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sábado, 2 de julho de 2022

O estulto do crime

Por Fernando Castilho


Imagem: Gladson Targa


 
Hitler, Mussolini, Stalin, Salazar, Franco, Pinochet, Idi Amin Dada, César, Gengis Khan, os presidentes-ditadores do regime militar do Brasil...  a lista é gigantesca.


Em 1940 foi lançado no gibi do Capitão Marvel, um gênio do crime, o cientista louco, Dr. Silvana, aquele que queria destruir o mundo para depois dominá-lo como um grande ditador.

Invariavelmente, nas páginas do gibi, o Herói, Capitão Marvel, o derrotava, mas, como tiririca (a erva daninha e não o deputado), o vilão sempre ressurgia.

No mesmo ano, outro supervilão surgiu, desta vez nas páginas do gibi do Super-Homem. Lex Luthor, um engenheiro perito em biologia e genética, se empenhava em descobrir formas de aniquilar o Super-Homem, o alienígena vulnerável apenas à Kriptonita, mineral somente existente em seu planeta natal. Luthor, como Dr. Silvana, era um gênio da tecnologia e do crime e também queria dominar o planeta.

Bem mais tarde, surgiria o satânico Dr. No, também um gênio da Física e do crime, que buscava, adivinhe, se tornar um ditador do mundo. Um agente secreto britânico chamado Bond, James Bond, cuja alcunha era 007, foi escalado para combatê-lo.

A ficção é recorrente e fértil para o surgimento de inúmeros supervilões.

Na vida real existiram vários nomes reais que sonharam em dominar o planeta ou, pelo menos, seus países. Curiosamente, nenhum deles era gênio e nenhum deles prezava a Ciência. A realidade se distancia totalmente da ficção.

Hitler, Mussolini, Stalin, Salazar, Franco, Pinochet, Idi Amin Dada, César, Gengis Khan, os presidentes-ditadores do regime militar do Brasil...  a lista é gigantesca.

Mas, se nenhum deles era gênio da Ciência, como puderam chegar ao poder?

A ousadia, a estratégia, o senso de oportunismo, o egocentrismo sem limites, o autoritarismo, a truculência, o desrespeito total às minorias, a total falta de empatia, o pragmatismo, a inclemência e a crueldade os conduziram ao poder diante de populações tolerantes, passivas, enganadas, indignadas e impotentes diante da tirania. Entre essas “qualidades”, a estratégia e o senso de oportunismo, de longe, são as mais importantes.

Em comum, o que todos eles têm é o destino a que foram relegados. Suicídios, golpes violentos, prisões, assassinatos, vinganças e, por fim, a lata de lixo da História.

No Brasil de 2022, o ambiente é fertilmente propício a uma ditadura novamente, porém, o contexto e a própria figura do candidato a ditador são diametralmente diferentes dos ditadores convencionais.

Bolsonaro, com certeza, não é nenhum gênio da estratégia e do oportunismo, embora possua as outras características comuns aos ditadores da vida real. É zero empático e muito cruel, como demonstrou durante a pandemia, e alimenta sonhos ditatoriais.

Pela maneira como vem conduzindo o governo, cuja linha de tempo se assemelha mais à trajetória de um bêbado de madrugada pela calçada, pelas inúmeras bobagens que fala e pelas ações ilógicas que empreende, o Capitão Morte (não Marvel) poderia ser classificado como um estulto do crime (já que seus crimes se acumulam) e, agravado pela sua total negação, um obtuso da Ciência.

Mas, o que faz com que uma súcia de quase 30% da população brasileira siga um estulto criminoso?

Precisam de alguém que os represente. Só isso. Não diferem dele.

Os autores das histórias do Capitão Marvel, do Super-Homem e do James Bond jamais pensaram em colocar em seus argumentos o elemento povo seguidor, talvez porque os vilões não eram políticos.

Talvez os heróis da ficção não conseguissem derrotar vilões com representação na população, como o Capitão Morte.

