovando o acerto nessa postura.

Porém, artigos como os do amigo Walter Falceta (A SOPA DO MISTÉRIO: A GENTE AINDA NÃO SABE NADA SOBRE TUDO, https://www.facebook.com/profile.php?id=1598311744) às vezes têm o poder de me “corromper”, fazendo-me sentir tentado a trair minhas convicções, tamanha a força de seus argumentos.

Um dos assuntos do momento é o aparecimento do cometa 3I/ATLAS em nosso sistema solar, vindo de uma região distante da galáxia.

Nosso planeta tem cerca de 4,5 bilhões de anos, mas cientistas, por meio de métodos rigorosamente científicos, estimam que esse intruso interestelar esteja viajando há inacreditáveis 7 bilhões de anos. Ou seja, quando a nuvem de poeira e gás que daria origem ao nosso Sol ainda estava em formação, ele já vagava pelo Universo, talvez expelido por uma estrela muito mais antiga.

O 3I/ATLAS é o terceiro objeto identificado como vindo de fora do sistema solar. Antes dele, tivemos o 1I/Oumuamua, em 2017, detectado tardiamente, e o 2I/Borisov, em 2019.

Esses, no entanto, não foram os únicos “invasores”. Foram apenas os primeiros que conseguimos identificar, graças ao avanço recente da nossa tecnologia.

Assim como no caso do Oumuamua, o renomado cientista e professor de Harvard, Avi Loeb, sugeriu que o 3I/ATLAS poderia ser um objeto artificial, talvez uma sonda enviada por uma civilização extraterrestre para explorar mundos com potencial para abrigar vida.

O comportamento anômalo do cometa alimentou essa especulação. Ele acelerou, desacelerou e até mudou de trajetória ao longo dos meses em que cruzou nosso quintal cósmico, contrariando a Primeira Lei de Newton, que afirma que todo corpo tende a permanecer em repouso ou em movimento retilíneo uniforme, a menos que uma força externa atue sobre ele.

Como, então, poderia apresentar tais variações sem uma força atuante?

Já escrevi, mais de uma vez, que, com base nas gigantescas distâncias entre os planetas fora do sistema solar e na Teoria da Relatividade Geral de Einstein, seria impossível que civilizações extraterrestres viajassem até aqui em curto espaço de tempo.

Para se ter uma ideia, os planetas mais próximos da Terra, localizados em Alpha Centauri, estão a cerca de 4 anos-luz de distância. Isso significa que a luz leva 4 anos para chegar até nós.

Nossas naves mais modernas levariam cerca de 17 mil anos para alcançar esse destino. Imagine, então, distâncias ainda maiores.

Se o 3I/ATLAS seja mesmo uma sonda alienígena, a civilização que o construiu teria realizado uma obra sem sentido prático, pois não viveria para acompanhar os resultados. Provavelmente, já estaria extinta.

Felizmente, as observações começaram a trazer respostas.

A explicação para sua aceleração, desaceleração e mudança de direção é simples: física pura.

À medida que o cometa se aproximava do Sol, a enorme atração gravitacional o acelerou. Após o periélio, o Sol continuou a puxá-lo, mas agora em sentido contrário, desacelerando-o e alterando sua trajetória.

Além disso, os gases aprisionados em seu interior, ao serem aquecidos pela proximidade solar, foram liberados em forma de jatos, contribuindo para mudanças de direção.

Temos a tendência de interpretar o desconhecido com base no que conhecemos.
Estamos acostumados ao comportamento dos cometas oriundos da Nuvem de Oort, resquícios da formação do sistema solar, compostos pelos mesmos elementos que formaram o Sol.

Mas um cometa vindo de fora pode ter se formado a partir de gases e poeira de outra estrela, com composição distinta.

Essas distinções fazem toda a diferença em relação ao comportamento dos nossos cometas.

Contudo, talvez seja a hora de procurar uma atitude mais humilde e dar uma pausa na rigidez do conhecimento científico cristalizado, pois, o telescópio espacial James Webb tem revelado inconsistências nas teorias consolidadas sobre a origem do Universo, enxergando muito além do que julgávamos possível.

À luz do artigo de Walter Falceta, precisamos voltar a fazer o que sempre fizemos: sermos curiosos e dar asas à imaginação. Ou, como queiram, baixar um pouco a bola.

Foi isso que permitiu o avanço da ciência ao longo dos últimos quatro séculos.

Embora as viagens espaciais a distâncias gigantescas sejam tecnicamente impossíveis hoje, a história humana está repleta de impossibilidades vencidas.
O avião, por exemplo, um objeto mais pesado que o ar, conseguiu alçar voo.

Por isso, não devemos desprezar as hipóteses de Avi Loeb. Ele não é um especulador qualquer.

Sua formação sólida lhe permite desconfiar que o 3I/ATLAS possa ser, sim, uma sonda de outro planeta muito distante, talvez enviada por uma civilização que sonhou como nós, ao lançarmos duas sondas ao espaço em 1977, que hoje estão a mais de 25 bilhões de quilômetros da Terra: as Voyager I e II.

