terça-feira, 26 de abril de 2022

Não nos deixam ser uma nação

Por Fernando Castilho





Hoje temos no poder um tirano que prometeu no início do mandato não só acabar com o sonho de nos tornarmos uma grande nação, mas destruir o país. Esse é o único projeto daquele que, no auge da pandemia, recebeu a alcunha de Capitão Morte


Em maio de 2013 a presidenta Dilma Rousseff ostentava confortáveis 65% de aprovação de seu governo, mas já no mês seguinte despencou para cerca de 30%.

O movimento pelo passe livre havia se insurgido contra o aumento de 20 centavos nas passagens dos ônibus e do metrô de São Paulo, mas com uma velocidade inédita se transformou em protestos pelo Brasil inteiro contra a única pessoa que seria a responsável por todas as mazelas de um país que caminhava para a frente social e economicamente: Dilma, a nova anta da classe média e da grande mídia.

Hoje se sabe - embora os autores da urdidura do golpe que tirou a presidenta honesta do poder, neguem - que as hordas de pessoas vestidas de verde-amarelo que invadiram as ruas foram comandadas pela atuação do Departamento de Estado dos Estados Unidos que estava de olho no petróleo do Pré-sal que Dilma resistia em entregar ao Tio Sam. Esse modelo de atuação tem sido replicado em todo o mundo, segundo os interesses norte-americanos.

A verdade é que os governos do PT haviam alçado o Brasil à sexta posição mundial na economia, superando o Reino Unido. A projeção do gráfico de crescimento fazia supor que o país emergente seguia segura e continuamente seu projeto de se tornar uma grande nação.

O golpe pôs fim a esse projeto com muita gente ganhando dinheiro e poder, e um juiz alçado à posição de celebridade nacional ao articular com o ministério público a prisão daquele que iria recolocar o país de volta aos trilhos do crescimento.

Hoje temos no poder um tirano que prometeu no início do mandato não só acabar com o sonho de nos tornarmos uma grande nação, mas destruir o país. Esse é o único projeto daquele que, no auge da pandemia, recebeu a alcunha de Capitão Morte.

O ousado lance de decretar uma graça ilegal constitucionalmente a um daqueles desqualificados, soldados da guerra contra a democracia, que invariavelmente o capitão abandona para trás, tem o intuito de, não só confrontar forças com o Supremo, mas sobretudo de dar o primeiro xeque contra a democracia brasileira.

Nesse xadrez em que, de repente, o país se vê envolvido, é imprescindível que o STF contra ataque, sob pena de que a porteira para a boiada do golpe já comece a se escancarar.

As pesquisas de opinião apontam há meses, com pequenas variações, um quadro em que Lula vence o inominável em todos os cenários, com possibilidade de vitória em primeiro turno, sem possibilidade de terceira via. Parece não haver nada que altere esse estado de coisas até 3 de outubro.

O capitão PRECISA de mais um mandato para que não seja preso e para que dê continuidade às maracutaias que se tornariam de domínio público assim que Lula assuma a presidência em 2023. E após mais quatro anos, precisará mudar a Constituição para um terceiro mandato ou colocar no poder um dos filhos para assegurar sua impunidade eterna.

Por isso, o capitão não esperará o dia das eleições em primeiro turno para dar um golpe.

Recentemente boa parte do exército reagiu contra a revelação de que em 1975 o STM (Superior Tribunal Militar) tinha conhecimento das torturas e assassinatos que ocorriam no Doi-Codi durante a ditadura. O inominável se aproveita desse fato para tentar aglutinar as forças que ele não conseguiu no último 7 de setembro.

Precisamos que o STF tenha a coragem de anular o decreto, mas, mais que isso, precisamos que as outras instituições, a sociedade civil responsável, os movimentos sociais e os partidos de oposição se organizem para dar suporte à decisão do Supremo.

Se a resposta ao inominável não for mais forte que o lance que acabou de fazer, desistiremos de ser uma nação para nos tornarmos a Cuba de Fulgêncio Batista.


Também publicado no Jornal GGN:

https://jornalggn.com.br/opiniao/nao-nos-deixam-ser-uma-nacao-por-fernando-castilho/



É preciso, a partir de agora, construir a resistência

Por Fernando Castilho 


Foto: Adriano Machado/Reuters

O que se passou na cabeça de Bolsonaro foi a ideia de testar o STF e, por conseguinte, todas as instituições


Quando Bolsonaro anunciou na última quinta-feira, 21, a graça concedida ao deputado federal Daniel Silveira, a primeira reação foi de estupefação.

Foi preciso ler o decreto com atenção e acompanhar as análises que os juristas fizeram sobre esse lance inesperado do presidente contra o STF.

Praticamente todas as opiniões convergiram para a inconstitucionalidade do ato e, por isso, não perderei tempo com considerações a respeito.

Resta analisar as motivações do capitão suas possíveis consequências e desdobramentos.

É certo que, faltando 5 meses e meio para as eleições presidenciais, o quadro das intenções de voto permanece praticamente inalterado com Lula bem à frente de Bolsonaro e nada indica que isso mudará.

É certo também que o capitão, pelo que já declarou inúmeras vezes, não aceitará qualquer resultado que não o contemple. Seu desejo é deflagrar um golpe alegando fraude nas urnas eletrônicas, mas, como foi demonstrado no último 7 de setembro, ainda não possui a totalidade das Forças Armadas de seu lado.

Nesta mesma semana ocorreu um fato que desagradou a ala mais autoritária dos militares da caserna e dos que acumulam vultosos salários no governo. A jornalista Míriam Leitão divulgou áudios de sessões do STM (Supremo Tribunal Militar) gravados em 1975 que demonstram sem sombra de dúvida que a alegação de que os comandos e os presidentes ditadores não tinham conhecimento das torturas e assassinatos cometidos nos porões do Doi-Codi é falsa.

O atual presidente do Tribunal, bem como os generais comandantes ficaram revoltados e se assanharam a ponto de dar todo o apoio à decisão de Bolsonaro, enquanto o centrão tentava dissuadi-lo, sem sucesso.

Uma das características mais marcantes do capitão é encarar seus amigos e aliados como soldados. Vão morrer alguns, o que fazer? Foi assim com Sarah Winter, Queiroz, Roberto Jefferson e muitos outros. Então, por que intervir de maneira tão forte na causa de Daniel Silveira?

Alguns sustentam que ele tem rabo preso com o deputado, mas Queiroz também não tem?

O que se passou na cabeça de Bolsonaro foi a ideia de testar o STF e, por conseguinte, todas as instituições.

Munido de certo reforço dado pelos militares, joga para ver se há possibilidade de romper a corda.

Se os ministros do STF recuarem agora, Bolsonaro cresce em prestígio com as Forças Armadas. É um movimento que pode ir se ampliando até 3 de outubro e que pode dar suporte a um possível golpe.