Para esse tipo de vilão precisamos de um herói com muito mais votos que ele, com propostas que ampliem a democracia e que garantam uma vida melhor ao povo. Enfim, sua antítese.

Precisamos de um gênio do bem, de alguém que, embora não tenha tido acesso ao que a Ciência afirma, não a trata com desdém, mas a respeita.

Lula!

 


domingo, 3 de abril de 2022

A mentira de um general que ofende a todos que lutaram contra a ditadura

Por Fernando Castilho


Arquivo nacional


Continuando a fugir da guerra que se instaurara, decidimos pular a catraca do Cine Ipiranga e entrar no meio de uma sessão em uma sala quase vazia para nos escondermos agachados no escuro atrás da última fileira. Mas não demora muito tempo para sentir um cano frio me pressionando a nuca.

 

Estamos saindo em grande número em passeata desde a Cidade Universitária até a Praça Fernando Costa onde haverá uma concentração e um ato público contra a ditadura. Uma das razões para o protesto é a morte do jornalista Vladimir Herzog, assassinado nas dependências do DOI-Codi em 1975. Simularam um suicídio por enforcamento.

Meu pai já tinha me informado que a repressão estaria na praça aguardando os estudantes e que seria violenta. Que eu tomasse muito cuidado.

Ao chegarmos, vejo que ele tinha razão. Há um grande contingente de policiais militares e soldados tomando toda a praça. Começam os lançamentos de bombas de gás lacrimogêneo, tiros e cavalaria perseguindo todos que se encontram no local. Há muita fumaça, barulho e palavras de ordem que não consigo entender. O lugar vira um inferno.

Preciso correr. Atrás de mim, um soldado tenta me alcançar com um chicote e cada vez que a ponta bate no chão, faíscas saem dela. Será um chicote elétrico? Mas nesta época não existem ainda baterias para isso. Provavelmente a ponta é metálica, mas não há tempo para verificar isso.

Logo uma colega da faculdade, a Anne Marie, se junta a mim. Após uns cem metros. o soldado desiste de nós e prefere perseguir outra estudante.

Continuando a fugir da guerra que se instaurara, decidimos pular a catraca do Cine Ipiranga e entrar no meio de uma sessão em uma sala quase vazia para nos escondermos agachados no escuro atrás da última fileira. Mas não demora muito tempo para sentir um cano frio me pressionando a nuca.

Agora levados, Anne Marie e eu, pelo soldado com arma na mão para o camburão, sentamo-nos junto com mais quatro homens que reclamam por terem sido presos. Os bancos inteiriços são dispostos lateralmente na viatura, de forma que três dos homens se sentam à nossa frente e um ao nosso lado. Se dizem operários que passavam pelo local e não sabem o que está acontecendo.

À minha frente o quarto homem, um rapaz com cara de estudante me faz sinais estranhos com os olhos que se dirigem a direção dos que estão ao seu lado. Demoro um pouco a perceber que ele está querendo me dizer para desconfiar e ficar quieto. Os “operários” dizem que não sabem o que está acontecendo, que estavam voltando do trabalho e que os militares safados estão abusando de todo mundo. Percebo agora que eles querem obter informações e me calo.

A viatura roda conosco durante mais de uma hora correndo muito com a sirena ligada e fazendo curvas fechadas que assustam e nos desequilibram. Os pneus “cantam” o tempo todo. O ar começa a ficar rarefeito e o calor se torna insuportável, mas, enquanto Anne Marie e eu estamos apavorados, os dois homens à frente parecem familiarizados com o procedimento.

Permanecemos eu e minha colega o tempo todo calados enquanto os três tentam puxar conversa e fazer com que falemos alguma coisa.

O suor escorre a cântaros, não só pelo calor infernal, mas também pelo medo do que podem fazer conosco quando a corrida terminar.

Enfim o camburão para.

Soldados do lado de fora abrem a porta traseira e formam duas fileiras de homens voltadas de frente uma para a outra. Em seguida nos mandam descer.

