''Operários'' de Tarsila do Amaral (detalhe) |
Entre
as respostas à repórter Sylvia Colombo, Castells afirmou: ''A
imagem mítica do brasileiro simpático existe só no samba. Na
relação entre as pessoas, [o brasileiro] sempre foi violento. A
sociedade brasileira não é simpática, é uma sociedade que se
mata. Esse é o Brasil que vemos hoje na internet. Essa agressividade
sempre existiu.
Há
dois anos atrás, em 17 de maio de 2013, a filósofa Marilena Chauí já havia afirmado: “A classe média [brasileira] é uma abominação
política, porque é fascista, é uma abominação ética porque é
violenta, e é uma abominação cognitiva porque é ignorante. Fim”.
Críticas
não faltaram aos dois intelectuais, porém sobrou mais para Chauí
porque a classe média vestiu a carapuça.
O
que temos presenciado ultimamente é o aumento da intolerância, do
preconceito, da violência verbal e até física não só na classe
média, mas também na alta, a chamada elite.
Mas
terá Castells razão em afirmar que o povo brasileiro sempre foi
violento?
A
dar-lhe razão está Darcy Ribeiro em seu ''O Povo Brasileiro'',
quando diz que a primeira elite que se instalou no Brasil, ainda
vinda de Portugal, tentou escravizar os índios para dar-lhes uma
ocupação, para que fizessem algo produtivo ao invés de viverem a
vida simples, feliz e tranquila que escolheram. Para isso não
hesitaram em enviar aos confins do país os bandeirantes para
caçá-los como animais. Os jesuítas trataram de catequizá-los para
dar-lhes uma oportunidade de escapar do inferno, para o qual jamais
iriam antes da chegada dos portugueses.
Pior
foi com os negros trazidos de maneira cruel da África. Eram coisas,
não gente. E para tudo encontrava-se uma justificativa: Na chegada
já eram violentamente chicoteados para que soubessem o tamanho da
dor que sentiriam, caso desobedecessem ou fugissem. Deus assim
queria.
Mas,
no mundo todo, qual povo nunca foi violento?
Observando
aqui e ali, percebe-se uma certa bipolaridade em todos os povos, de
acordo com períodos da História. A sociedade pode ser num momento
fraterna e generosa, e num outro momento cruel e destrutiva.
O
povo alemão era tão pacífico quanto qualquer outro em tempos de
paz. Com a ascensão de Hitler, o ódio foi sendo incutido aos poucos
pela mídia da época, comandada por Joseph Goebbels, Ministro da
Propaganda do Reich. Em pouco tempo os alemães, homens, mulheres,
crianças, idosos, passaram a odiar os judeus e a aceitar as ações
comandadas por Hitler.
Com
algumas diferenças, o mesmo se deu na Itália e no Japão, braços
do eixo.
E
de povo subjugado e quase exterminado, os judeus passaram a subjugar
e a quase exterminar os palestinos da Faixa de Gaza, enquanto que os
alemães desfrutam de tempos de paz, numa completa inversão das
situações.
Quem
poderia imaginar que os americanos seriam os primeiros grandes
terroristas da História, ao despejarem bombas atômicas em duas
cidades japonesas, exterminando milhões de inocentes? E que agora
fomentam guerras Europa afora?
Na
História do Brasil há inúmeros fatos que ilustram como um povo
simpático e alegre pode de uma hora para outra se tornar
extremamente violento. Basta ver o genocídio que Caxias cometeu no
Paraguai durante a guerra. Basta observar a repressão violenta que
Getúlio empreendeu contra as lideranças da Intentona Comunista,
retratada de forma magistral por Graciliano Ramos em seu ''Memórias
do Cárcere'', onde não faltou sequer o requinte de enviar Olga
Benário, esposa de Luís Carlos Prestes, grávida, para a Alemanha
nazista, onde seria executada numa câmara de gás do campo de
extermínio de Bernburg, conforme nos ensina Fernando Morais na
biografia ''Olga''. Basta conhecer que vinte mil matutos foram mortos
pela repressão durante a Guerra dos Canudos em 1897, junto com seu
líder, Antonio Conselheiro. Basta não se esquecer da ditadura
militar que perseguiu e prendeu cerca de 50 mil pessoas, torturou no
mínimo outras 20 mil e matou ou desapareceu com outros milhares. E
mais, muito mais...
Mas
percebamos que depois do fim do regime militar, o Brasil passou por
um período de paz relativa, apesar das grandes dificuldades
econômicas.
E
depois do fim do primeiro governo Lula, o país passou por anos de
crescimento econômico, redução das desigualdades, aumento de
empregos. Esse período colocou sorrisos nas pessoas, otimismo e
confiança no futuro.
O
brasileiro voltou a ser simpático pois podia comprar carro novo,
viajar de avião, comprar nos shoppings...
Porém,
em 2013 as coisas voltaram a mudar (bipolaridade?).
A
mídia, percebendo o tesouro que tinha nas mãos, após os protestos
do Movimento Passe Livre, engajou-se de vez nas manifestações
contra Dilma Rousseff, que não mais recuperou sua antiga
popularidade.
Agora,
em meio à Operação Lava Jato, o ódio subiu a patamares
inimagináveis.
A
oposição sem propostas para o país, a mídia que todos os dias
publica manchetes para aqueles que só lêem manchetes, deputados
federais eleitos para o Congresso mais conservador da História e
pastores que vivem ainda na Idade Média, tentam de todas as formas
ganhar para si os revoltados que se organizam em movimentos de
marchadores para Brasília e de vendedores de camisetas a pedir
impeachments e a admoestar imigrantes haitianos que buscam no Brasil
solução para suas vidas e as das suas famílias.
E
a todo momento as manifestações fascistoides ocorrem, cada vez mais
ousadas nas redes sociais.
Não
tenhamos dúvidas: o ovo da serpente está sendo chocado. E o máximo
que os ainda não contaminados estamos fazendo é observar perplexos
no que isso vai dar, exatamente como aconteceu quando Mussolini subiu
ao poder na Itália.
Manuel
Castells tem razão ao dizer que não somos simpáticos, mas sim
agressivos.
Como
todos os povos do mundo, inclusive os espanhois de sua terra natal.
E
Marilena Chauí, com certa dose de premonição, acertou em cheio em
2013. Basta ver o que estamos vivendo hoje.
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