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segunda-feira, 21 de outubro de 2024

Carta Aberta dos aposentados da Revisão da Vida toda ao presidente Lula

Por Fernando Castilho





Senhor presidente Lula, o senhor, por inúmeras vezes, demonstrou que sabe o que é passar fome e, por isso, seu governo está especialmente empenhado em garantir que todos os brasileiros tenham ao menos três refeições ao dia. Porém, o senhor realmente sabe o que é estar aposentado, com mãos que se tornaram rudes pelo esforço, com costas que se curvaram sob o peso dos anos e com dores que se tornaram nossas companheiras constantes, após trabalhar por 50, 60 anos, recebendo como aposentadoria apenas um salário-mínimo ou pouco mais?

Somos um grupo de cerca de 102 mil aposentados que trabalharam durante décadas alimentando o sonho de que um dia, quando nossa força de trabalho se exaurisse, teríamos direito a uma aposentadoria que nos garantisse, não a troca anual de carro, viagens internacionais ou outros luxos, algo que já ficou muito distante em nosso horizonte, mas pelo menos as três refeições diárias de que precisamos para continuar a sobreviver.

Senhor Presidente Lula, o senhor sofreu grandes injustiças na vida, desde que teve que se meter num pau de arara e chegar a São Paulo enfrentando todo tipo de discriminação e adversidades. Por quantas vezes o senhor foi discriminado por ser um operário nordestino?

Pois bem, nós aposentados nos sentimos também discriminados porque uma grande parte de nossos direitos foi cortada quando fomos lesados pelo INSS que não considerou nossas contribuições anteriores a 1994. Contribuímos durante mais de 20 anos numa época em que recebíamos salários mais altos, o que nos garantiria, pela média, uma aposentadoria mais segura. Como esses mais de 20 anos não foram computados, sentimos como se tivéssemos um braço decepado.

Senhor presidente Lula, o senhor sabe o que é ser preso injustamente sem provas. Não se deu por vencido e conquistou novamente o direito de caminhar com a cabeça erguida. Nós também sabemos o que é injustiça e, por isso, não nos demos por vencidos e ingressamos com uma ação no STJ, chamada de Revisão da Vida Toda. O tribunal, por unanimidade, reconheceu nosso direito.

O INSS, ignorando seu erro, recorreu ao STF, que nos garantiu nova vitória em 2022 por 6 a 5. Portanto, entendemos que a suprema corte deste país corrigiu a injustiça. O senhor percebe, o quanto, assim como o senhor, fomos resilientes?

Porém, a alegria durou pouco. O STF, munido de uma informação falsa de que a Revisão da Vida Toda acarretaria um rombo financeiro da ordem de 480 bilhões de reais, utilizou de um artifício para anular sua própria decisão de 2022. Chegou ao cúmulo de aguardar a entrada de dois novos ministros para desenterrar duas ADIs de 1999 para utilizá-las contra nós.

Assim como o senhor recusou a indignidade de voltar para casa com uma humilhante tornozeleira, recusamos também essa humilhante injustiça. Uma auditoria de alto nível foi contratada pelo Ieprev (Instituto de Estudos Previdenciários) para verificar o real impacto financeiro à União. E, pasme, senhor presidente, os 480 bilhões de reais são uma falácia, ou, como afirmou o ministro da previdência, Carlos Lupi, em entrevista, trata-se de um “chutômetro”. Os números verdadeiros são da ordem de apenas 3,1 bilhões de reais a serem dispendidos em 10 anos. Portanto, anular a RVT agora deixa de ser uma preocupação atuária para passar a ser algum tipo de punição. Como afirmou recentemente o ministro Barroso: quem insiste em ações no STF é oportunista.

Senhor presidente Lula, pode não parecer, mas nós, aposentados, representamos também, grosso modo, um programa social, na medida em que movimentamos a economia, e, muitos de nós, mesmo recebendo tão pouco, somos arrimos de família. Por isso, merecemos respeito.

Disso tudo que foi exposto, destacamos as consequências, caso o mérito a nosso favor, já julgado e com acórdão publicado seja anulado:

1 –Será cometida, em plena gestão de um governo voltado para os mais pobres, uma das maiores injustiças já cometidas contra um grupo vulnerável, invisibilizado e ignorado de que se tem notícia em nosso país;

2 - O STF, ao ignorar a Constituição, as próprias jurisprudências e seu próprio Regimento Interno, cria para si um enorme problema para todos os futuros julgamentos da corte: uma imensa insegurança jurídica;

3 – Teremos que continuar a fazer bicos para complementar nossa renda até que um dia, já não haja forças até para isso, contrariando o artigo 5º da Constituição.

Senhor presidente Lula, queremos afirmar e reafirmar que o que buscamos não é piedade nem esmolas, mas sim, tão somente o reconhecimento de nosso direito. Queremos nosso braço decepado de volta.