Os três “operários” descem primeiro, percorrem o corredor sem serem molestados e desaparecem. Em seguida, eu, Anne Marie e o outro estudante, descemos. Teremos que passar pelo meio das fileiras de soldados. É o chamado “corredor polonês”. Passamos correndo, mas apanhando muito daqueles cassetetes.

Quando, enfim, paramos, vemos que ninguém parece nos seguir.

Ao olhar em volta reconheço o prédio da Faculdade de Direito do Largo São Francisco.

Achamos melhor nos separarmos e nos despedirmos.

Em seguida tomo um ônibus para casa.

 

Este relato, extraído de meu livro Um Humano Num Pálido Ponto Azul, editora Mondrongo, de forma alguma, tem a pretensão de se equivaler a outros muito mais dolorosos, como o recente de Paulo Coelho que sofreu bárbara tortura e escapou por pouco da morte.

Também não se equivale em gravidade à tortura que a jornalista Míriam Leitão, então com 19 anos e grávida, sofreu nas dependências do Doi-Codi. Logo ao chegar, ela apanhou com socos e chutes e foi colocada nua numa sala escura, a sós com uma cobra jiboia.


Na verdade, meu relato pessoal, muito mais brando do que os de Paulo Coelho e Míriam Leitão, tem o intuito de apenas ser mais um a contribuir para ilustrar que a ditadura militar no Brasil, fruto de um golpe de estado, nunca foi um movimento, nem foi fruto de anseio popular como o general Braga Netto afirmou em sua última ordem do dia de 31 de março de 2022.

Não, general, João Goulart, à época do golpe, tinha, segundo pesquisa Ibope da época, cerca de 70% de aprovação da população, portanto não foi anseio do povo brasileiro, mas sim, do Departamento de Estado norte-americano. E o senhor sabe disso.

Aliás, se a democracia não fosse restaurada, quem garante que o senhor seria hoje membro de um governo eleito -  mesmo que de maneira fraudulenta - e estaria à vontade para falar asneiras e ameaçar mais um golpe, caso seu chefe não vença as eleições de 2022?

A história está registrada e não vai ser a fala de um general saudoso da ditadura que vai modificá-la.

O dia 31 de março de 2022 ficou lá pra trás e quase já estávamos nos esquecendo dele com tanta notícia nova acontecendo todos os dias, quando o deputado Eduardo Bolsonaro, o 03, ou zero nada, se insurgiu no twitter justamente contra uma nota de Míriam Leitão.

A jornalista estava comentando as declarações recentes do presidente que atacavam as instituições democráticas.

Eduardo não se conteve e expôs toda a sua crueldade e falta de empatia ao debochar de Míriam respondendo: “ainda com pena de cobra”.

Vários partidos afirmaram que vão representar contra o zero no conselho de ética da Câmara, o mínimo a ser feito.

A verdade é que se conseguirmos defenestrar Bolsonaro do poder após as eleições, há que se fazer uma faxina geral nessa turba autoritária, obscurantista e louca por dinheiro que se instalou no poder.

É uma pena que tipos como o filhão zero ainda conseguirão se reeleger.


Editado em 04/04/2022


Também publicado em Construir Resistência:

https://construirresistencia.com.br/mentira-de-um-general-que-ofende-a-todos-que-lutaram-contra-a-ditadura/


Também publicado em Medium Brasil:

https://medium.com/@fernandocastilho/a-mentira-de-um-general-que-ofende-a-todos-que-lutaram-contra-a-ditadura-553605150fe2




sexta-feira, 25 de fevereiro de 2022

Por que os militares se submetem a tanta humilhação?

Por Fernando Castilho


Foto: Alan Santos / Agência O Globo


Como se sentem esses militares de alta patente sendo relegados a um segundo plano por Bolsonaro e seu filho? Tendo que ficar em pé porque Carlos se sentou ao lado do pai?


Na época da ditadura as Forças Armadas do Brasil se impunham pela força, aparência agressiva e ações violentas contra os direitos humanos, prendendo, torturando e matando quem lutava contra o regime.

