Não será talvez por esse tipo de "licença poética" que o sonho de um Estado democrático está naufragando e, mais uma vez, grileiros, corruptores manjadíssimos, patrocinadores de candidatos marionetes, falsos profetas, contrabandistas, pilhadores e gente que usa o governo como mero entreposto para seus fantásticos negócios está vencendo a parada novamente e pela undécima vez?
Rodrigo Oller |
Não
sou PT, nunca fui. Mas, só de birra, está começando a me dar
vontade de deixar crescer uma barba e/ou a sibilar. O que vier com
mais facilidade, eu mando ver.
Explico.
Esse ódio crescente e tão palpável quanto um transatlântico que
jorra do coração dos "conservadoressauros" na direção
daqueles que, juntos são milhões, mas não conseguem nunca acumular
mais riqueza do que o famoso 1% dos ricos, já deu.
Pessoal
alega que foi o Lula que começou a "luta de classes", mas,
sejamos sinceros, já se vendia carro blindado e já existia cadeia
superlotada, rebelião na Febem, tiro na cara pra roubar Rolex na
Oscar Freire bem antes de o Lula ir trabalhar na Villares.
Mas
voltemos a essa gentalha pobre que incomoda.
Hoje,
eles não só ocupam espaço e saem gritando no shopping em rituais
primitivos chamados de rolezinhos, como passaram a ser identificados
por "massa de manobra" ou "vagabundos que votam no PT
pra ganhar Bolsa Família".
Pois
então, esse ódio que antes ficava lá contido, ele começa a
mostrar a fuça. Seja lá pelo motivo que for. Não, eu não acho o
Zé Dirceu santo e, sim, eu creio que, deixado livre para dispor do
poder que tinha, ele teria realizado uma pequena revolução
bolchevique a seu modo, por meio de uma reforma fiscal na surdina.
Se
isso seria bem-vindo? Não creio, se fosse feito sem consultar a
população e se não fosse à luz do dia.
Mas,
voltemos à crua realidade do que temos em mãos, e não daquilo que
poderia ter sido.
Agora
que o PT e o Lula não metem mais medo no empresariado, o pessoal que
costumava se restringir a frases econômicas como "eu voto na
Arena" ou "eu votei no PSDB" começa finalmente a
explicar melhor as razões pelas quais sempre teve como princípio
nunca jamais nemfu votar num partido de esquerda.
Isso
acontece porque a feroz desigualdade que impera no país impõe,
digamos, "estilos de vida" deveras conflitantes.
Você
se encontra de um lado ou do outro.
Se
mora na periferia, não tira selfie com policial e não participa de
panelaço contra nenhum político. Seja ele de que partido for, já
que ninguém que está acima de você ou que você seja obrigado a
chamar de "doutor" inspira confiança.
E
se você não mora na periferia e tem a sorte de possuir um jogo de
panelas para brincar de imitar o Cartel de Medellin na hora do jantar
-ueba!- ou se se ufana de vestir a camisa do 7x1 pra cantar aquela
musiquinha insossa, " ...com muito orgulho, com muito amor...
Eu, sou..." ... se você tira foto com polícia, se nenhum PM
nunca olhou feio pra você, nunca arrastou seu irmão no meio da
noite da cama em que ele dormia e o levou embora de camburão porque
ele se parece muito com um traficante do bairro; se você acha que
vence na vida quem estuda e trabalha e que todos nós podemos fazer
isso -sem discriminar entre ricos e pobres-, sem essa de vitimização,
já que basta olhar para os Estados Unidos ou, quem sabe, pra Índia
onde há inúmeros exemplos de gente humilde que venceu sem recorrer
ao crime, vai dizer que não há?
Parece
então que o que nós temos é um problema imenso de comunicação
entre duas populações distintas obrigadas a coexistir.
Trata-se
de uma diferença de pontos de vista e de experiências de vida tão
vultuosa, que acaba produzindo um mar de preconceito, indiferença,
desconfiança, ignorância e desdém.
Seria
lindo se fosse só isso. E olha que isso já seria uma catástrofe
depois de 515 anos empreendendo esta nossa aventura civilizatória.
Mas
provavelmente não é à toa que Pero Vaz de Caminha já tenha
conseguido enfiar um pedido de emprego para um parente na sua famosa
missiva, no primeiro episódio de nepotismo da história do nosso
país, aos 10 minutos do primeiro tempo, naquele que depois viria a
ser o paraíso da vantagem em benefício próprio e do desprezo pela
coletividade, o bem maior e o interesse público.
