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segunda-feira, 20 de outubro de 2025

Centrão: o grande camaleão da politica brasileira

Por Fernando Castilho



Nos últimos tempos, o Centrão, essa entidade política que sempre sabe onde fica a cozinha, esteve confortavelmente abraçado à extrema direita bolsonarista. A parceria, claro, não foi por afinidade ideológica, mas por conveniência. Prova disso foram os mimos trocados, como a PEC da Blindagem, uma tentativa quase poética de escapar das investigações sobre o destino das emendas parlamentares. Afinal, ninguém quer acabar atrás das grades por falta de zelo orçamentário.

Outro ponto de união foi a resistência à taxação dos super-ricos. Nada mais natural: muitos dos parlamentares do Centrão fazem parte desse seleto grupo e, como bons representantes (deles mesmos), defenderam com unhas e dentes seus próprios bolsos.

Mas eis que o roteiro saiu do controle. O povo, elemento imprevisível da democracia, resolveu sair às ruas contra os abusos. A mobilização popular pegou os parlamentares de surpresa. Com as eleições se aproximando, a má fama do Centrão começou a ameaçar a reeleição de seus membros, que até então acreditavam que bastava distribuir emendas e selfies para garantir votos.

A onda de protestos também deu um empurrãozinho nas pesquisas para o presidente. Lula foi beneficiado por episódios dignos de série. Eduardo Bolsonaro, ao agir contra os interesses nacionais, acabou presenteando Lula com o papel de defensor da soberania. É preciso lembrar que, uma vez iniciadas as campanhas eleitorais na TV, os vídeos em que Eduardo pede que os Estados Unidos imponham sanções ao Brasil, joguem uma bomba atômica ou enviem um porta-aviões para cá, serão enormemente explorados. Quem do Centrão, em juízo perfeito, vai querer ter seu nome ligado a alguém tão tóxico ao país?

Além do tiro no pé que Eduardo deu, Donald Trump, num giro inesperado, buscou diálogo com Lula para tentar consertar os estragos do tarifaço. Sim, até Trump percebeu que talvez seja melhor conversar com quem manda de verdade e não com dois patetas.

Outro dado importante é o destino de Jair Bolsonaro. Preso, ele iniciará uma nova trajetória rumo ao... ostracismo. Rei morto, rei posto. Adeus.

Enquanto o cenário se inverte, dois ministros de Lula, mesmo sob ameaças de expulsão partidária, ignoraram os caciques e permaneceram no governo. Um gesto raro de convicção política, ou talvez apenas de cálculo mais refinado.

Diante desse novo cenário, o Centrão, sempre com o dedo no vento, começa a recalibrar sua bússola. Alguns membros já se aproximam do governo, conscientes de que dividir o palanque com Lula, favorito em todos os cenários eleitorais, e não com um possível Tarcísio ou Ratinho Jr., pode render bons frutos. Afinal, quem quer ficar do lado que só oferece desgaste e memes ruins?

A debandada tem uma consequência direta: o isolamento dos bolsonaristas, agora desmascarados por seu apoio explícito aos bilionários, às casas de apostas e aos bancos. Nada como defender esse povo... rico. E há vídeos mais que suficientes de Sóstenes e outros, que serão explorados durante a campanha.

A aproximação do Centrão com Lula pode redesenhar completamente o jogo político. Governadores e prefeitos ligados ao grupo já ensaiam passos rumo ao governo federal, em busca de apoio, recursos e, claro, emendas. A dança das cadeiras começou, e os palanques bolsonaristas em estados-chave correm o risco de ficarem vazios ou, pior, com plateia hostil.

No Nordeste, onde Lula nada de braçada, a migração partidária deve ser ainda mais intensa. Não será surpresa se deputados e senadores trocarem de sigla como quem troca de gravata, buscando abrigo em partidos mais alinhados ao governo, como PSB, MDB ou até o próprio PT. Afinal, a coerência para eles é ditada pelo momento.

Essa disputa por espaço no campo governista pode gerar tensões internas. Partidos que sempre estiveram com Lula vão exigir contrapartidas: mais ministérios, mais apoio, mais tudo. E o bolsonarismo? Deve se restringir aos núcleos ideológicos mais radicais, com menos capilaridade eleitoral e orçamento digno de vaquinha online.

Com o Centrão recalculando sua rota, a dinâmica legislativa também muda. Lula pode conquistar uma base mais ampla e estável, suficiente para aprovar projetos estratégicos, especialmente nas áreas de economia, justiça tributária e reformas sociais e ambientais. O isolamento dos bolsonaristas, por sua vez, tende a reduzir a obstrução nas votações. O plenário, palco de gritaria e memes, pode finalmente virar espaço de debate (ou pelo menos de silêncio constrangedor). A negociação com o Centrão, embora pragmática e baseada em cargos e verbas, pode garantir avanços em pautas populares. Afinal, até o fisiologismo tem seu lado útil.

O Centrão, como sempre, não decepciona. Atento à direção dos ventos, recalculou sua rota com a precisão de um GPS político. A combinação entre pressão popular, desgaste bolsonarista e ascensão de Lula criou um novo campo gravitacional no Congresso. E como bons satélites da sobrevivência eleitoral, os parlamentares estão sendo atraídos para o lado do governo.

Se isso vai redefinir os rumos do país? Provavelmente. Se vai ser por convicção? Pouco provável. Mas no Brasil, até a conveniência pode ser revolucionária, desde que venha com cargo, verba e uma boa foto no palanque.

quarta-feira, 15 de outubro de 2025

Apresento o Zé Ninguém para a vaga de Barroso no STF

Por Fernando Castilho




Com a saída de Luís Roberto Barroso do STF, Lula tem agora a chance de corrigir alguns erros do passado.

Comecemos por Barroso. Em 2021, ele declarou à Folha que Dilma Rousseff não caiu por crime de responsabilidade, mas por não saber fazer política. Traduzindo: foi deposta por falta de traquejo parlamentar, não por pedaladas. E Barroso, indicado por ela, diante dessa “injustiça”, fez o quê? Nada. Omitiu-se. Um silêncio que grita. Dilma errou ao escolhê-lo, e Lula, agora, pode consertar isso.

Aliás, Dilma também nos presenteou com Luiz Fux, grande professor e autor de importantes livros sobre direito processual que, vergonhosamente os rasgou para defender um golpista. Mais, sobre ele, prefiro não falar para poupar meus dedos e sua paciência.

Lula, por sua vez, teve seu momento de arrependimento com Dias Toffoli. Quando estava preso, foi impedido por Toffoli de comparecer ao velório do irmão. Só autorizou a ida quando faltavam 20 minutos para o enterro, e ainda sugeriu que o corpo fosse levado a um quartel para um velório improvisado. Lula, com razão, recusou. E essa mágoa, dizem, ainda ecoa no Planalto.