No imaginário popular ficou a imagem, que perdura até hoje em muitas mentes, de um exército firme em suas convicções e incorruptível. Sabemos, pela História que não é bem assim. Há inúmeras evidências de corrupção não investigada nem punida, já que a imprensa era impedida de investigar e noticiar e os órgãos de controle estavam submetidos ao regime.

Mas uma coisa é certa: para a grande maioria da população as Forças Armadas se destacam pela rígida disciplina e hierarquia, além dos valores de defesa da Pátria e da soberania.

Mas então, por que se humilham quase que diariamente perante um capitão pateta que está presidente, mas que pode ser defenestrado pelas urnas nos próximos meses?

Dois casos. Vamos ao primeiro.

Quando Bolsonaro empreendeu a patética visita à Rússia, levou com ele não só os ministros-generais Ramos, Heleno e Braga Netto, mas também seu filho Carlos, uma espécie de vereador federal, caso único no mundo.

Sentados à mesa numa das reuniões com escalões inferiores do governo russo, estavam Bolsonaro e Carlos lado a lado e, mais afastado, Braga Netto. Em pé, o general Ramos e ao fundo, o general Heleno.

Como se sentem esses militares de alta patente sendo relegados a um segundo plano por Bolsonaro e seu filho? Tendo que ficar em pé porque Carlos se sentou ao lado do pai?

Agora vamos ao segundo.

O capitão viajou para São José do Rio Preto para inaugurar uma obra e fazer campanha eleitoral antecipada promovendo uma motociata, algo que lhe enche de prazer e, segundo ele, atesta sua popularidade. Se comporta como um estudante que cabula aula escapando da agenda presidencial, algo muito entediante para ele.

Em seu lugar ficou o vice-presidente, general Mourão.

Perguntado por jornalistas sobre a situação na Ucrânia, o militar condenou a invasão daquele país por parte da Rússia e comparou Vladimir Putin a Adolph Hitler. Não vou entrar no mérito da comparação descabida feita por quem revela não ter o mínimo conhecimento de geopolítica.

Mas, como sempre acontece quando Mourão dá uma declaração à imprensa, Bolsonaro ficou incomodado e, em sua live tradicional das quintas-feiras não se conteve e espinafrou seu vice novamente.

"O artigo 84 da Constituição diz que quem fala sobre este assunto é o presidente. E o presidente se chama Jair Messias Bolsonaro. E ponto final. Então, com todo respeito a esta pessoa que falou isso, e eu vi as imagens, falou mesmo, está falando algo que não deve, que não é de competência dela”, disse ele.

O que mais chama a atenção é a covardia do capitão ao não citar o nome de Mourão, dando uma indireta pra lá de direta. Mas além disso, se afirma como um ser terrivelmente autoritário que não permite que seu vice emita sua opinião.

Mas o mais grave nem é isso.

Onde estão as rígidas disciplina e hierarquia? Onde foi parar a altivez de um general perante um capitão, mesmo ele sendo presidente?

Para que serve aquele grande número de medalhas obtidas nas batalhas das quais nunca participou e em que em ocasiões solenes Mourão costuma ostentar no peito?

Para que serve um vice-presidente sempre humilhado pelo titular?

Mourão deveria pegar seu boné e renunciar. Mas, e o salário?

Os militares que participam do governo acumulam vencimentos das Forças Armadas com o que recebem em seus cargos e o salário do general Mourão é de cerca de 65 mil reais na vice-presidência! Pra não fazer quase nada.

Isso significa que, se Bolsonaro ordenar que qualquer um de seus generais passe a lhe servir o cafezinho, eles o farão.

Quando esse governo terminar os maiores prejudicados, além do capitão, que terá que responder a inúmeros processos, serão os militares, os que dele participam e os que não.

Qual será a imagem que ficará dessa aventura a que nossas Forças Armadas decidiram participar?

De gente incompetente, ávida por dinheiro, picanha, atum, uísque e vinho.