Nas
minhas páginas nas redes sociais, todo dia tomo porrada (forte) de
indivíduos que se auto intitulam "reaça" disto e "reaça"
daquilo. Ontem um quadrúpede desses tentou me explicar que "reaça"
e "esquerdista" são cosas equivalentes.
E
é esse o pior dano que se está perpetrando ao eliminar sem dó nem
piedade o PT da face da terra -como já se fez antes com Collor,
Jânio, Vargas etc..
Sem
um lado de cá e uma oposição para contra balancear, não existe
possibilidade de haver uma fagulha que dê (re) início ao processo
democrático.
Golbery
do Couto e Silva, ministro chefe da Casa Civil de Geisel e Antônio
Delfim Neto deram força para o surgimento de Lula como liderança
sindical antevendo um futuro democrático de raiz bipartidária.
A
despeito dos problemas com a propaganda e o financiamento das
campanhas políticas, sem o equilíbrio Labour/Tory,
Democratas/Republicanos, Democrazia Cristiana/Partito Socialista não
pode haver nem sequer esboço de arremedo de fiofó de burro de
democracia pra inglês ver.
Já
não são bem tolerados no país fenômenos que nós não captamos,
temos trauma ou consideramos (vá entender) démodé.
"Conservador"
por exemplo, é algo que desce mal para o brasileiro. Em outras
sociedades, o termo tem vários significados. Estritamente na
política, sinaliza que o camarada é a favor de menos interferência
do Estado na economia, da valorização dos direitos do indivíduo e
da não interferência de instituições como a igreja ou quaisquer
outras na vida privada. Soa como uma descrição da filosofia do
Bolsonaro ou do Tuminha pra você? Pois é, pra mim também não. E
Serra, exilado do regime militar e Dilma, presa política da mesma
turma, trocarem gentilezas com antigos algozes e fazerem alianças
que ultrapassam qualquer limite de vergonha na cara com o inimigo de
ontem, faz sentido?
Não
será talvez por esse tipo de "licença poética" que o
sonho de um Estado democrático está naufragando e, mais uma vez,
grileiros, corruptores manjadíssimos, patrocinadores de candidatos
marionetes, falsos profetas, contrabandistas, pilhadores e gente que
usa o governo como mero entreposto para seus fantásticos negócios
está vencendo a parada novamente e pela undécima vez?
Faz
sentido ainda não ter sido julgado o mensalão mineiro? Faz sentido
os senhores Renan e Cunha ainda estarem lá firmes e fortes?
Reafirmo: não sou petista, nunca fui, e nem me julgo particularmente
de esquerda.
Mas
esse desequilíbrio é indicação grave de golpe branco em
andamento, treta por baixo do pano, arranjo de que tipo não se sabe,
mas coisa boa dali não sai.
Ou
por bem julgam tantos deste lado e também do outro e medimos forças
e o país sai lambendo suas feridas, ou anistiamos a todos e vai todo
mundo fritar pastel.
Esta
caça às bruxas, em que o camarada está se transformando em milícia
odiosa que sai à caça do "inimigo" na internet e no
boteco da esquina do escritório, e acusa quem quer que lhe dê na
telha de bandido e ladrão e filho de uma égua só porque o outro
(que até ontem era seu amigão) não compartilha de sua ideologia
começa a se parecer demais com a Alemanha de Hitler circa 1934.
Cadê
o Renan, gente, lembra do processo cabeludo que caiu naquela cabeça
cheia de fio implantado por conta de um caso extraconjugal?
E
o envolvimento dele no Petrolão, não há nada ainda? Claro que há,
em abundância. Só não vê e não mostra quem não quer!
E
o problema lá de Furnas e do Aécio? Há uma montanha de coisas em
estados de todas as mais variadas importâncias, está faltando dizer
isso a quem, ao Papai Noel? Sim, porque ao papa, pode crer, sendo
argentino e odiando a Kirchner como odeia, a esta altura, ele já
está ao par de tudo.
E
o Sarney, onde andará, por sinal? Lembra quando o Lula dizia que ele
até não era de todo mau e que nós devíamos respeitar a
experiência que o bigode tinha acumulado nestes anos todos?
Pois
não é que, depois que ele desapareceu, eles deram um jeito de
cobrir com uma lona.
Agora
virou circo de verdade, completinho.
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