Bolsonaro não pode vencer essa queda de braço, mas não podemos deixar o STF sozinho nessa luta.

O jornalista Lauro Jardim cobrou uma reação de Lula, o que considero injusto porque exigir essa postura dele é colocar em seus ombros toda a responsabilidade da defesa das leis e das instituições.

O que realmente é necessário é uma articulação de forças da oposição juntamente com setores de outros partidos que são simpáticos à eleição de Lula para uma reação forte contra o ditador.

Além disso, não vejo como os movimentos sociais, os sindicatos, o MST, o MTST, a militância de esquerda e o povo que mais sofre com esse governo, podem se omitir neste momento e não saírem às ruas contra o tirano.

Sob pena de perdermos essa batalha pela via do golpe.

É preciso, mais do que nunca, construir resistência!


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quarta-feira, 20 de abril de 2022

A crueldade de Bolsonaro com os aposentados

Por Fernando Castilho




É certo que Nunes Marques usou de um trambique previsto no regimento interno do STF para atuar em prol do governo Bolsonaro


Conquistar uma aposentadoria digna para viver com tranquilidade o período que vai da velhice até o dia da morte sempre foi uma espécie de loteria.

Muitos jovens, ao ingressar na vida profissional, imaginam trabalhar durante mais de 30 anos para, ainda com saúde, poder desfrutar de mais umas poucas décadas do dinheiro a que têm direito.

Porém, nem sempre a realidade corresponde à expectativa. Muitas vezes o valor mensal do benefício é insuficiente para parar de trabalhar ou, o que é muito pior, o contribuinte morre antes de se aposentar.

Conheço um caso de uma pessoa que, décadas atrás, foi atropelado justamente ao sair do posto do INSS com seu pedido de aposentadoria concedido.

O Estado e a Justiça também podem ser particularmente cruéis com nossos velhinhos, como veremos a seguir.

A mídia, principalmente a Rede Globo, tentou convencer os brasileiros de que a Reforma da Previdência era necessária para não quebrar a instituição. Além disso, seria benéfica para a grande maioria das pessoas. Uma mentira particularmente cruel, mas que beneficiou grandes empresários, agora desobrigados de contribuir com sua parte.

Recentemente descobriu-se que grande parte de nossos aposentados tem direito a receber bem mais do que vem recebendo há muitos anos. É que a regra de transição estabelecida em 1999 desconsiderava as contribuições anteriores ao Plano Real, o que deixou muita gente no prejuízo.

Foi por isso que escritórios de advocacia que atuam no direito previdenciário ingressaram com ação no STJ (Superior Tribunal de Justiça) para corrigir essa defasagem. A ação foi ganha com os ministros votando a favor por unanimidade.

Porém, o governo Bolsonaro entrou com recurso no STF (Supremo Tribunal Federal) alegando que a correção dos benefícios e o pagamento dos atrasados levaria o INSS à falência.

O argumento é falso, já que muitos dos que teriam direito já faleceram. Além disso, pra muita gente a chamada Revisão da Vida Toda não compensaria, pois ela só é interessante para quem recebia até 1999 valores maiores do que passou a receber depois.

Mesmo assim, as planilhas que a AGU (Advocacia Geral da União) preparou conseguiram enganar alguns ministros do STF que, preocupados com a alegada provável falência do órgão previdenciário, votaram contrariamente.

A favor votaram o relator, Marco Aurélio Mello, Edson Fachin, Rosa Weber, Carmen Lúcia e Ricardo Lewandowski.

O escritório que é amicus curiae na ação apostava que Luís Roberto Barroso votaria favorável, mas este não correspondeu às expectativas.

A votação por sistema eletrônico estava empatada em 5 a 5 quando Alexandre de Moraes pediu vistas.

Em 25 de fevereiro último, o ministro deu ganho ao processo com seu voto.

Já havia motivos para comemoração quando Kássio Nunes Marques, faltando apenas 29 minutos para o encerramento das votações, pediu destaque!

Com esse pedido, a votação deverá ser anulada e outra, desta vez presencial, iniciada.

É certo que Nunes Marques usou de um trambique previsto no regimento interno do STF para atuar em prol do governo Bolsonaro.

Ocorre que, quando a votação se reiniciar, André Mendonça, o ministro terrivelmente evangélico que entrou no lugar de Marco Aurélio, que se aposentou, certamente também votará alinhado com o governo. Ele é tão alinhado e tão antiético que no último domingo até posou para foto junto ao presidente enquanto este fazia sua costumeira campanha eleitoral com dinheiro público. Na sabatina no Senado afirmou que atuaria com isenção, mas agora povou que mentiu. Vai pro inferno.

Espera-se que o placar se inverta para 5 a 6 com a consequente derrota de nossos aposentados que terão que se conformar com seus minguados benefícios.

Nunes Marques, ao pedir o destaque, desrespeitou a norma jurídica que exige que seu ato seja motivado. Desta forma, está criada uma insegurança jurídica, pois, a cada vez que um ministro tiver seu voto vencido, poderá requerer outra votação. É o mesmo que um time perdedor exigir novo jogo. Por isso, o destaque de Nunes Marques poderá ser derrubado, com consequente desprestígio para ele. Não há outra motivação para o ministro que a de tentar agradar seu chefe, o presidente Bolsonaro.

Além disso, houve falta de ética, merecendo até crítica indireta de Gilmar Mendes.

É certo que todos os ministros da Corte, inclusive os que votaram contra a ação, se sentiram desrespeitados, o que poderá motivar a mudança de um ou outro voto somente para colocar os dois bolsonaristas em seu devido lugar.

Também já há entendimento de que a AGU ousou tentar enganar os ministros quando da primeira votação e que o pleito é plenamente constitucional.

De qualquer forma, o Supremo só se reuniria presencialmente para rejulgar a ação daqui a talvez mais de um ano ou dois.

Enquanto isso, mais velhinhos morrerão sem receber seu benefício de direito.

É a crueldade de Jair Bolsonaro que não tem limites.

Felizmente, esse governo está para acabar e o Brasil iniciará um árduo período de reconstrução.


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terça-feira, 12 de abril de 2022

A pobreza invisível aos olhos dos partidos de direita

Por Fernando Castilho


Foto: Folha de São Paulo


As instituições que deveriam fiscalizar essas ações ilegais do capitão, o TSE e a PGR, fazem vista grossa, ou por pusilanimidade, caso da primeira, ou cumplicidade, caso da segunda


As propagandas eleitorais na TV, embora disfarçadas, já começaram.

Excetuando-se a centro-esquerda de Lula, e a extrema-direita de Bolsonaro, todos os outros partidos componentes desse espectro político são da direita. E nenhum, excetuando Lula, demonstra o menor sentimento de empatia com o sofrido povo brasileiro.