Por isso, senhor presidente Lula, dadas às nossas limitações por sermos um pequeno grupo de apenas 102 mil pessoas, vulnerável, invisibilizado pela grande mídia e tratado como desprezível pelo mercado financeiro, através desta carta, recorremos ao senhor, nosso grande exemplo de triunfo contra todas as injustiças já sofridas.

QUE NOSSO DIREITO CONQUISTADO SEJA PRESERVADO!


Adesões: 

https://www.change.org/p/carta-aberta-dos-aposentados-da-revis%C3%A3o-da-vida-toda-ao-presidente-lula





terça-feira, 3 de setembro de 2024

Silêncio injusto: a luta dos aposentados pela Revisão da Vida Toda

Por Fernando Castilho




Há alguns meses, o ministro da Previdência Social, Carlos Lupi, recebeu em audiência os representantes do Instituto de Estudos Previdenciários (Ieprev). A pauta não poderia ser mais crucial: a Revisão da Vida Toda, uma conquista que os aposentados obtiveram com muita luta, reconhecida em uma decisão histórica do STF. Na reunião, Lupi demonstrou sentir profundamente o peso dessa causa, compreendendo que a vitória dos aposentados estava sendo ameaçada de forma injusta, sob a alegação de um rombo colossal de 480 bilhões de reais. O instrumento utilizado para a derrubada vitória dos aposentados foi o ressuscitamento de duas Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) de 1999.

Com a responsabilidade que lhe cabia, Lupi concordou em receber do Ieprev um estudo científico que revelaria os números reais envolvidos, derrubando de vez esse espantalho de um prejuízo astronômico aos cofres públicos. Em uma demonstração de transparência e compromisso, Lupi afirmou à imprensa que os valores divulgados eram nada mais do que um “chutômetro”, reacendendo a esperança no coração dos aposentados. Eles acreditaram que, finalmente, o ministro levaria essa questão tão delicada ao presidente Lula, um líder que sempre se destacou na defesa dos mais vulneráveis.

Mas o que veio a seguir foi um silêncio que ressoou como um golpe seco e cruel. Apesar das inúmeras oportunidades, inclusive em reuniões ministeriais, o assunto foi deixado de lado, e a esperança dos aposentados começou a se esvair.

O estudo encomendado pelo Ieprev, agora finalizado, trouxe à tona uma verdade avassaladora: o impacto financeiro seria de apenas 3,1 bilhões em 10 anos (310 milhões por ano), um valor insignificante comparado aos 480 bilhões alegados pela AGU – apenas 0,5% do montante! Para os aposentados, esse valor mensal é muito menor do que os milhões que o governo planeja destinar ao resgate de uma empresa privada que administra o aeroporto de Porto Alegre, destruído pelas enchentes.

A missão do ministro da Previdência Social é clara e inquestionável:

  1. Implementar o plano do governo eleito em 2022;
  2. Proteger e melhorar a vida dos segurados do INSS.

Embora Lupi tenha mostrado competência em seguir essa missão, falta-lhe a coragem de enfrentar, com firmeza e determinação, o desrespeito brutal aos direitos de 102 mil aposentados que o STF deveria garantir.

Pode-se alegar que há um crescente rombo na Previdência que o governo precisa combater com seriedade, mas é preciso lembrar que a RVT é um direito conquistado que não pode ser anulado.

Enquanto isso, há duas semanas, os aposentados enfrentavam uma amarga derrota no julgamento virtual dos embargos de declaração das ADIs, com quatro votos desfavoráveis, quando o ministro Alexandre de Moraes pediu destaque, interrompendo a votação e levando o caso ao plenário presencial, onde tudo recomeçará do zero.

Essa pausa oferece uma nova chance. Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, e Bruno Fischgold, os advogados contratados pelo Ieprev, terão agora a oportunidade de apresentar os verdadeiros números aos ministros, dissipando a principal justificativa para a derrubada da Revisão da Vida Toda. Além disso, tentam convencer os ministros da necessidade, pelo menos, de modular os efeitos da ação, garantindo os direitos a quem entrou com a ação, por exemplo, antes da publicação do acórdão. Porém, os advogados não terão a oportunidade de conversar diretamente com o presidente.

Em um julgamento onde a política econômica parece prevalecer sobre a justiça, é urgente que surja um defensor de peso em favor dos idosos vulneráveis. Exceto Lupi, justamente o chefe da pasta e um grande defensor da RVT, parece não haver mais ninguém com a força política necessária para lutar pelos segurados.

Se o presidente Lula prometeu garantir a segurança alimentar de todos os brasileiros até o fim de seu mandato, é vital que ele saiba que essa promessa está em risco. Porém, se Lupi não apresentar os números verdadeiros ao presidente, a pressão sobre o Supremo para anular a decisão que deu vitória aos aposentados continuará, e a justiça arduamente conquistada poderá se perder no vazio da omissão.