Agora, Lula tem uma nova lista de possíveis indicados: Jorge Messias, Rodrigo Pacheco, Bruno Dantas, Carol Proner... Nomes fortes. Mas vamos aos poréns.

Rodrigo Pacheco? Um político de direita que, de repente, virou um doce de pessoa, justo quando a vaga apareceu. Coincidência, claro. Já Bruno Dantas é cria de Gilmar Mendes. Precisa dizer mais?

— “Ah, Fernando, então você quer um ministro que diga amém a tudo que Lula fizer, como Nunes Marques e André Mendonça fazem com Bolsonaro?”

Não. A questão não é alinhamento cego. A verdadeira polarização não é entre esquerda e direita, mas entre quem defende a democracia e quem flerta com o autoritarismo; entre quem luta pelos vulneráveis e quem serve aos privilegiados; entre quem busca justiça e quem a transforma em privilégio.

Outros nomes correm por fora: Kakay, Lenio Streck, Pedro Serrano... Todos bons. Mas o que define um bom ministro do STF?

Além do tal “notório saber jurídico”, que, convenhamos, virou bordão, é preciso que o ministro saiba para que lado pender a balança: o lado dos que mais precisam de justiça. Hoje, ela pende para os patrões, os latifundiários, o INSS contra os aposentados. Gilmar, Toffoli, Fux, Barroso, Nunes Marques, Mendonça, Cármen Lúcia... todos muito comprometidos com a minoria abastada.

Por isso, minha aposta é Jorge Messias. Tem preparo, tem trajetória, tem compromisso. E Carol Proner, porque o STF precisa de mais mulheres, e porque ela é muito competente.

Mas, correndo totalmente por fora, e com chances rigorosamente nulas, apresento a candidatura do Zé Ninguém.

Sim, ele tem notório saber jurídico. Não no sentido tradicional, claro. Seu saber é notório justamente por ser... escasso. Mas ele conhece bem a lei da vida e da sobrevivência. E tem algo que falta a muitos togados: senso de justiça. Aquele impulso quase infantil de querer proteger os mais vulneráveis e punir quem os explora.

Portanto, se você acha que o mais importante para o STF é alguém que conheça leis, talvez o Zé Ninguém não seja o nome ideal. Mas se acredita que o essencial é ter compromisso com quem realmente precisa de justiça, então, quem sabe, ele mereça ao menos um voto de confiança. Ou um cafezinho no gabinete.

Mas, afinal, quem é o Zé Ninguém?

São milhões espalhados pelo Brasil. Gente que possui muito mais senso de justiça que a maioria dos ministros. Gente que não faz negócios com empresas por meio de escritórios de fachada. Gente que não organiza regabofes em Portugal. Gente que não acha que indígenas e aposentados sejam fardos para o país. Gente, enfim, que carrega nas costas, dia após dia, o peso de uma desigualdade de mais de quinhentos anos.

Lula, o Dom Juan da política brasileira

Por Fernando Castilho



Depois que ouvi Lula falar na então Rádio Bandeirantes, no programa O Trabuco do saudoso Vicente Leporace, acho que ainda nos anos 70, senti uma inquietação: quem era esse líder metalúrgico que ousava desafiar a ditadura em nome dos direitos de sua categoria? A curiosidade me levou à histórica assembleia no Estádio de Vila Euclides, em São Bernardo do Campo. E ali, no meio da massa operária, comecei a entender que aquele homem não era só barulho, mas também pura estratégia.

Mais tarde, estive por duas vezes em reuniões na casa emprestada pelo advogado Roberto Teixeira a Lula, no bairro de Ferrazópolis. Ainda estudante, me vi hipnotizado ao ouvi-lo falar sobre economia com uma lógica tão simples e intuitiva que faria muito doutor engasgar com a própria tese.

O tempo passou, e Lula foi colecionando aliados como quem coleciona figurinhas raras. Seu poder de sedução política é digno de estudo, ou de uma tese de doutorado com direito a banca rendida.

Por mais improvável que parecesse, lá estava ele como presidente, trocando confidências com George W. Bush e recebendo elogios rasgados de Barack Obama, que não economizou: “Esse é o cara!” Pois é. O cara.

Com Emmanuel Macron, presidente da França e da ala direita, não foi diferente. Foram filmados de mãos dadas na Floresta Amazônica, em Belém, como dois adolescentes em passeio escolar. Faltou só o piquenique e a trilha sonora.

O senador Ciro Nogueira, bolsonarista de carteirinha, chegou a declarar: “Ele é capaz de me seduzir em 15 minutos. É macio e jeitoso.” Um elogio que até hoje causa urticária na ala mais radical do Congresso.

Em 2022, Lula fez o impossível parecer trivial. Bastaram algumas conversas para transformar Geraldo Alckmin, aquele mesmo, seu adversário em outras épocas, em seu vice. A conciliação, afinal, é uma das marcas registradas do Barba. E ele assina com estilo.

E quem não lembra da prisão em Curitiba? Lula, enclausurado na sede da Polícia Federal, acabou conquistando justamente o carcereiro. Horas e horas de conversa e, no fim, mais um fã. Se tivesse mais tempo, talvez saíssem de lá com um podcast.

A mais recente conquista do Dom Juan da política parece ser ninguém menos que o presidente norte-americano Donald Trump. Em uma conversa telefônica de 30 minutos, Trump saiu encantado: “Gostei da ligação. Nossos países vão se sair muito bem juntos!” Prometeu mais encontros, tanto no Brasil quanto nos Estados Unidos. Se isso não é charme, o que é então?

Nas entrevistas, seja com a imprensa progressista ou com os grandes veículos da mídia corporativa, o resultado é sempre o mesmo: entrevistadores saem satisfeitos, convencidos, quase convertidos. Lembro bem da entrevista com Reinaldo Azevedo durante a campanha de 2022. Justamente o cara que cunhou a expressão “petralha”. Tio Rei saiu de lá praticamente com uma estrela no peito.

Mas afinal, qual é o segredo desse poder de agregar?

Digo que é a verdade. A sinceridade no olhar. E uma biografia marcada pela coerência ou, no mínimo, pela habilidade de parecer coerente em qualquer cenário.

O poder do diálogo com Lula é tão surpreendente que os bolsonaristas evitam qualquer conversa com ele. E fazem bem. Porque se conversarem... é capaz que se apaixonem.

Pode ser até que Trump o traia. Afinal, isso não se descarta em nenhuma relação. Mas, por enquanto, parece que a coisa vai às mil maravilhas.

terça-feira, 1 de outubro de 2024

O que está faltando para Lula emplacar seus candidatos a prefeito?