O que se vê são platitudes e mentiras.

Um diz que a esquerda vê a pedofilia com simpatia.

Outro se intitula o verdadeiro partido conservador.

Para todos o que importa é a defesa da tradicional família brasileira. Mesmo que ela esteja se despedaçando por causa da fome, do desemprego e da Covid..

O Brasil perdeu em pouco mais de dois anos pelo menos 620 mil pessoas para a Covid-19, numero divulgado pelo Consórcio de Veículos de Imprensa que, com certeza, está subestimado. Multiplique-se isso por 5 e teremos a dor de mais de 3 milhões de familiares, muitos dos quais, perderam seus arrimos.

Mas esses partidos, o presidente e o centrão não viram isso, ou não sentiram isso, ou não ligam para isso, ou não agiram para evitar isso.

Outros milhares de pessoas, entre mortos, feridos e desabrigados foram vítimas das terríveis chuvas dos últimos meses, enquanto o presidente do Brasil se exibia em esquis aquáticos por Santa Catarina, alheio ao sofrimento humano.

Novamente, nenhum deles viu isso, sentiu isso. E nem se lembra mais disso.

Caminho pelas ruas da cidade e observo o enorme contingente de famélicos, sujos e  maltrapilhos a andar como zumbis a esmo ou deitar nas calçadas e marquises. Gente que chegou ao fundo do poço por causa do desemprego que lhe custou o despejo e a desagregação da família. Gente que talvez nunca mais consiga se reerguer.

Passo por um semáforo e observo a menina descalça de 7 ou 8 anos tentando vender balas para os motoristas que permanecem com as janelas de seus carros fechadas por medo de assalto. É inevitável um sentimento de tristeza e raiva.

Esse fenômeno também acontecia até 20 anos atrás, pouco antes da eleição de Lula a seu primeiro mandato.

Essas pessoas abandonadas pelo Estado são invisíveis aos olhos dos políticos dos  partidos de direita e de extrema-direita que fazem propaganda na TV. Nós já os vimos antes através de denúncias de corrupção, de votos favoráveis a medidas contrárias ao povo, como as reformas trabalhista e da previdência e envolvimentos em orçamentos secretos.

São os mesmos que em 2016 votaram a favor do impeachment de Dilma Rousseff, pela família, pelos filhos, pelo papagaio, mas sobretudo, pelo dinheiro que receberam de Eduardo Cunha. São predadores do Estado brasileiro que se aproveitam do fantoche que está no Planalto.

Sim, o responsável direto por todo esse sofrimento dos desvalidos, a autoridade máxima da nação, gasta seu tempo viajando pelo país, fazendo campanha eleitoral antecipada, paga com dinheiro público.

As instituições que deveriam fiscalizar essas ações ilegais do capitão, o TSE e a PGR, fazem vista grossa, ou por pusilanimidade, caso da primeira, ou cumplicidade, caso da segunda.

O sofrimento e a dor de não conseguir emprego, de não ter o mínimo necessário para comprar alimentos para os filhos famintos, de não poder comprar um botijão de gás, de perder o pouco dos bens que se conseguiu comprar com sacrifício em muitas prestações não é nem reverberado pelos veículos de comunicação que sempre procuram selecionar as pessoas mais conformadas com a própria sorte para as rápidas entrevistas no horário nobre dos telejornais. Chegamos a questionar se não existe mesmo ninguém revoltado no país.

É por isso que, em meio a essa profusão de insensibilidades das propagandas eleitorais dos partidos de direita e extrema-direita, a chama de esperança transmitida pelo velhinho de cabelos brancos que fala ao povo com voz rouca, ilumina aqueles momentos tão hipócritas e obscuros.

Para Lula, o enorme contingente de miseráveis não é invisível. Mas só pra ele.

É pra essa gente, mas também para a classe média que também começa a ser duramente atingida pela crise econômica descontrolada que Lula fala.

É essa gente que Lula quer colocar no orçamento do país.

Para Lula, o pobre não é um problema a ser desconsiderado ou colocado na invisibilidade, mas sim, a solução para a economia.

Ao dizer que é mais fácil vencer as eleições do que consertar todos os estragos cometidos nesses últimos anos, o velhinho barbudo dá a real dimensão da destruição que encontrará em todas as esferas federais ao assumir em janeiro de 2023.

Lula é o único candidato que não está em campanha por pura vaidade, para manter privilégios, para aumentar e dividir o butim ou para evitar ser preso.

Lula é o único candidato que ama seu país de verdade, com sinceridade.

Ele sempre demonstrou isso e a gente vê isso em seus olhos. 


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terça-feira, 5 de abril de 2022

Como propagou-se a Covid pelo mundo?

Por Fernando Castilho





A imprensa ocidental deixou de falar das armas biológicas norte-americanas encontradas pelos russos em laboratórios ucranianos. Por quê?


A mídia ocidental, capitaneada por agências como a Reuters, tem procurado mostrar a versão que mais agrada este lado do planeta acerca dos acontecimentos relativos ao conflito Rússia-Ucrânia.

Todos os dias temos lamentado a destruição e as mortes no país de Volodymyr Zelensky, alimentado nosso ódio pelo invasor, Vladimir Putin, mas esquecendo-nos de verificar quais seriam as razões para a invasão e, muito menos, ouvido e visto o que relata a imprensa do lado de lá.

Ontem mesmo, vimos revoltados os cerca de 300 corpos de pessoas assassinadas pelo exército russo, espalhados pelas ruas destruídas da cidade de Bucha.

Numa situação dessas, temos duas opções: acreditar piamente nas imagens ou desconfiar delas, afinal, há uma guerra de informações. A primeira é a mais cômoda e a segunda é a mais trabalhosa. Opto pela segunda.

Zelensky, como de costume, fez com muita competência um teatro em cima do fato, mas a Rússia nega veementemente que tenha cometido esse crime terrível.

Bem, neste contexto atual em que a Rússia, seus costumes, sua cultura e suas artes estão sendo canceladas pelo restante do mundo, vale perguntar qual seria a razão para jogar ainda mais a opinião pública planetária contra ela? Qual o simbolismo e qual a utilidade para a guerra desses 300 corpos?

Estive pensando o dia todo nisso quando me veios às mãos um vídeo mostrando os mesmos corpos deitados nas ruas acenando para tropas ucranianas que passavam de caminhão. Muito estranho.

Porém, da mesma maneira que desconfiamos dos vídeos de Zelensky, também desconfiamos desse.

A imprensa ocidental deixou de falar das armas biológicas norte-americanas encontradas pelos russos em laboratórios ucranianos. Por quê?

Por que a ONU não enviou uma missão para investigar esses laboratórios? A Rússia vai ficar falando sozinha na ONU? Ninguém tem interesse em verificar a veracidade das gravíssimas afirmações?