Apesar disso, tudo, ainda creio que o 3I/ATLAS seja mesmo um cometa. Diferente dos nosso, mas, ainda assim, um cometa.

quinta-feira, 6 de novembro de 2025

A última foto

Por Mauro Gouvêa



Luiz era um homem em extinção — ou melhor, exercia uma profissão praticamente extinta. Desde os anos setenta fotografava casamentos; festas; bailes de debutantes; formaturas; qualquer encomenda que aparecesse.
“Seu” Luiz como era conhecido, requisitado, chegava a recusar clientes quando sua agenda transbordava. De Laranjeiras atendia todo Rio de Janeiro e até alguns estados próximos.
O tempo passou. Quase ninguém mais queria as velhas fotos impressas. Luiz se adaptou como pôde: comprou máquinas digitais, uma caríssima Canon 7546, e continuou registrando o instante, fiel ao ofício que lhe dera nome e sentido.
O tempo, ah... o tempo.
Traz o tédio, a vontade de largar tudo, de se aposentar apenas para ver a vida passar.
Mas Luiz era um homem de hábitos. Fotografar, mais que profissão, tornara-se necessidade. O dinheiro já não importava, o hábito, sim.
O que ele não percebia é que esse hábito o consumia devagar. O gesto tornou-se automático, mecânico, sem luz, sem o instante mágico que outrora fazia pulsar sua alma de fotógrafo.
Fotógrafo, era o que o definia, o que o restava ser, mesmo tendo perdido a magia.
Atendia poucos pedidos, cada vez mais raros, até que um dia foi procurado por um casal de meia-idade com um pedido estranho, quase mórbido: queriam que ele fotografasse o pai em seu leito de morte.
Talvez fosse uma última lembrança ou alguma dívida emocional.
A princípio, Luiz pensou em recusar. Depois, refletiu. Por que não?
Ofereciam um valor absurdo e, embora não precisasse, poderia ser o empurrão para sua aposentadoria.
O endereço ficava em Santa Teresa, no Rio de Janeiro.
Antes de tocar a campainha, Luiz observou o bairro, as casas antigas, os bondes subindo lentamente, e pensou: um bom lugar para envelhecer.
Um mordomo o recebeu.
— Um mordomo? — pensou. — Quem tem mordomo em pleno século XXI?
Foi conduzido a uma sala elegante, onde lhe ofereceram chá. Chá! No Rio de Janeiro!
Enquanto esperava, Luiz observava tudo: móveis impecáveis, estantes com livros de capa dura, quadros de viagens antigas.
Uma família inglesa, deduziu. Mordomo e chá — não pode ser diferente. Sorriu de si para si.
Os filhos chegaram, cumprimentos, formalidades, pequenas conversas de ocasião. Confirmaram: o pai era inglês.
Subiram juntos por uma escada antiga e cinematográfica até o quarto onde o idoso o esperava.
Luiz preparou a câmera e pediu licença.
Apontou a lente, quando ouviu a voz firme do homem acamado:
— Não! O senhor não tem uma máquina antiga? Uma máquina de verdade?
Para alguém à beira da morte, o velho parecia bem decidido.
Envergonhado, Luiz explicou que não havia sido avisado e que, sim, tinha belas máquinas analógicas em casa.
— Não temos tempo para isso — interrompeu o homem. — Vai usar a minha. E revelará a foto como se deve. Tenho um quarto escuro, todos os produtos necessários. Aposto que meus filhos estão pagando muito bem, não é?
Luiz assentiu.
Ah, então era isso: queriam uma fotografia “como nos anos cinquenta”.
Tudo explicado pelo valor que ofereceram.
Mesmo assim, sentiu um leve desconforto — uma vergonha que não soube nomear.
O quarto estava quase em penumbra. Uma réstia de luz caía sobre o leito.
Por um instante, Luiz sentiu o mesmo arrepio antigo — o prazer de capturar o momento exato.
Clic. A última foto.
— Vamos ao quarto escuro — disse o velho. — Quero ver a obra.
Luiz o seguiu pelo corredor. O estúdio de revelação parecia novo, intacto.
Mãos à obra.
Despejou os produtos nas bandejas, mergulhou o papel fotográfico, mexeu com cuidado.
A imagem começou a surgir — lentamente demais.
Teria perdido o jeito?
Aos poucos, as sombras ganharam contorno.
O contorno virou rosto.
O homem na foto era ele.
Desgastado, cansado, terrivelmente velho.
Mas era ele.
Um pavor frio subiu-lhe pela espinha.
Correu até a porta para sair, mas ao abri-la encontrou o nada: nenhum corredor, nenhum cômodo, nenhum ruído humano.
Nada.
Luiz, aos 78 anos, foi encontrado morto em seu quarto em Laranjeiras.
No atestado, a causa: ataque cardíaco.
Sobre a mesa, uma fotografia ainda úmida — sem rosto, apenas um clarão.

quarta-feira, 5 de novembro de 2025

Bandido bom é parlamentar eleito?

Por Fernando Castilho



Há décadas, um grupo de políticos se alimenta da velha e falaciosa máxima: “bandido bom é bandido morto”. É a chamada bancada da bala na Câmara dos Deputados, sempre presente, eleição após eleição, vociferando que só a violência resolve o problema da segurança pública.

Nas duas últimas legislaturas, essa bancada ganhou reforço: uma cepa de deputados bolsonaristas como Paulo Bilinsly e o sargento Fahour, que se sentem em casa na Comissão de Segurança Pública. Até poucos meses atrás, suas únicas pautas eram a PEC da Bandidagem, para livrá-los dos próprios crimes, e o PL da Anistia, para salvar o chefe da quadrilha, Jair Bolsonaro, o mesmo que inundou o crime organizado com fuzis e armas de todos os calibres.