Por Fernando Castilho

Imagem: reprodução redes sociais

O que Lula tem a aprender com López Obrador?


Deu na Folha: os candidatos a prefeito apoiados por Bolsonaro lideram as pesquisas em 23 municípios com mais de 200 mil habitantes e, em 11 deles podem vencer no primeiro turno. Os apoiados por Lula estão em primeiro lugar somente em 16 cidades e apenas 5 liquidariam a eleição em primeiro turno.

Apesar de estranha, a notícia é verdadeira, pelo menos antes do dia 6, quando o pleito é pra valer.

Mas, por que isto está acontecendo?

Sabemos que Bolsonaro fez o pior governo da história. Não há nenhuma obra de vulto, nenhuma universidade foi construída, nenhum grande hospital erguido. Além disso, ele foi responsável por pelo menos 400 mil mortes durante a epidemia e quase todo mundo teve uma vítima em sua família ou em seu rol de amizades.

O capitão enfrenta processos que vão desde falsificação de cartão de vacinas até tentativa de golpe de estado, passando pelo vergonhoso roubo de joias do Estado. É também o responsável pelo apetite insaciável por emendas do centrão, o que se constitui numa verdadeira sabotagem ao programa de governo de Lula.

Na contrapartida, Lula tem tido grandes êxitos. Alguns não são percebidos pela população, como o arcabouço fiscal e a reforma tributária, mas outros afetam de maneira muito positiva a vida dos brasileiros mais pobres como a enorme redução do desemprego, a inflação sob controle, o crescimento do PIB e a volta dos programas sociais.

Mas, então, por que os candidatos de Lula não decolam?

A explicação parece simples: o povo não sente a melhoria de vida. Ou, se sente, o outro lado desmente com fake news.

O fato inconteste é que não há comunicação. Não há ligação entre os feitos do governo Lula e o povo. Há uma desconexão.

O presidente do México, López Obrador, que deixa o cargo hoje, adotou em seu governo a estratégia de comunicação diária, através de lives, com o povo mexicano. Deve ser por isso que sua aprovação é de 68%. Essa aprovação lhe garantiu a eleição de sua sucessora, Claudia Sheinbaum.

Amanhã Lula estará na posse de Claudia. Espero que Obrador lhe dê alguns conselhos.


sábado, 14 de setembro de 2024

Pobreza política

Por Palas Atena

Retirantes, de Candido Portinari em livre leitura


A gente viveu a década de 80, com a redemocratização, a era sarney, collor. O PT atuando na defesa do trabalhador, da democracia. O império da glogolpe abortando toda tentativa de a esquerda (PT em específico) ganhar eleições.

Vivemos os anos 90 de domínio do tucanato no país, com fhc sucateando universidades, vendendo o patrimônio e sendo considerado o "príncipe" da Sociologia, mesmo depois de mandar esquecer o que ele tinha escrito. A política neoliberal posta em prática, com d. Ruth Cardoso tentando dar uma humanizada enquanto o pavão marido vivia romance com jornalista global e era incensado na mídia, nos meios acadêmicos, vendido como moderno.

Quem viveu essa época sabe o que foi Lula chegar ao poder. Passamos a viver o melhor dos mundos. Ali, havia um projeto de país menos desigual sendo gestado, com suas falhas, contradições, mas tinha um projeto de país mais inclusivo.

Penso que vocês não têm noção do que foi a miséria legada pela ditadura e mantida pelos governos sarney, collor e fhc. Não têm a ideia.

Me lembro de que, criança e adolescente, vi isso de muito perto. Minha mãe era da Pastoral na cidade onde nasci, interior do Norte de Minas. Era da Legião de Maria, ministra da eucaristia, superatuante na igreja. Além de atuar na igreja, minha mãe trabalhava na prefeitura dando assistência às escolas rurais e, também, na secretaria de uma escola estadual do bairro onde morávamos.

Nossa casa mais longe do centro (bairro dos ricos), era o bairro de classe média baixa, perto da periferia, onde a miséria grassava. Miséria, miséria mesmo. Na rua, a maioria das mulheres eram viúvas, todas amigas. Aquela coisa de bairro do interior.

Nossa casa era referência porque minha mãe era um elo entre o poder público, a igreja e o povo pobre. Todos os problemas possíveis e imagináveis passavam por essas instâncias de poder. E nossa casa era a dos "desvalidos".

Eles iam lá pedir comida, receber cesta básica que a Pastoral coletava (a atuação da igreja católica era intensa na população pobre). Para terem uma ideia, quando Betinho lançou a campanha Fome Zero, ele que é da minha cidade, lá em casa foi um dos pontos de distribuição dos donativos. O povo pobre, quando alguém estava à beira da morte, ia lá em casa atrás de minha mãe para fazer oração e até extrema-unção.

O que a gente vê hoje em relação aos pastores era feito pelas mulheres e homens que atuavam na igreja católica nas pastorais. Só que, naquela época, era acolhimento de verdade, era exercitar o princípio de que, sendo filhos de Deus, as pessoas precisavam ser amparadas.

Tinha uma lavadeira, que trabalhava lá para casa (a roupa mais bem lavada e passada da vida). Ela ia na semana pegar as trouxas de roupa para lavar e passar. Ela era alcoólatra. A nossa rua era o caminho para a casa dela.

Quando ela bebia à noite, estava às vezes tão ruim que, sabendo não conseguir chegar à casa dela, abria o portão de casa, entrava no alpendre onde ficavam as cadeiras para ver a vida passar na rua. Ela se deitava lá e dormia. Não batia na nossa porta porque já estava todo mundo dormindo e havia o respeito de não se mostrar naquele estado para pessoas de família. Quem é do interior sabe como funcionava essa ética das relações. Mas essa lavadeira se sentia confiante e segura o suficiente para dormir no alpendre.

De manhã, minha mãe ou outra pessoa de casa se levantava para sair para o trabalho ou buscar pão e ela estava lá no alpendre. Minha mãe a acordava. Dava o café da manhã, conversava com ela, dando os conselhos. Essa lavadeira me fascinava porque ela usava brincos de argola dourada, batom vermelhíssimo e fazia um pinta no rosto quando saía para os bares. Não tinha os dentes da frente, mas só saía nos "trinques", no que a pobreza lhe permitia.

Tinha outra figura lá, que era bipolar ou esquizofrênica. A mania dela era ir lá para os meios dos matos pegar lenha. Atravessava a cidade de uma ponta a outra para buscar essa lenha e levar para a casa dela. Passava na porta de casa de manhã indo para uma fazenda buscar a lenha e por volta do meio-dia, carregando a lenha.