Agora me deparo com Ignacio Ramonet,  jornalista e diretor do sério jornal Le Monde Diplomatique em versão espanhola, acaba de fazer uma denúncia gravíssima.

O texto que compartilho aqui começa com a palavra Urgente e afirma que a Rússia não esperava descobrir, como parte da sua campanha militar, “aves numeradas“ criadas por laboratórios biológicos e bacteriológicos na Ucrânia, financiados e supervisionados pelos organismos militares dos EUA.

Outra “surpresa”, foi anunciar as localizações dos laboratórios norte-americanos que fabricam e ensaiam armas biológicas em 36 países do mundo (um aumento de 12 países em relação à sessão anterior).

Mas afinal o que são estes “pássaros numerados”, tratados por Ramonet como “Aves de destruição em massa”?

Depois de estudar a migração das aves e observá-las ao longo das estações, os especialistas ambientais e os zoólogos puderam conhecer o caminho que estas aves tomam a cada ano na sua viagem sazonal,incluídas as que viajam de um país para outro e até de um continente para outros.

(isso já sabíamos)

Aqui entra em ação o papel dos serviços de inteligência das organizações que conduzem um plano de “segurança estratégica” dos EUA. Um grupo destas aves migratórias são “detidas”, digitalizadas e providas de uma cápsula de germes e patógenos que levam um chip para serem controlados através de computadores, como se fossem drones vivos. A seguir são libertadas de novo para unirem-se às aves migratórias nos países onde se planeja efetuar a contaminação.

Sabe-se que estas aves tomam um caminho desde o mar Báltico e o mar Cáspio até o continente africano e o sudeste asiático, assim como outros dois voos a partir do Canadá para a América Latina na Primavera e no Outono. Durante o seu longo voo monitora-se o seu deslocamento passo a passo por intermédio de satélites e determina-se a sua localização exata. Se querem, por exemplo, prejudicar a Síria ou o Brasil, o chip é destruído quando o pássaro está nos seus céus. Mata-se o pássaro que cai levando a epidemia. Assim, as doenças se espalham neste ou naquele país. Dessa forma, o país inimigo é prejudicado sem nenhum custo militar, econômico e político para o imperialismo ianque genocida.

A numeração das aves migratórias é considerada um delito pelo direito internacional, porque são aves que penetram o céu e o ar de outros países, e podem espraiar contaminação. Se o laboratório lhes abastece de vírus e germes, então esta ave converte-se numa arma de destruição maciça. Portanto, no direito internacional, considera-se proibida a utilização de aves para lançar ataques mortais contra um país oponente. Porém, a pandemia não foi uma guerra convencional contra uma determinada nação, mas uma operação econômica para tentar resgatar o regime capitalista de sua crise terminal, gerando lucros trilionários para a Big Pharma, que agora no mercado financeiro só fica atrás da indústria armamentista.

O país que comete um ato tão imoral e criminoso, em tese seria punido pelo regimento da ONU. Acontece que os EUA não tremem diante de nenhuma punição internacional, pois os governos burgueses não se atrevem a castigá-los. Mas agora serão imputados diante do estigma que acompanhará a sua existência como um Estado terrorista, inclusive perante os seus submissos aliados.

O governo Putin têm uma forte “carta na manga”, quando afirma que capturou as “aves numeradas” . Isto quer dizer que os ianques foram agarrados com as mãos na massa, com todos os pormenores contidos que provam uma condenação decisiva por um organismo científico independente.

Isto obriga a pensar na possibilidade real de que todos os vírus que infectaram humanos neste século, especialmente os últimos, como o ébola que afetou a África, o antrax, a gripe porcina e aviar, e atualmente o Covid-19, provenham todos de laboratórios militares financiados e administrados pelos EUA.

E foi isto que fez com que a China apresentasse uma solicitação urgente, séria e estrita para realizar uma investigação internacional sobre o surgimento repentino do coronavírus. É muito provável que o imperialismo ianque tenha utilizado aves migratórias para primeiro matar cidadãos da China e depois no mundo todo, para potencializar seu sistema financeiro.

 

Embora não se possa chancelar essa opinião como verdadeira, não se pode simplesmente descartá-la e, muito menos desqualificar o seu autor, um jornalista sério, com muitos anos de história e com muitas fontes fidedignas.

Infelizmente, talvez o mundo nunca consiga comprovar a veracidade do que afirma o jornalista porque os EUA ainda são um império que manda em seus aliados, mas esse estado de coisas não é eterno, já que está em curso declínio de seu domínio com a crescente ascensão da China e da própria Rússia.

Talvez, daqui há alguns anos, possamos conhecer a verdade.


Abaixo, o texto original de Ramonet, em espanhol, extraído do Diario 16.


«… Urgente*

En una ruidosa reunión en el Consejo de Seguridad de la ONU, realizada a pedido de Rusia, sobre el desarrollo de armas biológicas estadounidenses en sus fronteras dentro de Ucrania, quedó en evidencia lo siguiente:

1- El delegado ruso entregó documentos y pruebas para que quedaran en el acta de la sesión que confirman lo siguiente:

*Financiamiento oficial del Pentágono para un «aparente» programa de armas biológicas en Ucrania

*Nombres de personas y empresas estadounidenses especializadas en las pruebas y documentos involucrados en este programa.

*La ubicación de los laboratorios en Ucrania y los intentos realizados hasta ahora para ocultar las pruebas.

2- Anunciar otra sorpresa del representante de Rusia en las ubicaciones de los laboratorios estadounidenses que fabrican y prueban armas biológicas en 36 países del mundo (un aumento de 12 países con respecto a la sesión anterior).

3- El delegado ruso específicó las enfermedades y epidemias, los medios de su liberación, los países en los que se están probando y cuándo y dónde se llevaron a cabo los experimentos con o sin el conocimiento de los gobiernos de estos países.

4- El delegado ruso confirmó públicamente que entre los experimentos y efectos está el virus responsable de la actual pandemia y la gran cantidad de murciélagos utilizados para transmitir este virus.

5- Estados Unidos lo niega, Francia y Gran Bretaña aliados con ella (y el eco entre los pueblos de estos países es muy violento), y tienden a creerse esta novela bajo la presión psicológica que la pandemia ha dejado sobre todos.

6- La Organización Mundial de la Salud niega su conocimiento de la existencia de experimentos biológicos en Ucrania y dice: Toda nuestra información es que son laboratorios de investigación médica para combatir enfermedades (y Rusia prueba con evidencia la correspondencia regular y visitas de expertos de la Organización Mundial de la Salud) a los laboratorios estadounidenses sospechosos en todo el mundo.

7- China ataca a todos, y le dice al delegado de USA: Mientras niegues y estés seguro de tu inocencia, ¿por qué te niegas desesperadamente. a permitir la realización de una investigación por parte de especialistas para averiguar la verdad, especialmente con documentos y pruebas contundentes?

