Mais
um assalto com morte foi cometido na Grande São Paulo. Acontece toda hora. E, é lógico,
como sempre, a família da vítima entrou em estado de choque. Com
razão. E como sempre, xingou o governo Federal pela falta de
segurança. Sem razão.
O
número de mortes em assaltos (latrocínios) cresceu 38,61% na
capital no ano passado –140 casos em 2013 contra 101 em 2012.
Já
no Estado, esse tipo de crime teve o maior número de registros desde
2004.
Em
praticamente todos esses casos, o culpado apontado é um só: o
Governo Federal.
Só
que está errado. A responsabilidade pela Segurança Pública no
Estado é do Governo do Estado.
Mas
qual é a competência do Governo Federal na área da segurança?
Entre
os órgãos com que conta o governo federal nesta área, destaca-se a
Polícia Federal, com competências de vigilância nas fronteiras e
alfândegas e nos crimes federais, entre outras.
Mas
são os estados os atores principais na área de segurança pública.
Cada estado conta com uma Polícia Militar, uma força uniformizada,
cuja tarefa é o patrulhamento ostensivo e a manutenção da ordem, e
com uma Polícia Civil, que tem como missão, investigar os crimes
cometidos. Dessa forma, nenhuma das duas polícias executa o chamado
“ciclo completo” de segurança pública, que vai da prevenção à
repressão, o que suscita problemas de duplicidade e rivalidade entre
ambas.
Em
geral, as políticas estaduais de segurança – se é que podem
receber este nome sem planejamento, objetivos e avaliação – são
basicamente reativas e baseadas na repressão, mais do que na
prevenção. Com freqüência, os governos reagem diante dos casos
com repercussão pública, particularmente os que se destacam na
imprensa, para dar uma resposta de curto prazo. Quando o caso perde
visibilidade, as medidas iniciais se desvanecem. Recomendo o artigo completo
Segundo IGNACIO CANO, formação e Doutorado em Sociologia na Universidad
Complutense de Madri, com a especialidade de Psicologia Social.
Pós-doutorado pelas Universidades de Surrey (Reino Unido), Michigan
e Arizona (EUA) com ênfase em metodologia de pesquisa e avaliação
de programas sociais:
''Entre
as deficiências mais comuns na área de segurança pública, podemos
destacar:
• falta
de investimento suficiente, o que se traduz, entre outras coisas, por
baixos salários para os escalões inferiores das polícias. Esses
salários obrigam os agentes a trabalharem em outros empregos,
geralmente em segurança privada, gerando altos níveis de estresse e
a tendência de privatização da segurança pública;
• formação
deficiente dos agentes policiais, sobretudo nos níveis hierárquicos
inferiores;
• herança
autoritária: a polícia era um órgão de proteção do Estado e das
elites que o dirigiam contra os cidadãos que representavam um perigo
para o status quo, as chamadas “classes perigosas”. A transição
do modelo de uma polícia de controle do cidadão para uma polícia
de proteção das pessoas é gradual e ainda não foi concluída.
Ademais disso, o Estado brasileiro conserva resquícios de sua
formação oligárquica, como a prisão especial para as pessoas com
formação universitária;
• insistência
no modelo da guerra como metáfora e como referência para as
operações de segurança pública. Desse modo, o objetivo continua
sendo, em muitos casos, o aniquilamento do “inimigo”,
freqüentemente sem reparar nos custos sociais. O problema de
segurança pública aparece às vezes como uma questão de calibre,
como um nó que será desatado quando o poder de fogo das polícias
supere o do inimigo. Em conseqüência, a segurança pública se
apresenta fortemente militarizada em suas estruturas, doutrinas,
formação, estratégia e táticas. As operações de segurança
pública em áreas pobres se assemelham a operações de guerra em
território inimigo: ocupação, blitz etc.;
• no
contexto anteriormente mencionado não é de se estranhar a
existência de numerosos abusos aos direitos humanos, particularmente
os que se referem ao uso da força. Os tiroteios em comunidades
pobres produzem um alto índice de mortes, incluindo as vítimas
acidentais. As alegações de tortura contra presos e condenados
também são freqüentes;
• relações
conflitivas com as comunidades pobres, sobretudo em lugares onde o
crime organizado é forte. A juventude que vive nesses lugares
considera a polícia inimiga e um setor da polícia tem esta mesma
visão. As pesquisas mostram que existem muitas comunidades onde os
moradores têm mais medo da polícia que dos traficantes de drogas,
cujo despotismo é mais previsível;
• numerosos
casos de corrupção policial, desde pequenos subornos para não
aplicar multas de trânsito até proteção a traficantes. Em muitas
ocasiões, o abuso de força está também vinculado aos casos de
corrupção.''
A
Polícia Militar do Estado de São Paulo para fins de organização é
uma força auxiliar e reserva do Exército Brasileiro. Conta com um
efetivo de 100 mil soldados.
Os
abusos e a ineficiência desta instituição saltam aos olhos da
sociedade civil. É acusada de repressão a movimentos políticos
contrários aos interesses do governo do Estado, falsificação de
evidências para incriminar tais movimentos, corrupção, repressão
violenta às populações da periferia, torturas e assassinatos.
Essas acusações são parcialmente confirmadas pela própria
corregedoria, mas é difícil definir a extensão deste problema,
devido à própria proeminência desta instituição no cenário
político e investigativo do Estado.