Mas o povo foi às ruas e enterrou essas pautas. Sobrou o quê? Apenas o apoio a Eduardo Bolsonaro, autoexilado nos Estados Unidos tentando impor sanções ao Brasil. Com a reunião entre Donald Trump e Lula caminhando bem, ficaram sem discurso. E, para piorar, assistem impotentes à escalada de Lula nas pesquisas para 2026. Estavam à deriva.

Foi então que o governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro, tirou essa turma da letargia. Recorreu à velha fórmula: mais uma chacina. Antes de se eleger em 2022, já havia promovido um massacre em nome da segurança. Agora, quer se tornar senador em 2026 e, quem sabe, intocável diante das acusações de corrupção que o cercam. “Já sei!”, pensou. “Preciso de outra operação sangrenta.”

E ela veio: a Operação Contenção, que deixou ao menos 121 mortos, sendo considerada a mais letal da história do Rio. Uma pesquisa revelou que 63% da população apoiou a ação. Com esse respaldo, a eleição de Castro ao Senado parece garantida, assim como foram as de figuras como Pazuello, que sabotou a vacinação, e Ricardo Salles, que passou a boiada no meio ambiente e tentou vender madeira ilegal para os EUA. Sim, boa parte da população apoia bandidos, desde que bem vestidos e com mandato.

Na esteira de Castro, os bolsonaristas se animaram. Haviam levado um baque com a Operação Carbono Oculto, da Polícia Federal, que desmantelou o tráfico sem disparar um único tiro. A operação mostrou que é mais eficaz cortar as cabeças da hidra do que continuar a matar soldados substituíveis.

Quando a imprensa noticiou o sucesso da operação, os deputados se retraíram. Já estavam incomodados com a PEC da Segurança Pública, que propõe constitucionalizar o SUSP, ampliar o papel da PF e das guardas municipais, e fortalecer a atuação da União. O ministro da Justiça foi à Comissão diversas vezes, mas os deputados preferiram atacar Lula e gravar vídeos para suas redes, saindo do plenário sem ouvir uma palavra.

É claro que projetos como a PEC da Segurança e operações como a Carbono Oculto não interessam a eles. Se o crime organizado for desmantelado, vão viver de quê? Não sejamos ingênuos: boa parte, senão todos, são financiados pelo mesmo crime que dizem combater. Sim, o crime organizado está na Câmara.

Agora, em estado de estase, voltaram a ter uma pauta: acusar o governo federal de “defender bandidos”. E há mais um ponto a considerar. A operação de Castro ocorreu em áreas dominadas pelo Comando Vermelho. Muitos “bagrinhos” foram mortos. Essa desorganização momentânea pode abrir espaço para o PCC avançar e tomar território. É só uma hipótese, sem dados, sem análise. Mas quem sabe?

O governo federal, dentro da política republicana de Lula, se dispõe a ajudar o Rio. Cláudio Castro dará apoio total? Será?

"O Brasil não aguenta mais quatro anos com Lula!"

Por Fernando Castilho



Foi o que bradou o deputado Gustavo Gayer na tribuna da Câmara, ignorando solenemente todos os índices positivos do governo, inclusive o recorde histórico de 150 mil pontos alcançado ontem na Bolsa de Valores. No momento, confesso, fiquei indignado com o tamanho da mentira do deputado bolsonarista. Depois, respirei fundo e pus-me a pensar: qual é o Brasil de Gayer? O do povo, ou das elites?

Ora, Gayer é um dos lacaios que, ao longo da história, sempre estiveram a serviço das oligarquias e da elite que insiste em mandar no país, e que, claro, não admite perder um centímetro de seus privilégios. Foi essa mesma elite que, de mãos dadas com os militares, deu o golpe de 1964 e instaurou uma ditadura que durou 21 anos. Saudade, né?

A frase do deputado, aliás, me remeteu imediatamente ao código usado pelos golpistas de 8 de janeiro de 2023, o famoso “apito de cachorro”, ou, para os íntimos, a “festa da Selma”. Explico.

Depois que o governo Lula desarmou, ao menos em parte, a bomba tarifária deixada pelo terrorista oficial de gravata vermelha, Donald Trump, que impunha tarifas de 50% aos produtos brasileiros, e o Congresso sepultou a PEC da Anistia e o PL da Dosimetria, que pretendiam livrar Jair Bolsonaro da cadeia, a extrema direita viu Lula subir mais uma vez nas pesquisas para 2026. E aí bateu o desespero.

Sem projeto, sem pauta, sem rumo, e ainda sendo fustigada por Flávio Dino, que vem apertando o torniquete para punir quem cometeu fraudes com emendas parlamentares, a extrema direita precisava de uma boia de salvação. E ela veio, pasme, na forma de uma chacina comandada pelo governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro. Contra todas as expectativas do mundo civilizado, sua popularidade aumentou. Sim, matar dá voto. E isso pode garantir a ele uma vaga no Senado.

A direita, ou melhor, o centrão, aquele agrupamento que habita a Câmara apenas para fazer negócios lucrativos, ainda hesita em abandonar o barco bolsonarista e embarcar com Lula. Afinal, quem estiver no palanque ao lado do presidente terá o apoio do povo para se reeleger. Mas se ainda não mudaram totalmente de lado, é porque têm dúvidas quanto à manutenção do recebimento de emendas. Pragmáticos, sempre.