A los que quieran saber cuáles son los pájaros numerados… y como América mata al mundo sin un sólo tiro… Aquí les dejo la información:

Aves de destrucción masiva..

Rusia no esperaba descubrir, como parte de su campaña militar en Ucrania, aves numeradas producidas por laboratorios biológicos y bacteriológicos en Ucrania financiados y supervisados por los Estados Unidos de América.

¡¿Pero qué son los pájaros numerados?!

Después de estudiar la migración de las aves y observarlas a lo largo de las estaciones, los especialistas ambientales y los zoólogos podrán conocer el camino que toman cada año estas aves en su viaje estacional, incluidas. lasque viajan de un país a otro o incluso de un continente a otros.

Aquí entra el papel de la inteligencia de las partes que llevan un plan malévolo, un grupo de estas aves migratorias son «arrestadas», digitalizadas y provistas de una cápsula de gérmenes que llevan un chip para ser controlados a través de computadoras, luego son liberadas de nuevo para unirse a las aves migratorias a los países donde se planea el daño.

Se sabe que estas aves toman un camino desde el mar Báltico y el mar Caspio hasta el continente africano y el sudeste asiático, y otros dos vuelos desde Canadá a América Latina en primavera y otoño. Durante su largo vuelo, se monitorea su desplazamiento paso a paso a por intermedio de satélites, y se determina su ubivación exacta, si quieren, por ejemplo, dañar a Siria o Egitpo, el chip se destruye cuando el pájaro está en sus cielos. Se mata el pájaro y cae llevando la epidemia, y las enfermedades se esparcen en tal o cual país. Así, el país enemigo ha sido dañado sin ningún costo militar, económico y político.

La numeración de las aves migratorias es considerada un delito por el derecho internacional, porque son aves que penetran el cielo y el aire de otros países, y si se les provee de gérmenes, entonces esta ave se convierte en un arma de destrucción masiva. Por lo tanto, en el derecho internacional, se considera prohibido el uso de aves para lanzar ataques mortales contra un oponente, y quien comete un acto tan inmoral e inhumano es castigado, y esto es lo que hizo que América no temblara ante ningún castigo (nadie se atreve a castigarlos a ellos) sino del estigma que acompañará la vida de todos ellos y de excluirlo por completo como país creíble, incluso de sus aliados.

Los rusos tienen una fuerte carta de presión, cuando dicen que han capturado las aves, quiere decir que los americanos están agarrados con las manos en la masa, con todos los detalles que contiene que prueban la condena decisiva. Esto obliga a pensar en la posibilidad de que todos los virus que han infectado a humanos en este siglo, especialmente los últimos, como el ébola, que afectó a África, ántrax, gripe porcina y aviar, y actualmente el Covid-19, todos provengan de laboratorios financiados y administrados por los Estados Unidos de América, y esto es lo que hizo que China presentara una solicitud urgente, seria y estricta para realizar una investigación internacional sobre la aparición repentina del coronavirus, es muy probable que Estados Unidos haya utilizado aves migratorias para matar ciudadanos de China.

Lo importante es que los escándalos de América del Norte van en aumento, y ahora ha comenzado a rebajar su tono hostil hacia Rusia y trata de reconectarse con ella, con la esperanza de que lleguen a un acuerdo político con los rusos que la proteja del mal de sus acciones y para que no represente ninguna amenaza para Rusia en el futuro.

 


Como evitar o emburrecimento e restaurar a plenitude da inteligência

Por Marcos Neves




Há umas semanas rodou por aí, partilhada à exaustão, a tradução de um texto francês sobre o empobrecimento da língua. O texto é bonito, mas a argumentação está colada a cuspo.

 

O cronista, um professor de gestão francês chamado Christophe Clavé, pouca culpa terá. Afinal, a língua é um tema interessante e, quando há que escrever uma crónica e não nos aparece outro assunto, há sempre a possibilidade de bater na língua dos dias de hoje. É um truque velho de séculos. Uma crónica escreve-se depressa, nem sempre temos tempo para pensar no que dizemos. Acontece.

Já fico um pouco mais preocupado com todos os leitores cultíssimos, exigentíssimos e sempre com o pensamento crítico na boca que, perante uma prosa sobre a língua que não mostra conhecimento mínimo sobre o estudo dessa língua, a divulgam sem remorsos e sem pensamento crítico que se veja.

Vejamos então o que diz o tal texto partilhado. Uso a versão traduzida que vi partilhada. O texto original é um pouco diferente (para dizer a verdade, mais subtil), mas foi este o texto que tantos portugueses quiseram partilhar. Vamos a ele.

«O QI médio da população mundial, que sempre aumentou desde o pós-guerra até o final dos anos 90, diminuiu nos últimos vinte anos …É a inversão do efeito Flynn. Parece que o nível de inteligência medido pelos testes diminui nos países mais desenvolvidos. Pode haver muitas causas para esse fenómeno.»

Alto e pára o baile! Na verdade, houve ganhos tremendos — quase inacreditáveis — do QI nos últimos 100 anos, em todo o mundo. Este é o gráfico do aumento (não são valores absolutos, são valores relativos à base):



Os dados estão na página Our World in Data.

É verdade que se notou uma estabilização ou mesmo inversão do efeito Flynn em alguns países, principalmente do Norte da Europa, mas não está generalizada nem apaga o que foram os ganhos das últimas décadas. Há ainda que ter em conta que as subidas e descidas têm muitos factores associados. Não é fácil compreender por que razão ocorrem. Não é fácil chegar a conclusões sólidas…

Bem, o autor apresenta uma hipótese:

«Uma delas [das causas] pode ser o empobrecimento da linguagem. Na verdade, vários estudos mostram a diminuição do conhecimento lexical e o empobrecimento da linguagem: não é apenas a redução do vocabulário utilizado, mas também as subtilezas linguísticas que permitem elaborar e formular pensamentos complexos. O desaparecimento gradual dos tempos (subjuntivo, imperfeito, formas compostas do futuro, particípio passado) dá origem a um pensamento quase sempre no presente, limitado ao momento: incapaz de projeções no tempo.»

«Pode ser» — uma excelente dúvida científica. É pena que essa dúvida seja logo substituída por certezas que vêm dos habituais «vários estudos»… Que estudos serão esses? (Serão as flutuações dos resultados PISA? Desconfio que sim, mas não sei. O texto não diz.)

Pergunto eu: onde estão os linguistas — cientistas que estudam a língua — que encontram diminuição sustentada do conhecimento lexical e o empobrecimento da linguagem?

É verdade que o senso comum parece ver empobrecimento no uso da linguagem. Mas essa sensação já nos acompanha há milhares de anos (sim, há milhares)! É como os óvnis: muitos os vêem, ninguém os encontra. Quando se põem a estudar a questão, os linguistas não registam empobrecimento do uso da linguagem pelos falantes (o que registam, isso sim, é uma uniformização da linguagem nos espaços nacionais, com menos variação regional — mas isso é outra questão).

