Por Fernando Castilho
Lula, homem das ruas |
Olha,
amigos, desta vez o texto não é deste blogueiro, e nem poderia,
dada a qualidade de expressão contida nele. Não seria capaz.
Diz
aí, Saul Leblon!
Por
Saul Leblon
Ex-presidentes
costumam dar expediente em institutos e fundações de carpete
macio, gabinetes de mogno e mesas de vidro com aço escovado.
Telefonemas
bajuladores e audiências reverenciais compõem uma rotina colorida,
fatiada de almoços elegantes e recepções requintadas. Amenidades
bocejam 24 horas por dia no seu entorno. (continue lendo...)
Bons
negócios, comendas, lavanda inglesa e gravatas de seda italiana.
Mas
tem um deles que destoa do figurino de voz macia e boutades
autocentradas.
Debaixo
da garoa fina desta quinta-feira, protegendo a cabeça branca com
chapéu de boiadeiro que destoa do blusão esportivo, a voz rangendo
idade, cansaço, estrada, o rosto vincado, lá está ele em Diadema,
no cinturão vermelho de São Paulo, em cima de uma carroceria,
puxando a carreata que fecha o primeiro turno da campanha de 2014.
Alguém
poderia imaginar que estamos falando de FHC?
Não.
Quem está ali com uma mão agarrada ao microfone e a outra a
gesticular, alternando uma e outra, a voz rouca modulando altos e
baixos de ironia e indignação, mestre na oralidade, é o único
ex-presidente capaz de fazer isso como se fosse um novato, a suar a
camisa para provar que suas ideias pertencem ao mundo através da
ação.
O
novato no caso é o político que alia a garra de um jovem militante
à experiência de maior líder popular do Brasil.
Duas
vezes ex-presidente da República, ele dá o exemplo da volta às
origens que cobra do PT.
Levar
a disputa às ruas.
Definir
o campo de classe dos interesses em jogo.
Voltar
às bases, ouvir, falar, engajar e aí nunca mais se omitir.
É
isso que ele tem feito com intensidade assustadora para a idade e o
susto de um câncer diagnosticado há três anos , em 29 de outubro
de 2011.
Lula
fará 69 anos no dia seguinte ao pleito de 5 de outubro próximo. A
contrariar o fardo dos outubros, nos últimos nove dias ele visitou
nove cidades, fez mais de 15 comícios.
Na
terça feira, de dia, estava na Capela do Socorro; à noite em Cidade
Tiradentes, agora em Diadema. Fala duas, três vezes por dia. Como
fazia no governo.
Fosse FHC, as câmeras de televisão estariam formando uma parede entre o orador e a plateia reunida em frente a um supermercado em Diadema.
Mas é Lula; e sendo Lula quem é, tem que ser escondido pelo que representa, pelo que já fez, pelo que ainda fará e hoje, sobretudo, pelo que ainda fala e faz.
Ele faz coisas do seguinte tipo: na carreata em Diadema levou anotações com dados do site Manchetômetro, um monitoramento de mídia feito por pesquisadores da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) sobre a cobertura das eleições de 2014.
Durante
quase dez minutos Lula dissecou o sentido político dos números
frios colhidos pelo Manchetômetro.
Fez
manchetes com notícias que não saem nos jornais.
Ao
mencionar o tempo ocupado por escaladas negativas contra a presidente
Dilma Rousseff no Jornal Nacional ( 1h46m), por exemplo, recorreu à
metáfora futebolística e disparou para ninguém mais esquecer: ‘A
Globo na campanha presidencial de 2014 dedicou mais tempo dando
manchetes contra a Dilma do que a duração de uma partida de
futebol’.
Mas
para reforçar ele não hesitou em sacudir a anotação no ar: sabem
quantos minutos de noticiário negativo a candidata do PSB teve no
mesmo período ?Nenhum.
Sobrou
também para os jornalões da ‘gloriosa imprensa brasileira’,
como ele gosta de alfinetar com ironia ácida.
Desde
o início da disputa, em 6 de junho, lembrou a voz rouca, mais afiada
que nunca, os jornais Folha de SP, Globo e Estadão deram nada menos
que 490 manchetes negativas contra Dilma.
Uma
intensidade mais de quatro vezes superior a soma das manchetes
negativas atribuídas a Aécio e Marina juntos (114).
A
conclusão disso tudo altera a voz rouca, que agora adquire um
sentimento de indignação diante do qual é impossível ficar
indiferente.
Porque
Lula não é FHC e porque FHC jamais diria o que ele vai disparar em
seguida. ‘Isso acontece porque neste país não existe liberdade de
imprensa, mas sim a doutrina de nove famílias que dominam a
comunicação e nutrem ódio pelo PT. Não pelos erros que o PT possa
ter cometido’, fuzila a rouquidão indignada. ‘O PT tem defeito?
Tem’, prossegue depois de uma pausa. ‘Mas eles nos odeiam não
pelos nossos defeitos. E, sim, porque o PT promoveu a ascensão
social dos pobres neste país. É por isso que desde o início da
campanha eles atacam a Dilma com o equivalente a três manchetes
negativas por dia cada um’.
A
indignação contra esse cerco, cujo núcleo duro está arranchado no
estado de São Paulo, fez o ex-presidente intensificar a campanha de
rua no interior e na região metropolitana da capital.
Sua
determinação extrai força de uma certeza: é preciso enfrentar e
romper o torniquete de aço contra Dilma, contra Padilha e,
sobretudo, contra o PT e contra ele próprio. Ou a restauração
conservadora pode fechar de vez as portas e frestas sociais e
geopolíticas arduamente abertas a unha nos últimos doze anos.
Ao final da carreta, esse orador empenhado faz um apelo acalorado. Lula pede que o último dia da campanha não seja o derradeiro da militância. Que ela continue a falar o que a sua voz já não poderá mais dizer na boleia de um caminhão. E que a partir desta 6ª feira, comece um mutirão boca a boca, porta a porta, voto a voto para buscar o eleitor indeciso e decisivo na arrancada final para a urna.
A
senha que ele sugere à militância diante dos recalcitrantes é a
sua convicção de que a memória é um pedaço precioso do futuro a
ser conquistado nestas eleições.
É
com essa certeza que ele faz sua despedida como quem sacode o país
pelos ombros para espantar o torpor criado pela doutrinação
midiática conservadora e diz: ‘Perguntem às pessoas se elas se
lembram como era o Brasil antes de o Lula governar este país’.
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