Já a extrema direita decidiu: se Lula não for contido, vence no primeiro turno. E o bolsonarismo sabe disso. A pergunta é: como conter?

As pesquisas indicam que a percepção popular do sucesso do governo está superando as avalanches de fake news que tentam pintar o país como um caos. Enquanto bolsonaristas como Gayer fazem vídeos jurando que o arroz está a mais de R$ 40, a realidade insiste em mostrar que o preço não passa de R$ 18. Se a estratégia continuar sendo apenas espalhar mentiras, Lula vence.

Por isso, é preciso criar factoides. Destruir a reputação de Lula e do governo virou prioridade. Um desses factoides foi justamente a chacina no Rio. A acusação é direta e rasteira: “Lula e a esquerda defendem bandido!”, ou seja, o velho calcanhar de Aquiles: segurança pública.

Mas de pouco adianta o governo estar lutando para aprovar a PEC da Segurança Pública, que ataca os líderes do crime organizado, asfixiando suas finanças e os prendendo, se isso não for amplamente divulgado. Afinal, manchete boa é só a que sangra.

A senha foi dada por Cláudio Castro: “Querem se eleger presidente? Façam como eu, matem.

Não me surpreenderia se Caiado, Zema, Ratinho Jr. e, principalmente, Tarcísio (que já tem uma chacina no currículo) começassem a competir em número de mortos em seus estados. Afinal, a extrema direita não vai assistir passivamente Lula vencer no primeiro turno.

E se não for possível subir nas pesquisas, o plano é simples: derrubar Lula. Ou acabar com ele.

Que Lula esteja com sua segurança bem reforçada.

sábado, 25 de outubro de 2025

O futuro do STF

Por Fernando Castilho



Dizem que Lula embarcou para o Oriente sem decidir se Jorge Messias será o novo iluminado do STF. Dizem também que o impasse tem nome e sobrenome: Davi Alcolumbre, o presidente do Congresso que, aparentemente, sonha acordado com Rodrigo Pacheco de toga. Será verdade? Vai saber. Brasília é o único lugar onde boatos têm mais credibilidade que comunicados oficiais.

Jorge Messias, é aquele tipo raro: técnico, discreto, sem ambições políticas. Um espécime em extinção. Já Pacheco... ah, Pacheco é político até o último fio de cabelo. E como todo político que se preze, sonha com voos altos. O governo de Minas Gerais, atualmente um cenário pós-apocalíptico graças à gestão Zema, seria o trampolim ideal para Pacheco se lançar à presidência em 2030. Se conseguir consertar o caos mineiro, claro. Mas virar ministro do STF? Isso seria como trancar um pássaro político numa gaiola dourada até os 75 anos. Um pesadelo para quem vive de articulação e holofote. Por isso, talvez Alcolumbre deseje Pacheco no STF mais do que o próprio Pacheco. Vai entender.

Enquanto isso, Luís Fux, lavajatista raiz, migrou para a segunda turma do tribunal. Lá, vai se juntar a Nunes Marques e André Mendonça, formando o que alguns chamariam de “clube do bolsonarismo gourmet”. Mas nem tudo são flores: Fux terá que dividir o cafezinho com Gilmar Mendes, seu desafeto de longa data. E como bônus, ainda tem Dias Toffoli, o ministro que parece sempre estar procurando a saída de emergência da Corte.

Toffoli, no entanto, tem se reinventado como o “consertador de estragos da Lava Jato”, uma espécie de zelador jurídico. E pode acabar levando Sérgio Moro ao tribunal para responder por crimes que, segundo dizem, começaram antes mesmo da operação. Ironia das ironias: o herói da Lava Jato sendo julgado. E não é certo que Nunes Marques e Mendonça vão sair em defesa de Moro. Afinal, o bolsonarismo o trata com o mesmo carinho que se dá a um ex-amigo que virou delator. E ainda tem o detalhe de que Moro saiu do governo acusando Bolsonaro de manipular a Polícia Federal para blindar os filhos. Um gesto que os filhos do capitão e gente como Malafaia não perdoam.

Fux, por sua vez, talvez não consiga nem defender Bolsonaro. A maioria dos processos do capitão está na primeira turma, sob a batuta de Alexandre de Moraes, que, digamos, não é exatamente fã do ex-presidente. Há quem diga que a segunda turma pode reverter a inelegibilidade de Bolsonaro. Eu, sinceramente, não apostaria nem um centavo. O capitão foi condenado e pode acabar atrás das grades ainda este ano. Depois disso, entra na Lei da Ficha Limpa e só volta a sonhar com eleições após cumprir seus 27 anos e 3 meses de pena. Com bom comportamento, pode até ir para o semiaberto em quatro anos e meio. Mas, mesmo assim, inelegível. A menos que mudem a Lei da Ficha Limpa para beneficiá-lo.

Fux não escapará dos encontros com seus desafetos da primeira turma. O plenário será seu purgatório. Lá, será lembrado, com toda pompa e circunstância, de como jogou sua carreira no lixo após seu voto talhado para defender Bolsonaro. Aos 71 anos, talvez decida mandar tudo às favas e se aposentar antes dos 75. Com muita grana no bolso, quem não faria isso?