E disposta a se humilhar diante de seu dono para garantir sua mamata.

  

 

 

 

 


quinta-feira, 20 de janeiro de 2022

A Copa que não comemorei

 Por Elza Soares




Além de ter sido um período muito difícil para o Brasil, a ditadura militar foi quando tive minha casa metralhada. Estávamos todos lá: eu, Garrincha e meus filhos. Os caras entraram, metralharam tudo e nunca soube o motivo.

Era 1970, já tínhamos recebido telefonemas e cartas anônimas, nos sentíamos ameaçados e deixamos o país. Acredito que fizeram isso por conta do Garrincha, mas também por mim, pois eu era muito inflamada e então, como ainda hoje, de falar o que penso. Eu andava muito com o Geraldo Vandré e devem ter pensado que eu estava envolvida com política. Mas eu sou uma operária da música, e qual é o operário que não se revolta?

Fomos para Roma, e lá o Garrincha, que não tinha sido convocado para aquela Copa, estava em desespero por não estar jogando e por não ter onde morar. Estávamos num hotel, vendo o Brasil ser campeão. Foi quando o Juca Chaves foi comemorar na Piazza Navona, onde fica a embaixada brasileira.

Estávamos trancados dentro de um apartamento, e o Garrincha queria sair de qualquer maneira: queria participar da festa, mas ao mesmo tempo estava altamente deprimido. Ele perdeu a casa, teve de deixar o país e não sabíamos como voltar.

Enquanto se celebrava o fato de o país se tornar o primeiro tricampeão na história da Copa do Mundo, o Brasil fazia barbaridades com sua população. O Garrincha sentia um misto de alegria e dor, porque ele queria comemorar, mas, ao mesmo tempo, sentia repulsa por tudo que nos havia acontecido.

Imagine o que é para um homem que, para mim, está acima de qualquer nome no futebol brasileiro, ser mandado embora do país. Isso já é tenebroso, vergonhoso; imagine então esse homem vendo aquela conquista, confinado numa selva de pedra, no exterior, sem entender nada, sem saber o que havia acontecido com nossa casa.

Aquela foi a época em que ele mais bebeu, e não saía de casa, pois tinha vergonha de aparecer embriagado. Eu fazia de tudo para ele não beber, mas não adiantava.

Era tão grande a minha angústia que eu tinha vontade de invadir a embaixada brasileira em Roma. Mas segurei a onda. Continuamos vivendo num hotel e tivemos grande ajuda de Chico Buarque e Marieta. Eles tinham se exilado na cidade e foram dois amigos de alma.

Ali eu tive um bom empresário, trabalhei muito e fui ganhando o dinheiro com o qual pagava todas as contas. Durante um jantar, conheci Ella Fitzgerald, que estava fazendo shows com repertório de bossa nova e teve um problema de saúde. Eu acabei substituindo-a.

Mas, quando descobriram que eu estava trabalhando na Itália sem documentação, tivemos de sair de Roma -então fomos para Portugal por um tempo.

Um dia, estávamos no Cassino Estoril, perto de Lisboa, e encontramos o apresentador Flávio Cavalcanti e o Maurício Sherman, que dirigia um programa na TV Tupi. Eles deram ao Garrincha uma camisa do Brasil, querendo homenageá-lo -mas quem queria camisa da seleção naquela altura?

"Obrigado o..., cadê minha casa, cadê minha moradia? Já vesti a camisa do Brasil anteriormente, já dei tudo que eu poderia ter dado ao Brasil", ele disse.

Passados 50 anos do golpe, ninguém jamais tomou nenhuma atitude sobre o que nos aconteceu naquele 1970, e eu continuo brigando pelo Mané, até hoje.