Quando estava mais desequilibrada, ela falava palavrão, mas tanto palavrão hahaha. O povo a chamava só para vê-la responder com página inteira de xingamentos. Mas ela reconhecia nossa casa, minha mãe. Nunca a xingou.

Tinha vezes que entrava lá em casa para ganhar comida. É, gente, naquela época as pessoas pediam comida, roupa. Não tinha essa coisa de pedir dinheiro porque todo mundo era pobre (a gente era classe média baixa, passava muito aperto).

Quando vocês leem os contos de Guimarães Rosa, Vidas Secas de Graciliano Ramos, mas principalmente Guimarães, podem pensar que vivi e vi todo aquele sertão bruto e riquíssimo, demasiadamente humano. Aqueles personagens todos, com suas complexidades e fascínios, povoaram minha infância e adolescência.

Por que estou nesse relato de memória? Porque vi a vida das pessoas, a minha se transformarem com a chegada do PT à presidência. Porque acompanhei toda a trajetória de Lula, desde o sindicalista que era tratado como comunista, terrorista, povoando o imaginário do povo e aterrorizando a classe dominante por falar em nome do trabalhador.

Em minha cidade, conservadora, que tinha uma família se perpetuando no poder (direita), a miséria só começou a ser vencida quando o PT chegou à presidência, implantou as políticas de distribuição de renda, como o Bolsa Família.

Vocês não têm noção do que é miséria, pobreza, falta total de desenvolvimento, precariedade, falta de água de um Norte de Minas, irmanado com o Nordeste. Não têm noção.

E hoje vejo gerações que nasceram no pós-fhc ou eram crianças nessa época. Pegaram a bonança dos governos lulistas. Vejo essas gerações se dizendo de esquerda e progressistas, exercitando o mais ferrenho antipetismo, antilulismo. Uma geração, em geral urbana, que pegou um país institucionalmente mais organizado pela Constituição de 88, com seus avanços.

Vejo o desprezo e a arrogância como criticam Lula, como se fosse alguém ultrapassado, até de pelego o chamam porque ele faz conciliações. Eu fico por entender o porquê de tanto desprezo, travestido de suposta crítica. Vejo tudo isso e penso: vocês não estão entendendo nada, nada, nada.

Agora mesmo, estão batendo no governo e no PT porque supostamente não estão enfrentando arthur gângster lira para salvar a pele de glauber braga. A culpa é de Lula e do PT. Querem que o presidente assuma esse B.O. psolista. Só olho e penso: não estão entendendo nada, nada, nada.

A soberba é uma forma de húbris. Essas gerações tanto estão fazendo que vão conseguir minar o PT. Tanto desprezam Lula que ficarão no vazio quando não o tiverem mais para desprezar. De minha parte, vejo um grande vácuo quando Lula não mais estiver aqui, segurando todas essas pontas que impedem o país de sucumbir de vez a mais uma barbárie.

Aí essa gente toda, do alto do seu antipetismo, antilulismo, talvez saiba o que é pobreza, miséria, de fato.

 


sábado, 1 de junho de 2024

Governo precisa se livrar de um parasita chamado Congresso Nacional

Por Fernando Castilho

Foto: reprodução Internet

No parasitismo, apenas um dos organismos envolvidos é beneficiado e o outro é prejudicado. Sabemos quem está sendo beneficiado e quem, prejudicado.

Lula está fazendo um ótimo governo, pois os índices, todos positivos, falam por si, mas ainda não há uma clara percepção do povo sobre isso. Enquanto não há, a extrema-direita, agora engrossada pela direita que dizem ser civilizada e de diálogo, cresce assustadoramente no Congresso, impondo sua vitória em pautas que prejudicam o país, mas dão aquele gostinho de derrotar Lula. E fazem estardalhaço com isso.

Os fascistas explodem os vídeos nas redes sociais com seus vídeos feitos pra lacrar e faturar muito dinheiro (estima-se que só Nikolas Ferreira lucre mais de 200 mil reais em monetização) e a percepção do povo começa a ser de que o governo é um fracasso.

Há uma divisão de tarefas. Enquanto o Congresso tenta ferrar com o governo Lula, a mídia se encarrega de minar a confiança nele. Além disso, já começa a apresentar uma alternativa a ele, o Tarcísio. Ações combinadas.

Em 2002, a direita, o mercado e a grande mídia deixaram Lula se eleger porque apostaram em seu fracasso, já que o cara era um simples metalúrgico e não teria a capacidade de governar. Apostaram na queda de Lula e, após ser demonstrada a total incapacidade de o PT governar com um projeto de nação com viés socialista, seria, de uma vez por todas, enterrado de vez.

Mas aconteceu o contrário. Criaram a ficção do mensalão em 2005 para tentar derrubar Lula, mas não deu certo. Porém, a investida seguinte logrou êxito ao provocar um golpe em Dilma e afastar definitivamente a esquerda do poder.

Nesse processo, acabaram por criar o monstro Bolsonaro. Exageraram na dose e perceberam, já bem perto das eleições que poderiam terminar sendo comidos pelo monstro fascista que conduziria o Brasil a uma ditadura duradoura. Tentaram, então, uma terceira via, mas esta não vingou. A única saída foi fazer campanha contra a reeleição de Bolsonaro. Vejam que em nenhum momento fizeram campanha para eleger Lula. Este venceu por pouco.

A direita não vai querer correr o risco de ver o PT vencer novamente eleições seguidas. Desta vez, não. Vai tentar destruir Lula antes que ele consiga mais êxitos e consiga mostrar à população que o governo é ótimo.

Não tenho dúvidas de que a guerra contra ele será antecipada e violenta. E já começou. Percebam que toda a ajuda bilionária e inédita ao Rio Grande do Sul ainda não foi reconhecida devido ao trabalho incessante dos fascistas em propagar fake news. Lula, porém, não é neófito e já deve estar se preocupando com isso. O problema é que ele parece estar sozinho. Nenhum de seus ministros consegue acompanhar seu raciocínio e fazer uma análise de conjuntura afiada como ele. Principalmente os de direita que estão no governo, mas também Haddad, que parece preocupado em tentar agradar o mercado, esse mesmo que lhe dá índices pífios de aprovação em pesquisas.

Porém, algo me diz que Lula prepara alguma coisa para reagir. Uma boa ideia, creio que seria, chamar o Zé Dirceu para o governo. Para estar próximo de Lula. Para fazer articulações. Ele é o único que acompanharia o raciocínio de Lula.

Mas, seja isso ou não, é preciso uma reação forte do governo. E tem que ser rápida.



sexta-feira, 22 de dezembro de 2023

O tapa que Quaquá deu em Donato

Por Fernando Castilho

Foto: reprodução

A CPMI do 8 de janeiro perdeu uma grande oportunidade de indiciar os deputados golpistas, talvez por receio de cortar na própria carne. Agora eles continuam a tentar o golpe.