A ver. Ou melhor: a assistir, porque esse roteiro está digno de série.

terça-feira, 21 de outubro de 2025

Estarei desenvolvendo o dom da invisibilidade?

Por Fernando Castilho



Platão, em A República, nos apresenta o famoso Anel de Giges, uma espécie de "modo stealth" da Antiguidade. Giges, um pastor da Lídia, encontra um cadáver dentro de um cavalo de bronze depois que um terremoto abre uma fenda na terra. Sim, parece roteiro de série épica, mas é filosofia mesmo.

O defunto usava um anel de ouro que, ao ser girado para a palma da mão, concedia o poder da invisibilidade. Giges, então, faz o que qualquer personagem de tragédia grega faria com esse poder: seduz a rainha, assassina o rei e vira o novo monarca da Lídia. Tudo isso sem levar uma multa sequer.

Platão, por meio de Sócrates, lança a pergunta que vale mais que o trono: se alguém pudesse agir injustamente sem ser punido, ainda escolheria ser justo? Glauco, o irmão cético, responde que a maioria só é justa por medo das consequências, e que, se pudesse agir impunemente, escolheria a injustiça. Basicamente, ele diz que a ética é uma questão de vigilância. Ou seja, sem câmeras, sem caráter.

E aí vem a pergunta que nos cutuca até hoje: quando ninguém está olhando, ainda assim agimos corretamente?

Às vezes, confesso, me sinto como se estivesse usando o Anel de Giges. Caminho pelas calçadas e as pessoas que vêm no sentido contrário simplesmente não desviam. Se eu não sair do caminho é trombada na certa. E sou sempre eu quem desvia. É como se eu fosse invisível. E não é raro.

Semana passada, por exemplo, sentei num banco de ônibus praticamente vazio. Uma senhora entrou, olhou ao redor, e, ignorando todos os assentos livres, sentou-se ao meu lado. Com meus 1,80 m, achei que era impossível não me notar. Mas, ao sentar, ela fez uma expressão de surpresa, como quem percebeu que havia se sentado num banco já ocupado por um... fantasma? Em seguida, levantou-se e foi se sentar em outro lugar. Fiquei ali, me perguntando se deveria começar a atravessar paredes.

Outro dia, numa fila, já estava sendo atendido quando uma mulher passou direto por mim. Fiquei tão surpreso que quase pedi replay. A atendente, gentil, disse que eu era o próximo. A mulher, constrangida, respondeu: “Desculpe, não tinha visto o senhor.” Olhei para meus braços, pernas, conferi o reflexo no vidro. Estava visível, sim. Ufa. Procurei o anel nos dedos.  Nada. Ainda bem. Um poder desses nas mãos erradas (ou nas minhas, num dia ruim) é um perigo.

Portanto, sempre sigo atento. Se alguém me atravessa na calçada, ignora minha presença no ônibus ou me ultrapassa na fila, já sei: ou estou invisível... ou sou só mais um cidadão comum em modo “transparente social”. Mas sigo firme. Afinal, enquanto não encontrar um cavalo de bronze com um cadáver dentro, acho que estou seguro. E se um dia eu achar o tal anel, prometo usar com moderação: no máximo para escapar de conversas chatas de gente reacionária.

No Kings

Por Fernando Castilho



No sábado, 18 de outubro, cerca de sete milhões de pessoas tomaram as ruas dos Estados Unidos em protesto contra o presidente Donald Trump. Sob o slogan “No Kings” (“Sem Reis”), mais de 2.600 atos se espalharam pelos 50 estados, em uma explosão de criatividade: fantasias, bandas marciais e um clima de festa, mas com um recado direto e contundente contra o autoritarismo.
A resposta de Trump veio no mesmo tom que o consagrou: infantil. Um vídeo gerado por inteligência artificial o mostrava fantasiado de rei, pilotando um avião e despejando fezes sobre os manifestantes. A escatologia e o humor de quinta série evocam o bolsonarismo, uma política performática, provocadora e avessa ao debate racional.
Mas enquanto o presidente brinca com IA, o país arde em questões reais.
Inflação em alta, escassez de mão de obra, dependência de produtos importados e, sobretudo, o avanço do autoritarismo têm levado até os mais apáticos às ruas. E não são só os cidadãos que se inquietam: os grandes conglomerados econômicos, que não toleram prejuízos, já demonstram impaciência com Trump. Seus lobbies começam a se mover, discretamente, mas com força.
Quem surfa essa onda é o Partido Democrata, que deve intensificar sua campanha contra o presidente, aproveitando o desgaste. Até mesmo alguns congressistas republicanos já sinalizam desconforto, percebendo o crescimento da oposição.
Por ora, Trump se limita a vídeos gerados por IA. Mas seu histórico é imprevisível. Se decidir dobrar a aposta, o país pode testemunhar repressão violenta, perseguições e prisões. E num país que já enfrentou uma guerra civil, não é impossível imaginar outra. Basta um estopim para o fogo se alastrar.
O fiel da balança pode ser o Congresso, hoje de maioria republicana. A depender da nova composição parlamentar nas eleições de novembro de 2026, um processo de impeachment pode deixar de ser apenas uma hipótese.
O que está em jogo não é apenas um mandato, é o modelo de democracia que os Estados Unidos pretendem sustentar sua significativa influência no mundo ocidental. E, como sempre, o tempo corre contra os que esperam demais.

segunda-feira, 20 de outubro de 2025

Centrão: o grande camaleão da politica brasileira

Por Fernando Castilho



Nos últimos tempos, o Centrão, essa entidade política que sempre sabe onde fica a cozinha, esteve confortavelmente abraçado à extrema direita bolsonarista. A parceria, claro, não foi por afinidade ideológica, mas por conveniência. Prova disso foram os mimos trocados, como a PEC da Blindagem, uma tentativa quase poética de escapar das investigações sobre o destino das emendas parlamentares. Afinal, ninguém quer acabar atrás das grades por falta de zelo orçamentário.