Os falantes continuam a ter os milhares de palavras que sempre tiveram ao seu dispor, mesmo que essas palavras não sejam exactamente as mesmas que eram há 100 anos. Nos dicionários, o número de palavras até estará a aumentar (porque os dicionários são cada vez mais abrangentes).

Olhando para o texto de Clavé, e exercendo o tal pensamento crítico que o próprio texto preconiza, temos de perguntar: mesmo se existisse esse empobrecimento da linguagem, como saber que há uma ligação de causa-efeito entre o empobrecimento e a suposta diminuição da inteligência? Não seria muito mais provável que o empobrecimento fosse uma consequência e não uma causa dessa descida da inteligência (que, como vimos, não é bem como a pintam)?

Outra pergunta: se aceitarmos essa relação de causa-efeito, quer isso dizer que os anos 90, quando o QI chegou ao pico segundo o próprio texto, foram os anos em que a riqueza da língua chegou ao expoente máximo? Os anos 90 do século XX? A sério?

Continuemos a ler Clavé:

«A simplificação dos tutoriais, o desaparecimento das letras maiúsculas e da pontuação são exemplos de «golpes mortais» na precisão e variedade de expressão.»

A escrita é hoje usada em contextos informais onde não aparecia há umas décadas. Assim, em certos contextos, usamos menos pontuação e menos maiúsculas. Mas noutros, ninguém deixa de usar maiúsculas ou pontuação. Na verdade, havendo mais variedade, há mais complexidade. Saber escolher entre um ponto, um ponto de exclamação ou nada numa mensagem de SMS é mais difícil do que apenas entre um ponto e um ponto de exclamação. Este uso da escrita na informalidade não se faz sem dificuldades, mas faz-se. Não há menos complexidade… Afinal, todos temos de aprender a usar a língua na escrita em mais registos do que até há poucos anos, quando os registos informais eram quase um exclusivo da oralidade.

Por outro lado, não percebi bem o que será «a simplificação dos tutoriais». Vou ao original: está lá «tutoiement». O tradutor de ocasião compreendeu muito mal o texto. Trata-se do tratamento por tu. (Se os tradutores profissionais falham algumas vezes, os «tradutores» com aspas falham muito mais.) Enfim, olhando para o original, parece que o autor defende que as formas de tratamento distintas são uma subtileza que importa não perder. Que ligação tem isto à inteligência? Não sei. Há várias línguas sem distinção T-V (como se chama habitualmente), sendo o exemplo mais conhecido o inglês. Serão menos subtis? Serão menos inteligentes?

«Apenas um exemplo: eliminar a palavra «signorina» (agora obsoleta) não significa apenas abrir mão da estética de uma palavra, mas também promover involuntariamente a ideia de que entre uma menina e uma mulher não existem fases intermediárias.»

Aquele «signorina» virá, presumo, de um original «mademoiselle» que se transformou na versão italiana por alguma razão numa das várias traduções portuguesas que por aí circulam. (É, de facto. Confirmei no original. Como este problema em particular não existe em português, o «tradutor» inventou.) Nós não usamos uma forma intermédia entre «menina» e «mulher»/«senhora». Temos, por outro lado, um sistema de formas de tratamento que não lembra ao diabo — nem a um francês! Seremos mais subtis que os franceses? Talvez mais inteligentes? Seremos menos capazes de perceber as várias fases do desenvolvimento da mulher? Que confusão se cria assim entre as particularidades de cada língua, a inteligência e o conhecimento…

Há ainda que desconfiar destas impressões («mademoiselle» está a desaparecer!). Às vezes, vamos a ver e o tal desaparecimento não se verifica. Outras vezes, é um facto, mas muito mais antigo do que parece. Há que desconfiar das nossas impressões… Muitos portugueses estão convencidos de que «você» é palavra recente, quando já se usa desde o século XVII. É apenas um exemplo. Todos nós nos enganamos com as nossas impressões. Talvez fosse útil perguntar a algum linguista francês se pode verificar o tal desaparecimento de «mademoiselle».

«Menos palavras e menos verbos conjugados significam menos capacidade de expressar emoções e menos capacidade de processar um pensamento.»

Os jovens usam menos palavras? Parece, mas é uma impressão de todos os tempos. Diria que os jovens sempre conheceram menos palavras que os mais velhos, porque viveram menos que os mais velhos. Mesmo assim, uma criança de cinco anos já sabe uns bons milhares de palavras, bem mais do que se diz por aí (já cheguei a ouvir dizer que só usamos 1000 palavras, um disparate…). Usamos hoje muitas bengalas? Sempre as usámos, fazem parte dos mecanismos mentais que nos permitem pensar enquanto falamos. Usamos muitas vezes umas poucas palavras? A distribuição de uso de palavras é constante entre línguas e é também constante no tempo. Chama-se a isto a Lei de Zipf (é fácil encontrar descrições sobre este fenómeno). Não, não andamos a usar muito poucas palavras — continuamos a usar a linguagem como sempre usámos. A língua muda, o cérebro humano lá se vai mantendo…

«Estudos têm mostrado que parte da violência nas esferas pública e privada decorre diretamente da incapacidade de descrever as emoções em palavras. Sem palavras para construir um argumento, o pensamento complexo torna-se impossível. Quanto mais pobre a linguagem, mais o pensamento desaparece. A história está cheia de exemplos e muitos livros (Georges Orwell – “1984”; Ray Bradbury – “Fahrenheit 451”) contam como todos os regimes totalitários sempre atrapalharam o pensamento, reduzindo o número e o significado das palavras.»

Quais estudos? Até admito que haja estudos que dizem isto mesmo quanto à violência (gostava, no entanto, de saber quais são). Só que a dificuldade de descrever as emoções é um problema de sempre… Será que hoje, quando a população está alfabetizada como nunca esteve, é mais difícil descrever as emoções? Será que isso tem levado a um aumento da violência? Será estranho defender isto depois de várias décadas de diminuição da violência nos países da Europa (por exemplo, no que toca aos homicídios). Mas mesmo que não fosse o caso, há que ter cuidado com as conclusões apressadas. Estabelecer uma ligação entre o uso da linguagem à violência exige provas bastante sólidas…

Quanto aos escritores referidos, dificilmente defenderiam que as suas obras descrevem uma diminuição da inteligência provocada por um empobrecimento da linguagem em regimes como os nossos. Mesmo que fosse o caso, para fazermos análises linguísticas convém ter dados e não apontar para representações ficcionais, por mais importantes que sejam — e estas são-no. Desconfio que apareçam aqui para dar um certo ar de profundidade literária a um texto cheio de ar. Há perigos no uso da língua, claro que há: todo este texto de Clavé mostra bem como podemos embrulhar numa retórica bonita ideias muito pouco desenvolvidas…

«Se não houver pensamentos, não há pensamentos críticos. E não há pensamento sem palavras. Como construir um pensamento hipotético-dedutivo sem o condicional? Como pensar o futuro sem uma conjugação com o futuro? Como é possível captar uma temporalidade, uma sucessão de elementos no tempo, passado ou futuro, e sua duração relativa, sem uma linguagem que distinga entre o que poderia ter sido, o que foi, o que é, o que poderia ser, e o que será depois do que pode ter acontecido, realmente aconteceu?»

