Charge: Aroeira |
Eduardo Cunha construiu seu enorme poder nas sombras, das quais emergiu apenas em fevereiro de 2015, para presidir a Câmara. Sabe melhor do que ninguém os caminhos subterrâneos da política. Não precisa de exposição pública para agir.
É
inteiramente justo o júbilo nacional pelo afastamento de Eduardo
Cunha da Câmara dos Deputados. Mas será que ele é mesmo carta fora
do baralho?
Juntemos
os pontos:
1)
Cunha não perdeu o mandato. Foi suspenso do exercício dele por
tempo indeterminado, graças a uma inovação interpretativa, visto
que a possibilidade não existe na Constituição. Segundo a BBC
Brasil, “a suspensão dura até quando Zavascki entender que
persistem os riscos de que o peemedebista use seu mandato para
interferir nas investigações”.
2)
Cunha não perdeu privilégios. O site Congresso em Foco diz que ele
“continuará recebendo salário e outros benefícios garantidos aos
deputados, que somam mais de R$ 160 mil por mês. Fora isso, seguirá
com as garantias previstas para um presidente da Câmara, como ocupar
a residência oficial, locomover-se em carro oficial e jato da Força
Área Brasileira (FAB) e ter à sua disposição uma equipe de
seguranças”.
3)
As condições de trabalho para o deputado seguem excelentes. “Cunha
receberá o salário de R$ 33,7 mil, a verba de R$ 35,7 mil para
gastar com alimentação, aluguel de veículo e escritório,
divulgação do mandato, entre outras despesas. Também estão
assegurados os R$ 92 mil reservados para a contratação e manutenção
de até 25 funcionários em seu gabinete de apoio. Não entram nessa
conta os servidores que atuam por livre escolha do peemedebista na
presidência da Câmara”.
4)
Cunha controla uma bancada “pessoal” de, no mínimo 160
deputados, para cujas campanhas carreou recursos e dos quais conhece
os podres.
5)
O processo de Cunha no Conselho de Ética da Câmara, para cassação
de seu mandato, foi instalado em 3 de novembro de 2015. Anda a passo
de tartaruga, de protelação em protelação. Já é o mais longo
processo no conselho em toda a história da Câmara Federal.
6)
O presidente em exercício da Câmara, Waldir Maranhão, é uma
incógnita. Alguns dizem que ele é bem diferente do titular afastado
e até sonham que anule o processo de impeachment. Mas, há menos de
20 dias, Maranhão manobrou no Conselho de Ética para limitar a
investigação contra Cunha. Não parece exatamente hostil ao colega.
Esse
conjunto de circunstâncias sugere que Cunha pode montar um bunker de
resistência na Residência Oficial, do mesmo modo que Dilma montará
o dela no Palácio do Alvorada.
Mas,
ao contrário da Presidenta, que não tem mais força no Congresso,
Cunha poderá influir na presidência de Waldir Maranhão e seguir
controlando a sua bancada, para manter a obstrução de seu
julgamento no Conselho de Ética e decidir as votações em plenário
que desejar.
Enquanto
não for cassado, portanto, Cunha poderá sustentar um poder
considerável, até porque é completamente inédita e esdrúxula a
sua situação. Incontáveis políticos morrem de medo de que ele
abra a boca e conte o que sabe.
É
claro que o ministro Teori Zavascki pode mandar prendê-lo, se
entender que tudo acima vai de fato conhecer, configurando a
reincidência no delito que levou ao afastamento: uso do cargo para
obstruir a Justiça, em proveito próprio.
Mas
Teori sabe perfeitamente que, se entregar Cunha a Moro, ele pode
negociar a delação premiada. E o risco de derrubar a República com
isso, tantas vezes apontado em outros delatores, será real. Ele,
sim, tem bala para derrubar dezenas, senão centenas de políticos.
Bancará
o ministro a prisão de Cunha? Ateará fogo no circo político
inteiro? Para por Lewandowski no Palácio do Planalto?
Eduardo
Cunha construiu seu enorme poder nas sombras, das quais emergiu
apenas em fevereiro de 2015, para presidir a Câmara. Sabe melhor do
que ninguém os caminhos subterrâneos da política. Não precisa de
exposição pública para agir.
Assim
é que, se houver alguma plausibilidade nesta especulata, o Brasil
terá a honra de inaugurar o "home working" parlamentar. E
logo com o presidente da Câmara Federal.
De
chinelão e bermuda na piscina da residência Nº 171, notebook e
celular ao alcance, seguirá Cunha com o país nas mãos.
Gabriel Priolli é Jornalista,
consultor político e diretor de televisão
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