Outro ponto de união foi a resistência à taxação dos super-ricos. Nada mais natural: muitos dos parlamentares do Centrão fazem parte desse seleto grupo e, como bons representantes (deles mesmos), defenderam com unhas e dentes seus próprios bolsos.

Mas eis que o roteiro saiu do controle. O povo, elemento imprevisível da democracia, resolveu sair às ruas contra os abusos. A mobilização popular pegou os parlamentares de surpresa. Com as eleições se aproximando, a má fama do Centrão começou a ameaçar a reeleição de seus membros, que até então acreditavam que bastava distribuir emendas e selfies para garantir votos.

A onda de protestos também deu um empurrãozinho nas pesquisas para o presidente. Lula foi beneficiado por episódios dignos de série. Eduardo Bolsonaro, ao agir contra os interesses nacionais, acabou presenteando Lula com o papel de defensor da soberania. É preciso lembrar que, uma vez iniciadas as campanhas eleitorais na TV, os vídeos em que Eduardo pede que os Estados Unidos imponham sanções ao Brasil, joguem uma bomba atômica ou enviem um porta-aviões para cá, serão enormemente explorados. Quem do Centrão, em juízo perfeito, vai querer ter seu nome ligado a alguém tão tóxico ao país?

Além do tiro no pé que Eduardo deu, Donald Trump, num giro inesperado, buscou diálogo com Lula para tentar consertar os estragos do tarifaço. Sim, até Trump percebeu que talvez seja melhor conversar com quem manda de verdade e não com dois patetas.

Outro dado importante é o destino de Jair Bolsonaro. Preso, ele iniciará uma nova trajetória rumo ao... ostracismo. Rei morto, rei posto. Adeus.

Enquanto o cenário se inverte, dois ministros de Lula, mesmo sob ameaças de expulsão partidária, ignoraram os caciques e permaneceram no governo. Um gesto raro de convicção política, ou talvez apenas de cálculo mais refinado.

Diante desse novo cenário, o Centrão, sempre com o dedo no vento, começa a recalibrar sua bússola. Alguns membros já se aproximam do governo, conscientes de que dividir o palanque com Lula, favorito em todos os cenários eleitorais, e não com um possível Tarcísio ou Ratinho Jr., pode render bons frutos. Afinal, quem quer ficar do lado que só oferece desgaste e memes ruins?

A debandada tem uma consequência direta: o isolamento dos bolsonaristas, agora desmascarados por seu apoio explícito aos bilionários, às casas de apostas e aos bancos. Nada como defender esse povo... rico. E há vídeos mais que suficientes de Sóstenes e outros, que serão explorados durante a campanha.

A aproximação do Centrão com Lula pode redesenhar completamente o jogo político. Governadores e prefeitos ligados ao grupo já ensaiam passos rumo ao governo federal, em busca de apoio, recursos e, claro, emendas. A dança das cadeiras começou, e os palanques bolsonaristas em estados-chave correm o risco de ficarem vazios ou, pior, com plateia hostil.

No Nordeste, onde Lula nada de braçada, a migração partidária deve ser ainda mais intensa. Não será surpresa se deputados e senadores trocarem de sigla como quem troca de gravata, buscando abrigo em partidos mais alinhados ao governo, como PSB, MDB ou até o próprio PT. Afinal, a coerência para eles é ditada pelo momento.

Essa disputa por espaço no campo governista pode gerar tensões internas. Partidos que sempre estiveram com Lula vão exigir contrapartidas: mais ministérios, mais apoio, mais tudo. E o bolsonarismo? Deve se restringir aos núcleos ideológicos mais radicais, com menos capilaridade eleitoral e orçamento digno de vaquinha online.

Com o Centrão recalculando sua rota, a dinâmica legislativa também muda. Lula pode conquistar uma base mais ampla e estável, suficiente para aprovar projetos estratégicos, especialmente nas áreas de economia, justiça tributária e reformas sociais e ambientais. O isolamento dos bolsonaristas, por sua vez, tende a reduzir a obstrução nas votações. O plenário, palco de gritaria e memes, pode finalmente virar espaço de debate (ou pelo menos de silêncio constrangedor). A negociação com o Centrão, embora pragmática e baseada em cargos e verbas, pode garantir avanços em pautas populares. Afinal, até o fisiologismo tem seu lado útil.

O Centrão, como sempre, não decepciona. Atento à direção dos ventos, recalculou sua rota com a precisão de um GPS político. A combinação entre pressão popular, desgaste bolsonarista e ascensão de Lula criou um novo campo gravitacional no Congresso. E como bons satélites da sobrevivência eleitoral, os parlamentares estão sendo atraídos para o lado do governo.