Ficamos chocados com os deputados bolsonaristas que deram as costas para a bandeira do Brasil no plenário da Câmara durante a cerimônia de promulgação da emenda constitucional que reforma o sistema tributário do país? Por quê?

Era totalmente esperado que Lula seria vaiado pela extrema-direita, afinal, ele coroa a finalização de um ano de recuperação com um projeto que impactará economicamente a médio e a longo prazo a vida dos brasileiros. Vale ressaltar que a grande imprensa noticiou que o presidente recebeu aplausos e vaias, como se essas duas manifestações fossem geradas pelo mesmo número de pessoas, o que é totalmente falso, até porque foi a maioria dos parlamentares que votou a favor do projeto.

Já estava tardando uma reação mais violenta às provocações dos bolsonaristas e esta aconteceu pela palma da mão do deputado Washington Quaquá (PT-RJ) que foi parar no rosto do extremista de direita Messias Donato (Republicanos-ES).

Não, não se trata aqui de apoiar ou justificar a atitude de Quaquá, mas lembrar que Donato o provocou. E sabe-se lá o que foi falado.

No ensino fundamental II é muito comum um aluno de repente bater em outro, aparentemente sem motivo algum, mas quase sempre se trata de uma reação a uma grave ofensa. A diferença é que deputados não são pré-adolescentes, mas sim, pessoas eleitas para representar o povo no Congresso Nacional. Por isso, a atitude de Quaquá deve ser criticada.

Donato, mais tarde, foi chorando ao plenário fazer aquele discursinho de que é homem de bem, cristão de família. Aproveitou bem o incidente para se fazer de vítima ao dizer que agora sente muito medo.

No Instagram, Quaquá postou vídeo de Donato chorando e chamou o colega de "fascista chorão". "Adora xingar e agredir os outros, mas não aguenta uma porrada", afirmou.

Se não aprendermos com quem estamos lidando, não saberemos combatê-los. E essa gente só aprenderá debaixo da vara da Justiça.

Às vezes parece que esquecemos que deputados e senadores bolsonaristas foram influenciadores da tentativa de golpe de 8 de janeiro e que ainda estão tentando aglutinar forças para novas investidas.

A CPMI perdeu uma grande oportunidade de indiciar esse pessoal, talvez por receio de cortar na própria carne. Se fossem indiciados, talvez a esta altura se comportassem melhor.

Infelizmente, apesar de Lula ter durante este ano demonstrado a diferença entre os dois governos, Jair Bolsonaro, inacreditavelmente, ainda possui um grande número de apoiadores.

O fato é que os bolsonaristas estão perdidos em seus discursos que não contém propostas para o Brasil nem argumentos para contrapor as medidas que o governo Lula tem tomado. A todo momento só sabem falar de aborto, dama do tráfico e ida de Flávio Dino ao Complexo da Maré.

Nesta semana chegaram à ousadia de tentar encaminhar um processo de impeachment da ministra da saúde, Nísia Trindade por ela ter faltado a uma convocação na comissão de saúde da Câmara, plenamente justificada pela reunião ministerial do presidente Lula. Lembrando que ela já atendeu a inúmeras convocações para falar sobre aborto, drogas e consequências malignas da vacina da Covid. Jamais a questionam sobre a eficiência do SUS, da farmácia popular ou de outras políticas. E ela sempre repete as mesmas coisas. O objetivo é claro: fazer com que os ministros percam seu precioso tempo para boicotar o governo.

Foram contrários a reforma tributária, mas não disseram o que colocariam nela ou dela tirariam porque não têm, repito, propostas.

Esperemos que o novo Procurador Geral da República, Paulo Gonet, comece a aceitar denúncias contra os nomes mais ligados ao fundamentalismo, às fake-news e ao golpismo para que possamos em curto espaço de tempo ver essa gente ser cassada e pagar pelos seus crimes na Papuda, Bangu 8 ou Colmeia.

Parece que agora vai.

 


domingo, 17 de setembro de 2023

Ao lado das medalhas, uma mancha indelével nas fardas verde-oliva

Por Fernando Castilho

Foto: Fernando Souza/AFP

Por que e como os acampamentos dos golpistas em frente aos quartéis foram permitidos? Quem articulou?


Em meu texto anterior, O relatório da CPMI poupará os parlamentares golpistas?, defendi que o relatório da senadora Eliziane Gama na CPMI do 8 de janeiro incluísse, além do indiciamento dos militares envolvidos, uma moção de repúdio ao exército por dar apoio à súcia golpista, destacando que a democracia no Brasil só não foi destruída porque no momento mais crucial, naquele fio da navalha em que o novo governo se encontrava, Lula não solicitou a Garantia da Lei e da Ordem (GLO), que era somente o que as Forças Armadas estavam aguardando.

Por que essa punição, ainda que branda?

O exército, como instituição, não pode ser indiciado em sua totalidade. Somente aqueles militares que participaram direta ou indiretamente da intentona poderão ser condenados.

Porém, refletindo um pouco mais sobre como os acampamentos foram sendo montados em frente aos quartéis, podemos especular sobre como isso foi possível.

Todos sabemos – e isso foi explicado na última sessão da CPMI – que o exército não permite que nenhuma pessoa pare um carro ou permaneça por mais que alguns segundos em frente a um quartel porque o local é designado como área de segurança nacional. Se alguém ousar desobedecer, imediatamente soldados armados com fuzis poderão executar a prisão.

As pessoas inconformadas com a derrota de Jair Bolsonaro começaram aos poucos a montar acampamentos em frente aos quartéis, notadamente o de Brasília, sem que fossem incomodadas.  Pensando nisso, imagine a primeira pessoa que chegou com um carro para descarregar barracas e mantimentos. Ela deveria ter sido retirada dali no mesmo instante em que parou o carro, certo?

Mas, por que isso não aconteceu?

Só há uma possibilidade. Os soldados de plantão já tinham ordens para permitir a montagem dos acampamentos e os acampados já sabiam disso. Ou seja, já havia uma combinação prévia para que isso acontecesse.

Se essa suposição for verdadeira – e acredito que seja – os organizadores já tinham se reunido com o Alto Comando do Exército ou com o ministro da defesa, General Paulo Sérgio.

Quero dizer que essa combinação se deu entre o comando dos golpistas, muito provavelmente Jair Bolsonaro ou seus prepostos, generais Braga Netto e Augusto Heleno. Vale lembrar que os dois faziam parte do grupo que foi montado e que se reunia diariamente numa casa alugada para definir as estratégias após a vitória de Lula, enquanto Bolsonaro se refugiava nos Estados Unidos.

É a isso que a CPMI tem que chegar.