Quando eu canto "Meu Guri", canto com muita força, e essa é uma maneira que eu tenho de cantar uma música do Chico, mas homenageando o Mané. Eles são os dois guris de "my life".


terça-feira, 18 de janeiro de 2022

Uma menina

Por Virgílio Almansur


DILMA resistiu estoicamente. Sofreu muito! Pense numa menina aos 23 anos. Pense em suas filhas chegando a essa idade e submetida à barbárie! Pense no algoz, naquele assassino homenageado em 17/04/16 por ninguém menos que um vagabundo de estribeira, do baixíssimo clero, aclamado como mito, nada mais que um palmito... Pense em suas meninas, em suas namoradinhas... Pense numa sobrinha; pense numa neta. Pense tão somente na garota que você amou ou ama. Pense na filha do vizinho que você viu nascer, na prima distante que você vê nos albuns de família. Pense na gata da praia que você olha até ela desaparecer e voltar deixando-o atônito pela curvilínea expressão de um corpo a atrair os deuses da beleza enquanto você boquiaberto perde o senso da razão e exprime aquele “meu deusxxx!!!” Pense! Pense em todas as meninas... Pense na menina frentista balouçando seus seios enquanto limpa seu vidro dianteiro. Pense! Pense ainda nessa menina que você imagina pura, desinibida, galhofeira, alegre, festiva e colega, colega de sua filha ou sobrinha, sobrinha de sua melhor amiga, neta de seu grande companheiro... Pense!!! Não deixe de pensar na mais incrível emoção em ver uma menina desabrochando para a vida, conquistando a universidade, fazendo seus estágios, começando a trabalhar e contando novas a cada dia de suas conquistas. Pense na aventura que essa menina terá pela frente, nas histórias que comporá e nas promessas que cumprirá ou não... Pense na menina... Pense agora que essa menina terá o Estado contra ela; ela que imaginou resistir em entregar esse mesmo Estado à mãos criminosas, estúpidos plantonistas que se sentem ainda hoje donos desse pedaço alviverde. Pense nessa menina sendo surrada, espancada, chutada e seviciada. É a sua filha, lembra? Sua sobrinha! Sua vizinha que você viu nascer. A netinha de sua melhor amiga... Sua namoradinha desde os 14 e que agora conta com 23 anos e o presidente de seu país, a tal pátria amada, quer lhe dar algumas lições. Pense na sua menina sendo açoitada; pense agora que essa menina resiste, pouco chora mesmo apanhando. Pense! Pense na sua capacidade de resistir, mesmo solitária, numa solitária, sendo coberta por fezes e urina. Pense agora, que o terror, aclamado e venerado, será parte das brincadeiras de um monstro representante das chamadas forças armadas; um herói! Aquele coronel venerado pelo inominável e seu vice burlesco, homenageado como um herói brilhante; um ustra... Este convidará expectadores, voyeurs quase profissionais para um espetáculo que irá se repetir por dias, meses e anos... Pense na menina exposta, amarrada pelos pés num batente... Pense agora naquela gata de outrora rindo mas sob abuso, acuada, tendo suas partes íntimas exploradas por um cacetete emborrachado. Pense! Tapas e mais tapas nas orelhas... Sim! Você ouviu e viu... Tapas e mordidas... Mordidas de um, dois, três... A satisfação é garantida. E há quem pague, vindo correndo de uma das avenidas mais famosas do Brasil varonil... O coronel é banbanban... Laureado como herói do inglório exército cumprirá com o que seu aluno esperou com muita certeza ao tê-lo invocado. Pense na menina sendo penetrada inúmeras vezes; primeiro frontalmente promovendo dor e depois sob aviso de empalamento e o sangue jorrando pelas costas com muito mais dor. Pense naquela garota. Pense na menina graciosa sob espancamento, com as pernas abertas e sua intimidade não só exposta mas quase dilacerada. Pense! Observe que há eletrodos em seus grandes lábios já arroxeados quase necrosados. Sim!!! É isso mesmo! Você está vendo um coronel do exército brasileiro praticando seu esporte preferido: subjugar aquela menina de suas lembranças para que ela confesse o inconfessável ou o já sabido. Um dia ele confessará: “...Era preciso! Era necessário!”. Pense então que a sua namoradinha de antanho agora não reagirá mais com naturalidade. Ela requererá uma atenção especial por muito tempo, eis que mutilada na carne e no espírito. A sua menina está com escoriações. Um caminhão a atropelou. As maçãs do rosto estão esmagadas e a mandíbula não mais se encaixa... Pense na garotinha que você gerou, viu nascer, cuidou, criou, ensinou e agora balança num pau-de-arara e recebe palmadas. Está como um franguinho pronto pra ser assado. Pense naquelas lindas mãos que o afagava. Já estão sem unhas, extraídas com um alicate. O coronel, o terror da menina, ainda usa um alfinete: aplica-o sob o que resta da faixa ungueal para prender a carne exposta. A menina grita e recebe um safanão. Aquela menina novinha está irreconhecível, quase cadavérica. Pense na gata que você babava quando via... Pense! Pense nessa menina levando choques e mais choques e depois jogada às jaulas fétidas com companheiras já trucidadas. Continue pensando! Você, nós, lamentavelmente, contribuímos para o escarnecimento, para que essa gentalha voltasse. Foram se insinuando, deram pitacos irresponsáveis, ousaram desafiar a própria instituição, vestiram-se de maçons ilibados e contribuíram para um massacre durante dois anos pandêmicos. Ficamos calados! Nós sabíamos quem eram!!! O “terror de Dilma” foi bem recebido, não foi repudiado; todo congresso admitiu... Nenhuma sanção, nenhuma representação, nada de ética... Fomos e continuamos covardes!


