segunda-feira, 24 de janeiro de 2022

A agromúsica é pop

Por Aquiles Marchel Argolo


Nos anos 90, o cantor Lulu Santos desabafou no programa do Faustão sobre como os sertanejos e a agromúsica ajudaram a eleger Fernando Collor. Como prêmio ele ficou anos na geladeira da emissora, só que ele estava certo e a coisa hoje é pior.

Acontece que esse estilo de música não domina as rádios, as paradas do Spotify à toa. Ele faz parte de um projeto do agronegócio para fazer sua boa imagem por meio da indústria cultural e sua maior arma é fazer acreditar que o agro é pop por meio do sertanejo universitário.

Nos anos 90 as duplas sertanejas dominaram as paradas e foram símbolo da era Collor, com os mais pobres perdendo suas poupanças, enquanto grandes latifundiários continuaram enriquecendo ao som de Leandro e Leonardo e Zezé Di Camargo e Luciano.

Nos anos 2000, novas duplas surgiram e com a saturação do estilo romântico pop, apareceram os universitários, que traziam roupagem mais pop, próxima ao rock e eletrônico e cooptava o visual vaqueiro mas jamais falando sobre as agruras do homem do campo.

Na verdade, o sertanejo pop romântico e o universitário sempre negaram pautas que seriam de interesse do homem comum do campo, como reforma agrária, grilagem de terra, morte de pequenos agricultores e focou a produção em falar de amores alcoólatras e sexo.

A pauta sempre foi não ter pauta e ser uma arma de alienação em massa.

Já repararam na quantidade de rádios sertanejas que existem? Não é como se houvesse escolha. Esses artistas são forçados goela abaixo, muitos ganhando prêmios sob critérios bem duvidosos.

Enquanto escrevia essa sequência de tweets, só três músicas entre as vinte mais tocadas do Spotify não eram de sertanejo universitário.

Enquanto esses artistas distantes politicamente da realidade do Brasil ganham dinheiro como clones um dos outros, artistas independentes são sufocados pela ausência de espaço e investimento.

A música "batom de cereja" da dupla Israel e Rodolfo concorreu a prêmios na Globo, enquanto trabalhos incríveis foram sumariamente ignorados.

E o público? Ah, o público...

O público jamais admite que seu gosto está sendo guiado. Que estamos em um mar de monocultura onde a variedade é tirada, consequentemente o poder de escolha.

A ilusão que o sertanejo universitário representa o Brasil serve aos interesses de homens por trás dessas duplas parecidas.

É coincidência que a classe sertaneja que apoiou Collor hoje apoia Bolsonaro, que por sua vez serve ao lobby dos grandes pecuaristas?

Pois é. A indústria cultural controla a gente como marionete e a gente engole bonitinho sem nem questionar"

Aquiles Marchel Argolo é jornalista


Título por Fernando Castilho

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