O jornalista Breno Altman é dos mais lúcidos blogueiros de toda a blogosfera.
Aqui
ele escreve um texto irreparável, que tem mais ou menos a ver com o
texto deste blog
''Se separado, São Paulo seria um regime fascista?'',
porém com uma grande diferença: é muito mais completo e
competente.
Vale
a pena ler.
Se Dilma quer a paz, que faça a guerra
A
oposição mudou sua estratégia.
Das
eleições findadas em 26 de outubro, extraiu a conclusão de que
deveria passar imediatamente à ofensiva.
Nada
de acumular progressivamente forças, como em pleitos anteriores. A
nova orientação é cristalina: acuar e sabotar o governo desde o
primeiro momento.
O
objetivo de importantes setores conservadores está traçado:
aproveitar as denúncias de corrupção na Petrobrás para levar a
presidente às cordas e derrubá-la através de um golpe parlamentar,
operado por uma maioria de centro-direita.
Se
as condições jurídicas e políticas não permitirem esse arremate,
a escalada contra o PT, nos planos oposicionistas, ao menos deverá
desidratar a autoridade da chefe de Estado, limar a popularidade de
Lula e construir um cenário de isolamento e derrocada da esquerda.
A
direita não está agindo apenas por ódio de classe, ainda que tal
sentimento mobilize seus seguidores para o combate.
Move-se
fundamentalmente por cálculo político. Além das investigações
sobre desvios na principal empresa nacional, o antipetismo reformula
a atuação porque avalia ter, a seu favor, um quadro de dificuldades
econômicas, divisão na base aliada e confusão nas hostes
governistas.
O
recuo oposicionista, por outro lado, poderia significar o caminho ao
cadafalso em 2018, pois daria tempo para o oficialismo arrumar a
casa, relançar reformas e reocupar espaços, impulsionado pela
eventual candidatura do primeiro presidente petista.
Guinada
oposicionista
A
seu modo, o conservadorismo aprendeu as lições de 2005, somando
esse aprendizado a uma leitura agressiva das circunstâncias que
cercaram a última disputa presidencial, cuja síntese está no
célebre axioma lacerdista: Dilma tomou posse, não pode governar.
Por
isso, não há qualquer disposição para a paz. O comando da
oposição está convencido que somente terá triunfos com a guerra.
Não somente porque seu estado de espírito é belicoso, mas também
porque está seguro sobre o potencial da estratégia de tensão
máxima.
Os
acenos administrativos de governadores a este respeito, como os do
paulista Alckmin e o goiano Perillo, são secundários. Relevante,
cheio de simbolismo, é o senador Aloysio Nunes Ferreira, vice na
fórmula de Aécio, se juntar à marcha da ultradireita no último
dia 15 de novembro.
A
bem da verdade, não há surpresa nesta guinada oposicionista,
construída palmo a palmo durante a campanha eleitoral. O que espanta
é a paralisia do governo e seu bloco político. Há três semanas o
conservadorismo opera sem maiores constrangimentos ou contraposição.
O
petismo frequentemente age, apesar das recentes resoluções de sua
direção nacional, como se fosse possível repetir a política de
distensão operada após as três eleições presidenciais
anteriores.
Sem
maioria parlamentar de esquerda, além de atrair partidos de centro,
os governos de Lula e Dilma puderam ser provisoriamente exitosos na
tentativa de neutralizar frações hegemônicas da oposição de
direita, do capital financeiro e até da velha mídia.
Uma
das razões desse sucesso, nos primeiros anos, foi a erosão do campo
conservador. Estava recortado por divisões internas e constrangido à
defensiva, pagando as contas, na memória popular e até entre fatias
da burguesia, pela herança maldita e neoliberal do governo Fernando
Henrique Cardoso.
Este
desgaste político era suficiente para facilitar o deslizamento de
forças centristas e grupos periféricos da direita para fora do
sistema de alianças protagonizado pelo PSDB e o DEM desde 1994,
viabilizando a governabilidade.
O
cenário econômico ajudava a equação.
Reformas
que ampliavam o mercado interno a partir da reorganização de
prioridades orçamentárias, associadas ao forte incremento das
exportações, fomentaram um modelo de desenvolvimento com inclusão
social que não feria interesses oligárquicos. O feijão dos
proletários foi servido sem afetar o uísque dos abastados.
Nem
sequer Cândido, o otimista e célebre personagem de Voltaire,
poderia achar que a situação se mantém.