Meu comentário: uma menina que jamais iria para o BBB

sábado, 22 de novembro de 2014

Alexandre Garcia, o porta-voz da ditadura

Por Fernando Castilho





Alexandre Garcia cometendo um crime

O nome é Alexandre Garcia


A ideia do texto não é promover o jornalista, mas sim, desmascarar a falsa moral com que ele se reveste.


No começo da década de 70, Garcia era um jovem jornalista à caça de uma oportunidade para se projetar. Percebeu-a ao trabalhar em Brasília, no Jornal do Brasil, na época de Ernesto Geisel. Mas sua chance de ouro apareceu ao ser convidado, lambe botas que era, para ser porta-voz de João Figueiredo, o último dos ditadores.


Sempre destacando os ''grandes feitos'' de seu herói, sem jamais noticiar ao povo brasileiro as torturas e mortes que aconteciam nos porões da ditadura, ganhou fama e projeção nacional.
Tanta fama, que logo após ter sido entrevistado pela incipiente revista Playboy, segundo Giovani de Morais e Silva em seu blog O Cachete, Garcia foi assediado pela publicação concorrente, a revista Ele & Ela, que queria, também, fotografá-lo. O próprio Alexandre narra o episódio em uma entrevista concedida, em agosto de 2006, a Marcone Formiga, do Brasília em Dia:
” Eu havia sido entrevistado para a “Playboy” e aí o Flavinho Cavalcante, na época da Bloch, disse que a “Ele & Ela” também queria uma entrevista. Só que maior, com fotos. Fui perguntar para o meu guru, o ministro Golbery, que respondeu: “Pode, sim. Vamos, em breve, tirar o Farhat. Vamos extinguir a Secretaria de Comunicação Social e queremos que você fique como secretário de Imprensa. Nada como dar uma entrevista para uma revista masculina para projetar mais o seu nome, para virar depois secretário de Imprensa”. Dei a entrevista, revisei, praticamente copidesquei.


Então aquilo que está lá é meu mesmo. O Flavinho me trouxe o primeiro exemplar que entreguei para o Figueiredo ler. O Figueiredo leu a bordo de um Búfalo em uma viagem a Pindamonhangaba. Até aconteceu uma coisa engraçada…Estourou um cano do sistema hidráulico do avião sujando as calças do presidente… Quando ele foi trocar as calças olhou para mim e disse: “É perigoso tirar as calças na sua frente”! (risos) Foi a única observação que ele me fez a respeito da entrevista.”