Uma vez permitidos os acampamentos, o exército forneceria água e energia elétrica e permitiria que empresas contribuíssem com alimentos, criando condições para que esses grupos fermentassem durante dois meses seu ódio e ousadia para que no dia 8 de janeiro agissem como ponta de lança do golpe, invadindo a Praça dos Três Poderes e implantando o terror.

Em seguida, num plano muito bem elaborado, diante da gravíssima situação, um presidente atônito e apavorado que havia tomado posse há somente 7 dias, não hesitaria em decretar a GLO.

Porém, o ministro Flávio Dino e Lula, escaldados que são, perceberam a armadilha.

Lula conclamou governadores e ministros do STF para se juntarem a ele para a defesa da democracia e nomeou um interventor para debelar os atos golpistas.

A essa altura, não foi possível mais insistir no golpe, já que as Forças Armadas como um todo a ele não aderiram, preferindo cumprir as novas ordens emanadas pelo interventor Capelli.

Lula parece ter hoje as forças sob seu comando, por isso, é fundamental que seja feita uma limpeza nelas.

Cabe à Polícia Federal indiciar militares golpistas como Braga Netto, Augusto Heleno e o general Dutra e cabe à CPMI indiciar todos e dar uma lição de moral que maculará para sempre a honra do exército através de uma moção de repúdio por ação e omissão por uma tentativa de golpe que colocaria de novo no poder um arruaceiro.

Ao lado das medalhas, uma mancha indelével nas fardas verde-oliva.

 


domingo, 10 de setembro de 2023

Ei, Sakamoto! Lula não foi passear de jet-ski!

Por Fernando Castilho



Há uma distância colossal entre ir à Índia para os fins descritos acima e passear de jet-ski da marinha com dinheiro público, enquanto pessoas morrem ou ficam desabrigadas, como fez Jair Bolsonaro.


Leonardo Sakamoto, colunista do Uol, é um dos jornalistas que mais sofreram ameaças de morte dos bolsonaristas. Foi também uma das poucas vozes do jornalismo tradicional a defender a candidatura de Lula.

Porém, parece que faz parte de uma esquerda namastê, aquela que vive num mundo de fantasia onde todo mundo tem que incondicionalmente ser uma vestal.

Sentir-se mal com a substituição da Ana Moser no Ministério dos Esportes por um elemento do centrão é direito, não só dele, mas de todo o espectro progressista, mas, se for incapaz de compreender as razões que levaram Lula a tomar essa decisão, revela o mundo de fantasia em que vive. O governo precisa de sustentação para aprovar projetos de interesse da população e isso só será possível se tiver maioria no Parlamento. Esse é o jogo político. Ponto.

Mas o que mais chamou a atenção foi a crítica feita a Lula por ter ido à reunião do G20 na Índia, enquanto os desastres climáticos aconteciam no Rio Grande do Sul.

O cara já passou para a oposição ou não entendeu que Lula precisava ir ao G20 porque iria assumir a presidência do grupo dos 20 países mais ricos. Isso é fundamental para que o Brasil se torne novamente uma potência econômica reconhecida mundialmente e investimentos sejam para cá atraídos. Lula nem queria ir devido ao seu problema no fêmur que lhe custará uma cirurgia, mas o evento já estava marcado há tempos.

O povo sofrido do RGS não ficou desamparado. O presidente em exercício (vejam bem, presidente, não um qualquer!) Geraldo Alckmin e um grupo de ministros está acompanhando no feriadão as vítimas, prestando socorros e liberando 800 reais aos desabrigados. Não houve, portanto, descaso do governo.

Há uma distância colossal entre ir à Índia para os fins descritos acima e passear de jet-ski da marinha com dinheiro público, enquanto pessoas morrem ou ficam desabrigadas, como fez Jair Bolsonaro (E daí? Não sou coveiro!) enquanto era presidente.

Uma desonestidade intelectual de Sakamoto.

Uma pena.


sexta-feira, 8 de setembro de 2023

A utilidade e a ética da delação premiada

Por Fernando Castilho

Ilustração: Gustave Doré

Quando Mauro Cid delatar seus companheiros de crimes, os estará traindo. Na Divina Comédia de Dante Alighieri, vemos que está reservado o nono e último círculo do inferno aos traidores, portanto a traição seria o pecado mais grave de todos.


O tenente-coronel Mauro Cid decidiu, enfim, fazer delação premiada a ser avaliada pelo ministro do STF, Alexandre de Moraes.

A imprensa lavajatista agora nos alerta, cinicamente, para o risco de Moraes repetir as ações de Sergio Moro e Deltan Dallagnol.

Lembramos que Moro e Dallagnol espremiam prisioneiros até obterem a delação que almejavam. Foi assim com Leo Pinheiro, dono da OAS.

Pinheiro fora preso e, para poder sair precisava delatar Lula como proprietário do tríplex do Guarujá, porém, em seu depoimento, afirmou que o atual presidente não tinha nada a ver com o imóvel. Somente tinha ido visitá-lo, mas como não gostou, desistiu da intenção de compra.

Moro mandou Pinheiro para o xilindró de novo.

Meses depois, pressionado a delatar, Pinheiro, em novo depoimento, disse que Lula era o dono do apartamento sem apresentar uma única prova. Hoje sabemos que o empresário mentiu para sair do inferno da prisão.

Mas o que é, para nós, leigos em direito, o instituto da delação premiada?

Vamos começar pelos filósofos da corrente utilitarista, Jeremy Benthan e John Stuart Mill que pregavam que toda ação teria justificativa caso se destinassem ao bem-estar das partes afetadas, neste caso, a elucidação dos crimes.

Por este prisma, a delação premiada se justifica juridicamente porque pode ter o poder de jogar luz nos crimes praticados por uma quadrilha e prender seu possível líder, o ex-presidente Jair Bolsonaro.

Porém, na outra mão se encontra uma questão ética difícil de se aceitar.

Sempre ensinamos, ou devíamos ensinar, nossos filhos a serem éticos. Isso significa não ser dedo-duro, não trair a confiança de seus amigos. Muitos presos políticos dos tempos da ditadura, como Dilma Rousseff, por exemplo, sofreram torturas cruéis, mas nunca delataram seus companheiros. Isso é ser ético.

Quando Mauro Cid delatar seus companheiros de crimes, os estará traindo. Na Divina Comédia de Dante Alighieri, vemos que está reservado o nono e último círculo do inferno aos traidores, portanto a traição seria o pecado mais grave de todos.

Mas esse traidor será PREMIADO! Esta é a questão.

Alguém só delata seus companheiros se não for inocente, portanto, Cid é culpado. Portanto, Cid é bandido como os outros, mas poderá receber um prêmio: a redução de talvez dois terços de sua pena.