Novas
medidas para segundo mandato
O
antigo padrão de crescimento parece visivelmente esgotado, depois de
garantir o mais amplo processo de ascensão social em nossa história
recente.
Há
um conflito distributivo sobre o futuro que abala a paz transitória
entre as classes na qual o petismo pode consolidar seu governo.
A
retomada do crescimento, a expansão dos serviços públicos e a
continuidade da inserção econômica dos mais pobres são
impensáveis sem o Estado impor significativa redução da renda
financeira dos mais ricos, desonerando seu próprio orçamento.
O
capital usurário e sua rede de relações, por seu lado, defende a
política de juros altos e corte nos gastos governamentais, para
preservar o valor e a segurança de sua receita.
Este
setor, cujo núcleo duro está composto por vinte mil famílias que
abocanham 70% dos juros pagos pelos títulos da dívida federal, de
quebra almeja a redução relativa de salários e direitos, como
atrativo para um novo ciclo de acumulação capitalista.
A
nova política da oposição de direita tem coerência com este pano
de fundo. Mas não a do governo.
Dilma
foi reeleita porque levou o choque de projetos à radicalidade.
Mobilizou e unificou a esquerda e os movimentos sociais, apoiando-se
sobre o empenho militante de estamentos multitudinários da
intelectualidade, da juventude, do sindicalismo e das organizações
populares.
A
candidatura petista foi capaz de derrotar a poderosa aliança entre a
direita e os meios de comunicação porque soube estabelecer a
contraposição de identidades, deixando claro o significado de cada
fórmula eleitoral.
Desde
o discurso da vitória, porém, a presidente emite sinais híbridos.
O
governo atua, em muitas oportunidades, como se o objetivo principal
fosse acalmar o lado derrotado, acenando com a possibilidade de
absorver determinadas pressões do mundo rentista e mitigar as
reivindicações do campo político-social que sagrou-se vitorioso
nas urnas.
Não
há mensagens e compromissos claros em relação aos milhões de
brasileiros que travaram batalha contra a restauração e pelo
aprofundamento das reformas. Falta uma agenda política e econômica
mais precisa que concretize as aspirações da maioria eleitoral.
Ensinamentos
de Getúlio
A
presidente, por vezes, indica o risco de repetir passos de Getúlio
Vargas em seu segundo governo, brilhantemente descritos pelo
jornalista Lira Neto na biografia que Dilma levou para ler em suas
curtas férias.
Vitorioso
em uma campanha popular e com um programa nacionalista, Getúlio
reassume o governo, em 1951, sem maioria parlamentar e encurralado
pela imprensa.
Nomeia
um ministério conservador e esfria as ruas.
Aceita
a política econômica ditada por banqueiros e latifundiários, ainda
que tenha sido capaz de criar a Petrobrás e elevar o salário
mínimo, entre outras conquistas.
Indisposto
a convocar para o teatro político as forças sociais que o haviam
eleito, o presidente trata de apaziguar seus inimigos com sucessivas
concessões.
Nada
feito. Isola-se e desgasta-se. Vira refém de instituições
controladas pela direita golpista.
Sem
o povo, chega a 1954 entre a queda e a renúncia. Deprimido, recorre
ao suicídio para chamar as massas novamente à cena e deter a
escalada reacionária.
O
sacrifício, que adiou por dez anos a intentona fascista, foi resgate
épico que pagou por ter demorado a reagir diante do sequestro de seu
governo.
Nada
de tão sinistro está à vista para a segunda administração da
presidente Dilma Rousseff. Mas há ensinamentos importantes que
eventualmente poderiam ser tirados da tragédia getulista.
O
primeiro deles é que consiste grave erro desmobilizar e desanimar
multidões, fonte de uma vitória eleitoral, especialmente quando não
se é hegemônico no Estado e na sociedade.
O
segundo registra-se na insuficiência da mera habilidade política
como instrumento para acantonar o golpismo, neutralizar a direita
republicana e reconquistar o centro para um pacto programático. Não
se avança nessa direção sem demonstração inconteste de força na
sociedade, por parte da esquerda e seu governo, que torne caro e
arriscado demais, para correntes centristas, o alinhamento ao pólo
mais conservador.
O
terceiro vem de uma velha frase latina, que bem poderia ser adaptada
à conjuntura brasileira, na qual os ramos mais truculentos detêm,
por ora, a iniciativa e a direção da oposição: quem quer paz,
prepara-se para a guerra.
Meu DEUS, não acalma-me, nem mesmo saber, que esses MAUS BRASILEIROS, PAGARÃO POR ISSO...
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