Na reportagem da Ele & Ela, que exibiu o jornalista deitado em uma cama, de cueca, cuidadosamente recoberto por uma felpuda toalha, Garcia revelou que era ali que ele “abatia suas lebres”, aludindo à locução cunhada por Carlos Imperial para referir-se às mulheres com quem mantivera conjunções lascivas.




Alexandre Garcia, telefonando para uma das lebres

Ficou envergonhado? O blogueiro também. Mas tem muito mais.


Garcia esquecera que trabalhava para um ditador afeito à censura. Pisou na bola e foi demitido.


Segundo Altamiro Borges, no blog do Miro, em 2009, em artigo publicado em vários jornais, ele defendeu na maior caradura os golpes militares em Honduras e no Brasil. Intitulado “Zelaya e Goulart”, o texto tenta desqualificar a atuação soberana e altiva da diplomacia brasileira na crise deste sofrido país da América Central.


Para o “jornalista”, que mais se parece um porta-voz dos golpistas, a política externa do governo Lula seria equivoca. “O Brasil insiste em ficar na contramão, considerando Zelaya presidente de Honduras. Insiste em dizer que houve um golpe”. Na sua visão direitista, que serve para justiçar atentados à democracia e mesmo torturas, assassinatos e censura, não houve um golpe, mas um “contragolpe”. E ele ainda tenta justificar seu raciocínio tacanho, de viés fascista.


Portanto, aí está. Esse é o homem.


Apresentador de telejornais da Globo, colunista de jornais e de rádios, Alexandre Garcia é uma figura de aparência respeitável, fala firme e boa dicção. Assim como outro da mesma laia, Arnaldo Jabor, possui uma legião de admiradores, fãs de carteirinha, que não hesitam em publicar suas ''belas'' falas na internet.


Mais um indignado seletivo que não fala sobre a sonegação de impostos de seu patrão.



Mas agora, quando impeachloides e patetas que querem a volta da ditadura saem às ruas contra Dilma, Garcia percebe outra oportunidade: a da volta ao passado.
O jornalista mente descaradamente ao afirmar que Renato Duque, ex-diretor da Petrobrás, desviava dinheiro da companhia para financiamento de campanhas do PT. As campanhas foram financiadas pelas empreiteiras. As do PT, do PSDB, do PMDB, do PP, do DEM, do PSB, enfim, de todos.


Tem sido assim desde sempre. As empreiteiras só não financiavam campanhas dos militares porque não havia eleições. Mas começaram a enriquecer naquela época, pois os procedimentos não eram de forma alguma transparentes, e a corrupção era ainda muito maior. Bastava puxar o saco de um general, que qualquer obra saia, e superfaturada. Ninguém investigava mesmo...


Garcia também comete um crime, que deveria ser investigado pelo Ministério Público. Insufla o ódio entre os fascistas que querem a derrubada do regime, ao afirmar que os 53 milhões de brasileiros que votaram em Dilma são cúmplices do crime cometido.


Ora, cúmplices também são bandidos, e bandidos tem que ser presos. Mas, se não é possível que se prenda 53 milhões de pessoas, que se faça justiçamento, é o que ele quer dizer. Que todo e qualquer reaça saia batendo em quem votou em Dilma.


Estamos assistindo passivos, a jornalistas, em rede nacional, conclamando pessoas a bater em outras pessoas, somente por terem posição política diferente, jornalistas como Sheherazade, ordenando o justiçamento de suspeitos de crimes, pastores e políticos pedindo aos homens de bem que não tolerem homossexuais.


Meu consolo é que o jornalistazinho já está com 74 anos, deveria, como seus ídolos do passado, vestir o pijama e esperar o dia em que levará seu ódio e sua biografia para sete palmos abaixo do solo.


Meu desconsolo é que, no lugar dele já há outros mais novos.


Ouça aqui, a fala de Alexandre Garcia:


http://pocos10.com.br/?p=16036


Não cabe a Comissão da Verdade para ele?



Gostaria de comentar? Fique à vontade.