Uma sociedade que premia um bandido que ainda por cima trai seus companheiros de crime não pode ser dita como sã. Há problemas éticos insuperáveis nisso.

Mas voltemos a Benthan e Stuart Mill.

Embora antiética, essa delação, caso chegue ao mandante do crime e tenha o poder de puni-lo, será útil para toda a sociedade. Vamos dar o devido desconto a isso, então.

Porém, não será essa delação a condenar Jair Bolsonaro pelo seu crime maior, o de, por ação e omissão, ceifar as vidas de centenas de milhares de vítimas da Covid-19.

Para esse crime, como já afirmei antes, não há pena proporcional.

 

E você, o que acha?

Deixe sua opinião nos comentários.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


quinta-feira, 7 de setembro de 2023

Ana Moser está fora. O que fazer?

Por Fernando Castilho

Foto: Ricardo Stuckert

A verdade é que nós que votamos em Lula estamos deixando o presidente sozinho na dificílima tarefa de negociar a governabilidade com Arthur Lira.


Lula, cedendo mais uma vez ao centrão, tirou Ana Moser do Ministério dos Esportes para dar lugar a um tal de Fufuca do PP.

As críticas estão vindo de quase todo lado. Grande mídia (que sempre gosta de ver Lula emparedado) e formadores de opinião da esquerda se unem contra a decisão. Menos os atletas. Ou alguém viu algum deles, a maioria bolsonarista, defender a Ana?

Ninguém procura saber os reais motivos de Lula ao ceder à pressão de Arthur Lira. E eles são claríssimos, não enxerga quem não quer. Ademais, já sabíamos que seria assim, em nome da governabilidade, não?

Lula, em 9 meses de mandato já transformou o Brasil. Seu governo, apesar de todos os obstáculos que o próprio centrão e a grande mídia lhe colocam pela frente, vai cumprindo suas promessas de campanha. O desfile de 7 setembro foi um grande exemplo da transformação do país.

Mas o presidente quer mais. Quer, ao deixar o governo, deixar a marca de melhor mandatário de todos os tempos no Brasil. Melhor ainda que Lula 1 e Lula 2.

Mas a verdade é que nós que votamos em Lula estamos deixando o presidente sozinho na dificílima tarefa de negociar com Arthur Lira. Somos somente críticos sem apontar um caminho, uma direção.

Não saímos às ruas para exigir Ana Moser no Ministério dos Esportes! Os atletas e as torcidas organizadas dos grandes clubes de futebol também não saíram e nunca sairiam porque ou são despolitizados ou são bolsonaristas.

Criticamos sentados confortavelmente em nossas poltronas. Me incluo nisso.

Não há sequer uma liderança que mobilize as pessoas a sair às ruas contra o centrão.

Somente as ruas têm o poder de anular o apetite de Arthur Lira. Os bolsonaristas já as abandonaram. Está na hora de as recuperamos.

Portanto, se não formos às ruas, é aceitar o que está acontecendo ou... aceitar.

A única saída para Lula se livrar do centrão é mandar fazer um monitoramento atento dos ministérios comandados pelo centrão e, ao menor indício de corrupção, denunciar, tornar público, exonerar o sujeito e esfregar na fuça do Arthur Lira.

Que Lula comece pelo Juscelino Filho, das Comunicações, envolvido até o pescoço com denúncias de desvio de dinheiro público.

 

 


quarta-feira, 6 de setembro de 2023

É Lula, gente. Confiem mais no que o velhinho diz

Por Fernando Castilho



Arrepia ver tantos colunistas de nossa esquerda crucificando o presidente por uma opinião ou um conselho, como ele mesmo disse.


“Se eu pudesse dar um conselho, é o seguinte: a sociedade não tem que saber como é que vota um ministro da Suprema Corte. Sabe, eu acho que o cara tem que votar e ninguém precisa saber. Votou a maioria 5 a 4, 6 a 4, 3 a 2. Não precisa ninguém saber foi o Uchôa que votou, foi o Camilo que votou. Aí cada um que perde fica com raiva, cada um que ganha fica feliz”.

Essas foram as frases proferidas por Lula em entrevista a Marcos Uchoa no Conversa com o Presidente.

Pronto! Acabou o mundo! Lula falou besteira!

Me arrepia ver tantos colunistas de nossa esquerda crucificando o presidente por uma opinião ou um conselho, como ele mesmo disse.

Em 1993 Lula, para escândalo da mídia e de parlamentares, disse que na Câmara havia 300 picaretas com anel de doutor. O tempo mostrou que ele só errou no número. Para menos.

É sempre preciso analisar com calma o que Lula quer dizer.

Foi durante o julgamento do mensalão que o então presidente da corte, Joaquim Barbosa, indicado por Lula, caprichou na pavonice ao transmitir as sessões pela TV. Os demais ministros, todos vaidosos como ele, perceberam que estava erguido ali o palco para que eles exibissem suas lustrosas togas.

De lá para cá, o que tem acontecido?

Luís Roberto Barroso, certa feita disse que o Judiciário deveria sentir o clamor do povo. Traduzindo, deveria ceder às pressões quando estas fossem fortes e que dane-se a Constituição.

Gilmar Mendes, o mais pavão de todos, não perde a oportunidade de agradar uns e outros quando lhe convém usando sempre sua erudição e hermenêutica para enganar quem ainda pensa que ele está lá para defender a Carta Magna. Em questões sociais, invariavelmente vota pelo lado do mais forte.

Será que já esqueceram que em 7 de setembro de 2021, Bolsonaro tentou um golpe? E que para insuflar as massas para isso, chamou o ministro Alexandre de Moraes de canalha? E que disse que não iria cumprir decisões dele?

Sabem por que Moraes e sua família são obrigados a manter um corpo de seguranças 24 horas por dia? Alguém sabe como é viver assim?

Sabemos que a fala de Lula contraria a transparência prevista na Constituição, mas ele não sugeriu mudança nenhuma na Carta.

Nos Estados Unidos e em vários países da Europa, todos ditos democráticos, a votação de cada ministro é secreta e só o resultado é divulgado.

Aqui no Brasil temos o instituto do voto monocrático que é aquele em que determinado ministro decide por si mesmo algo que deveria em tese ser decidido pela turma a que ele pertence ou ao plenário. Por quê? Holofotes, minha gente.

Se não foi por holofotes, por que Dias Toffoli, outro indicado por Lula, não permitiu que Lula, então preso pela Lava Jato, apoiada por toda a grande mídia, comparecesse ao velório do irmão? 

Moraes não visou holofotes porque só ganhou dores de cabeças. Corajosamente, teve que carregar muita coisa nas costas porque ele era o relator de vários processos, principalmente contra Jair Bolsonaro. Os demais ministros permaneceram quietinhos durante os anos do capitão por medo de que a súcia os ameaçasse como faz com Moraes. Vejam o que faz uma forte pressão.

