Por Fernando Castilho
Trabalho gráfico de Alper Yesiltas utilizando Inteligência Artificial e outros programas |
Uma IA altamente desenvolvida poderá, num futuro bem próximo, produzir vídeos e áudios em que até peritos tenham dificuldade em atestar sua veracidade.
Em
1994 os remanescentes dos Beatles, Paul, George e Ringo, se reuniram para
gravar algumas músicas que John Lennon havia deixado como demo em um gravador
doméstico. Após esse trabalho, decidiram lançar somente duas músicas, Free as a Bird e Real Love, que seriam as últimas do
quarteto. Como o som de Lennon estava ruim, tiveram que fazer um esforço para
subtrair ruídos, além de fazer arranjos típicos dos Beatles.
Uma
das músicas de Lennon, Now and Then, não foi incluída porque foi considerada
ruim, principalmente por George. A última fase de John, antes de sua morte, não
pode ser considerada das mais criativas.
Naquela
época nem se cogitava que a ainda inexistente Inteligência Artificial pudesse
promover milagres. Mas Paul McCartney percebeu a possibilidade de gravar essa
última música utilizando justamente a IA que, no caso, só serviria para “limpar”
a voz de Lennon sem mudar absolutamente nada.
E
foi assim que surgiu a “nova” música dos Beatles. A guitarra do falecido George,
gravada ainda em 1994, foi incluída, assim como a bateria de Ringo.
O
resultado, com os típicos arranjos à la Beatles, é bom, embora, insisto, a
música não é lá essas coisas.
Após
isso, tem aparecido no YouTube alguns outros “milagres” utilizando a IA.
Ouvi
duas músicas de McCartney, Band on the Run e Uncle Albert, na voz de Lennon,
com resultados muito ruins. A IA talvez ainda não tenha aprendido como John
Lennon se comportaria ao cantar músicas de Paul McCartney.
Há
também uma gravação com a voz de Elis Regina cantando Nos Bailes da Vida, de
Milton Nascimento. Ela nunca gravou essa música e, caso pudesse ouvi-la, acho
que ficaria vermelha de raiva qual uma pimentinha. Pela primeira vez ouvi Elis
desafinar e sair do tom.
Pode
parecer divertido ouvir essas gravações, mas elas representam alguns perigos.
Primeiro,
para quem conhece Beatles e Elis Regina, pode ser realmente interessante, mas
para quem não conhece e está apenas começando a tomar conhecimento dos
artistas, soa como fraude, já que serão enganados.
Pensando
por outro lado, uma IA altamente desenvolvida poderá, num futuro bem próximo,
produzir vídeos e áudios em que até peritos tenham dificuldade em atestar sua
veracidade.
Provas
de crimes poderão ser adulteradas enganando o sistema judiciário.
Tomemos
como exemplo as três pessoas que agrediram com palavras o ministro do STF,
Alexandre de Moraes e que desferiram um tapa em seu filho.
Um
dos agressores, Alex Zanatta, apresentou à PF um vídeo gravado por ele,
mostrando a reação do ministro, mas cortou a parte em que ele foi agredido.
Caso
Zanatta tivesse feito uso de uma IA, o vídeo não poderia ser considerado
autêntico por um perito e, por isso, jamais poderia ser considerado como prova.
De qualquer forma, nesse caso, a prova definitiva virá das câmeras do aeroporto.
Outro
exemplo são as gravações da Vaza Jato tornadas a público pelo hacker Walter
Delgatti. Se ele tivesse a oportunidade de na época ter usado a IA, essas
gravações jamais poderiam ter sido usadas para que o STF considerasse o ex-juiz
Sergio Moro suspeito e cancelasse todos os processos contra Lula. Uso esses
exemplos para demonstrar o risco que nosso sistema jurídico poderá correr daqui
para frente.
A IA
é um avanço da tecnologia e não pode ser renegada por quem não é conservador,
mas, como em qualquer novidade, é preciso que seja usada para o bem, além de
ser necessário que se criem mecanismos para conter abusos.
Como disse Lula, o que é crime na vida real, é crime na vida digital.
Ah,
ainda prefiro ouvir Beatles e Elis no original.
Link para Band on the Run com John Lennon:
https://www.youtube.com/watch?v=Qo6e_DrhxZU
Link para Uncle Albertt com John Lennon:
https://www.youtube.com/watch?v=7QNBDcY85ds
Link para Nos Bailes da Vida com Elis Regina:
https://www.youtube.com/watch?v=8xZJc2AzupQ
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