A
corporação foi acusada de matar mais do que todas as polícias dos
Estados Unidos juntas, e envolveu-se em conflitos repudiados por
grandes parcelas da população e importantes autoridades, como as
repressões à marcha da maconha, aos protestos de camelôs, ao
protesto contra o aumento do preço de ônibus na capital paulista, à
reintegração de posse do Pinheirinho e uma reintegração de posse
na Universidade de São Paulo.
Um
relatório da polícia civil de 2011 estimou que PMs foram
responsáveis por pelo menos 150 assassinatos. Os motivos seriam
vingança, ''limpeza'' e abuso de autoridade.
A
intensificação da prática de tortura e da violência nas
instituições policiais é uma herança da ditadura militar. análise e opinião
Muita
gente anda defendendo a desmilitarização das polícias estaduais. E
estão certas. Não vá pela opinião da veja, que é contrária à desmilitarização.
O que este blogueiro defende vai mais além: A mudança de
competências.
Sugiro
que se proceda uma verdadeira revolução na política de segurança
pública no país.
Que
se faça um amplo estudo de viabilidade da proposta, envolvendo
cientistas, sociais, cientistas políticos, especialistas na área,
advogados, e outras pessoas que possam colaborar na discussão,
formando inicialmente um grupo de trabalho e diagnóstico da situação
de (in)segurança no país.
Se
a conclusão for pela implementação de um Plano de Segurança
Nacional, não aquele nos moldes do governo FHC, feito às pressas,
somente para atender à uma pressão da mídia devido ao assassinato
do sequestrador do ônibus 174, nem aquele do governo Lula, que não
chegou a sair do papel.
Esse
plano deve ter como espinha dorsal que as polícias se tornem civis e
passem para o controle do Governo Federal.
Por
que?
Hoje
a União sempre arca com o ônus de carregar a pecha de
''incompetente'' na área, mesmo sem ter a competência para tanto.
Pois
que passe a tê-la.
A
União passaria a centralizar o comando da polícia, promovendo
capacitação de policiais, intercâmbios com o exterior, cursos,
mudança de filosofia da corporação, com ênfase nos direitos
humanos, melhorando salários, melhorando os equipamentos e
modernizando a estrutura. Vamos parar de prender manifestantes com
antecedência (como são competentes para isso, não?), e focar
diretamente no crime.
Os
policiais aprenderiam a agir com o rigor da Lei, mas sem cometer
arbitrariedades. Menos robocops, mais humanos.
Até
os uniformes mudariam, deixando de se parecer com uniformes de
soldados. Os veículos perderiam aquela cor horrorosa e aquele
aspecto repressor.
E
os Estados, como ficariam?
É
lógico que os governadores não vão querer se livrar assim tão
fácil do abacaxi, que pra eles ainda é um filão (lembrem-se que em
todas as campanhas, o que mais se promete é a melhora da segurança),
visto que são os comandantes das corporações em seus respectivos
estados. Há ainda que se destacar o cheiro forte de conluio entre
governadores e crime organizado.
Arcariam
com o ônus do envio das verbas à União, para que contribuam com o
custeio. Com amplo apoio da população, que deseja que se faça
alguma coisa, teriam que ceder.
Como
se daria o processo de mudança?
Em
primeiro lugar, é fundamental que o próprio Governo esteja
convencido e tenha vontade política. E que como um todo se envolva
em uma discussão interna.
Em
segundo lugar, enviando-se um projeto de lei do Executivo ao
Congresso, para que se altere o Artigo 21, inciso XXII que diz
respeito ao que compete à União em termos de polícia.
Será
necessária uma ampla discussão e mobilização com a sociedade
civil e também com conselhos populares, justamente os mais
interessados na mudança.
Será
fundamental envolver os atores deputados e senadores, esclarecendo-os
da importância do projeto.
Seria
criado o Ministério da Segurança Pública, que teria a função de
gerar e implementar as políticas, além do controle da polícia nos
municípios.
Haveria
algum modelo que deu certo a ser seguido?
Pesquisando
sobre o assunto, o modelo mais interessante, ao meu ver, é o da
polícia japonesa, apesar da baixa criminalidade daquele país, se
comparado ao Brasil.
Atualmente
o sistema policial japonês é baseado em polícias locais, ligadas
às prefeituras, que no dia a dia tem autonomia operacional e
administrativa. Porém essas polícias são supervisionadas pela
National Police Agency , que supervisiona a formação e treinamento
de policiais, fornecimento de equipamentos, estatísticas criminais,
etc. O sistema policial japonês é subordinado ao Primeiro Ministro,
e o governo nacional auxilia também as polícias locais com verbas,
salários e armamentos. Dessa maneira a Agência de Polícia Nacional
mantém um sistema de controle vertical sobre as polícias locais. Leia mais aqui
Ou
seja, as polícias locais são ligadas às prefeituras, o que se
traduz em maior descentralização e rapidez de ação, porém sob
controle de um ministério. Um dos destaques, que até tem sido
copiado pela PM de São Paulo, são os postos policiais.
Teria que ser este o modelo? Claro que não. Faria parte do estudo. O importante é que se discuta, e que se leve em consideração que há outros modelos a serem seguidos.
Há
décadas se fala em mudança na estrutura da polícia. Mas parece que
ninguém quer mexer em time que está perdendo.
O
que se propõe, mais que uma mudança, é uma real revolução no
sistema de segurança do país, pois do jeito que está, não pode
ficar.
Mereceria
um estudo sério, pelo menos?
Ou, como diria o Felipão, ''em time que está perdendo não se mexe''?
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