Dizem que o novo ministro, Cristiano Zanin, andou votando como os reacionários Nunes Marques e André Mendonça para agradar bolsonaristas e, depois que recebeu críticas da esquerda, votou contra o Marco Temporal das terras indígenas para limpar sua barra. Agora fica bem com a esquerda. Amanhã pode mudar de novo. Não pode ser assim.

Se os votos fossem secretos, logicamente a transparência seria menor, teríamos menos textos a escrever sobre ministros da Suprema Corte e tudo pareceria mais enfadonho.

Não precisamos saber quem é o ministro que condenou o coitado por roubar um frango e votou a favor do Marco Temporal que prejudicaria toda uma população de indígenas que perderiam suas terras. Precisamos saber que, se o coitado foi condenado pelo plenário e o Marco Temporal foi aprovado, o STF como um todo se coloca do lado dos mais poderosos.

Se Lula fizer uma boa indicação para a vaga de Rosa Weber que se aposenta em outubro, a balança poderá pender para os mais desassistidos e é isso que importa.

Lula, como todo ser humano, não é infalível, mas neste caso, precisa ser ouvido com ouvidos que o compreendam segundo uma perspectiva histórica e não imediatista.

 

 

 

 

 

 

 




sábado, 29 de julho de 2023

E por que não um trem-bala brasileiro?

Por Fernando Castilho

Imagem: Forbes


É preciso lembrar que 2016 foi ano do golpe contra Dilma Rousseff e o início do período de trevas inaugurado por Michel Temer e aprofundado por Jair Bolsonaro. É coerente que o projeto de trem-bala tenha parado.


Por estes dias recebi um vídeo que mostra uma verdadeira revolução tecnológica em andamento na cidade de Shenzhen na China.

Toda a frota de ônibus urbanos foi substituída por novíssimos veículos movidos a energia elétrica. Não há mais aquele barulho dos motores a diesel nem a fumaça que era expelida por eles. Além disso, quase todos os carros agora são movidos a eletricidade.

Como Shenzhen consegue a energia elétrica para suprir suas novas demandas?

A resposta está na captação de energia solar com células fotovoltaicas espalhadas por tudo quanto é lugar onde elas possam ser instaladas. Há também captação de energia eólica em bom número. A cidade, que não é pequena (possui uma população de 12,59 milhões de pessoas), parece ser plenamente sustentável e serve atualmente como piloto para toda a China.

Também, no mesmo vídeo, vemos como a China com suas dimensões continentais está promovendo a largos passos a integração nacional através do trem-bala elétrico. É essa integração que permite ampliar de maneira significativa comércio e serviços, implementando o crescimento econômico.

É preciso lembrar que talvez o Japão seja hoje a grande potência que conhecemos devido à integração nacional por suas linhas ferroviárias normais cuja construção se iniciou no final do século 19 e que somam hoje incríveis 27.268 km, e pelo trem-bala, o shinkansen, ícone no país e motivo de orgulho nacional para o povo japonês, que começou a operar em 1964, cobrindo hoje todo o Japão.

É neste ponto que pergunto: e o Brasil?

Bem, o terceiro governo Lula começou a apenas quase 8 meses com o imenso desafio de reconstruir um país praticamente destroçado por um presidente totalmente desqualificado e mal-intencionado para o cargo. A missão de recolocar o país em pé, surpreendentemente, vem sendo cumprida em tempo recorde: os programas sociais que haviam sido extintos ou paralisados voltaram a funcionar, o prestígio do Brasil lá fora foi recuperado e coloca o país entre os grandes do planeta e a economia começa a ir de vento em popa com inflação controlada e queda no desemprego e no dólar. Quando a taxa de juros baixar para níveis aceitáveis, o país decolará.

Por que falo isso? Porque Lula tem a oportunidade histórica de não só ser o presidente que acabou com a fome dos brasileiros, desafio que ele mesmo impôs a si, mas de revolucionar o Brasil tecnologicamente como faz a China. Um verdadeiro up-grade no país!

É possível?

Vejamos, o Brasil tem dimensões continentais como a China. Porém, diferentemente dela, tem usinas hidrelétricas em bom número. Além disso, a captação de energia solar e eólica vem se ampliando muito e hoje representa 24% de toda matriz energética.

Portanto, temos capacidade de suprir uma frota de veículos em cidades-piloto, como, por exemplo, Campinas, para que depois possa se ampliar para todo o Brasil.

 E por que não o trem-bala?

Segundo o site Mobility Now, “Se as promessas feitas uma década atrás tivessem se concretizado, hoje seria possível entrar em um trem-bala na estação do Campo de Marte, zona norte de São Paulo, pagar R$ 400 numa passagem direto para o Rio de Janeiro (com escalas em Volta Redonda e São José dos Campos), viajar a 350 km/h e chegar em apenas uma hora e meia na estação Barão de Mauá, no centro da capital fluminense. Nada mal.”

Por que não deu certo?

Ainda, segundo o mesmo site, “Esse sonho, que hoje parece absurdamente distante, já esteve tão perto da realidade que foi quase possível tocá-lo. Grande promessa do governo Lula, o trem-bala deveria ficar pronto para a Copa do Mundo de 2014. Quando as primeiras datas se provaram impraticáveis, o projeto foi revisto e estimado para as Olimpíadas de 2016.”

Neste ponto é preciso lembrar que 2016 foi ano do golpe contra Dilma Rousseff e o início do período de trevas inaugurado por Michel Temer e aprofundado por Jair Bolsonaro. É coerente que um projeto tão inovador tenha parado.

Mas agora já é possível sonhar novamente.

A ótima notícia é que a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) autorizou a construção dos trilhos no início deste ano, com a informação de que a empresa TAV Brasil prevê iniciar suas operações com o trem-bala interligando o eixo Rio-São Paulo.

Mas, em que pese o acerto de se implantar o primeiro trem-bala no país, a necessidade é que se construa uma rede ferroviária moderna para trens de carga e de passageiros que integre todo o país. Não é mais possível, em pleno século 21, que o escoamento da produção seja feito por milhares de poluentes caminhões.

Se o governo Lula compreender essa necessidade e ousar como fez com a transposição do Rio São Francisco obra majestosa que se estende por 477 quilômetros e tida como impossível por seus críticos, levando hoje água para milhões de brasileiros no Nordeste, será o presidente que integrou o país e que o elevou a um outro patamar tecnológico.

Quem sabe?


Link para o vídeo: (793) China: Revolução do Transporte: Trem Bala e os Carros Elétricos | Expresso Futuro com Ronaldo Lemos - YouTube