Se isso vai redefinir os rumos do país? Provavelmente. Se vai ser por convicção? Pouco provável. Mas no Brasil, até a conveniência pode ser revolucionária, desde que venha com cargo, verba e uma boa foto no palanque.

domingo, 19 de outubro de 2025

3I/ATLAS: Um estranho no sistema solar

Por Fernando Castilho

 


O cometa 3I/ATLAS, terceiro objeto interestelar já registrado em nosso sistema solar, tem despertado grande curiosidade entre os astrônomos. Recentemente, ele passou a cerca de 30 milhões de quilômetros de Marte e foi observado por sondas como a Mars Express, ExoMars TGO e até pelo rover Perseverance. Mas o que mais chama atenção não é sua rota, mas seu comportamento.

 As observações mostraram que o cometa desenvolveu uma cauda anti-solar, ou seja, apontando na direção oposta ao que seria esperado. Isso desafia os modelos tradicionais sobre como cometas interagem com o vento solar e levanta dúvidas sobre sua estrutura interna ou possíveis fenômenos eletromagnéticos ainda desconhecidos.

 Outro ponto intrigante é sua composição química: o 3I/ATLAS é rico em níquel, mas praticamente não tem ferro. Isso sugere que ele pode ter se formado em um ambiente muito diferente do nosso, talvez ao redor de uma estrela exótica ou nas regiões mais distantes de um sistema planetário.

 Para os cientistas, esse cometa não é apenas um corpo errante. Ele pode ser uma janela para outros mundos, uma peça que ajuda a repensar como os sistemas estelares se formam. E como há chance de ele carregar moléculas orgânicas complexas, também reacende discussões sobre a origem da vida.

 Como todo mistério, o 3I/ATLAS também virou alvo de especulações, inclusive de nomes respeitados na astronomia. O professor Avi Loeb, de Harvard, conhecido por suas ideias ousadas, levantou a hipótese de que o cometa poderia ser uma sonda enviada por uma civilização extraterrestre, talvez até com intenções hostis. Ele baseia essa ideia em características incomuns do objeto: sua velocidade altíssima, a composição química fora do padrão e o comportamento estranho da cauda.

 Para Loeb, essas anomalias podem indicar que o 3I/ATLAS não é natural, mas sim um artefato artificial, como ele já sugeriu sobre outro visitante interestelar, o Oumuamua. Segundo ele, a ciência deve estar aberta a hipóteses não convencionais quando os dados desafiam os modelos tradicionais.

 Mas essa teoria enfrenta um grande obstáculo: as imensas distâncias entre as estrelas, como já abordei em outros artigos. Mesmo a 220 mil km/h, velocidade estimada do cometa, uma sonda levaria milhares ou até milhões de anos para chegar até aqui. Para isso, uma civilização teria que ter uma tecnologia extremamente avançada, um motivo muito claro para a missão e uma precisão absurda para acertar um alvo tão pequeno como o nosso sistema solar.

 Além disso, não há sinais de controle, comunicação ou estrutura artificial no objeto. Os dados obtidos por telescópios e sondas indicam que ele tem características físicas compatíveis com cometas naturais, embora incomuns.

 A maioria dos cientistas vê a hipótese de Loeb como uma provocação interessante, mas improvável. O consenso atual é que o 3I/ATLAS seja um fragmento natural de um sistema planetário distante, lançado ao espaço por forças gravitacionais intensas.

 De qualquer forma, em breve o 3I/ATLAS deixará nosso sistema solar. Se for mesmo uma sonda, já terá cumprido sua missão: observar, mapear e talvez identificar a Terra como um dos raros planetas com vida em sua longa jornada pela galáxia.

Procurando o procurador Gonet. Cadê você?

Por Fernando Castilho



O Procurador-Geral da República, Paulo Gonet, foi impecável ao oferecer denúncia contra Jair Bolsonaro no caso da tentativa de golpe de Estado. Palmas. Aplausos. Medalha de mérito jurídico. Mas agora, parece que resolveu dar uma pausa estratégica, e está deixando Alexandre de Moraes com um abacaxi institucional para descascar.

Bolsonaro está em prisão domiciliar desde 18 de julho, no inquérito que investiga seu filho Eduardo e o sempre performático e traidor da pátria Paulo Figueiredo, por obstrução da ação penal relacionada ao golpe. Entre os motivos da prisão preventiva está o risco de fuga e, convenhamos, não seria exatamente surpreendente se o ex-presidente fugisse.

Só que os advogados de Bolsonaro, percebendo que Gonet sumiu da cena, pediram a revogação das medidas cautelares. Moraes, claro, negou. Mas, ironicamente, os advogados têm um ponto: sem denúncia formal, a prisão preventiva começa a parecer uma peça de teatro jurídico sem roteiro. E isso coloca Moraes numa sinuca de bico: se revogar, Bolsonaro pode fugir e o caos estará armado. Se mantiver, será acusado de manter uma prisão ilegal. E lá vem o discurso de perseguição política.

A situação de Bolsonaro hoje é bem diferente daquela de três meses atrás, quando muita gente estourou champanhe acreditando que ele iria direto para a Papuda. Hoje, essa certeza evaporou. Além dos problemas de saúde alegados (com boletins médicos dignos de novela), há uma tendência crescente e preocupante de normalizar a ideia de que ele cumpra pena em prisão domiciliar. Afinal, já está lá.