Cada língua tem um determinado sistema de flexão verbal. Há línguas que usam muitos verbos auxiliares ou outras palavras para expressar uma grande parte dos tempos, enquanto línguas como as latinas apostam em diferentes formas do verbo. Um sistema não é melhor do que o outro. O inglês, por exemplo, expressa o condicional através da sintaxe. O português fá-lo através de uma forma particular do verbo. Serão os ingleses incapazes de construir pensamento hipotético-dedutivo? Claro que não! Todas as línguas permitem fazer isso mesmo, usem ou não uma forma verbal particular. Mesmo que o francês e o português estivessem a perder o condicional (não estão), a língua continuaria a ter formas de expressar o mesmo. Em português, por exemplo, podemos usar o imperfeito em vez do condicional, mas só o fazemos se se cumprirem certas condições. A língua, nesse ponto, está a ficar mais complexa, não menos.

A nossa flexão verbal continua a ser riquíssima. Basta tentarmos descrevê-la (como já tentei ao escrever uma gramática) para vermos como é difícil de sistematizar. É muito complexa, muito mais do que pensamos. Só como exemplo, temos expressões iterativas («tenho falado com ele»), temos vários graus do futuro, com subtis diferenças («eu falo com ele, eu falarei com ele, eu vou falar com ele, eu hei-de falar com ele, eu irei falar com ele…»). Nada disto mudou nos últimos anos.

Já o inglês, por exemplo, não tem uma forma verbal simples de expressar o futuro — precisa sempre de auxiliares. Serão menos inteligentes por lá?

«Caros pais e professores: Façamos com que nossos filhos, nossos alunos falem, leiam e escrevam. Ensinar e praticar o idioma em suas mais diversas formas. Mesmo que pareça complicado. Principalmente se for complicado. Porque nesse esforço existe liberdade. Aqueles que afirmam a necessidade de simplificar a grafia, descartar a linguagem de seus “defeitos”, abolir géneros, tempos, nuances, tudo que cria complexidade, são os verdadeiros arquitetos do empobrecimento da mente humana.»

Sem dúvida! Assino por baixo este último parágrafo (só este). As nossas línguas são complexas. Todas as línguas são complexas. (Já agora, se nós temos dois géneros e os falantes de suaíli têm mais do que dez, serão mais inteligentes por isso?) Convém não simplificar — e isso implica analisar a língua como ela existe e não a imagem simplificada (lá está) que temos do uso dessa língua. É por isso que dar mais atenção aos estudos linguísticos pode ajudar a cair em menos ratoeiras retóricas como este texto.

A questão é esta: as línguas não estão a ficar menos complexas. O que se perde de um lado, ganha-se de outro (por estranho que pareça), num jogo de equilíbrio cognitivo que não notamos, mas que se desenvolve ao longo dos milénios (o livro que proponho abaixo descreve esse jogo).

No final, nenhuma língua exige dos seus falantes nativos mais inteligência para ser falada do que outra língua. É uma característica das línguas pouco conhecida, mas que se revela quando as estudamos de forma um pouco mais profunda. Para saber isso é preciso estudar um pouco mais a fundo a língua do que os habituais comentários de café…

Entretanto, Clavé ainda não terminou:

«Não há liberdade sem necessidade. Não há beleza sem o pensamento da beleza.»

Muito bem. Frases bonitas, para terminar. Não vejo grande relação com o resto do texto, mas não faz mal. As línguas continuam a permitir pensar a beleza. Até continuam a permitir criar beleza, veja-se bem.

Antes de terminar, digo: as línguas podem passar por períodos de decadência — mas na escrita… Quando o Império Romano desapareceu, os níveis de alfabetização desceram. No entanto, as línguas em si, na oralidade, não se transformaram em subprodutos linguísticos — acabaram por dar origem às nossas línguas, que simplificaram partes do latim, mas complexificaram outras (os artigos, por exemplo).

Ora, mesmo na escrita não vivemos hoje num período de decadência: a alfabetização é superior a qualquer época passada. Ainda não estamos bem? Pois claro que não. Preocupa-me a falta de leitura de muitos jovens, que não permite ganhar capacidades de escrita adequadas para um mundo em que vivemos pela escrita. Mas de uma preocupação que todos podemos partilhar até conclusões catastróficas sobre a evolução da língua, o estado da gramática, do vocabulário, da violência e de tudo o mais — vai, claro, uma grande distância…

Temos de ser muito exigentes. A língua exige uso e estudo, principalmente na escrita. É por isso que proponho que se leia mais sobre a língua, para lá de impressões de café.

Por exemplo, este artigo (em inglês) mostra como as línguas tendem a transmitir informação com a mesma eficiência, afinada ao longo dos milénios pelas capacidades cerebrais e auditivas dos seres humanos. É um artigo difícil? Com certeza que sim… Nada que assuste quem tanto grita a favor da exigência. É uma das pistas que apontam para uma certa constância das línguas humanas no que toca à complexidade e às capacidades cerebrais necessárias para as falar.

Proponho ainda um livro de que já falei anteriormente, mas que é um bom ponto de partida para percebermos como as línguas não se desfazem no tempo: The Unfolding of Language, de Guy Deutscher. É um livro exigente, como certamente Clavé e os seus leitores gostam. É também um livro muito interessante e muito informado sobre as línguas. Já agora, como estamos a falar de um texto francês, deixo também outra sugestão de leitura: Le Français dans tous les sens, de Henriette Walter. Sobre a nossa própria língua, temos o recente (e já muito recomendado por aqui) Assim Nasceu Uma Língua, de Fernando Venâncio. Talvez sirvam, todos eles, como antídoto para o vício do catastrofismo linguístico.

São exemplos de textos inteligentes e exigentes, que nos entusiasmam para saber mais sobre as línguas e sobre a linguagem humana.


Marcos Neves é professor na Nova FCSH, tradutor na Eurologos e autor de vários livros de divulgação linguística.

 


 

domingo, 3 de abril de 2022

A mentira de um general que ofende a todos que lutaram contra a ditadura

Por Fernando Castilho


Arquivo nacional


Continuando a fugir da guerra que se instaurara, decidimos pular a catraca do Cine Ipiranga e entrar no meio de uma sessão em uma sala quase vazia para nos escondermos agachados no escuro atrás da última fileira. Mas não demora muito tempo para sentir um cano frio me pressionando a nuca.

