Por Fernando Castilho
Durante a COP 30, em Belém, o ministro do Turismo, Celso
Sabino, prestes a ser expulso do União Brasil por cometer o grave pecado de
permanecer no governo, declarou, com ar messiânico: “Nenhum partido político,
nenhum cargo ou ambição pessoal vai me afastar desse povo que eu amo.” E, num
gesto digno de novela das seis, olhou nos olhos de Lula e disse: “Conte comigo,
onde quer que eu esteja, para lhe apoiar, para segurar na sua mão.” Faltou só a
trilha sonora e os créditos finais.
Outro que resolveu dar uma guinada retórica foi o deputado
Otoni de Paula. Sim, ele mesmo, um dos mais fervorosos defensores de Jair
Bolsonaro, agora faz críticas públicas a Silas Malafaia e à gestão desastrosa
(eufemismo generoso) de Cláudio Castro no Rio de Janeiro. Aos poucos, o pastor
Otoni vai se aproximando de Lula como quem muda de banco na igreja,
discretamente, mas com fé renovada.
E tem mais: o senador Cleitinho, conhecido por suas falas
inflamadas contra o presidente, declarou recentemente que votará a favor de
todos os projetos do governo que beneficiem o povo, como a isenção do Imposto
de Renda. Um gesto nobre, claro, mas que também soa como quem já está ensaiando
o discurso para o novo palanque.
Já o governador de Mato Grosso, Mauro Mendes (também do
União Brasil), resolveu mirar em Eduardo Bolsonaro. Criticou duramente o
deputado por ter atuado junto a Donald Trump para impor tarifas de 50% ao
Brasil. Aparentemente, o nacionalismo econômico bolsonarista tem seus limites,
especialmente quando ameaça o agronegócio.
Cito esses quatro, todos da ala mais à direita do espectro
político, para ilustrar uma tese simples: se até bolsonaristas já ensaiam
passos de dança em direção a Lula, imagine o que os deputados do centrão não
farão para garantir um espacinho no palanque presidencial em 2026.
É pura lógica de sobrevivência: os indicadores econômicos
vão bem, Lula lidera todas as pesquisas, e, a partir do ano que vem,
trabalhadores que ganham até R$ 5 mil mensais verão sua renda aumentar com o
fim da mordida do Imposto de Renda. Subir no palanque com Caiado, Ratinho Jr.,
Zema ou até mesmo Tarcísio, nesse cenário, seria um ato de suicídio político, e
sem bilhete de despedida.
Outro fator que acelera a debandada é a iminente prisão de
Bolsonaro. Não deve acontecer logo após o julgamento dos embargos de
declaração, pois Alexandre de Moraes — sempre adepto do xadrez em vez do pôquer
— pode conceder mais um prazo. Curto. Mas, se a defesa não trouxer nada de
novo, os embargos nem serão recepcionados, e o ex-presidente, alguns dias
depois, será transferido para a Papuda. Hoje, em prisão domiciliar, Bolsonaro
já caiu no esquecimento e, quando for para o regime fechado na Papuda, poucos
darão falta. Nem os pombos da Praça dos Três Poderes.
Como disse Lula: rei morto, rei posto. E o novo rei, ao que
tudo indica, está com a coroa bem ajustada.
Enquanto isso, a extrema-direita, órfã e desorientada,
começa a disputar as roupas do defunto. Em Santa Catarina, a briga é de foice
no escuro. A deputada Carol de Toni tinha a promessa do governador Jorginho
Melo de que seria candidata ao Senado, ao lado de Espiridião Amin. Mas
Jorginho, num gesto clássico do bolsonarismo raiz, rasgou o acordo para atender
à exigência de Bolsonaro: emplacar Carluxo. Sim, ele mesmo, com seu
inconfundível sotaque carioca, como candidato. Como a decisão não pode ser
salomônica, Carol de Toni ameaça deixar o PL. Afinal, Jorginho jamais ousaria
contrariar o clã.
Com o sucesso da COP 30 ofuscando a narrativa golpista que
tentava colar em Lula o rótulo de “defensor de bandido”, restou à
extrema-direita o desespero. Após o enterro do projeto de anistia, agora tentam
aprovar uma aberração legislativa: obrigar meninas estupradas a levar a
gravidez adiante.
Outro sintoma de desespero foi o relator do PL da Segurança
Pública restringir a atuação da Polícia Federal no combate ao crime organizado,
com o claro intuito de preservar seus líderes. Na cabeça desse pessoal, as
polícias militares dos estados devem continuar a sacrificar rapazes de bermuda
e chinelo, enquanto a diretoria segue intocada em mansões com garagens
abarrotadas de carrões esportivos. Porém, há alguns meses, o povo saiu às ruas
e conseguiu derrubar a PEC da Bandidagem. Talvez agora tenha que fazer o mesmo
contra esse projeto absurdo.
Vencida mais essa tentativa de golpe no governo (e será), a
menos que algo absolutamente imponderável aconteça, Lula seguirá até 2026 em
céu de brigadeiro. E, pelo visto, com cada vez mais gente pedindo carona na
cabine.
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