Essa normalização vem sendo empurrada por setores da grande imprensa e por políticos de vários naipes. É claro que Bolsonaro não vai cumprir pena pelo genocídio durante a pandemia, nem pelo desfile de joias desviadas. Mas, para quem acompanhou a trajetória do traste por quatro longos anos, a condenação de 27 anos soa como uma espécie de acerto simbólico, uma tentativa de justiça acumulada.

Agora, se essa pena virar prisão domiciliar num condomínio de luxo em Brasília, com aluguel bancado pelo Fundo Partidário do PL, ou seja, com o nosso dinheiro, então não é punição, é prêmio. E ainda há o projeto que reduz a dosimetria da pena, podendo colocar Bolsonaro de volta à sociedade em cerca de três anos. Três curtos anos. Depois voltará a sua habitual sandice provocando nossa sanidade mental.

Não. Paulo Gonet precisa oferecer a denúncia ao STF, para que Bolsonaro se torne réu também por obstrução de justiça. Isso aliviaria a pressão que os advogados estão jogando sobre Moraes e, quem sabe, evitaria mais uma reviravolta digna de série política.

Vamos lá, Gonet. É pra ontem. Antes que a Papuda vire só mais uma miragem institucional.

quarta-feira, 15 de outubro de 2025

Apresento o Zé Ninguém para a vaga de Barroso no STF

Por Fernando Castilho




Com a saída de Luís Roberto Barroso do STF, Lula tem agora a chance de corrigir alguns erros do passado.

Comecemos por Barroso. Em 2021, ele declarou à Folha que Dilma Rousseff não caiu por crime de responsabilidade, mas por não saber fazer política. Traduzindo: foi deposta por falta de traquejo parlamentar, não por pedaladas. E Barroso, indicado por ela, diante dessa “injustiça”, fez o quê? Nada. Omitiu-se. Um silêncio que grita. Dilma errou ao escolhê-lo, e Lula, agora, pode consertar isso.

Aliás, Dilma também nos presenteou com Luiz Fux, grande professor e autor de importantes livros sobre direito processual que, vergonhosamente os rasgou para defender um golpista. Mais, sobre ele, prefiro não falar para poupar meus dedos e sua paciência.

Lula, por sua vez, teve seu momento de arrependimento com Dias Toffoli. Quando estava preso, foi impedido por Toffoli de comparecer ao velório do irmão. Só autorizou a ida quando faltavam 20 minutos para o enterro, e ainda sugeriu que o corpo fosse levado a um quartel para um velório improvisado. Lula, com razão, recusou. E essa mágoa, dizem, ainda ecoa no Planalto.

Agora, Lula tem uma nova lista de possíveis indicados: Jorge Messias, Rodrigo Pacheco, Bruno Dantas, Carol Proner... Nomes fortes. Mas vamos aos poréns.

Rodrigo Pacheco? Um político de direita que, de repente, virou um doce de pessoa, justo quando a vaga apareceu. Coincidência, claro. Já Bruno Dantas é cria de Gilmar Mendes. Precisa dizer mais?

— “Ah, Fernando, então você quer um ministro que diga amém a tudo que Lula fizer, como Nunes Marques e André Mendonça fazem com Bolsonaro?”

Não. A questão não é alinhamento cego. A verdadeira polarização não é entre esquerda e direita, mas entre quem defende a democracia e quem flerta com o autoritarismo; entre quem luta pelos vulneráveis e quem serve aos privilegiados; entre quem busca justiça e quem a transforma em privilégio.

Outros nomes correm por fora: Kakay, Lenio Streck, Pedro Serrano... Todos bons. Mas o que define um bom ministro do STF?

Além do tal “notório saber jurídico”, que, convenhamos, virou bordão, é preciso que o ministro saiba para que lado pender a balança: o lado dos que mais precisam de justiça. Hoje, ela pende para os patrões, os latifundiários, o INSS contra os aposentados. Gilmar, Toffoli, Fux, Barroso, Nunes Marques, Mendonça, Cármen Lúcia... todos muito comprometidos com a minoria abastada.

Por isso, minha aposta é Jorge Messias. Tem preparo, tem trajetória, tem compromisso. E Carol Proner, porque o STF precisa de mais mulheres, e porque ela é muito competente.

Mas, correndo totalmente por fora, e com chances rigorosamente nulas, apresento a candidatura do Zé Ninguém.

Sim, ele tem notório saber jurídico. Não no sentido tradicional, claro. Seu saber é notório justamente por ser... escasso. Mas ele conhece bem a lei da vida e da sobrevivência. E tem algo que falta a muitos togados: senso de justiça. Aquele impulso quase infantil de querer proteger os mais vulneráveis e punir quem os explora.

Portanto, se você acha que o mais importante para o STF é alguém que conheça leis, talvez o Zé Ninguém não seja o nome ideal. Mas se acredita que o essencial é ter compromisso com quem realmente precisa de justiça, então, quem sabe, ele mereça ao menos um voto de confiança. Ou um cafezinho no gabinete.

Mas, afinal, quem é o Zé Ninguém?

São milhões espalhados pelo Brasil. Gente que possui muito mais senso de justiça que a maioria dos ministros. Gente que não faz negócios com empresas por meio de escritórios de fachada. Gente que não organiza regabofes em Portugal. Gente que não acha que indígenas e aposentados sejam fardos para o país. Gente, enfim, que carrega nas costas, dia após dia, o peso de uma desigualdade de mais de quinhentos anos.