 

Estamos saindo em grande número em passeata desde a Cidade Universitária até a Praça Fernando Costa onde haverá uma concentração e um ato público contra a ditadura. Uma das razões para o protesto é a morte do jornalista Vladimir Herzog, assassinado nas dependências do DOI-Codi em 1975. Simularam um suicídio por enforcamento.

Meu pai já tinha me informado que a repressão estaria na praça aguardando os estudantes e que seria violenta. Que eu tomasse muito cuidado.

Ao chegarmos, vejo que ele tinha razão. Há um grande contingente de policiais militares e soldados tomando toda a praça. Começam os lançamentos de bombas de gás lacrimogêneo, tiros e cavalaria perseguindo todos que se encontram no local. Há muita fumaça, barulho e palavras de ordem que não consigo entender. O lugar vira um inferno.

Preciso correr. Atrás de mim, um soldado tenta me alcançar com um chicote e cada vez que a ponta bate no chão, faíscas saem dela. Será um chicote elétrico? Mas nesta época não existem ainda baterias para isso. Provavelmente a ponta é metálica, mas não há tempo para verificar isso.

Logo uma colega da faculdade, a Anne Marie, se junta a mim. Após uns cem metros. o soldado desiste de nós e prefere perseguir outra estudante.

Continuando a fugir da guerra que se instaurara, decidimos pular a catraca do Cine Ipiranga e entrar no meio de uma sessão em uma sala quase vazia para nos escondermos agachados no escuro atrás da última fileira. Mas não demora muito tempo para sentir um cano frio me pressionando a nuca.

Agora levados, Anne Marie e eu, pelo soldado com arma na mão para o camburão, sentamo-nos junto com mais quatro homens que reclamam por terem sido presos. Os bancos inteiriços são dispostos lateralmente na viatura, de forma que três dos homens se sentam à nossa frente e um ao nosso lado. Se dizem operários que passavam pelo local e não sabem o que está acontecendo.

À minha frente o quarto homem, um rapaz com cara de estudante me faz sinais estranhos com os olhos que se dirigem a direção dos que estão ao seu lado. Demoro um pouco a perceber que ele está querendo me dizer para desconfiar e ficar quieto. Os “operários” dizem que não sabem o que está acontecendo, que estavam voltando do trabalho e que os militares safados estão abusando de todo mundo. Percebo agora que eles querem obter informações e me calo.

A viatura roda conosco durante mais de uma hora correndo muito com a sirena ligada e fazendo curvas fechadas que assustam e nos desequilibram. Os pneus “cantam” o tempo todo. O ar começa a ficar rarefeito e o calor se torna insuportável, mas, enquanto Anne Marie e eu estamos apavorados, os dois homens à frente parecem familiarizados com o procedimento.

Permanecemos eu e minha colega o tempo todo calados enquanto os três tentam puxar conversa e fazer com que falemos alguma coisa.

O suor escorre a cântaros, não só pelo calor infernal, mas também pelo medo do que podem fazer conosco quando a corrida terminar.

Enfim o camburão para.

Soldados do lado de fora abrem a porta traseira e formam duas fileiras de homens voltadas de frente uma para a outra. Em seguida nos mandam descer.

Os três “operários” descem primeiro, percorrem o corredor sem serem molestados e desaparecem. Em seguida, eu, Anne Marie e o outro estudante, descemos. Teremos que passar pelo meio das fileiras de soldados. É o chamado “corredor polonês”. Passamos correndo, mas apanhando muito daqueles cassetetes.

Quando, enfim, paramos, vemos que ninguém parece nos seguir.

Ao olhar em volta reconheço o prédio da Faculdade de Direito do Largo São Francisco.

Achamos melhor nos separarmos e nos despedirmos.

Em seguida tomo um ônibus para casa.

 

Este relato, extraído de meu livro Um Humano Num Pálido Ponto Azul, editora Mondrongo, de forma alguma, tem a pretensão de se equivaler a outros muito mais dolorosos, como o recente de Paulo Coelho que sofreu bárbara tortura e escapou por pouco da morte.

Também não se equivale em gravidade à tortura que a jornalista Míriam Leitão, então com 19 anos e grávida, sofreu nas dependências do Doi-Codi. Logo ao chegar, ela apanhou com socos e chutes e foi colocada nua numa sala escura, a sós com uma cobra jiboia.


Na verdade, meu relato pessoal, muito mais brando do que os de Paulo Coelho e Míriam Leitão, tem o intuito de apenas ser mais um a contribuir para ilustrar que a ditadura militar no Brasil, fruto de um golpe de estado, nunca foi um movimento, nem foi fruto de anseio popular como o general Braga Netto afirmou em sua última ordem do dia de 31 de março de 2022.

Não, general, João Goulart, à época do golpe, tinha, segundo pesquisa Ibope da época, cerca de 70% de aprovação da população, portanto não foi anseio do povo brasileiro, mas sim, do Departamento de Estado norte-americano. E o senhor sabe disso.

Aliás, se a democracia não fosse restaurada, quem garante que o senhor seria hoje membro de um governo eleito -  mesmo que de maneira fraudulenta - e estaria à vontade para falar asneiras e ameaçar mais um golpe, caso seu chefe não vença as eleições de 2022?

A história está registrada e não vai ser a fala de um general saudoso da ditadura que vai modificá-la.

O dia 31 de março de 2022 ficou lá pra trás e quase já estávamos nos esquecendo dele com tanta notícia nova acontecendo todos os dias, quando o deputado Eduardo Bolsonaro, o 03, ou zero nada, se insurgiu no twitter justamente contra uma nota de Míriam Leitão.

A jornalista estava comentando as declarações recentes do presidente que atacavam as instituições democráticas.

Eduardo não se conteve e expôs toda a sua crueldade e falta de empatia ao debochar de Míriam respondendo: “ainda com pena de cobra”.

Vários partidos afirmaram que vão representar contra o zero no conselho de ética da Câmara, o mínimo a ser feito.

A verdade é que se conseguirmos defenestrar Bolsonaro do poder após as eleições, há que se fazer uma faxina geral nessa turba autoritária, obscurantista e louca por dinheiro que se instalou no poder.

É uma pena que tipos como o filhão zero ainda conseguirão se reeleger.


Editado em 04/04/2022


Também publicado em Construir Resistência:

https://construirresistencia.com.br/mentira-de-um-general-que-ofende-a-todos-que-lutaram-contra-a-ditadura/


Também publicado em Medium Brasil:

https://medium.com/@fernandocastilho/a-mentira-de-um-general-que-ofende-a-todos-que-lutaram-contra-a-ditadura-553605150fe2