Por Fernando Castilho
Derivado
do termo ''esquerda festiva'', esquerda caviar é uma expressão
pejorativa utilizada para se referir às pessoas que, mesmo
socialistas, não abrem mão dos confortos do capitalismo. O
jornalista Mino Carta define a ''gauche caviar'' como "representantes
do chique radical".
Este
termo, utilizado pelo neolib Rodrigo Constantino, colunista de Veja e
uma das expressões do Instituto Millenium, clubinho da direita mais
reacionária do país, tem incomodado muita gente de esquerda que se
defende dizendo que a postura pró combate às desigualdades sociais
não implica necessariamente em voto de pobreza.
É
claro que defender os direitos das minorias não implica
obrigatoriamente em fazer parte delas. Não se precisa passar fome
para defender os pobres, nem ser crucificado para pregar o
cristianismo.
Mas
pelo menos um pouco de coerência é necessário para quem se diz
socialista.
Quando
alguém que, oriundo da classe média, participou no passado de
movimentos sociais que culminaram na derrubada do regime militar, que
participou de toda a luta pelas Diretas Já, que lutou para eleger um
partido que à época era a maior expressão possível da esquerda,
mas que hoje em dia tendo sua vida resolvida financeiramente, se dá
ao luxo de possuir carro importado, ser apreciador dos melhores
vinhos e restaurantes, vestir-se com roupas de marca e viajar
rotineiramente para Miami ou Paris, tudo isso junto e misturado, por
mais que se intitule de esquerda, seus hábitos denunciam o
contrário.
Não
se trata de preconceito, não.
Trata-se
de coerência.
Nesse
caso, talvez Constantino tenha alguma razão. Talvez muita.
E
há muita gente assim. Este blogueiro conhece.
Se
ao menos participassem de alguma forma da luta pela redução das
desigualdades e do preconceito, tudo bem. Se ao menos atuassem em
movimentos sociais, em ONG's, na esfera governamental, na imprensa ou
nos blogs, defendendo bandeiras socialstas, tudo bem. Mas muitas
dessas pessoas ficam só no discurso fácil de esquerda, posando de
intelectuais e exibindo suas vaidades.
Num
diálogo com uma dessas pessoas, tem-se a impressão de se estar
conversando com um autêntico capitalista. Só falta citarem com
mais propriedade, Milton Friedman da Escola de Chicago, que Thomas
Piketty, autor de ''O Capital no Século XXI''.
Outro
termo muito em voga é a palavra ''Esquerdopata'', utilizada por
outro ícone da direita mais reacionária do país, Reinaldo Azevedo,
colunista de Veja, a exemplo do menino maluquinho, Constantino.
Por
possuir o sufixo ''pata'' presente nas palavras ''sociopata'' e
''psicopata'' que se referem ao Transtorno de Personalidade
Antissocial, o termo ''esquerdopata'' remete à uma espécie de
transtorno ou doença de alguém que, de maneira obsessiva, diária
e contínua prega o esquerdismo.
Porém,
para o tio-rei Azevedo, em sua visão distorcida da realidade
histórica do mundo, o esquerdopata defende que tem sido necessário
ao longo da História matar milhões de pessoas para que outros
milhões possam viver em relativo bem-estar, recado para Fidel
Castro, seu Baphomet.
Porém,
fora essa tentativa de manipulação do pit-bull Azevedo, a direita pode ter
razão, se a definição for utilizada para aqueles que, 24 horas por
dia, de maneira intermitente, obsessiva, pregam seu esquerdismo aos
quatro cantos, a ponto de não conseguirem enxergar mais nada à sua
frente. O blogueiro conhece também gente assim. E às vezes,
confessa, tem uma tendência (combatida dia a dia) a se comportar
também dessa forma. Gente chata.
Mas,
existe o meio termo? Aquele que foge dos extremos estereotipados do
espectro político tão simploriamente delimitado pelos supercoxinhas
Azevedo e Constantino?
O
mundo hoje não se reparte mais em crimes, espaçonaves, guerrilhas,
nem em Cardinales bonitas. Há coxinhas de todos os graus para todos
os gostos. Com ou sem pimenta.
Pessoas,
sejam elas de classe média, ou mesmo pobres (não se fala aqui da
classe alta, pois esta, infelizmente, é a que tem maior consciência
de sua classe), não conseguem a sintonia fina da percepção do que
é ser de direita. A classe média procura se garantir, não
hesitando em furar a fila da vida para que possa atingir seus
objetivos, afinal, o paraíso, mesmo em meio ao inferno, pode ser
aqui mesmo.
Os
pobres, muitas vezes fazem o jogo da classe dominante, acreditando na
meritocracia, tentando alcançar o Olimpo, chegar lá. Quando não
conseguem, retiram-se à sua insignificância atribuindo a si mesmos
a culpa de sua incapacidade de ascensão social. E podem viver assim
para sempre, admitindo sua inferioridade e admirando as pessoas
brancas das novelas da Globo.
Mas
e o resto?
Aqueles
que se organizam em grupos sociais, que militam em partidos de
esquerda, que saem às ruas para defender a democracia, que lutam
contra os preconceitos, que possuem um veículo somente para
locomoção, ou nem possuem (dando o exemplo e preferindo o
transporte coletivo, mesmo que deficiente), que se preocupam em não
vestir uma roupa de grife que foi confeccionada com mão de obra
análoga à escrava, que não consomem os produtos alimentícios que
enriquecem grandes empresas em detrimento da saúde das pessoas, dão
um bom exemplo de como se pode ser socialista em plagas capitalistas
selvagens.
Pessoas
que se revoltam contra as ideias (ideias?) de Azevedos, Constantinos,
Mervais, Jabores, Sheherazades, Lobões, Bolsonaros, Felicianos et
caterva.
Pessoas
que praticam no seu dia a dia a busca por uma sociedade mais justa,
não importando se para isso tenham que criticar um governo que se
utiliza de pessoas indignas para compor seu ministério.
Afinal,
o que temos que buscar é o bem de quem foi pouco ou nunca assistido
em suas primeiras necessidades.
O
equilíbrio para tudo é necessário.
Se
o blogueiro vem lutando para combater sua tendência à
esquerdopatia, em 2015 espera que esse equilíbrio necessário seja
alcançado.
Falta
pouco para chegar lá.
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